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FUNDAMENTOS DE ESTATÍSTICA E EPIDEMIOLOGIA Aula 08: Estudos de intervenção Apresentação Os estudos epidemiológicos podem ser classi�cados em não experimentais (observacionais) e experimentais (de intervenção). Estudaremos os Ensaios Clínicos Randomizados (ECR), que são o padrão-ouro do delineamento dos estudos experimentais. O padrão ouro é um teste padrão que serve de comparação para outros testes, de forma que se possa veri�car a exatidão dos resultados destes, assegurando o máximo de acertos para o estabelecimento do diagnóstico real. Veri�caremos também os processos de validação de e�cácia e efetividade em ECR, abordando a con�abilidade, os confundimentos e os demais vieses inerentes aos estudos epidemiológicos. Entenderemos ainda a importância das evidências cientí�cas como base da prática da saúde no processo de tomada de decisão. Objetivos Descrever o processo de desenho e Explicar os processos de organização dos Ensaios Clínicos Randomizados (ECR); Examinar as questões de validade, con�abilidade, confundimento e outros vieses dos estudos epidemiológicos; Reconhecer a importância da atuação clínica baseada em evidências cientí�cas. Estudos experimentais O que são estudos experimentais? Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Fonte: Elaborada pelo autor. Os estudos experimentais são também conhecidos como estudos de intervenção, clinical trials (Quando aplicados a conjuntos de indivíduos) ou community trials (Quando aplicados a comunidades inteiras). Esses estudos se caracterizam pelo fato de o investigador determinar os grupos de expostos (a+b) e de não expostos (c+d) a um certo fator e, posteriormente, medir os resultados. O ponto de partida do estudo, portanto, é a variável independente. Já a distribuição dos participantes nos grupos de expostos e de não expostos se faz de modo intencional. Os estudos experimentais podem ser representados esquematicamente em uma tabela 2x2, como a seguir. Tabela 1 – Estudos experimentais Doença presente Doença ausente Total Exposição presente a b a + b Exposição ausente c d c + d Total a + c b + d N Ensaios Clínicos Randomizados (ECR) Embora a nomenclatura ensaio clínico randomizado seja, com frequência, usada acompanhada do acrônimo ECR, o delineamento desse tipo de ensaio também é aplicável em estudos fora do cenário clínico, como os ensaios de base comunitária. Por essa razão, usamos a expressão ensaio randomizado. Comentário Para facilitar a discussão, referências são geralmente feitas para tratamentos e drogas; pois você poderia ter em mente que os princípios descritos se aplicam igualmente para avaliações de medidas preventivas e outras. Sugestões de muitos elementos importantes para ensaios randomizados podem ser vistas em diversos relatos de casos de ensaios iniciais. Ensaios podem ser usados para diversos propósitos, como para a avaliação de novas drogas e de outros tratamentos, incluindo testes de novas tecnologias de cuidado médico e de saúde. Alguns ensaios também podem ser usados para avaliar novos programas de rastreamento e detecção precoce de doenças, ou novas formas de organização e distribuição de serviço de saúde. Figura 1 – Delineamento de um ensaio randomizado. Fonte: (GORDIS, 2017). Coleta de dados de sujeito É essencial que os dados coletados para cada grupo estudado sejam de mesma qualidade. Que dados são necessários? Primeiramente, precisamos saber para qual dos grupos de tratamento o indivíduo foi alocado. Além disso, devemos saber qual terapia o paciente recebe atualmente. Atenção É importante saber, por exemplo, se o paciente foi designado a receber o tratamento A e não concordou. Um paciente pode concordar em ser randomizado, mas posteriormente mudar de opinião e se recusar a cumprir o tratamento. Em oposição, é também importante saber se o paciente que não foi designado para o tratamento A pode assumi-lo por conta própria, frequentemente sem perceber. Desfecho A necessidade de medidas comparáveis em todos os grupos de estudo é particularmente verdadeira para medidas de desfechos. 1 Estas incluem tanto a melhora (efeito desejado) quanto algum efeito colateral que possa surgir. Então, há necessidade de explicitar os critérios utilizados para todos os resultados a serem medidos no estudo. 2 Uma vez estabelecidos explicitamente os critérios, devemos nos certi�car que eles sejam mensurados comparativamente em todos os grupos estudados. Em particular, devem ser evitadas as potenciais armadilhas de se medir mais cuidadosamente os desfechos naqueles que estão recebendo uma nova droga do que nos com a terapia atualmente disponível. 3 O cegamento do estudo, discutido a seguir, pode prevenir muito desse problema, mas como nem sempre é possível, deve-se dar atenção ao aumento da comparabilidade das medidas e à qualidade dos dados em todos os grupos de estudo. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Cegamento O cegamento envolve vários componentes. Primeiramente, gostaríamos que os sujeitos não soubessem para qual dos grupos foram designados. Isso é de grande importância quando o desfecho é uma medida subjetiva, como dor de cabeça ou dor lombar. Se o paciente souber que está recebendo uma nova terapia, o entusiasmo e certos fatores psicológicos podem atuar na indução de uma melhor resposta. Como os sujeitos podem ser cegos (mascarados)? Um modo é pela utilização de um placebo . O uso de placebo não garante automaticamente que os pacientes estejam cegos. Alguns participantes podem tentar determinar se estão tomando o placebo ou a substância ativa. Exemplo Por exemplo, em um ensaio randomizado com a vitamina C para o resfriado comum, pacientes foram cegados pelo uso de um placebo e então perguntados se sabiam ou suspeitavam qual droga estavam tomando. Seleção dos sujeitos O critério para determinar quem será ou não incluído no estudo deve ser explicado detalhadamente com grande precisão e por escrito. Um excelente teste da adequação desses critérios escritos é perguntar: http://portaldoaluno.webaula.com.br/cursos_graduacao/go0302/aula8.html Se escrevemos detalhadamente nossos critérios e alguém, que está caminhando na rua, aplicá-los, na mesma população, selecionará os mesmos indivíduos que nós? geralt (Fonte: pixabay). Não deveria haver qualquer elemento subjetivo de interpretação do investigador para tomar a comprovada decisão de quem será ou não incluído no estudo. Qualquer estudo deve, em princípio, ser reproduzido por outros, como se fosse um experimento laboratorial. Certamente isso é mais fácil de dizer do que de fazer, pois em um ensaio randomizado geralmente lidamos com populações relativamente grandes. O princípio é, entretanto, importante; e o critério de seleção deve ser precisamente estabelecido. Alocação de sujeitos para os grupos de tratamento A melhor abordagem ao se delinear um ensaio é a randomização randomização . Esta tem como elemento crucial a imprevisibilidade da próxima alocação (GORDIS, 2017). Confusão, mediação e modi�cação de efeito em epidemiologia Os estudos epidemiológicos costumam lidar com uma quantidade relativamente grande de variáveis. A elaboração de modelos teóricos que hierarquizem a suposta relação entre as variáveis é recomendada para que os pesquisadores tenham convicção do papel de cada variável estudada na determinação do desfecho em estudo. Por Bertold Werkmann (Fonte: Shutterstock). Exemplo http://portaldoaluno.webaula.com.br/cursos_graduacao/go0302/aula8.html Para facilitar a compreensão, pode-se supor que um pesquisador deseje analisar os fatores associados à ocorrência de infarto agudo do miocárdio em adultos e idosos. As variáveis independentes coletadas foram sexo, idade, cor de pele, nível socioeconômico, níveis de estresse, atividade física, obesidade e tabagismo. Validade dos testes de rastreamento A validade de um teste é de�nida como a habilidade de diferenciar entre quem tem ou não a doença. A validade possui dois componentes: Clique nos botões para ver as informações.Capacidade de identi�car corretamente aqueles que apresentam a doença. Sensibilidade Capacidade de identi�car corretamente aqueles que não apresentam a doença. Especi�cidade Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Con�abilidade (reprodutibilidade) dos testes Vamos considerar outro aspecto da avaliação diagnóstica e dos testes de rastreamento: O quanto um teste é con�ável ou reproduzível. Os resultados obtidos podem ser reproduzidos se o teste for repetido? Está claro que, independentemente da sensibilidade e da especi�cidade do teste, se os resultados não puderem ser reproduzidos, o valor e a utilidade dele serão mínimos. Os fatores que contribuem para a variação dos resultados dos testes discutidos primeiramente são: 1 Variação intrassujeito Variação entre os sujeitos individualmente. 2 Variação intraobservador Variação na leitura dos resultados pelo mesmo examinador. 3 Variação interobservador Variação entre os examinadores dos resultados do teste. Vieses na pesquisa clínica A prática da saúde é baseada, principalmente, em informações produzidas por pesquisas cientí�cas e publicadas em periódicos médicos. A rápida aceitação de uma pesquisa publicada e a incorporação da informação na prática da saúde sem uma avaliação crítica do estudo podem levar a graves erros e ao uso inadequado de recursos. Os resultados de determinado estudo podem ser verdadeiros, mas podem ter sido gerados por acaso (erros aleatórios) ou por desvios sistemáticos da verdade. Portanto, quando se lê um estudo cientí�co, duas questões principais devem ser consideradas: Os resultados do estudo são válidos e con�áveis? Se sim, eles são relevantes e podem ser aplicados a um determinado paciente? A primeira questão se refere ao conceito de validade interna do estudo, ou seja, a capacidade de os resultados do estudo serem verdadeiros para aquela população que foi estudada. A validade interna pode ser afetada pelo erro aleatório ou pelo erro sistemático. O erro aleatório se deve ao acaso e pode ser minimizado mediante o aumento do tamanho da amostra ou a diminuição da variação nas medidas. O erro sistemático consiste em qualquer erro introduzido no estudo, desde a preparação até a publicação, que lhe distorça sistematicamente os resultados e as conclusões. A segunda questão se refere ao conceito de validade externa, ou seja, até que ponto os resultados de um estudo são aplicáveis a outras situações ou outros pacientes. A validade externa também é denominada capacidade de generalização. Apesar de a nomenclatura não ser padronizada, os principais tipos de vieses podem ser inseridos em três grupos principais: Seleção, informação e confusão. Saúde baseada em evidência A Medicina Baseada em Evidências (MBE), movimento médico que teve início por volta da década de 1970, propõe que a prática médica deva seguir o rigor do método cientí�co. Esse tema é de especial interesse para a população para que haja um entendimento de como os médicos atualmente estruturam o raciocínio e adotam condutas perante os pacientes. Saiba mais No Brasil, o Grupo Interdepartamental de Epidemiologia Clínica (Gridec) foi criado no início da década de 1990 por um grupo de professores da Universidade Federal de São Paulo. O Centro Cochrane do Brasil, cuja missão é elaborar, manter e divulgar revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados com o melhor nível de evidência para as decisões em saúde, foi inaugurado em 1996. A colaboração do Cochrane representa um excelente avanço para a tomada de decisões no campo dos cuidados à saúde, sendo comparada ao Projeto Genoma em importância para a medicina clínica mundial. Os objetivos da colaboração do Cochrane são: Fornecer informações precisas sobre os efeitos do cuidado à saúde prontamente disponível por todo o mundo; Produzir e disseminar revisões sistemáticas de intervenções aos cuidados à saúde; Promover a busca por evidências na forma de ensaios clínicos e outros estudos de intervenção. Atividade 1. Assinale a opção que apresenta os estudos epidemiológicos que têm menor potencial de introdução de vícios. a) De coorte b) De casos controles c) Ensaios clínicos randomizados d) Transversais e) De série de casos 2. Com respeito à aleatorização nos ensaios clínicos, assinale a opção FALSA. a) Elimina o vício da alocação do tratamento. b) Pode equilibrar os grupos de tratamento em covariáveis. c) Garante a validade dos testes de significância usados para comparar o tratamento. d) Exclui os fatores de confusão. e) Aloca as pessoas aos grupos de tratamento usando o jogo de azar. 3. Sobre a alocação em estudos experimentais, assinale a opção correta. a) A possibilidade de confundimento por fatores de risco não identificados ou desconhecidos é de pouco interesse em muitos estudos epidemiológicos. b) O confundimento não pode ser evitado em estudos em que as pessoas são alocadas para receber ou não uma intervenção que altera o status de exposição delas. c) Em estudos experimentais (trials), a randomização é alocada com o propósito de melhorar a validade da intervenção. . d) O propósito da alocação randomizada de exposição é evitar o vício causado por diferenças entre expostos e não expostos. e) Com grande número de pessoas envolvidas na randomização, os grupos tendem a ser diferentes com respeito a outros fatores prévios à intervenção. Notas placebo Substância que se parece e tem o mesmo sabor e o mesmo cheiro do agente ativo. randomização Segundo Gordis (2017), randomizar signi�ca, de fato, jogar uma moeda para decidir a alocação do paciente para um dos grupos de estudo. Referências GORDIS, L. Epidemiologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2010. MEDRONHO, R. de A. Epidemiologia. São Paulo: Atheneu, 2002. ROUQUAYROL, M. Z. (org.). Epidemiologia & saúde. 3. ed. Rio de Janeiro: Medsi, 1988. Próxima aula Planejamento estratégico de ações em saúde; Papel da ciência epidemiológica na elaboração de planos, programas e ações de prevenção de doenças e promoção de saúde. Explore mais Pesquise na internet, sites, vídeos e artigos relacionados ao conteúdo visto. Em caso de dúvidas, converse com seu professor online por meio dos recursos disponíveis no ambiente de aprendizagem.
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