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CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTA E A DISTÂNCIA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ- UFPI MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO COORDENAÇÃO DO CURSO DE HISTÓRIA DISCIPLINAS: HISTÓRIA DO PIAUÌ I PROFESSORA CLEIDE CARVALHO A ESCRAVIDÃO NO PIAUÍ: uma breve discurssão historiográfica FRANCISCA ODENIZA PERES DE OLIVEIRA CASTELO DO PIAUÍ, 2020. A ESCRAVIDÃO NO PIAUÍ: uma breve discussão historiográfica 1 INTRODUÇÃO O sistema escravocrata moldou a estrutura da sociedade colonial brasileiro, a escravidão foi um fenômeno complexo que marcou presença em todo o território explorado, foram três séculos, da colônia ao império, de violência de ordem física, psicológica e cultural, e em território piauiense não foi muito diferente. No entanto, no que diz respeito a escravidão em território piauiense existe uma dircurssão entre os historiadores, pesquisadores e escritores que estudam o processo de escravidão no Piauí. Desta maneira este trabalho pretende analisar a discurssão historiográfica existente a cerca desse tema. Essa temática referente a escravidão foi escolhida em virtude de ser um elemento fundamental na construção da complexa sociedade brasileira de maneira geral. A herança da escravidão esta presente nas relações sociais do dia a dia, por tanto é preciso expandir olhares a fim de não reproduzir os estereótipos e julgamentos do passado. A história do Piauí é riquíssima e com várias lacunas a serem preenchidas. O propósito da pesquisa é compreender o processo de escravidão ocorrido no Piauí colonial, salientando algumas características, diferenças e semelhanças existentes nos dois tipos de escravidão que predominaram no Piauí, a escravidão indigena e a escravidão do negro africano. A metodologia usada na pesquisa foi bibliográfica do tipo exploratória com a técnica de coleta de dados destacando a busca de artigos, periódicos, dissertações, teses e livros em sites acadêmicos confiáveis com o SciELO e o Google Acadêmico. A análise historiográfica foi feita através do estudo de autores renomados á respeito dessa temática: Mott, Brandão, Nunes, Chaves, Dias, autores estes que relatam de forma sucinta as características do sistema escravocrata no sertão piauiense desde o período colonial ao tempo do império. Sendo que as palavras chaves utilizadas foram escravidão no Piauí, História do Piauí, Piauí colonial e Piauí Imperial. 2 A ESCRAVIDÃO NO PIAUÍ: UMA BREVE DISCUSSÃO HISTORIOGRÁFICA 2.1 O processo de “povoamento” do Piauí Conforme Abreu (1969) a ocupação das terras do Piauí, as quais correspondiam a uma parte da área do “Sertão de Dentro”, ocorreu na segunda metade do século XVII, e iniciou-se pela costa leste e sul do território, pelas margens dos rios Piauí, Canindé, Paraim e Gurguéia. A data precisa da “descoberta” do Piauí oficialmente, conforme o pesquisador Luiz Mott, ocorreu no ano de 1674, mesmo período em que Domingos Afonso Mafrense e Francisco Dias Dávila, da casa da Torre da Bahia, instalam suas primeiras fazendas de gado nas imediações da Ribeira do Canindé (MOTT, 1985, p.72). Durante muito tempo, a região que atualmente corresponde ao Estado do Piauí, foi considerado pelo dominante pensamento historiográfico como a “terra de ninguém”. No entanto, de acordo com as pesquisas arqueológicas da fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM) o Sertão Sudeste do Piauí é a região de povoamento mais antigo das Américas. Desta forma, antes da chegada dos colonizadores ao território piauiense estas terras já eram povoadas por indígenas de várias etnias. De acordo com Claudete Dias: Havia no Piauí, quatro etnias - JÊ, CARAIBA, CARIRI, E TUPI entre diversas e numerosas tribos ou nações como os Tremembés, Jenipapos, Anapurus, Cupinharós, Amanajás, Precatis, Aramis, Alongás, Aroás, Amoipiras, Guegês, Jaicós, Pimenteiras, Gilbués, Tapecuás, Timbiras. Essa população desenvolvia uma agricultura rudimentar, plantava mandioca, milho e batata doce para se alimentar, além da caça e da pesca, viviam nus e tinham cabelos cumpridos (DIAS,2010, p.423). No entanto, a ideia de “povoamento” do território piauiense é tratada pela historiografia tradicional como um processo iniciado no momento de expansão territorial da Coroa Portuguesa, sendo assim desconsiderando as populações nativas que já ocupava esse território do sertão nordestino. Segundo Brandão (1999) o povoamento do território piauiense foi consequência da grande expansão da agricultura canavieira que ocupou toda a área da zona da Mata Nordestina, surgindo assim a necessidade de explorar novos territórios. Em contrapartida ao pensamento da historiografia tradicional dominante existem novas perspectivas que sugere uma discussão sobre o significado de conceitos como “conquista” “descobrimento” ou “invasão”. Nesse sentido as pesquisas da historiadora Claudete Dias (2010) apontam que ao mesmo tempo em que houve o povoamento do território piauiense pelos portugueses, ocorreu também o despovoamento da população nativa. Segundo a mesma: A historiografia piauiense incorporou e reproduz tradicionalmente a ideia de “conquista do território” descoberta, ocupação e povoamento para explicar a ocupação das terras dos nativos e em geral focaliza a implantação das fazendas de gado, o comércio, a organização do poder a partir das famílias latifundiárias, dando pouco destaque à existência de uma população dizimada pela guerra, sem se dar conta de que esses conceitos valorizam unilateralmente a perspectiva do colonizador, apagando e até mesmo menosprezando a existência de uma outra população no cenário onde se desenrolou a história da colonização (DIAS,2010 ,p.421). Dias (2010) ainda argumenta que com a chegada dos colonos portugueses em solo piauiense, os desbravadores da Casa Da Torre, dentre eles Domingos Afonso Mafrense considerado o “descobridor” dos Sertões de Dentro, não encontraram terras propícias para o cultivo de cana-de-açúcar, principais atividade econômica da época. No entanto as terras eram bastante apropriadas para a criação de gado, na qual foi implantadas várias fazendas de gado ao longo do processo de povoamento da região. Odilon Nunes (1983) descreve que no sertão piauiense existia grandes extensões de terra, distante do litoral e com excelentes pastos, condições ideias para o desenvolvimento da pecuária. Sobre a instalação das fazendas no Piauí, o mesmo autor, descreve os relatos dos primeiros viajantes no século XVIII: Não há neles aquele horroroso trabalho de deitar grossas matas abaixo, e romper as terras à força do braço! Neles pouco se muda na superfície da terra; tudo se conserva quase no seu primeiro estado. Levanta-se uma casa coberta pela maior parte de palha, feitos uns currais e introduzidos os gados, estão povoadas três léguas de terra, e estabelecida uma fazenda (NUNES, 1983, p.06). Nunes (1983) relata que havia um “empecilho” na ótica dos desbravadores, a região conhecida como Sertões de Dentro possuía muitas populações nativas, e para os colonizadores os índios eram seus inimigos, então para construir os currais de gados, os colonizadores fizeram a "chamada limpeza da terra" que teve como resultado a expulsão e a escravização e o aldeamento dos povos nativos que habitavam essas terras. 2.1.2 A escravidão no Piauí: um breve histórico A escravidão foi um fenômeno complexo que marcou presença em todo o território brasileiro, moldando a estrutura da sociedade colonial. O sistema escravocrata interligado ao comercio foi um sistema lucrativo. Na sociedade colonial tal sistema moldou laços e deixou heranças profundas, refletindo em problemas de ordem estrutual do nosso país. Quando se pensa em escravidão, quase sempre, lembramos-nos da escravidão do negro africano, no entanto temos ampliar nossosolhares para entender o processo de escravidão dos nativos que habitavam praticamente todo o território americano antes da chegada dos europeus, este foi o primeiro sistema escravocrata. Sendo assim é perceptivel que o Brasil, por apresentar, um território extenso e heterogêneo, possuiu múltiplas facetas da escravidão que variaram de região para região, foram mais de três séculos de sistema escravo, desde os índios ao negro africano. Fazendo um recorte para o Piauí, sendo observados alguns traços, ora de forma semelhante ora de forma diferente, do sistema escravocrata que predominou no Brasil. A formação do território piauiense é marcada pela a predominância da pecuária como a principal atividade econômica voltada para o abastecimento do mercado interno. Não havia necessidade de investimento por parte dos colonos em escravos, pois a mão de obra era pouca, além disso, havia os indígenas que eram investimentos mais baratos, quando comparado ao escravo negro. Com essas particularidades vários autores compartilham que a escravidão no Piauí ocorreu de forma inexpressiva e de maneira branda. De forma tradicional, estudiosos como Caio Prado Júnior, Odilon Nunes, defendem tal ponto de vista. O Piauí era relativamente diferenciado, um sertão extensivo e extrativista, de caráter frouxo, onde quase não havia escravismo, desenvolvia atividade econômicas de pouca expressão na economia colonial, diferenciando-se do nordeste litorâneo, açucareiro semiburguês, este diretamente ligado com o capital internacional, mas lhe era abastecedor e subordinado, uma subordinação do sertão ao capitalismo mercantil que se esboçava no nordeste açucareiro. No caso do Piauí haverá uma subordinação interna ao capital mercantil do litoral em Salvador e Recife na produção, circulação da mercadoria, o gado e, que somente após a guerra de secessão norte americana introduz o algodão no mercado Inglês e Norte americano, levando a mercadoria em escala mundial, e tardiamente com a borracha de maniçoba e a carnaúba (SOUSA;2012, p.13). Em contrapartida Brandão no livro o escravo na formação social do Piauí, fez um levantamento das singularidades do sistema escravocrata presente no Estado no período colonial. Segundo mesma autora: Estudar a sociedade piauiense nos primeiros séculos de sua formação implica em se verificar as principais características dos escravos que a constituíam, uma vez que, os contextos sociais foram sempre expressivos desde a primeira fase do povoamento (BRANDÃO, 1999, p.120). A partir do aumento de pesquisas específicas voltada para a historiografia local foi possível diminuir as lacunas e contestar a historiografia tradicional. Destacando os estudos de Brandão, Mott e Chaves, ambos concordam que a introdução do escravismo no Piauí não se ligou ao aspecto puramente econômico da produção, apesar da existência da pecuária, não ocorreu de forma aleatória sem padrões do Brasil escravocrata, como por exemplo, a formação de o latifúndio e a exploração de uma única atividade econômica, no sertão piauiense. Sendo assim, prevaleceram dois processos de escravidão o nativo e o negro. 2.1.3 A escravidão indígena Com chegada dos colonizadores em terras piauienses, e a introdução das fazendas de gado os colonizadores travaram diversos conflitos com os índios que eram considerados como seus inimigos “selvagens”. Os índios começam a perder seus territórios e cada vez mais tendo de embrenhar-se nas matas. Como forma de repressão os nativos atacavam as fazendas de gado e matavam animais para seu próprio consumo, gerando uma revolta ainda maior nos fazendeiros, isso acabou gerando grandes conflitos, que culminaria em uma grande guerra de extermínio dessas nações. Nessa perspectiva o autor Wilson Correa descreve: [...] a legislação portuguesa em relação ao nativo era por demais falha e a presença de colonos nessa região levou os nativos aos primeiros confrontos na proteção de suas terras. Esses primeiros confrontos serão patrocinados pelos fazendeiros criadores de gado, que visam apossar-se das aldeias, as quais geralmente localizavam- em regiões próximas a rios, para garantir as instalações dos currais em regiões bem servidas de água. Essas ações iniciais vão torna-se cada vez mais intensas e teremos com isso o início do processo espoliativo das nações nativas dos piauienses (CORREA, 2010, p.15). Os índios foram perseguidos, mortos, e os que sobreviviam eram aldeados e escravizados, eram obrigados a trabalhar nas fazendas de gados, além disso também houve a catequização dos indígenas, tidos como “selvagens”, pelos jesuítas mandados pela coroa portuguesa. Nesta perspectiva Claudete Dias (2010) afirma que as populações nativas permaneceram em segurança até a chegada do colonizador, que traz em si o germe da violência. A mesma autora descreve que: No Piauí, durante o período de meados de 1660 até final do século XVIII, numerosos expedições foram organizadas com a finalidade de expulsar os nativos de suas terras, aprisioná-los para torná-los escravos nas grandes fazendas de gado e de lavoura, para combater outras aldeias, como guias em penetrações nas matas ou para expulsá-los das terras férteis e ricas em minérios e madeira. Eram para “fazer guerra ao gentio bárbaro” com o apoio das autoridades portuguesas, como as lideradas Domingos Jorge Velho, pelo Ten.Cel. João do Rêgo Castelo Branco. ” e José Dias da Silva, designado para “conquistar” os pimenteiras dos vales dos rios Gurguéia e Piauí : são totalmente dizimados sob o comando destes militares, por meio de uma guerra, entre 1776 a 1784 (DIAS,2010 ,p.424). Brandão (1999) destaca que o trafico indígena, entre os séculos XVII e XVIII, foi um setor com altas taxas de lucros no território sertanejo, um investimento compensatório principalmente entre os colonos com menor renda. O Piauí era um ponto de trafico indígena para outras localidades no território brasileiro. Levando em conta que, ao findar, no século XVII, as bacias do Canindé.Itaim-açu, Itaueira,Maraotoã e Gurgéia achavam-se conquistados e povoado, conclui-se que grande quantidade de índios havia sido escravizados. Dos 438 habitantes das fazendas, naquela época, apenas 64 eram nativos, fica claro que os demais apresados foram traficados (BRANDÃO, 1999, p.117). Vale ressaltar que a coroa portuguesa atuava de forma contraditória em relação à questão indígena, ora protegia com ações educadoras dos jesuítas e ora apoiava e aprovava o uso de violência dos colonos que escravizava os nativos, principalmente quando ocorria resistência de dominação. No Piauí no ano de 1763 o governador João Pereira Caldas promoveu campanha contra as tribos nativas sertanejas. Em 1777, João Rêgo de Castelo Branco, declarou guerra a tribo pimenteiras. As expedições eram oficias e contava, na maioria dos casos, com apoio dos próprios indígenas que eram conhecedores da região. A ação dos bandeirantes contra o gentio do sertão, inclusive no Piauí, foi à primeira etapa no processo de expansão dos currais. Isso porque promovia a expulsão e eliminação das tribos instaladas na região. Também foi instrumento de redução dos nativos sobreviventes dessa guerra ao cativeiro (BRANDÃO, 2014, p.111). A “guerra de colonização” no Piauí provocou o extermínio de várias etnias indígenas, e a formação de uma estrutura social, política e econômica nos moldes mercantil e escravista. Esse cenário de escravidão indígena só começa a mudar a partir do tráfico negreiro, que introduz a mão de obra escrava dos negros trazidos da África para a colônia brasileira. A partir de então troca-se a mão de obra indígena pela africana. 2.2.1 A escravidão do Negro Nunes (1983) destaca que o aumento da produção açucareira nos engenhos brasileiros, tornou-se necessária uma mão-de-obra cada vez maisespecializada, como a dos africanos, que já lidavam com essa atividade nas propriedades dos portugueses, na Ilha da Madeira, litoral da África. A escravidão de negros e seus descendentes foi a forma de trabalho compulsório adotada, de uma maneira geral, no Brasil, desde o período colonial até o ano de 1888, quando essa prática de trabalho escravo foi oficialmente abolida. Segundo Gorender, (2010) os homens escravizados eram considerados coisas, bens de seu senhor, que poderiam ser vendidos, trocados ou deixados de herança. Os estudos de Monsenhor Chaves afirmam que os escravos negros entraram no Piauí pela estrada que ligava a feira de gado de Capoame, na Bahia, a Vila da Mocha, no Piauí, não se sabe ao certo em que ano chegaram os primeiros escravos negros. A historiografia piauiense durante muito tempo tratou a escravidão como sendo algo incompatível ao sistema econômico do Piauí naquela época, alegando que a labuta com o gado não demandava muitos esforços, afirmando ainda que a mão de em geral, era livre, sendo desnecessário o uso de escravos. Um dos defensores dessa visão é o escritor Odilon Nunes, ele apresenta os cativos como parte do contexto familiar senhorial: [...] ordinariamente, tratava de modo paternal sua escravaria, e ainda melhor tratava, se era ele pobre, pois disporia apenas de escravos como serviçais, para pajem, ou trabalhos domésticos, e desde então ficavam integrados na vida familiar como criados (NUNES,1983, p.29). Em contrapartida à visão paternalista do escritor Odilon Nunes, existe as argumentações do padre Monsenhor Chaves (1998). Para ele o sistema escravista brasileiro, e consequentemente o piauiense, pode ser muito bem definido por duas fases: Uma primeira em que imperou, com certa ênfase, o regime de ferro e fogo, como os castigos mais violentos e mais fortes, com o abandono dos doentes e dos velhos… A segunda fase, menos árdua e violenta, com tratamento mais cuidadoso aos escravos, é o que se segue ao ano de 1850, quando medidas muito sérias começam a ser tomadas para o cumprimento da Lei de 1831, que extinguiria o tráfico no Brasil. (CHAVES, 1998, p. 37). Assim como nas outras regiões do país, a mão de obra escrava do negro africano também foi utilizada no território piauiense durante muito tempo, embora acredita-se que pelas características da economia os escravos desta região tenham sido menos explorados que nas regiões agrícolas e de exploração mineral. Tania Brandão afirma: A escravidão de africanos e seus descendentes também vigorou no Piauí desde a instalação dos primeiros currais até 1888, quando o regime escravo foi abolido no Brasil. Esse fato é confirmado por um dos primeiros colonizadores dos sertões piauienses, Domingos Afonso Mafrense, em seu Testamento, datado de 1711 (BRANDÂO, 1999, p.151). Embora haja um debate historiográfico a respeito da escravidão negra no Piauí, existe um consenso que existiu sim esse sistema escravocrata no território piauiense, talvez com as algumas peculiaridades no que diz respeito as outras regiões brasileiras. Quanto ao tratamento com os escravos, Luiz Mott fala: o que existia era um tratamento menos opressivo do que em outras áreas produtivas, onde “parece que as condições e relações de trabalho, assim como as perspectivas de alforria eram muito melhores na zona pecuária do que nos engenhos de açúcar (MOTT,1985, p.85). Devido a economia piauiense ser baseada na pecuária, e ser voltada para o mercado interno o trabalho exercício pelos escravos não eram tão pesados se comparado a região de mineração e dos engenhos de açúcar, no entanto é importante ressaltar que é um sistema escravocrata e para manter esse sistema em ordem os meios utilizados pelos senhores donos de escravos eram cruéis, iam deste a violência física e psicológica até a morte dos escravos. Para firmar essa realidade Luiz Mott apresenta trechos de uma carta, escrita por uma escrava de nome Esperança Garcia, denunciando os maus tratos dispensando a ela, a suas companheiras e filhos e aos demais escravizados da fazenda: [...] há grandes trovoadas de pancadas em um filho meu sendo uma criança que lhe fez extraio sangue pela boca, em mim não posso explicar que sou um colchão de pancadas, tanto que cai uma vez do sobrado abaixo peiada. Por misericórdia de Deus escapei [...] (MOTT, 1985, p. 141). Para Tanya Brandão (1999), no Piauí possuir escravos não estava diretamente ligado só a obtenção de mão de obra para os afazeres diários, essa prática estava relacionando também com a questão de status social. Portanto possuir escravaria não era um privilégio só dos grandes senhores. Tanya Brandão afirma que: a presença do escravizado nesta região se deu com características distintas no resto do País, sendo absorvida muito mais como uma demonstração de social do que como força de trabalho atuante, apesar de, do ponto de vista da relação social, não fugir à regra do sistema escravista impregnado no Brasil (BRANDÃO, 1999, p. 154). A diminuição do tráfico negreiro no Atlântico, no século XIX provocou a fragmentação da escravidão no Brasil, a partir daí inicia-se uma nova fase do tráfico de pessoas escravas, o tráfico interno, ou seja, a compra e venda de escravos entre as próprias províncias brasileiras, para suprir as necessidades de mão de obra, nos lugares em maior desenvolvimento. O tráfico interprovincial contribuiu para a diminuição da população escrava no Piauí. Acredita-se que o tráfico interno no Brasil tenha perdurado durante muito tempo, até a abolição da escravidão em 13 de maio de 1888, quando a princesa Isabel assinou a Lei Áurea. Em apenas 15 anos, espaço de tempo que corresponde o período entre os anos de 1872 e 1887, o número de escravos no Piauí teve uma redução de 14.825 cativos. Nesse espaço de tempo, verifica-se que a população de cativos diminuía cerca de 988,3 escravos por ano. O tráfico interprovincial foi importante no processo de diminuição dessa população (SILVA, 2018, p.02). A partir do ano de 1872, verificou-se que o número da população escrava diminuiu rapidamente no Piauí. Se naquele ano existia aproximadamente 23.638 escravos, em 1887, segundo o Resumo Geral dos Escravos Matriculados na Província do Piauí, existiam apenas 8. 970 pessoas na condição de escravas (RESUMO GERAL DOS ESCRAVOS MATRICULADOS NO PIAUÍ, 1887 apud SILVA, 2018, p.01). 3 CONSIDERAÇÔES FINAIS É inegável que houve escravidão no Piauí desde os primórdios da época colonial. Nenhuma escravidão é branda, a escravidão por si só já é uma forma de violência, de ordem física, psicológica e social. A escravidão no solo do sertão do Piauí teve uma formação específica tendo como pano de fundo a estrutura da pecuária, voltado ao mercado interno. Houve escravidão tanto do índio, quanto do negro. Os primeiros povoados e vilas foram fundados em torno da pecuária, houve guerras e resistência entre indígenas e colonos. A Coroa Portuguesa participava da administração nem sempre de forma ativa. A guerra de colonização do território piauiense culminou no exterminio de várias etnias indigenas que antes da chegada dos “colonizadores” , habitaram durante muito tempo o território que corresponde ao atual Estado do Piauí. A escravidão negra entre os séculos XVII e XIX aconteceu com o uso de violência tanto na zona rural ou urbana, as condições eram péssimas desde a saúde a questão de alimentação. Existem lacunas na história do Piauí, que ao longo do tempo espaço, foram sendo preenchidas, isso só foi possivel devido ao trabalho de vários pesquisadores, historiadores e escritores que buscam questionar a historiografia tradicional, afim de entender a história através da ótica das minorias e dos desprevilegiados pela história geral, tradicional. Sendo assim é preciso sempre novas perguntas e questionamentos.REFERÊNCIAS ABREU, J. Capristano de. Capítulos de História Colonial (1500- 1800). , 5a. ed. Rio de Janeiro: Livraria Briguet, 1969. BRANDÃO, Tanya Maria Pires. O escravo na formação social do Piauí: perspectiva histórica do século XVII e XVIII. Teresina: Editora da Universidade Federal do Piauí, 1999. BRANDÃO, Tanya Maria Pires. Para Além dos Engenhos: A Escravidão na Colonização do Piauí. IN.: EUGÊNIO, João Kennedy (org.). Escravidão Negra no Piauí e Temas Conexos. – Teresina: EDUFPI, 2014, p. 152-189. CHAVES, Monsenhor. O índio no solo piauiense IN: Obra completa. Teresina. Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1998. DIAS, Claudete Maria Miranda. História dos Índios do Piauí. Teresina, EDUFPI/GRAFICA DO POVO: 2010. GORENDER, Jacob. O escravismo colonial. 3a .Ed São Paulo: Ática, 2010. MOTT, Luiz R.B. Piauí Colonial; População, Economia e Sociedade. Teresina: Projeto Petrônio Portela, 1985. NUNES, Odilon. Estudos de História do Piauí. 2ª ed. Teresina: COMEPI, 1983. SILVA, Rodrigo Caetano. A fragmentação da escravidão no Piauí: exportação de cativos e a entrada de flagelados da seca. Vozes, Pretérito & Devir Ano 2018, Vol. VIII, Nº I, artigos.
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