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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO PRISCILLA REINISCH PERDICARIS CONTRATUALIZAÇÃO DE RESULTADOS E DESEMPENHO NO SETOR PÚBLICO: A experiência do Contrato Programa nos hospitais da Administração Direta no Estado de São Paulo. SÃO PAULO 2012 FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO PRISCILLA REINISCH PERDICARIS CONTRATUALIZAÇÃO DE RESULTADOS E DESEMPENHO NO SETOR PÚBLICO: A experiência do Contrato Programa nos hospitais da Administração Direta no Estado de São Paulo. Tese apresentada à Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP), em cumprimento aos requisitos para obtenção do título de Doutor em Administração Pública e Governo Linha de Pesquisa: Transformações do Estado e Políticas Públicas Orientadora: Profa. Dra. Regina Sílvia Viotto Monteiro Pacheco SÃO PAULO 2012 PERDICARIS, Priscilla Reinisch CONTRATUALIZAÇÃO DE RESULTADOS E DESEMPENHO NO SETOR PÚBLICO: A experiência do Contrato Programa nos hospitais da Administração Direta no Estado de São Paulo./ Priscilla Reinisch Perdicaris, 2012, 133 f. Orientadora: Regina Sílvia Viotto Monteiro Pacheco. Tese (doutorado) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo. 1. Administração pública – São Paulo (Estado). 2. Contratos de gestão. 3. Hospitais - Administração. 4. Hospitais – São Paulo (Estado). 5. Desempenho. 6. Setor público – São Paulo (Estado) I. Pacheco, Regina Silvia Viotto Monteiro. II. Tese (doutorado) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo. III. Título. CDU 35(816.1) PRISCILLA REINISCH PERDICARIS CONTRATUALIZAÇÃO DE RESULTADOS E DESEMPENHO NO SETOR PÚBLICO: A experiência do Contrato Programa nos hospitais da Administração Direta no Estado de São Paulo. Tese apresentada à Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP), em cumprimento aos requisitos para obtenção do título de Doutor em Administração Pública e Governo Linha de Pesquisa: Transformações do Estado e Políticas Públicas Orientadora: Profa. Dra. Regina Sílvia Viotto Monteiro Pacheco Data de Aprovação: ___/___/_____ Banca Examinadora: Profa. Dra. Regina Sílvia Viotto Monteiro Pacheco (Orientadora) FGV-EAESP Prof. Dr. Álvaro Escrivão Jr. FGV-EAESP Profa. Dra. Cibele Franzese FGV-EAESP Prof. Dr. José Manoel de Camargo Teixeira USP- HCFMUSP Prof. Dr. Humberto Falcão Martins UNB APRESENTAÇÃO E AGRADECIMENTOS O desafio de transformar o foco das organizações públicas para resultados tem sido uma experiência profissional enriquecedora e de grande aprendizado. Este trabalho é fruto de uma inquietação pessoal, que surge das discussões sobre modelos de gestão privada nas organizações públicas, que dividem acadêmicos e profissionais em apaixonados defensores ou adversários ardorosos. Com o pragmatismo característico da minha formação como engenheira e, atualmente como gestora de uma organização, este trabalho não se limita a discutir a política ideologicamente, o principal objetivo é saber se traz resultados. Agradecimentos: Primeiramente gostaria de agradecer à amizade e dedicação de minha orientadora Regina Pacheco, pelo seu conhecimento, paciência e contínua motivação ao curso deste trabalho. Sem ela não teria me motivado a seguir do mestrado direto ao doutorado. Ao Professor Thomas D’Aunno, que me orientou no período em que estive na Universidade de Columbia e me abriu os olhos para os modelos estatísticos na área de gestão da saúde. Aos Professores Ana Maria Malik e Wilton de Oliveira Bussab (em memória) pelas contribuições enriquecedoras em ocasião da banca de qualificação. À Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo (SES) e as áreas da Coordenadoria de Serviços de Saúde (CSS), Divisão de Infecção Hospitalar do Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) e Núcleo Técnico de Humanização, pelas informações prontamente prestadas por seus profissionais. Aos entrevistados, pelo espaço nas concorridas agendas e pelas valiosas contribuições. Aos colegas pelo apoio, troca de experiências, discussões e contribuições ao longo deste enriquecedor período na FGV, iniciado em 2007, entre mestrado e doutorado. Aos meus pais Martha e André e meu irmão Andreas pelos exemplos de ética, perseverança e pelo apoio incondicional. Um agradecimento especial à minha mãe e irmão por “segurarem as pontas” nessa fase de empreendimento familiar. Ao meu amor, Robson, pelo companheirismo, paciência, dedicação e por ficar literalmente ao meu lado nessa fase. À CAPES, pela concessão da bolsa de estudos que viabilizou este trabalho. RESUMO O escopo desta pesquisa é analisar o impacto da contratualização de resultados sobre o desempenho de hospitais públicos estaduais da Administração Direta no Estado de São Paulo. Este trabalho visa cobrir uma lacuna existente nos estudos de Nova Gestão Pública, buscando entender a correlação entre a implementação de políticas de gestão, no caso a contratualização, e os resultados de processo (outputs) e de impacto (outcomes) da organização. A hipótese a ser testada é a de que a contratualização melhora o desempenho das unidades hospitalares, pois aumenta a coordenação do núcleo estratégico de governo, estimula a aprendizagem organizacional, além de promover incentivos para a melhoria contínua. Um objetivo secundário da pesquisa será o de entender como os contratos são acompanhados, de forma a minimizar os problemas da relação agente-principal originados neste tipo de prática. A literatura indica que uma maneira de minimizar tais problemas tem sido a utilização de contratos baseados em confiança, reciprocidade e aprendizado mútuo, os chamados contratos relacionais, que serão explorados na análise do caso. O caso escolhido para testar a hipótese é o de contratualização das unidades hospitalares da Administração Direta (AD) com a Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo (SES), através do “Contrato Programa” iniciado ao final de 2008. Os resultados indicam que há relação entre a introdução dos contratos e os resultados do hospital, com melhoria na maior parte dos indicadores analisados. Palavras-chave: Gestão Pública, Contratualização de resultados, Administração Direta, Desempenho Hospitalar, Contratos Relacionais. ABSTRACT The aim of this research is to evaluate the impact of results-based contracting on the performance of public managed and owned hospitals within the state of São Paulo. It intends to fulfill a gap in studies on New Public Management, showing correlations between the implementation of management polices and the results (outputs and outcomes) of an organization. The hypotheses to be tested is that management contracts increases performance by improving coordination within the government’s strategic centre, and stimulating organizational learning, while it promotes the adequate incentives to continuous improvement. A secondary objective of the research will be to understand how contracts are designed and managed, in order to minimize the problems of principal-agent relationship arising from this type of practice. The literature indicates that one way to minimize such problems has been the use of contracts based on trust, reciprocity and mutual learning, the so- called relational contracts, which will be explored in the case study analysis. The case selected to test the hypothesis is that of performance contracts of state managed hospital units from with the Health Department of São Paulo State (Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo –SES/SP), through the “Program Contract”, which started at the end of 2008. This experience will be used to test the contribution of results-based contracting to the quality of hospital services. Results show that there is a correlation between the introduction of contracts and hospital performance, with better outcomes in almost all of the aspects analyzed. Keywords: New Public Management, Performance Contracting, Hospital Performance, Relational Contracts. LISTA DE ILUSTRAÇÕES, QUADROS E GRÁFICOS Ilustrações Ilustração 1. Quadro Referencial para Avaliar a Qualidade do Atendimento. ...................................... 14 Ilustração 2. Combinação dos Quadros Conceituais de Donabedian e La Forgia. ................................ 14 Ilustração 3. Variáveis do Quadro Conceitual....................................................................................... 15 Ilustração 4. Metodologia de Análise Horizontal .................................................................................. 26 Ilustração 5. Modelo de Dendrograma .................................................................................................. 30 Ilustração 6. Modelo de Análise de Contratualização. .......................................................................... 41 Ilustração 7. Pressão dos Sistemas de Mensuração de Desempenho e Gaming. ................................... 45 Quadros Quadro 1. Fase Quantitativa da Metodologia de Pesquisa. ................................................................... 13 Quadro 2. Descrição de Variáveis – Taxa de Mortalidade Institucional. .............................................. 16 Quadro 3. Descrição de Variáveis – Índice de Satisfação. .................................................................... 18 Quadro 4. Descrição de Variáveis – Taxa de Infecção. ........................................................................ 18 Quadro 5. Descrição de Variáveis – Leitos Instalados. ......................................................................... 19 Quadro 6. Sistema de Classificação Hospitalar do Sistema Único de Saúde. ....................................... 20 Quadro 7. Descrição de Variáveis – Classificação Hospitalar do SUS ................................................. 20 Quadro 8. Descrição de Variáveis – Taxa de Ocupação. ...................................................................... 21 Quadro 9. Descrição de Variáveis – Média de Permanência. ............................................................... 22 Quadro 10. Descrição de Variáveis – Índice de Rotatividade. .............................................................. 22 Quadro 11. Descrição de Variáveis – Contrato Programa. ................................................................... 22 Quadro 12. Unidades de Administração Direta Tradicional do tipo “Hospital Geral” subordinadas à CSS ........................................................................................................................................................ 24 Quadro 13. Tipologia de Gaming nas Organizações. ............................................................................ 44 Quadro 14. Quadro Comparativo de Indicadores de Eficiência Alocativa entre Hospitais administrados por OSS e AD (Dados de 2003). ........................................................................................................... 55 Quadro 15. Quadro Comparativo de Índices de Mortalidade entre Hospitais administrados por OSS e AD (Dados de 2003). ............................................................................................................................ 55 Quadro 16. Índices de Produção acompanhados pelo Contrato Programa ........................................... 66 Quadro 17. Índices de Produtividade acompanhados pelo Contrato Programa .................................... 66 Quadro 18. Índices de Qualidade acompanhados pelo Contrato Programa .......................................... 66 Quadro 19. Processos de Melhoria da Informação acompanhados pelo Contrato Programa ................ 67 Quadro 20. Processos de Melhoria de Qualidade acompanhados pelo Contrato Programa .................. 67 Quadro 21. Processos de Melhoria do Controle Financeiro acompanhados pelo Contrato Programa .. 68 Quadro 22. Processos de Melhoria de Qualidade acompanhados pelo Contrato .................................. 68 Quadro 23. Sentido das variáveis .......................................................................................................... 77 Quadro 24. Comportamento das variáveis em dos dois grupos considerados conjuntamente entre 2007 e 2011. ................................................................................................................................................... 77 Quadro 25. Comportamento das variáveis do grupo sem contrato entre 2007 e 2011. ......................... 78 Quadro 26. Comportamento das variáveis do grupo com contrato entre 2007 e 2011. ........................ 78 Quadro 27. Variação de desempenho nos grupos com e sem contrato ................................................. 79 Quadro 28. Taxa de Infecção de Corrente Sanguínea por Cateter Central em hospitais com e sem contrato .................................................................................................................................................. 88 Quadro 29. Resultados da Análise de Regressão .................................................................................. 90 Quadro 30. Estatística Descritiva das Variáveis ................................................................................... 90 Quadro 31. Média da eficiência calculada via análise envoltória de dados para 2007 e 2009 .............. 94 Quadro 32. Média da eficiência calculada via análise envoltória de dados para 2010 e 2011 ............. 95 Quadro 33. Teste de diferença de médias para os dois grupos analisados ............................................ 96 Quadro 34. Teste de diferença de médias para o grupo dos contratados nos períodos 2007-2009 e 2010-2011. ............................................................................................................................................ 96 Quadro 35. Teste de diferença de médias para o grupo dos não contratados nos períodos 2007-2009 e 2010-2011 ............................................................................................................................................. 97 Gráficos Gráfico 1. Comportamento da taxa média de ocupação mensal entre 2007 e 2011. ............................. 80 Gráfico 2. Comportamento do tempo médio de permanência entre 2007 e 2011. ................................ 81 Gráfico 3. Comportamento do número de pacientes/dia entre 2007 e 2011. ........................................ 82 Gráfico 4. Comportamento da taxa de rotatividade entre 2007 e 2011. ................................................ 83 Gráfico 5. Comportamento da taxa de mortalidade entre 2007 e 2011. ................................................ 84 Gráfico 6. Comportamento da satisfação mensal entre 2007 e 2011. ................................................... 85 Gráfico 7. Comportamento da satisfação mensal para o interior e para a região metropolitana de São Paulo entre 2007 e 2011. ....................................................................................................................... 86 Gráfico 8. Dendrograma para análise de Clusters ................................................................................. 92 Gráfico 9. Dendrograma para análise de Clusters, excluindo-se outliers ............................................. 93 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AD Administração Direta AE Agências Executivas CGCSS Coordenadoria de Gestão de Contratos de Serviços de Saúde CLT Consolidação das Leis de TrabalhoCNES Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde CONASS Conselho Nacional dos Secretários de Saúde CP Contrato Programa CSS Coordenadoria de Serviços de Saúde CTAA Comissão Técnica de Acompanhamento e Avaliação do Contrato Programa CVC Catéter Venoso Central CVE Centro de Vigilância Epidemiológica DATASUS Portal mantido pelo Ministério da Saúde, que reúne diferentes bases de dados disponíveis no Ministério. DEA Data Envelopment Analysis ou Análise Envoltória de Dados GPR Gestão por Resultados ICS Infecção de Corrente Sanguínea MARE Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado MS Ministério da Saúde NGP Nova Gestão Pública NIH Núcleo de Informações Hospitalares OECD Organisation for Economic Co-operation and Development ou Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento OMS Organização Mundial de Saúde 1 OS Organizações Sociais OSS Organizações Sociais de Saúde PDRAE Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado POA Plano Operativo Anual RH Recursos Humanos SES/SP Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo SPDM Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina SUS Sistema Único de Saúde TCE Tribunal de Contas do Estado UTI Unidade de Terapia Intensiva WHO World Health Organization 2 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3 2. METODOLOGIA ............................................................................................................................... 11 2.1. Construção Conceitual das Variáveis .......................................................................... 13 2.2. Amostra ....................................................................................................................... 22 2.3. Fase Quantitativa ......................................................................................................... 25 2.4. Fase Qualitativa ........................................................................................................... 31 3. CONTRATUALIZAÇÃO NO DEBATE CONTEMPORÂNEO ....................................................... 32 3.1. Contratos de Gestão e Contratualização de Resultados .............................................. 32 3.2. Consequências Não Intencionais da Mensuração de Desempenho ............................. 41 3.3. Contratos Incompletos e Contratos Relacionais .......................................................... 46 4. CONTRATOS DE GESTÃO NA SAÚDE: A EXPERIÊNCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO ....................................................................................................................................................... 50 4.1. A experiência com as OSS (Organizações Sociais de Saúde) ..................................... 52 4.2. Resultados das OSS ..................................................................................................... 53 4.3. Objeto de Análise: O Contrato Programa .................................................................... 59 5. ANÁLISE DE RESULTADOS........................................................................................................... 70 5.1. Gestão do Contrato Programa ..................................................................................... 70 5.2. Análise Horizontal ....................................................................................................... 77 5.3. Análise de Regressão .................................................................................................. 89 5.4. Análise de Eficiência ................................................................................................... 92 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. 98 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................................... 104 ANEXO 1. Relação de Entrevistados........................................................................................................ 110 ANEXO 2. Classificação SUS dos Hospitais Analisados ......................................................................... 114 ANEXO 3. Variação Percentual dos Indicadores – Antes e Depois do CP .............................................. 116 ANEXO 4. Pesquisa de Satisfação dos Usuários – Programa Conte Comigo .......................................... 117 ANEXO 5. Contrato Programa – Anexo sobre Indicadores de Produtividade e Qualidade ..................... 118 ANEXO 6. Planilha de Acompanhamento do Contrato Programa ........................................................... 120 3 1. INTRODUÇÃO Este estudo trata da implantação de contratos de gestão em hospitais da administração direta no Estado de São Paulo e seu impacto nos indicadores de desempenho das instituições de saúde. Busca-se adicionalmente uma análise da gestão de contrato, para verificar se estão sendo minimizados os problemas de gaming que podem advir deste tipo de prática. A principal motivação para estudar o tema surgiu devido à falta de pesquisas quantitativas sobre novas práticas de gestão na administração pública no Brasil, que buscassem avaliar os resultados dos esforços de modernização da gestão. A contratação de resultados tem sido cada vez mais utilizada por órgãos governamentais como um meio de aperfeiçoar aspectos relacionados à coordenação, à prestação de contas (accountability1) e, de uma maneira geral, à melhoria na prestação de serviços públicos. A contratação é o componente formal de uma parceria que implica uma relação firmada entre organizações governamentais e uma terceira entidade, seja ela governamental ou privada, com ou sem fins lucrativos, para o fornecimento de produtos ou a prestação de serviços (Skyle, 2009, p. 137); (Smith, 2005). Este mecanismo vem sendo utilizado, mais recentemente, por órgãos governamentais para gerir resultados em seus próprios departamentos e instituições, como uma maneira de atingir metas previamente estabelecidas junto ao núcleo estratégico de governo (Di Pietro, 1996). Entende-se como “contratos de gestão”, “contratos de resultados” ou, ainda, “contratualização de resultados” a prática de conceder maior autonomia de gestão a entidades descentralizadas em troca do comprometimento da organização em atingir determinados resultados. Desta forma, o controle do Estado deixa de ser exercido apenas da maneira burocrática tradicional, ou seja, pelo cumprimento de normas e procedimentos, e passa a orientar-se prioritariamente à avaliação de resultados, um dos 1 A accountability pode ser definida como sendo “[...] a obrigação daqueles que possuem determinadas responsabilidades de prestar contas e responder pelas suas ações” (OCDE, 2005b: 2). Para o CLAD (2000), a accountability pressupõe duas ações, ampliando o seu significado. Se de um lado, os governos e os administradores públicos devem ser responsáveis perante os cidadãos, por meio da transparência e da prestação de contas de suas ações, por outro lado, os cidadãos devem ter o direito de controlar as ações do governo e da administração pública. Para Abrucio e Loureiro (2005), “[...] esse tema tem sido estudado em intersecção com a reforma do Estado, analisando como o aperfeiçoamento das instituições estatais pode contemplar, ao mesmo tempo, a melhoria do desempenho dos programas governamentais e sua maior transparência e responsabilização do poder público frente à sociedade” (Abrucio e Loureiro, 2005: 75). 4 principais conceitos da NGP (Nova Gestão Pública)2. A contratualização é considerada uma das políticas de NGP mais comumente utilizadas nos países da OECD (Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento),tendo em vista que governos de diferentes países estão utilizando atores privados e unidades descentralizadas para elaborar, gerir e implementar políticas publicas (OECD, 2005). Uma pesquisa realizada pela OECD e Banco Mundial em 2003 mostra que quase 80% dos países membros utilizam algum tipo de acordo de resultados, especificando metas de processo (OECD, 2004). Um exemplo de ampla utilização é a experiência inglesa, na qual mais de 70% do civil service foi transferido para agências executivas que tinham seus serviços estabelecidos por contratos de gestão (Fundação Getulio Vargas, 2008). Ainda que alguns estudos tenham testado a relação entre a melhoria no desempenho da organização e a clareza dos resultados a serem perseguidos (Boyne & Chen, 2007; Camillus, 1975; Christensen, Lie, & Laegreid, 2007), uma pesquisa recente conduzida por Pollitt e Dan (2011) identifica uma lacuna nos estudos de NGP. Os autores apontam que, das pesquisas publicadas sobre o tema na Europa, apenas 8,5% tratam da relação entre a introdução de mecanismos de gestão e o impacto nos resultados obtidos através da adoção de tais práticas em órgãos governamentais (Pollitt & Dan, 2011). No Brasil, a discussão sobre contratualização foi iniciada no governo Fernando Henrique, com o Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE) em 1995, sob a liderança do Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira. Buscava-se uma ferramenta para a melhoria de resultados das políticas públicas, com mudanças estruturais no aparelho do Estado e formatos organizacionais inovadores, como a criação das Organizações Sociais (OS) e as Agências Executivas (AE). Tais organizações descentralizadas seriam responsáveis pela prestação de serviços, enquanto que a função de planejamento caberia ao Estado, fortalecendo seu papel estratégico. A relação entre o núcleo estratégico e as organizações descentralizadas se daria através de compromissos com resultados, concedendo maior autonomia executiva às organizações (Pacheco, 2006). 2 A NGP é uma expressão utilizada regularmente por acadêmicos e profissionais da área para se referir aos modelos e tendências da administração pública que emergiram nas últimas duas décadas e que questionam o paradigma burocrático vigente até então. A lógica racional-legal orientada pela centralização, hierarquização das funções, impessoalidade e controle rígido das ações e procedimentos administrativos tornou-se incompatível com o novo contexto político e econômico que se moldava nas últimas décadas do século XX (Perdicaris, 2009). 5 O Governo Federal teve pouca adesão ao modelo de organizações descentralizadas, porém as propostas passaram a ser adotadas por alguns Estados e capitais. O Estado de Minas Gerais foi um dos estados precursores na introdução de práticas de NGP e contratos de gestão, com o chamado “Choque de Gestão” iniciado em 2003, no primeiro mandato do Governador Aécio Neves. O governo trabalhou em um planejamento estratégico, definindo 57 projetos estruturantes em 11 áreas de resultados, pactuados formalmente através de contratos com as secretarias, autarquias, fundações e empresas estaduais. Com base nessas metas passou-se a avaliar o desempenho dos órgãos públicos e servidores na prestação de serviços. O acordo compreende principalmente compromissos relativos à: 1) execução dos projetos estruturantes; 2) alcance dos resultados, ou seja, das metas dos indicadores; 3) execução da agenda setorial e; 4) racionalização do gasto (Granha, 2009). Já em Curitiba, cidade pioneira na adoção de ferramentas de gestão no setor público, a cultura de planejamento estratégico e estabelecimento de metas para equipes de saúde está presente desde 1995. Os Planos Anuais de Operação (POA), obrigatórios pelo SUS (Sistema Único de Saúde), mas muitas vezes não levados a sério pelos estados e municípios, em Curitiba são usados como ferramentas de gestão, acompanhados de contratos de gestão entre a Secretaria Municipal de Saúde, os distritos e as unidades de saúde. Tais contratos estabelecem cerca de 60 metas, definidas a partir de discussões entre as partes e são acompanhados por meio de sistemas integrados e protocolos bem definidos, minimizando as chances de gaming provenientes desse tipo de prática (The World Bank, 2006). Outros estados iniciaram a implantação da contratualização vinculada a modelos de gestão para resultados como, por exemplo, Bahia, Sergipe, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal, com maior ou menor amplitude, encontrando-se em vários estágios de desenvolvimento. Um estudo realizado em 2009 para o Ministério do Planejamento, o Levantamento Nacional de Parcerias entre Entes de Cooperação e Colaboração e o Poder Público e sintetizado por Martins e Levy (2011) indica a existência de contratos de gestão nos âmbitos federal, estadual e municipal firmados com 61 OSs (Martins & Levy, 2011). Recentemente, o Governo Federal também adotou um modelo de gestão semelhante, voltado especificamente para a área da saúde. Foram criados contratos que estabelecem 6 metas específicas de atendimento a serem cumpridas pelos estados e municípios na rede pública de saúde, como número de cirurgias ou de pré-natal, diferentemente do que ocorria até então, quando apenas compromissos nacionais eram definidos3. Com essa medida, quem descumprir os compromissos acordados corre o risco de ser punido, podendo deixar de receber recursos, mas por outro lado, aqueles que cumprirem as metas serão recompensados e poderão receber até o dobro do repasse (Pimentel, 2011) (Jornal do Brasil, 30/06/2011). Em São Paulo, um dos casos mais marcantes de contratualização é o desenvolvido no sistema de saúde pública estadual, que vem sendo implementado de forma ininterrupta por mais de uma década junto às unidades de saúde gerenciadas por Organizações Sociais de Saúde (OSS). A contratualização começou como uma forma de controlar e direcionar o serviço público prestado pelas OSS, regulamentadas pelo Estado de São Paulo em 1998, que passaram a ser contratadas para administrar hospitais públicos estaduais recém construídos. A iniciativa acima descrita ganhou espaço na literatura acadêmica, principalmente em estudos comparativos entre o desempenho dos hospitais gerenciados por OSS versus aqueles administrados pelo Estado, denominados Administração Direta ou AD. Pesquisas mostram que hospitais gerenciados por OSS são mais eficientes e produzem mais que os hospitais AD quanto a altas por leito, custos por leito, rotatividade de leitos e taxas de substituição e ocupação (Barradas Barata & Mendes, 2006) (CONASS, Progestores, 2006) (Couttolenc, Nicolelle, Machado, Zapparoli, & Dias, 2004) (Ibanez et al, 2001) (LaForgia & Couttolenc, 2008) (Mendes R. & Costa, 2005) (Quinhões, 2009). (Couttolenc et al, 2004) (Marinho, 2001). Porém, utilizar-se de parceiros privados no serviço de saúde sem mecanismos de coordenação parece não ser a solução. Historicamente o SUS contrata organizações privadas para a prestação de serviços através de um instrumento intitulado “convênio”, o qual não define funções e tampouco estabelece metas de desempenho ou serviços a serem executados pelo parceiro. Hospitais privados com esse tipo de modelo tendem a 3 Decreto nº 7508 de 28/06/2011 assinado pela Presidente Dilma Roussef em 28/06/2011. Define o Contrato Organizativo da Ação Pública da Saúde - acordo de colaboração firmado entre entes federativos com a finalidade de organizar e integrar as ações e serviços de saúde na rede regionalizada e hierarquizada, com definição de responsabilidades, indicadores e metas de saúde, critériosde avaliação de desempenho, recursos financeiros que serão disponibilizados, forma de controle e fiscalização de sua execução e demais elementos necessários à implementação integrada das ações e serviços de saúde. 7 enfatizar cuidados de alta complexidade em detrimento de procedimentos de maior volume e menor lucro, muitas vezes contrários ao interesse público (LaForgia & Couttolenc, 2008). A prestação de serviços de saúde por provedores particulares sem mecanismos de coordenação e avaliação de desempenho mostraram-se pouco eficazes na realidade brasileira. Entende-se, portanto, que o contrato, devidamente acompanhado pela SES, desempenhou um papel importante no caso das OSS. O caso de contratualização com as OSS e os sucessivos estudos comparativos entre OSS e AD serviram de inspiração para que a Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo (SES/SP) iniciasse, ao final de 2008, a contratação de resultados em algumas de suas unidades da Administração Direta, através de um mecanismo denominado Contrato Programa (CP). O Contrato Programa é um instrumento formal, registrado em cartório, que estabelece metas de produção, qualidade e eficiência para os hospitais públicos. As metas são estabelecidas entre as equipes da SES/SP juntamente com os dirigentes do hospital e são acompanhadas pela CSS (Coordenadoria de Serviços de Saúde), em reuniões periódicas de avaliação de desempenho. As reuniões, que podem ser mensais ou trimestrais, dependendo da evolução da gestão do hospital, reúnem as equipes de gestores do hospital e da CSS para discutir os indicadores e as ações necessárias para o alcance das metas. Esta experiência com o contrato programa será utilizada para testar a contribuição da contratação por resultados no desempenho dos serviços públicos, especificamente no que tange à qualidade e eficiência dos serviços hospitalares. A hipótese a ser testada é a de que a contratualização melhora o desempenho das unidades hospitalares, pois aumenta a coordenação do núcleo estratégico de governo e estimula a aprendizagem organizacional, além de promover incentivos para a melhoria contínua. É importante salientar que sem supervisão governamental adequada, há possibilidade de fraude, abusos e desvios, já que os órgãos contratualizados podem buscar seus próprios interesses ao invés das metas governamentais. Este problema, característico da relação agente-principal, se origina quando um ator econômico (o principal) depende da ação, da natureza ou da moral de outro ator (o agente), sobre o qual não tem informações exatas. Questões como a assimetria de informação e gaming4 surgem então como 4 Gaming é o termo em inglês utilizado para descrever comportamentos inadequados das organizações para o alcance de metas a qualquer custo. 8 obstáculos para a contratação e avaliação de desempenho dos provedores de serviços (agente), principalmente em serviços complexos, como é o caso da saúde. A literatura indica que uma maneira de minimizar tais problemas tem sido a utilização de contratos baseados em confiança, reciprocidade e aprendizado mútuo, os chamados contratos relacionais (Skyle, 2009). Deste modo, um objetivo secundário da pesquisa será o de entender como os contratos são desenhados e gerenciados, de forma a minimizar os problemas da relação agente-principal originados neste tipo de prática. A experiência nos hospitais da Administração Direta de São Paulo oferece uma oportunidade relevante de testar a hipótese desta pesquisa. Em primeiro lugar, a área de saúde apresenta indicadores com conceitos já consolidados, o que não é frequente em demais áreas da administração pública. Ainda, por consequência de um programa de modernização de gestão iniciado em 2004, os hospitais da rede pública estadual desenvolveram a sistemática de coletar e tabular os indicadores de resultado e de processo, como taxa de mortalidade, índice de rotatividade do leito, tempo de permanência, entre outros. Outro ponto positivo para utilização do caso de São Paulo diz respeito à possibilidade de criar um grupo de tratamento e outro de controle, já que a administração utiliza a contratualização de resultados apenas em parte dos hospitais estaduais – o processo começou com três unidades em 2008 e, em dezembro de 2011, contava com 15 hospitais contratualizados, de um universo de 25 hospitais5. São hospitais que, apesar de diferentes entre si, estão inseridos no mesmo contexto político- institucional da administração pública, diferentemente de quando se compara hospitais OSS e AD. Até o momento, os estudos que comparam o desempenho de hospitais estaduais sob contrato de gestão focam no modelo institucional, testando se os hospitais administrados por OSS são mais eficientes que os da Administração Direta. Como já dito, tais pesquisas mostram que há diferença de desempenho entre hospitais OSS e AD, sendo que as OSS apresentaram melhores resultados. Porém, existem claras limitações a esses estudos, já que comparam hospitais muito diferentes entre si, inseridos em contextos institucionais distintos, com regras e legislações específicas para cada modelo 5 Vale salientar que os hospitais submetidos ao contrato programa não foram selecionados aleatoriamente – os hospitais inicialmente selecionados pela Secretaria de Saúde para contratação por desempenho foram aqueles com melhores sistemas de informação e muito provavelmente, com um processo de gestão mais avançado. Esta limitação será tratada oportunamente na metodologia da pesquisa. 9 institucional. Este estudo pretende ir além da discussão sobre gestão pública versus privada, buscando entender a melhoria de desempenho a partir do contrato de gestão. Portanto, não é objeto desta tese a discussão das vantagens e desvantagens do modelo de OSS em relação à Administração Direta, mas sim entender se há maneiras de melhorar os resultados dos hospitais, dado o contexto político-institucional da Administração Direta. Aqueles que se posicionam a favor da privatização, frequentemente argumentam que os provedores privados, com ou sem fins lucrativos, que operam no mercado são mais eficientes do que o governo devido ao fato de estarem mais próximos dos clientes e por possuírem incentivos de competitividade para produzir produtos e serviços de melhor qualidade. Isto seria resultante da existência de mecanismos de inovação e motivação para melhoria contínua, característicos da competição de mercado (Skelcher, 2005). Entretanto, pesquisas têm mostrado que considerações sobre o modelo institucional – seja público ou privado – têm menor impacto na avaliação de desempenho quando comparados à introdução de mecanismos de gestão, indicadores e metas, como a contratualização de resultados (Savas, 1977), (Carrick, 1988). Sendo assim, acredita-se que, mesmo com a rigidez imposta pelo regime estatutário e demais regras estatais ao qual de submetem os hospitais AD, existe a possibilidade de que tais instituições possam aprimorar seu desempenho com o uso de incentivos adequados, representados pela busca de metas estabelecidas pelo Contrato Programa. Para testar a hipótese do estudo, foi adotada uma abordagem estatística junto a um estudo qualitativo, com entrevistas com membros da SES e diretores de hospitais estaduais. A metodologia adotada está descrita detalhadamente no próximo capítulo. Este presente estudo visa contribuir para o tema de contratualização de resultados de três maneiras: 1. Agregar aos estudos sobre Nova Gestão Pública (NGP), buscando entender a correlação entre a adoção de políticas de gestão e os resultados da organização, identificada por Pollitt e Dan (2011) como uma lacuna nos estudos de NGP; 2. Ir além da questão da eficiência privada versus a eficiência pública aotentar compreender como a contratualização de resultados pode impactar no desempenho dos hospitais da AD; 10 3. Analisar o uso de contratos relacionais para casos de contratos de gestão em serviços complexos como a saúde. A pesquisa está estruturada em seis blocos principais. Após este capítulo introdutório, a metodologia será detalhada, avaliando a literatura sobre desempenho hospitalar para verificar quais variáveis devem ser consideradas na fase quantitativa. O terceiro bloco trata do debate contemporâneo sobre contratação por desempenho, com ênfase nas consequências não intencionais que possam vir a surgir deste tipo de arranjo, e introduzindo a discussão sobre contratos relacionais. O estudo de caso sobre contratação por desempenho em hospitais em São Paulo será detalhado no quarto bloco, no qual as condições históricas e de contexto serão descritas. O quinto bloco trata da apreciação dos resultados obtidos: a análise do Contrato Programa à luz da literatura de contratualização, utilizando-se as entrevistas realizadas, e os resultados da análise quantitativa. O sexto capítulo traz as considerações finais. 11 2. METODOLOGIA Com o objetivo de testar as hipóteses do estudo, a metodologia abrange uma fase quantitativa agregada a um estudo qualitativo. As questões de pesquisa estão descritas abaixo: 1. Há diferença entre os indicadores de impacto e de processo dos hospitais contratualizados e não contratualizados da AD? 2. A variável “Contrato Programa” pode explicar variações nos indicadores de impacto? 3. Há diferença de eficiência relativa entre os hospitais com e sem Contrato Programa? 4. Como o Contrato Programa é estruturado e acompanhado junto à SES e hospitais, de forma a minimizar a presença de gaming nos resultados apresentados pelas unidades hospitalares? O estudo quantitativo visa responder às três primeiras perguntas e está dividido em três partes (vide Quadro 01 a seguir). A primeira consiste da avaliação geral de desempenho, onde será analisada a diferença dos indicadores em toda a amostra, buscando saber se os hospitais contratualizados apresentam maior variação de desempenho no período estudado, em relação aos hospitais não contratualizados. Serão avaliados os indicadores de processo e resultado, antes e depois da inclusão do hospital no Contrato Programa. Já na segunda fase, o objetivo é buscar entender quais variáveis são significantes para explicar a taxa de mortalidade (variável dependente), através do método multivariado de mínimos quadrados. Para a variável de tratamento foi utilizada a existência ou não do Contrato Programa (variável binária) e como variáveis de controle o número de leitos, taxa de ocupação e média de permanência. Um terceiro momento consiste na análise da eficiência relativa dos hospitais. Para tanto é feito um agrupamento dos hospitais com características semelhantes, utilizando-se a metodologia de clusters, com os dados de perfil de internação dos hospitais, tornando a amostra o mais compatível possível. O objetivo é avaliar quais hospitais encontram-se próximos da fronteira de eficiência, utilizando-se a metodologia DEA (Data 12 Envelopment Analysis), buscando entender se os hospitais contratualizados são mais eficientes em comparação ao restante da amostra. Já o estudo qualitativo consiste de entrevistas semi-estruturadas com lideranças da SES, CSS e hospitais, com o intuito de entender em que consiste o Contrato Programa, quais seus objetivos, como é formalizado, como é feita a gestão desse contrato e como os hospitais respondem ao contrato. O objetivo central dessa fase é o de entender se o acompanhamento realizado pela SES estimula os hospitais a buscarem melhores resultados, e se são relatados casos de desvios de comportamento nas unidades hospitalares, na busca de resultados a qualquer custo. O estudo apresenta algumas limitações. O Contrato Programa começou a ser implantado ao final de 2008, o que seria pouco mais de três anos de experiência, tempo que pode ser considerado curto para o amadurecimento de um projeto desta complexidade. Optou-se por prosseguir a pesquisa pelo ineditismo do tema e também por entender que houve uma mudança no padrão de comportamento dos hospitais que optaram por fazer parte do contrato. Outra limitação diz respeito à escolha dos hospitais para fazerem parte do Contrato Programa em sua fase inicial. Os primeiros hospitais escolhidos foram aqueles cujo sistema de gestão e disponibilidade da base de dados encontravam-se em um estágio mais avançado em relação aos demais. Porém, em um segundo momento da implantação do Contrato Programa este problema de pesquisa é menor, pois outros hospitais considerados menos avançados em seu modelo de gestão também são convidados a aderir ao contrato. Para dar conta deste viés de seleção da amostra, ocorrido na fase inicial de implantação do CP, os hospitais são comparados com eles mesmos, antes e depois do contrato, quando se utiliza a metodologia de análise horizontal. 13 Quadro 1. Fase Quantitativa da Metodologia de Pesquisa. Grupo de Tratamento Grupo de Controle Metodologia Objetivo 1a Fase Hospitais AD Contratualizados Hospitais AD sem contrato Análise Horizontal Analisar se o grupo de hospitais contratualizados apresenta uma maior variação de desempenho (antes e depois do CP) quando comparados aos sem contrato. 2a Fase Hospitais AD Contratualizados Hospitais AD sem contrato Análise Multivariada (OLS) Avaliar quais variáveis são significativas para explicar variações na taxa de mortalidade, utilizando o CP como variável de tratamento. 3ª Fase Hospitais AD Contratualizados (Perfil Semelhante) Hospitais AD sem contrato (Perfil Semelhante) Análise de Clusters e DEA Verificar quais hospitais encontram-se mais próximos da fronteira de eficiência, comparando hospitais com e sem CP. Foi necessário agrupar os hospitais por características semelhantes, com a metodologia de clusters. Fonte: Elaborado pela autora. Nas sessões deste capítulo serão descritas as variáveis utilizadas na pesquisa, a amostra utilizada para construção da base de dados e as fases da pesquisa. 2.1.Construção Conceitual das Variáveis A principal ideia deste bloco é construir um quadro conceitual para avaliar o desempenho hospitalar com base no paradigma clássico proposto por Donabedian (1988) composto de três fatores para analisar a qualidade do atendimento – estrutura, processo e resultados, sendo que cada fator influencia o subsequente, conforme mostrado na Ilustração 01. A estrutura dá conta dos recursos materiais, humanos e estrutura organizacional. O processo envolve o que é feito durante o atendimento por parte de quem presta e recebe o serviço, como por exemplo, um tratamento ou diagnóstico. Os resultados representam o efeito do atendimento sobre a saúde dos pacientes. 14 Ilustração 1. Quadro Referencial para Avaliar a Qualidade do Atendimento. Fonte: Donabedian (1988). Além do quadro referencial de Donabedian, a análise das tendências e estratégias no atendimento hospitalar de LaForgia & Couttolenc (2008) fornecem uma estrutura conceitual ainda mais ampla, a qual apresenta três novas dimensões para o desempenho hospitalar – o ambiente externo, interno e organizacional. Primeiramente, o ambiente externo consiste de políticas, regulamentos, mercados e sistemas de pagamento que constituem os sistemas de incentivos. O ambiente organizacional é constituído pelo grupo de estruturas, acordos governamentais e mecanismos de prestação de contas e a disciplina financeira do hospital. Por fim, o ambiente interno é constituído pelas práticas de gestão, estrutura interna e processos envolvidos na prestação de serviços. A Ilustração 02 mostra a composição dasduas estruturas conceituais combinadas. Ilustração 2. Combinação dos Quadros Conceituais de Donabedian e La Forgia. Fonte: Elaborado pela autora. Para cada grupo que compõe o modelo foram escolhidas de uma série de variáveis, como mostra o diagrama a seguir (Ilustração 03). As variáveis que compõe o quadro 15 conceitual foram escolhidas por dois motivos principais: pela disponibilidade de dados pela SES e DATASUS (base de dados pública mantida pelo Ministério da Saúde) e pela presença desses indicadores na maioria dos demais estudos sobre eficiência existentes na literatura. Ilustração 3. Variáveis do Quadro Conceitual Fonte: Elaborado pela autora. Resultados de Impacto (Outcomes) Os indicadores de resultado foram selecionados dentre aqueles que mais comumente são utilizadas para medir desempenho hospitalar, no caso a taxa de mortalidade que é frequentemente utilizada como proxy de qualidade do procedimento médico e dos processos hospitalares. Embora se questione o uso da variável mortalidade para avaliar a qualidade do atendimento, um desempenho superior neste indicador é constantemente associado a um serviço de melhor qualidade. A taxa de infecção hospitalar também é utilizada na literatura como variável de desempenho, ainda que com menor frequência e, no caso também será usada como variável para mensurar resultados do tipo outcome, de impacto. A taxa de satisfação dos usuários é também utilizada como indicador de impacto, pois representa a percepção dos usuários em relação aos serviços prestados. A taxa de mortalidade utilizada aqui é a institucional, medida após 24hs de estadia do 16 paciente na instituição, o que permite excluir os casos de pacientes muito graves, que vão a óbito nas primeiras 24 horas, o que não dependeriam da gestão da unidade de saúde (vide Quadro 2). Nos trabalhos americanos e europeus, normalmente se ajusta a taxa de mortalidade ao risco da instituição pelo perfil de pacientes internados no hospital, utilizando a metodologia de DRG (Diagnosis-Related Group ou Grupos de Diagnósticos Relacionados). O DRG consiste em agrupar indivíduos clinicamente semelhantes baseados no diagnóstico do CID (Classificação Internacional de Doenças), idade, sexo, status de internação e presença de comorbidades. A lógica é de que pacientes na mesma categoria teriam probabilidades de óbito semelhantes, o que possibilitaria avaliar os riscos de óbito de um hospital com determinadas características de internação. Hospitais que apresentem taxas reais de mortalidade muito superiores às esperadas, considerando-se o risco ao qual a instituição está exposta, representam um desempenho inferior e vice- versa. No caso brasileiro, no qual a metodologia DRG não é utilizada, a solução encontrada foi o agrupamento de hospitais semelhantes por clusters, utilizando o volume de paciente- dia por clinica, ou tipo de serviço. A descrição da metodologia de agrupamento por clusters é detalhada mais a frente, na seção 2.3. Quadro 2. Descrição de Variáveis – Taxa de Mortalidade Institucional. Nome TAXA DE MORTALIDADE INSTITUCIONAL Descrição É a relação percentual entre os óbitos ocorridos após 24hs do início da admissão hospitalar e o número de saídas. Mede o risco de mortalidade após 24 horas de internação e, indiretamente, a efetividade da assistência prestada. Fórmula Taxa de Mortalidade Institucional = no óbitos ocorridos após 24hs ingresso x 100 no de saídas Unidade de Medida = percentual Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). A taxa de satisfação dos usuários também pode ser considerada um indicador para mensurar resultados de impacto, já que capta a percepção do usuário quanto à qualidade 17 dos serviços prestados. A taxa utilizada é resultado do “Programa Conte Comigo”, cuja implementação nos hospitais da AD iniciou-se em julho de 2004. O programa busca, além de coletar informações de satisfação dos usuários por meio de formulários, ser um instrumento de melhoria dos serviços prestados ao cliente. O “Conte Comigo” possui quatro grandes frentes de atuação: (1) prestar informações ao público, orientando os clientes quando estes chegam ao hospital; (2) atender ao cidadão, quando em dificuldades dentro do hospital, com a presença de acolhedores funcionando como uma primeira instância da ouvidoria; (3) ouvir e orientar o cidadão, quando em situação de dificuldades em relação à sua saúde ou de um familiar, com o serviço de assistência social; e (4) apoiar o cliente interno, em relação à melhoria contínua da qualidade dos serviços prestados, principalmente avaliando as diferenças entre a qualidade técnica do serviço e a qualidade percebida pelo cliente (SES/SP, 2004). Os dados da pesquisa de satisfação são coletados diariamente e enviados mensalmente para a SES. Os serviços avaliados incluem ambulatório, internação, pronto socorro e pronto atendimento, em cerca de 15 itens, que vão desde a qualidade no atendimento na recepção até as condições de infraestrutura, serviço social e disponibilidade de informações. Os itens são pontuadas de 1 a 4, sendo 1 insatisfeito e 4 muito satisfeito, por isso a necessidade de se multiplicar o resultado final por 2,5, de forma que os resultados fiquem parametrizados de 1 a 10. A pesquisa está detalhada no Anexo 4. Os dados utilizados foram o de resultados gerais consolidados do hospital e foram coletados diretamente do sistema de informação da SES, o NIH (Núcleo de Informações Hospitalares). Este dado será utilizado apenas na análise horizontal, pois é indicativo da percepção do cliente e pode apresentar particularidades do local, como a proximidade com a equipe do hospital, ou as condições de vida da região onde o hospital está instalado. Por esses motivos, é interessante apenas analisar se houve mudança na percepção da qualidade antes e depois da adesão ao Contrato Programa. A descrição da variável encontra-se detalhada no Quadro 3. 18 Quadro 3. Descrição de Variáveis – Índice de Satisfação. Nome ÍNDICE DE SATISFAÇÃO Descrição Mede a satisfação global do usuário com o serviço de saúde, resultante das pesquisas do Programa Conte Comigo. Fórmula Índice de Satisfação = Soma da pontuação obtida nas pesquisas x 2,5 no de pesquisas realizadas Unidade de Medida = número absoluto Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). Outro indicador do tipo outcome escolhido foi taxa de infecção (Quadro 4). A taxa aqui utilizada é a de incidência de infecção de corrente sanguínea (ICS) associada a catéter venoso central (CVC) em pacientes internados em UTI (Unidade de Terapia Intensiva). Essa taxa foi escolhida por ser o indicador com maiores condições de controle, já que pode ser reduzida com treinamentos e introdução de protocolos. Também é a única taxa de infecção acompanhada nacionalmente pela ANVISA, sendo obrigatória para todos os hospitais (Informações coletadas em entrevista realizada em 04/01/12 com a Coordenadora da CVE - Centro de Vigilância Epidemiológica). As informações de dados de infecção foram disponibilizadas pelo CVE. Quadro 4. Descrição de Variáveis – Taxa de Infecção. Nome TAXA DE INFECÇÃO Descrição Mede a taxa de infecção de corrente sanguínea associada ao uso de cateter central em UTI, através da relação de casos de infecção pelo número de pacientes que utilizaram cateter central. Fórmula Taxa de Infecção = Nº de casos novos de IPCSC no período x 100 Nº de pacientes com cateter central-dia no período Unidade de Medida = percentual Fonte: Assis, Madalosso, Ferreira, & Yassuda (2011). Estrutura O tamanho e a complexidade do hospital também servem como proxy para analisar a estrutura. Um estudo realizado pelo Banco Mundial(2008) mostra que o tamanho do hospital é um dos fatores mais relacionados à eficiência da instituição. Segundo eles, 19 quanto maior o número de leitos, maior a eficiência, em termos de custo da operação e em termos da eficiência do processo. A descrição do indicador está detalhada no Quadro 5. Os indicadores aqui colocados também servem como variáveis de controle para o porte do hospital, o que pode influenciar nas taxas de mortalidade. Quadro 5. Descrição de Variáveis – Leitos Instalados. Nome LEITOS INSTALADOS Descrição É a medida para a capacidade hospitalar instalada, sendo o número total de leitos disponíveis para internação dos pacientes, mesmo que alguns deles eventualmente não possam ser utilizados por um certo período por qualquer razão Fórmula Leitos Instalados (LTS) = No leitos disponíveis Unidade de Medida = leitos Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). Outro indicador utilizado para representar a estrutura é a Classificação Hospitalar do Sistema Único de Saúde, estabelecida em dezembro de 2002 pela portaria nº 2.224/GM (Escrivão, 2004), que avalia uma série de características como número de leitos, perfil assistencial, existência e complexidade de serviços e capacidade de produção. Cada item de avaliação apresenta uma pontuação específica e, de acordo com a pontuação obtida o hospital é classificado por porte, de I a IV (vide Quadro 06). Os dados para pontuação dos hospitais foram obtidos na base de dados DATASUS, base de dados disponível online pelo Ministério da Saúde (MS), de notificação obrigatória por parte dos hospitais. Porém, vale a ressalva de que nem sempre a informação é absolutamente confiável. Buscou-se checar as informações diretamente na fonte, em websites dos hospitais quando disponível e também com a equipe da CSS. Nas vezes em que houve divergência de informações privilegiou-se a base primária. A pontuação obtida para cada hospital está detalhada no Anexo 2. Esta pontuação oferece algumas limitações para classificação dos hospitais. Como já dito anteriormente, o ideal seria ter algo semelhante à metodologia de DRG para auxiliar a classificação. Escrivão (2004) sistematiza uma classificação de hospitais baseado no perfil de internação, utilizando os dados de idade e sexo, o que foi batizado como “DRG tupiniquim”. No entanto, não foi possível ter acesso aos dados de perfil de 20 internação para a consecução deste trabalho. Os dados obtidos foram os de pacientes internados por serviço (ambulatório, emergência, internação, UTI, cirurgias, partos), que serviram para o agrupamento dos hospitais em clusters pelo perfil de atendimento. Porém, a pontuação é uma boa proxy para avaliar a estrutura do hospital e, por conseguinte, será também utilizada. Quadro 6. Sistema de Classificação Hospitalar do Sistema Único de Saúde. Fonte: (Escrivão, 2004). Quadro 7. Descrição de Variáveis – Classificação Hospitalar do SUS Nome CLASSIFICAÇÃO HOSPITALAR SUS Descrição Define as características dos hospitais através de pontuação, utilizando dados de número de leitos, perfil assistencial, existência e complexidade de serviços e capacidade de produção. Fórmula Σ Pontuação Obtida nos Itens de Avaliação (vide Quadro 6) Unidade de Medida = número absoluto Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). 21 Processo Os indicadores de processo dizem respeito às medidas de eficiência tais como tempo médio de internação, rotatividade de leitos e taxa de ocupação. Marinho (2001) mostrou que eficiência, medida pela taxa de mortalidade, geralmente tem uma relação direta com tempo médio de internação, ou seja, quanto maior o tempo de internação maior a mortalidade6. Taxas mais altas de mortalidade também estão associadas a hospitais que realizam menos cirurgias (LaForgia & Couttolenc, 2008). Outra pesquisa sobre desempenho de unidades hospitalares realizada por Couttolenc et al (2004), utilizando DEA e análise multivariada, indica que a rotatividade de leitos e a taxa de ocupação têm um efeito significativamente positivo sobre a taxa de mortalidade. Os indicadores de processo que irão ser utilizados no estudo são a Taxa de Ocupação, Tempo Médio de Permanência e Índice de Rotatividade, também por serem os indicadores mais consolidados nos hospitais estudados, e estão detalhados nos Quadros 08 a 10. Quadro 8. Descrição de Variáveis – Taxa de Ocupação. Nome TAXA DE OCUPAÇÃO Descrição É a relação percentual entre o número de pacientes-dia e o número total de leitos-dia, incluindo os leitos-dia extras e excluindo os leitos-dia bloqueados. Mede a ocupação das diferentes clínicas e da instituição. Fórmula Taxa de Ocupação = no de pacientes-dia x 100 no de leitos-dia Unidade de Medida = percentual Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). 6 “Eficiência é geralmente definida como a proporção entre a quantidade de produtos entregues e a quantidade de insumos empregada no processo. Está relacionada com produtividade e custos no sentido em que uma organização eficiente irá apresentar maior produtividade e ter custos menores de produção”, (LaForgia & Couttolenc, 2008, p. 52) 22 Quadro 9. Descrição de Variáveis – Média de Permanência. Nome MÉDIA DE PERMANÊNCIA Descrição Mede o tempo médio que o paciente permanece internado em uma determinada clínica ou na instituição e o resultado é expresso em dias. Fórmula Média de Permanência = no de pacientes-dia no de saídas Unidade de Medida = dias Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). Quadro 10. Descrição de Variáveis – Índice de Rotatividade. Nome ÍNDICE DE ROTATIVIDADE Descrição É a relação entre o número de saídas e o número de leitos-dia total, dividido pelo número de dias do mês (leitos operacionais). Mede o número de vezes que o leito foi utilizado. Fórmula Índice de Rotatividade = no de saídas no de leitos-dia total/ no de dias do mês Unidade de medida = número absoluto Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). A variável “Contrato Programa” (CP), detalhada no Quadro 11, é discutida no próximo capítulo, que trata do debate contemporâneo acerca do contrato de gestão. Consiste na variável de tratamento, que trata da existência ou não da contratualização na organização, o objetivo é testar sua significância nos diferentes modelos. Na regressão, esta é uma variável binária, também conhecida como dummie, que assume o valor de “1” caso a organização faça parte do Contrato Programa e “0” caso contrário. Quadro 11. Descrição de Variáveis – Contrato Programa. Nome CONTRATO PROGRAMA Descrição Trata da aderência ou não da instituição de saúde ao contrato programa. Por se tratar de uma variável binária assume os valores de 0 ou 1. Fórmula Contrato Programa = 0 para unidades não contratualizadas = 1 para unidades contratualizadas Unidade de Medida = número absoluto Fonte: (BRASIL. Ministério da Saúde, 2002). 23 2.2.Amostra A amostra do estudo consiste nos hospitais gerais da Administração Direta gerenciados pela CSS (Coordenadoria de Serviços de Saúde), área da SES, contratualizados e não contratualizados. A CSS coordena 38 unidades hospitalares de saúde, classificadas em Hospital Geral, Centros Psiquiátricos e Centros de Reabilitação. Destes, 25 são considerados hospitais gerais, sendo que 14 foram contratualizados entre dezembro de 2008 e março de 2010. Em março de 2010 também foi contratualizado pela primeira vez um Centro de Reabilitação, que não constará na amostra, por possuir características muito distintas de um hospital geral. Portanto, a amostra consiste de 25 hospitais gerais, sendo14 contratualizados, conforme o Quadro 12 a seguir. O recorte temporal é do período 2007-2011, pois segundo a SES, não existem dados confiáveis antes de 2007 para todos os hospitais a serem estudados. Os dados para as taxas de infecção hospitalar disponíveis são dos anos de 2007 a 2010, pois o ano de 2011 ainda não havia sido consolidado até data de entrega da pesquisa. O total da amostra, considerando o número de hospitais e o período estudado, é de 125 observações. É importante salientar que os hospitais foram contratualizados aos poucos, portanto em um determinado ano pode constar como não contratualizado e no ano seguinte há mudança de status para contratualizado. A base de dados deste estudo foi construída com informações do Ministério de Saúde, disponível online no DATASUS, e informações do NIH, disponibilizadas pela equipe da CSS. 24 Quadro 12. Unidades de Administração Direta Tradicional do tipo “Hospital Geral” subordinadas à CSS # Nome Unidade Contrato-Programa (Data Assinatura) 1 Assis Hospital Regional de Assis Não contratado 2 Cachoeirinha Hospital Geral Dr. Álvaro Simões de Souza de Vila Nova Cachoeirinha 29/04/2009 3 Cândido Fontoura Hospital Infantil Cândido Fontoura 22/12/2008 4 CRSM Centro de Referência Saúde da Mulher Não contratado 5 Dante Pazzanese Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia Não contratado 6 Darcy Vargas Hospital Infantil Darcy Vargas Não contratado 7 Emilio Ribas Instituto de Infectologia Emílio Ribas Não contratado 8 Ferraz de Vasconcelos Hospital Dr. Osiris Florindo Coelho de Ferraz de Vasconcelos 21/12/2009 9 Guaianases Hospital Geral de Guaianases Jesus Teixeira da Costa 21/12/2009 10 Guilherme Álvaro Hospital Guilherme Álvaro – Santos 31/07/2009 11 Heliópolis Hospital Heliópolis Não contratado 12 Interlagos Hospital Maternidade Interlagos 31/07/2009 13 Ipiranga Hospital Ipiranga Não contratado 14 Leonor Mendes de Barros Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros 31/07/2009 15 Mandaqui Conjunto Hospitalar do Mandaqui 01/03/2010 16 Mirandópolis Unidade Integrada de Saúde de Mirandópolis Não contratado 17 Osasco Hospital Regional de Osasco 31/07/2009 18 Padre Bento Complexo Hospitalar Padre Bento de Guarulhos 29/04/2009 19 Penteado Hospital Geral de Vila Penteado 29/04/2009 20 Presidente Prudente Hospital Estadual de Presidente Prudente (Materno-Infantil) Não contratado 21 Promissão Hospital Regional de Promissão Não contratado 22 Regional Sul Hospital Regional Sul 22/12/2008 23 São Matheus Hospital Geral de São Mateus 29/04/2009 24 Sorocaba Conjunto Hospitalar de Sorocaba Não contratado 25 Taipas Hospital Geral de Taipas 22/12/2008 Fonte: Documento Eletrônico disponibilizado pela equipe da CSS em 19/09/2011. 25 2.3.Fase Quantitativa Fase 1. Avaliação Horizontal de Variação de Desempenho. A primeira fase do estudo consiste em uma análise horizontal, com o objetivo de comparar os dois grupos de estudo (hospitais com e sem contrato), com todos os hospitais estaduais do tipo “Hospital Geral”, listados anteriormente no Quadro 12. Nesta metodologia verifica-se o comportamento de cada um dos dois grupos no período de 2007 e 2011. As variáveis selecionadas para essa fase do estudo são: • Taxa de ocupação mensal média; • Tempo médio de permanência; • Pacientes/dia; • Taxa de rotatividade; • Taxa de mortalidade; • Índice de Satisfação; • Taxa de Infecção Hospitalar. Para se analisar o comportamento das variáveis foram utilizadas as médias anuais. A justificativa para essa escolha está no fato de que ao utilizar uma média de tendência central diluí-se o impacto de qualquer tipo de choque ou sazonalidade. Nessa avaliação busca-se observar como foi o comportamento das médias das variáveis. Como se trata de uma avaliação horizontal, ou seja, o hospital é comparado com si próprio ao longo dos anos, não se faz necessário agrupar a amostra em perfis semelhantes. O objetivo desta fase é avaliar se o grupo de hospitais contratualizados apresenta uma variação de desempenho superior ao grupo de hospitais sem contrato (Ilustração 4). Com isso, busca-se lidar com uma das limitações apresentadas anteriormente, o fato de que os hospitais submetidos ao contrato não foram selecionados aleatoriamente na fase inicial. O software utilizado nesta fase do estudo foi o MS Excel. 26 Ilustração 4. Metodologia de Análise Horizontal Fonte: Elaborado pela autora. Fase 2. Regressão Multivariada. Esta fase do estudo tem o objetivo de identificar quais as variáveis significantes para explicar o desempenho do hospital (variável dependente). Foi utilizada uma regressão multivariada utilizando-se o método OLS (Ordinary Least Squares ou Método dos Mínimos Quadrados) para análise. Este método consiste em uma análise condicional, ou seja, traz maior controle das variáveis. A análise realizada é do tipo cross section, pois envolve a observação de toda a população, ou de um grupo representativo, em um corte temporal específico (Wooldridge J. , 2009). Foi utilizado um grupo de tratamento (com contrato programa) e um grupo controle (sem contrato programa) em um universo de 25 hospitais em um período de 5 anos (2007 a 2011) totalizando 125 observações. O software estatístico utilizado nessa fase do estudo foi o EViews. O modelo empírico para análise segue abaixo: Resultadosit = a0 + a1 Estruturait + a2 Processoit + a3 Contrato Programait +e 27 Ou ainda, Taxa de Mortalidadeit = b0 + b1 Número de Leitosit + b2 Taxa de Ocupaçãoit + b3 Tempo Médio de Permanênciait + b4 Índice de Rotatividadeit + b5 Contrato Programait +e A variável de resultados utilizada no modelo é a taxa de mortalidade institucional para o hospital i no período de tempo t. As variáveis de controle utilizadas são: (1) o vetor de variável Estrutura, composta pela variável número de leitos; (2) o vetor de variável Processo, representado pela taxa de ocupação, tempo médio de permanência e índice de rotatividade. A variável Contrato Programa (CP) é a variável de tratamento para o modelo. A constante está representada por b0 e o erro randômico pela letra e. Todas as variáveis são numéricas, sendo que o Contrato Programa é uma variável binária. A variável classificação hospitalar não entra no modelo, pois só temos essa variável para o ano de 2011. Fase 3. Análise da Eficiência e Identificação dos Clusters A última fase quantitativa compreende a análise da eficiência dos hospitais, com a metodologia de DEA (Data Envelopment Analysis ou Análise Envoltória de Dados). O DEA é utilizado para determinar a eficiência relativa de um grupo de unidades organizacionais, como por exemplo, diferentes unidades escolares ou hospitalares, na presença de múltiplos parâmetros de insumos (inputs) e de produtos (outputs ou outcomes). A metodologia busca identificar uma fronteira de eficiência baseada nos parâmetros apresentados e mapeia quais unidades encontram-se mais próximas da fronteira, portanto sendo considerados mais eficientes (Charnes, Cooper, & Rhodes, 1978). Para a análise do DEA foram utilizados insumos e produtos conforme abaixo, comparando-se os períodos 2007-2009 e 2010-2011. Insumos • Taxa de ocupação média; 28 • Tempo médio de permanência; • Pacientes/dia; • Taxa de rotação de leitos. Produto • Taxa de mortalidade. A justificativa para a utilização dos anos de 2010 e 2011 se baseia no fato de que todos os hospitais contratados analisados formalizaram seus contratos entre nos anos anteriores a 2010. Sendo assim, 2010 e 2011 são períodos onde 100% dos hospitais contratados possuem ao menos 1 ano de contrato, permitindo assim obter ao menos uma noção inicial dos efeitos dos contratos sobre a eficiência. Este período é comparado ao período anterior, entre 2007 e 2009, quandoos contratos ainda estavam em sua fase inicial de implantação. O índice de insumos foi produzido a partir dos indicadores de Taxa de ocupação média; Tempo médio de permanência; Pacientes/dia, e Taxa de rotação de leitos. Foi mantida a taxa de mortalidade como único produto. Entretanto, antes da construção do índice foi preciso transformar as variáveis, dado que todas precisam ter um mesmo sentido de grandeza. Por esse motivo usou-se o inverso do tempo médio de permanência e o inverso da taxa de mortalidade. Com todas as variáveis na mesma ordem de grandeza os índices para todas as variáveis de acordo com a fórmula (1), com a média como base de valor igual a 100. (1) Ii,j=100*(Vi,j/Bi) - Ii,j: índice da para variável “i” para o hospital “j”; - Vi,j: valor da variável “i” para o hospital “j”; - Bi: base da variável “i” (média da variável “i”). Para a construção do índice de insumos ponderou-se por 0,25 cada um dos 4 índices 29 de insumo, como mostra a fórmula (2). (2) IIi = 0,25*(Iocupação,j + Ipermanência,j + Ipacientes,j + Irotação,j) - IIi,: índice de insumos para variável “i” ; - Iocupação,j: índice para variável taxa de ocupação média mensal para o hospital “j”; - Ipermanência,j: índice para variável tempo médio de permanência mensal para o hospital “j”; - Ipacientes,j : índice para variável pacientes/dia para o hospital “j”; - Irotação,j: índice para variável taxa de rotação de leitos mensal para o hospital “j”. É importante salientar que existem alguns limites na aplicabilidade do DEA, principalmente no que diz respeito à homogeneidade da amostra e a escolha das variáveis adequadas (Dyson et al, 2001). Sendo assim, para posicionar os hospitais na fronteira de eficiência seria necessário ajustar o índice de mortalidade conforme o perfil do hospital (o chamado risk-adjusted mortality), para comparar hospitais de forma mais equitativa. Como já comentado anteriormente, este ajuste não é possível para o caso brasileiro. A saída encontrada foi agrupar os hospitais de porte e perfil semelhante, utilizando a metodologia de análise de clusters. A análise de clusters é uma técnica de análise exploratória de dados utilizada para resolver problemas de classificação. Tem como objetivo ordenar diferentes unidades em grupos, de forma que o grau de similaridade entre membros do mesmo cluster seja mais forte que o grau de similaridade entre membros de diferentes clusters. Os clusters podem ser descritos como a classe a qual determinados membros pertencem. A técnica permite descobrir associações entre dados, que não são evidentes a priori. É normalmente utilizada para segmentação de mercados, por variáveis que expressam hábitos de consumo ou perfil de gastos, por exemplo, ou ainda classificar produtos, com o objetivo de analisar e definir estratégias mercadológicas (Wooldridge J. , 2003). A representação gráfica utilizada para a identificação dos clusters é o dendrograma (Ilustração 05), um gráfico em forma de árvore que resume o processo de agrupamento, onde os indivíduos similares se conectam e cuja posição no diagrama está determinada pelo grau de similaridade entre os indivíduos. A Ilustração 05 mostra que, entre os 30 indivíduos I, II, III e IV, há similaridade de 80% entre I e III, de 70% entre I, III e II e que o indivíduo IV aparece de forma isolada, com apenas 50% de similaridade com os demais. No caso da Ilustração 5, seria indicado trabalhar com dois clusters, A e B, sendo que o A agruparia os indivíduos I, II e III. Para a divisão dos hospitais em clusters, foram considerados os seguintes indicadores: • Classificação Hospitalar do SUS; • Número de Leitos; • Perfil de atendimento, considerando o número de pacientes atendidos nos diferentes serviços de Clínica Médica, Clínica Cirúrgica, Pediatria, Psiquiatria, Obstetrícia, Emergência, UTI Adulto, UTI Pediátrica e UTI Neonatal. Tais indicadores foram escolhidos para o agrupamento, pois representam o porte do hospital e o perfil de atendimento. O software estatístico utilizado nessa fase foi o Minitab. Ilustração 5. Modelo de Dendrograma Fonte: Imagem disponível em http://dendrolab.wordpress.com, acessado em 08/12/2011. Após o agrupamento dos hospitais por similaridade, entende-se que o perfil e porte das unidades dentro de um determinado cluster possuem um alto grau de similaridade. Desta forma, pode-se utilizar o DEA para classificar os hospitais conforme sua 31 eficiência relativa, buscando entender se os hospitais com contrato encontram-se mais próximos da fronteira de eficiência. Para o DEA utilizou-se o software estatístico Stata, combinado ao MS Office Excel. 2.4.Fase Qualitativa Essa fase da pesquisa buscou entender em que consiste o contrato, como é feito o gerenciamento, quais competências são necessárias ao núcleo estratégico, quais os benefícios obtidos pelos hospitais e como a equipe adere às metas acordadas. Ainda, busca-se entender como o contrato é desenhado e gerenciado de forma a minimizar problemas de assimetria de informação e gaming, utilizando-se como embasamento a literatura de contratualização a ser apresentada no capítulo 3. Por ser uma experiência relativamente recente, não foram identificados trabalhos acadêmicos ou relatos a respeito do Contrato Programa para embasar a pesquisa. Um dos poucos documentos disponíveis para análise é o próprio modelo de contrato utilizado, disponibilizado pela SES. Sendo assim, foram realizadas 12 entrevistas semi-estruturadas para coleta das informações necessárias dos gestores da SES, coordenadores da CSS, técnicos da CSS responsáveis pelo gerenciamento dos contratos e gestores dos hospitais contratualizados, Também foram acompanhadas reuniões de análise de desempenho trimestrais realizadas entre a SES e Hospitais. Os entrevistados e datas de entrevistas estão detalhados no Anexo 1. As perguntas das entrevistas foram baseadas nos pontos levantados pela revisão de literatura, apresentada no próximo capítulo desta pesquisa. 32 3. CONTRATUALIZAÇÃO NO DEBATE CONTEMPORÂNEO O objetivo desta seção é o de oferecer base conceitual para análise do caso de contratualização na administração direta, descrevendo as origens, analisando vantagens e desvantagens, bem como trazer estudos que relacionam a contratação de resultados ao desempenho da organização. Queremos buscar subsídios teóricos para responder às seguintes questões: (1) A contratação está relacionada à melhoria de desempenho nos hospitais? E (2) Se contratos são importantes para o resultado da organização, como desenhá-los de forma a não gerar desvios de comportamento pela busca de resultados a qualquer custo? Para tanto será necessário revisitar a literatura sobre contratualização de resultados, seus desafios, problemas apontados, alternativas de gestão de contratos e sua relação com o desempenho da organização. 3.1.Contratos de Gestão e Contratualização de Resultados Os contratos de gestão estão relacionados à ideia de que o núcleo estratégico de governo por si só é insuficiente para responder à complexidade da sociedade e prover os serviços demandados, por isso parcerias são formadas para que se possam atingir melhores resultados para a população. São geralmente associados à estratégia de compra de serviços, que envolve a transferência da prestação de serviços que previamente estavam sob a responsabilidade da esfera publica para agentes privados7, embora sejam crescentemente utilizados para formalizar acordos de resultados entre organizações governamentais. Diferenciam-se da contratação clássica ao estabelecer metas de desempenho baseadas em um planejamento prévio do governo, especificando claramente qual o nível de serviço esperado da entidade contratada. A contratualização estabelece um novo papel de coordenação para o núcleo estratégico, o
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