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Responsabilidade Social nas Organizações Professora conteudista: Cíntia Alves Sanches Sumário Responsabilidade Social nas Organizações Unidade I 1 O QUE É RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL (RSE) .............................................................3 2 BREVE HISTÓRICO DA RSE ..............................................................................................................................5 3 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS E O BALANÇO SOCIAL NO BRASIL ...............8 3.1 Os anos 1980, a participação e o fortalecimento da questão ........................................... 10 3.2 Os anos 1990: a consolidação da responsabilidade social das empresas e o balanço social no Brasil ................................................................................................. 13 3.3 O balanço social das empresas e a consolidação da ideia de empresa cidadã ........... 16 3.4 A legislação sobre balanço social ................................................................................................... 20 4 CERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL ............................................................................................................ 22 Unidade II 5 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS EMPRESAS ..................................................................................... 25 5.1 Responsabilidade social com o púbico interno ........................................................................ 25 5.2 Responsabilidade social com fornecedores ............................................................................... 28 5.3 Responsabilidade social com o meio ambiente ....................................................................... 31 5.4 Responsabilidade social na relação com os clientes .............................................................. 33 5.5 Responsabilidade social com governo e sociedade ................................................................ 35 5.6 Responsabilidade social na relação com a comunidade ...................................................... 38 5.7 A ética da responsabilidade social ................................................................................................. 40 6 MARKETING SOCIAL ....................................................................................................................................... 42 7 O INSTITUTO ETHOS ........................................................................................................................................ 44 1 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 Unidade I 5 10 15 20 25 INTRODUÇÃO As empresas estão inseridas em um ambiente de incertezas e de muitas pressões das partes interessadas, que exigem cada vez mais um desempenho global que promova a eficiência, a eficácia, a efetividade e a economicidade, além de operações “limpas” e ações transparentes e socialmente responsáveis. Neste contexto, nos últimos anos foram desenvolvidas inúmeras técnicas gerenciais direcionando as organizações a garantir sua sobrevivência no mercado e maximizar os seus resultados financeiros. Porém, como gerar competitividade vem dia após dia e assim torna-se um desafio central para as empresas. Na busca pela garantia de espaço no mercado globalizado e na potencialização do seu desenvolvimento, as empresas inteligentes, incansáveis na redefinição de seus valores como forma de adequá-los às necessidades mercadológicas vigentes, desenvolvem um novo comportamento voltado para o seu estabelecimento no mundo competitivo: Responsabilidade Social de Empresas (RSE) é a nova forma de “como fazer” adotada pelas empresas modernas. Essa tendência decorre da maior conscientização do consumidor e consequente procura de produtos e práticas que gerem melhoria para o meio ambiente ou comunidade, valorizando aspectos ligados à cidadania. Além disso, essas profundas transformações mostram-nos que o crescimento econômico só será possível se estiver alicerçado em bases sólidas. Deve haver um desenvolvimento de estratégias empresariais 2 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 competitivas por meio de soluções socialmente corretas, ambientalmente sustentáveis e economicamente viáveis. Neste material, você encontrará um histórico sobre o desenvolvimento da ideia de responsabilidade social no mundo e no Brasil, a sua legislação, informações sobre os certificados socioambientais, e o amplo aspecto da res, que envolve as relações das empresas com seus fornecedores, clientes, funcionários, meio ambiente, governo, sociedade e comunidade. Ao final do livro-texto, você encontrará links interessantes sobre o tema e leituras complementares para que você aprofunde seu conhecimento e conheça exemplos de empresas que são socialmente responsáveis. Bons estudos! “Ao se dar conta do enorme poder das empresas, a sociedade passa a exigir delas uma responsabilidade de mesma abrangência e intensidade.” “A empresa que sobrevive em longo prazo em um ambiente democrático reconhece sua natureza pública ao demonstrar quanto agrega de valor à sociedade e não apenas aos acionistas e dirigentes.” “Em um tempo de enorme transparência e visibilidade todas as ações e omissões das empresas, especialmente das grandes, serão conhecidas publicamente. É apenas uma questão de tempo.” “A reputação das empresas será formada cada vez mais pelo que os diversos stakeholders falam dela e cada vez menos pelo que a empresa fala de si própria.” Fonte: Helio Mattar, presidente do Conselho da Associação Brasileira de Desenvolvimento de Lideranças (ABDL), em depoimento à seção Tendências do Anuário Expressão de Gestão Social 2006. 5 10 3 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 1 O QUE É RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL (RSE) Para o Instituto Ethos, responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais. O conceito de RSE às vezes está associado à prática filantrópica, pois é muito comum ver empresários e empresas divulgando nos meios de comunicação a participação ou o apoio a projetos sociais, através de doações. No entanto, a questão da responsabilidade social abrange muito mais do que simples doações financeiras ou materiais. De acordo com Silva (2001), “filantropia significa amizade do homem para com o outro homem”. Significa ajuda e possui um caráter assistencialista. Trata-se de uma ação externa à empresa, tendo como benefício a comunidade, tornando-se um paliativo para uma grave conjuntura social. Para Grajew (1999), RSE trata da relação ética em todas suas ações, políticas e práticas, sejam elas com o seu público interno ou externo. Para Oliveira (2005), não existe uma lista rígida de ações que uma empresa deve fazer para ser socialmente responsável, ou seja, não existe uma definição consensual. Responsabilidade social envolve uma gestão empresarial mais transparente e ética e a inserção de preocupações sociais e ambientais nas decisões e resultados das empresas. Responsabilidade social - relacionamento ético e transparente da organização com todas as partes interessadas, visando ao desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para gerações futuras, respeitando a 5 10 15 20 25 30 4 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais (FPNQ, 2005). Cherques (2003)enfatiza que as empresas estão sendo chamadas à responsabilidade porque, havendo se equivocado sistematicamente sobre o futuro da economia e da sociedade, veem-se na contingência de reavaliar o peso dos efeitos das suas atividades e de corrigir a sua conduta. Dentre as atitudes possíveis para enfrentar esse desafio, a mais sábia parece ser a de sacudir a letargia e tentar dar conta do que está evidentemente errado. Trata-se de buscar uma nova identidade para as empresas. Uma identidade que integre a responsabilidade social às áreas estratégica, logística, operacional, financeira e comercial (Cherques, 2003). De acordo com Melo Neto e Froes (2001, p. 78), a Responsabilidade Social das Empresas consiste na sua “decisão de participar mais diretamente das ações comunitárias na região em que está presente e minorar possíveis danos ambientais decorrentes do tipo de atividade que exerce”. Para Ashley (2003, p. 56) a responsabilidade social empresarial pode ser definida como: O compromisso que uma organização deve ter para com a sociedade, expresso por meio de atos e atitudes que afetem positivamente, de modo amplo, ou a alguma comunidade, de modo específico, agindo proativamente e coerentemente no que tange a seu papel específico na sociedade e na prestação de contas para com ela. O termo responsabilidade social implica uma forma das empresas conduzirem seus negócios “de tal maneira que as tornem parceiras e corresponsáveis pelo desenvolvimento social” (Instituto Ethos). A empresa socialmente responsável é aquela que possui a capacidade de ouvir os interesses das diferentes partes 5 10 15 20 25 30 5 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 envolvidas no negócio (stakeholders): acionistas, funcionários, fornecedores, consumidores, comunidade, governo e meio ambiente, de forma a conseguir incorporá-los no planejamento de suas atividades, buscando atender às demandas de todos. De acordo com Silva (2001), responsabilidade social empresarial é o comprometimento permanente dos empresários de adotar um comportamento ético e contribuir para o desenvolvimento econômico, melhorando simultaneamente, a qualidade de vida de seus empregados e de suas famílias, da comunidade local e da sociedade como um todo. Para Cherques (2003): (...) do ponto de vista ético, não há limite de responsabilidade para os danos sociais que uma empresa possa causar. A ideia de limite de responsabilidade vem do direito civil e do comercial. Os proprietários de empresas de responsabilidade limitada só respondem pelo seu patrimônio social. Mas esta é uma figura econômica e jurídica. Moralmente não há limite para a nossa responsabilidade. O que existe é a não responsabilização sob determinadas condições. A responsabilidade social das empresas compreende o conjunto de deveres morais que as empresas, na pessoa dos que as dirigem, têm para com a sociedade. Esses deveres são de caráter preventivo, por exemplo, quando a empresa se esforça por não deteriorar o meio ambiente, e de caráter reparador, quando, por exemplo, a empresa restaura o meio ambiente depois de um vazamento de efluentes. 2 BREVE HISTÓRICO DA RSE1 Para Torres (2003), a realização de ações de caráter social não é uma prática tão recente no meio empresarial. Porém, somente no final dos anos 1960 e início da década de 1970, 1Fonte: <http://www1.ethos.org.br/EthosWeb/pt/52/o_que_e_rse/ referencias/referencias.aspx>. 5 10 15 20 25 30 6 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 tanto nos Estados Unidos da América (EUA) quanto em parte da Europa, que uma atuação voltada para o social ganhou destaque, basicamente como resposta às novas reivindicações de alguns setores da sociedade, que levaram para o universo das empresas diversas demandas por transformação na atuação corporativa tradicional voltada estritamente para o econômico. Corrêa et al. (2004) citam que o despertar da responsabilidade social das empresas não tem um histórico cronologicamente definido. Há, na verdade, uma evolução da postura das organizações em face da questão social, provocada por uma série de acontecimentos sociopolíticos determinantes e, também, por aqueles que foram consequência da inovação tecnológica. De acordo com o site Balanço Social (ver: <http://www. balancosocial.org.br/>), no Brasil, os indícios de que uma mudança de mentalidade empresarial estava acontecendo eram percebidos desde meados da década de 1960, quando novas ideias começaram a ser discutidas e foi criada a Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas (ADCE), sendo publicada a “Carta de Princípios do Dirigente Cristão de Empresas”, em 1965. A difusão dessas ideias, no entanto, tomou impulso a partir da segunda metade dos anos 1970, quando mereceram destaque como ponto central do 2° Encontro Nacional de Dirigentes de Empresas. Um dos princípios da ADCE Brasil baseava-se na aceitação por seus membros de que as empresas, além de produzir bens e serviços, devem possuir função social que se realiza em nome dos trabalhadores e do bem-estar da comunidade em geral. As enormes carências e desigualdades existentes no país, aliadas às deficiências crônicas do Estado no atendimento das demandas sociais, conferem maior relevância à Responsabilidade Social Empresarial (RSE). Daí a importância das entidades empenhadas na mobilização do setor privado em torno do assunto, a consciência de responsabilidade social do empresariado brasileiro teve certas instituições como protagonistas desta 5 10 15 20 25 30 7 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 história e como catalisadores importantes e diretamente responsáveis pelo despertar desta consciência. A pioneira dessas instituições foi o Grupo de Instituições, Fundações e Empresas (GIFE), surgido em 1989, mas somente institucionalizado e formalizado em 1995. (Corrêa et al, 2004). E também a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança, criada em 1990. Outra evidência dos avanços obtidos na área é o número crescente de empresas brasileiras que vêm obtendo certificados de padrão de qualidade e de adequação ambiental, como as normas ISO. O surgimento de novos parâmetros de certificação relacionados especificamente à responsabilidade social – como as normas SA8000 (relações de trabalho) e AA1000 (diálogo com partes interessadas) – desafia as corporações a atingir um patamar mais alto de desempenho. Atualmente, a RSE está no centro das discussões das principais economias do mundo e é praticamente indissociável do conceito de desenvolvimento sustentável. Citado pela primeira vez em 1987, no relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, o termo é definido como o “modelo de desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades”. Em resposta a esse anseio mundial, surgem os índices de sustentabilidade empresarial no mercado financeiro. O primeiro deles foi o Sustainability Index, lançado em 1999 pela Dow Jones, empresa americana dedicada a informações sobre negócios. Funciona como uma ferramenta para investidores que busquem empresas ao mesmo tempo lucrativas e eficientes na integração dos fatores econômicos, ambientais e sociais nas estratégias de seus negócios. No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) lançou em 2005 o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), que reflete o retorno de uma carteira composta por ações de empresas reconhecidamente comprometidas com a responsabilidade social e a sustentabilidade empresarial e atua como promotor de boas práticas no meio empresarial brasileiro. 5 10 15 20 25 30 35 8 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo -3 0/ 06 /2 01 0 3 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS E O BALANÇO SOCIAL NO BRASIL O conteúdo deste capítulo foi desenvolvido com base nas informações extraídas do site www.balancosocial.org.br, assinado por Círio Torres. Os primeiros e isolados discursos em prol de uma mudança de mentalidade empresarial no Brasil já podem ser notados em meados da década de 1960. E nesse sentido, a Carta de Princípios do Dirigente Cristão de Empresas2, publicada em 1965, é um marco histórico incontestável do início da utilização explícita do termo responsabilidade social, diretamente associado às empresas e da própria relevância do tema relacionado à ação social empresarial no país, mesmo que ainda limitado ao mundo das ideias e se efetivando apenas em discursos e textos, o tema já fazia parte da realidade de uma pequena parcela do empresariado paulista. Esta ideia, que começou a ser discutida e difundida ainda nos anos 1960 após a criação da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas (ADCE)3, demorou até a segunda metade dos anos 1970 para difundir-se amplamente. As principais manifestações estavam concentradas no Estado de São Paulo, fato que se explica pela importância econômica e política daquele estado, que reúne, desde o início da industrialização brasileira, as maiores empresas e entidades de representação empresarial do país. Em 1977, o tema mereceu destaque a ponto de ter sido o assunto central do 2º Encontro Nacional de Dirigentes de Empresas promovido pela ADCE. A responsabilidade das empresas e dos empresários diante das questões sociais também foi o 2 Observe com atenção um trecho da Carta: As crises e tensões do mundo contemporâneo devem-se a que as instituições econômico-sociais vigentes se afastaram dos princípios cristãos e das exigências da justiça social e que os antagonismos de classe, os aberrantes desníveis econômicos, o enorme atraso de certas áreas do país decorrem, em parte, de não ter o setor empresarial tomado consciência plena de suas responsabilidades sociais. (Carta de Princípios do Dirigente Cristão de Empresas, 1965). 3 A ata de fundação da ADCE data de 29 de março de 1961, conforme se pode constatar em: ADCE. A história de um ideal: a ADCE no Brasil . 1961- 1996, São Paulo: Edicon, 1997. 5 10 15 20 25 9 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 tema do Plano de Trabalho 77/78 da União Internacional Cristã de Dirigentes de Empresas (Uniapac), que chegava a identificar o balanço social e a gestão social da empresa, com ênfase num viés mais participativo, como eficientes instrumentos que deveriam ser utilizados pelas empresas no efetivo cumprimento da responsabilidade dessas ante a sociedade. Todavia, a conjuntura nacional daquele período não era propícia para ideias de transformação e mudança, seja de mentalidade, seja de ação. A ideia de responsabilidade social nas empresas, que já motivava algumas discussões desde os anos 1960, também vai sofrer com a falta de liberdade e as restrições impostas pela ditadura militar pós-1964.4 Entre o final dos anos 1970 e o início dos anos 1980, com a crise do modelo de desenvolvimento baseado na ação e na proteção estatais, o próprio papel das empresas e a postura dos empresários ante o mercado e a sociedade entraram em processo de redefinição e reestruturação. Dessa forma, pode-se compreender o quanto essa prática e este recorrente discurso de ação social por parte das empresas está relacionada, ao mesmo tempo, com a reestruturação do Estado, com uma renovação do empresariado nacional no Brasil e com o processo de substituição das ações compensatórias. Já no contexto dos EUA e da Europa, relaciona-se à crise do Estado de bem-estar social, o Welfare State5 assistencial, que buscava garantir integralmente o bem- estar de todos os cidadãos. 4 Desde o início dos anos 60, a Consultec, empresa formada por Luiz Antônio da Silva Pinto, Jorge Oscar de Mello Flores e Roberto Campos, técnicos ligados ao antigo BNDE, realizava um balanço social para empresas multinacionais e alguns grupos nacionais, basicamente um instrumento interno de avaliação de impacto e análise de risco, para implantação e expansão no país (Flores, 1999). 5Welfare State, ou Estado de bem-estar social, pode ser entendido como o conjunto de práticas e instituições compensatórias desenvolvidas a partir da Segunda Guerra Mundial, tendo o Estado como agente principal na garantia da universalidade de direitos, bens e serviços. Na década de 1980, com o crescimento do desemprego e a crise econômica, este modelo de Estado assistencial mostra sua incapacidade de proporcionar as garantias sociais compensatórias, necessárias para se contrapor aos malefícios causados pelo mercado capitalista. 5 10 15 20 25 10 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 Cabe aqui um destaque sobre o primeiro tipo de relatório que aborda aspectos sociais e de recursos humanos e que se tornou obrigatório para todas as empresas que atuam no Brasil. Na década de 1970, durante a ditadura militar, foi criada pelo Decreto Lei no 76.900, de 1975, a Relação Anual de Informações Sociais (Rais): um relatório obrigatório para todas as empresas e que dava e dá ainda hoje conta das informações sociais relacionadas aos trabalhadores nas empresas. Compulsório para todos os empregadores, independentemente do número de empregados, refere-se a uma série de informações laborais específicas e consolida números que se encontram também em outros documentos da empresa. Apesar de mais antigo que o obrigatório balanço social francês, as informações contidas na Rais são muito inferiores, tanto qualitativa quanto quantitativamente (Freire, 1999). 3.1 Os anos 1980, a participação e o fortalecimento da questão A situação sociopolítica e econômica entrou em processo de mudança a partir do final dos anos 1970 no Brasil, durante o período da abertura política, que se consolidou durante os anos 1980, no período da chamada redemocratização. Este período marca também a falência do modelo intervencionista de caráter estatal. Nesse período, os sindicatos fortaleceram-se e diversas organizações da sociedade consolidaram-se, aumentando o poder de pressão em relação a diversas instituições, incluindo-se as empresas. A sociedade passou por áureos períodos de participação, organização e atuação efetiva, das greves do ABC paulista à promulgação da Carta de 1988: abertura, diretas já, redemocratização e o movimento constituinte. Também merecem destaque as lutas relacionadas às questões étnicas e raciais, as 5 10 15 20 25 30 11 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 conquistas feministas, os embates dos ambientalistas durante toda a década de 1980 e as cobranças pelo cumprimento dos avanços da nova Constituição. A sociedade passou por um amplo processo de transformação. Pressionados interna e externamente, transformavam-se também empresários e empresas. No entanto, cabe ressaltar que o novo e principal fator desse período que acabou influenciando e transformando também o discurso e a ação de parte do setor empresarial foi o crescimento da participação6. Nesse contexto, devemos buscar entender a importância e o papel das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) na construção, difusão e consolidação de todo um discurso ético, de responsabilidade social e ambiental. Ou seja, uma moral e uma prática relativas ao social que, em determinado momento, se torna bastante ampla e passa a influenciar a sociedade como um todo, incluindo-se os empresários e suas corporações. Assim, pode-se destacar o papel estratégico das ONGs e das OSCs como atores no processo de construção e reprodução da chamada responsabilidade social corporativa a partir da metade dos anos 1980. A discussão em torno da atuaçãosocial das empresas e da construção de uma ética empresarial acabou tendo consequências concretas: muitas empresas começaram a investir em áreas sociais, tradicionalmente ocupadas somente pelo Estado. Na tentativa de adaptar-se aos novos tempos, cambiaram também algumas formas tradicionais de se relacionar com funcionários e fornecedores, iniciando, ao mesmo tempo, mudanças na atuação em relação ao meio ambiente e às comunidades mais próximas. A partir do momento em que essas novas ações/discursos começaram a aumentar e tornaram-se significativas, surgiu a 6 Para um melhor entendimento de todas as etapas de renascimento da sociedade civil durante o processo de abertura e redemocratização em nosso país, ler o livro organizado por Alfred Stepan, Democratizando o Brasil, da editora Paz e Terra. 5 10 15 20 25 30 12 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 necessidade e, obviamente, o interesse de torná-las públicas, ou seja, dar maior visibilidade e publicidade às ações sociais e ambientais realizadas pelas empresas. Para isso, começaram a ser utilizados relatórios regulares. Alguns desses documentos de periodicidade anual foram chamados de relatório de atividades sociais. Posteriormente, alguns evoluíram em forma e conteúdo e em uma clara alusão ao balanço contábil e financeiro da empresa começaram a receber a denominação, que vem se tornando cada vez mais usual nos últimos anos: balanço social. Mas afinal, em breve e leve abordagem, o que é o balanço social? De maneira muito simples, um instrumento colocado nas mãos dos empresários para que possam refletir, medir, sentir como vai a sua empresa, o seu empreendimento, no campo social. Este é um tema atual. Este é um tema de desafio. Este é um tema que, queiramos ou não, irá crescer e implantar-se cada vez mais. Dessa maneira, direta e eficaz, é colocada a questão pelo professor Ernesto Lima Gonçalves em seu pioneiro livro de 1980. No ano de 1984, foi publicado o primeiro relatório de cunho social de uma empresa brasileira: o relatório de atividades sociais da Nitrofértil, empresa estatal que se situava no pólo petroquímico de Camaçari, estado da Bahia. Esse documento registrava as ações internas realizadas e o processo participativo desenvolvido na empresa durante aquele período e recebeu o nome de balanço social da Nitrofértil. Esse balanço social é considerado o primeiro documento brasileiro do gênero a carregar essa denominação. Nesse mesmo período, meados da década de 1980, também foi publicado o balanço social da Femaq (empresa de São Paulo) e o relatório de atividades sociais do Sistema Telebrás. Decorridos seis anos da realização do balanço pioneiro, o Banco do Estado de São Paulo (Banespa) produziu e tornou público um relatório completo, denominado balanço social do Banespa, divulgando as ações sociais realizadas. O Banespa realizou seu balanço social em 5 10 15 20 25 30 35 13 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 1992, porém este foi publicado somente nos primeiros meses de 1993. Nos anos subsequentes, diversas empresas passaram a publicar anualmente seus balanços sociais, a partir do incremento da realização de ações sociais e ambientais concretas. Algumas prioridades, atitudes, valores e, principalmente, os discursos como se pode constatar começaram a mudar no universo empresarial a partir da década de 1990. 3.2 Os anos 1990: a consolidação da responsabilidade social das empresas e o balanço social no Brasil A partir de 1993, empresas de diversos setores passaram a realizar efetivas ações sociais e ambientais, ao mesmo tempo em que começaram a divulgar de maneira mais ostensiva, inclusive nos meios de comunicação, um perfil mais responsável e humano. Foi no início dos anos 1990 que a realização anual de relatórios sociais e ambientais iniciou um processo de aceitação e disseminação no meio empresarial. Assim, a partir dessa época, os chamados balanços sociais anuais passaram a fazer parte da realidade de um número cada vez maior de corporações. Esse também foi um importante período de consolidação da mudança de mentalidade de uma parcela do empresariado nacional, no qual novas lideranças empresariais passaram a defender um capitalismo de cunho mais social, buscando, inclusive, maior diálogo com representantes dos trabalhadores. Esses novos empresários dos anos 1990 estão cada vez mais atentos aos problemas ambientais e sociais. Eles passaram a levar em consideração, de forma crescente, a questão da ética e da responsabilidade social e ambiental na hora de tomar decisões. Foi nesse ambiente de mudança de mentalidade, a partir de reuniões realizadas em São Paulo ao final dos anos 1980, 5 10 15 20 25 14 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 que uma parcela do empresariado paulista, preocupada mais intensamente com a inserção de suas empresas no universo das ações sociais ainda que com um enfoque mais filantrópico, criou o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), já citado anteriormente. Deve-se ressaltar aqui a importância do Gife para o desenvolvimento das ações sociais realizadas no âmbito empresarial brasileiro, cabendo também igual destaque aos eventos relacionados ao Prêmio Eco criado em 1983 e consolidado a partir de 1986, desenvolvido pela Câmara Americana de Comércio, em São Paulo (AmCham/SP). Diversas organizações estiveram e outras ainda estão diretamente ligadas à história da ação social no mundo empresarial. Algumas delas estão relacionadas diretamente com o nascimento, o crescimento e a difusão da responsabilidade social das empresas no Brasil, tornando-se necessário destacar algumas das iniciativas marcantes: as pioneiras ADCE e a Fundação Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social (Fundação Fides, que na década de 1980 possuía o nome de Instituto de Desenvolvimento Empresarial IDE); o Pensamento Nacional das Bases Empresariais (Pnbe); o próprio Gife, acima citado; a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança (criada e mantida pela Associação Brasileira das Indústrias de Brinquedos, Abrinq); o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (e a luta contra a Aids, no início dos anos 1990; a campanha da Ação da Cidadania, em 93/94 e 95, e depois o projeto Balanço Social das Empresas, a partir de 1997); e o mais novo integrante dessa lista que possui uma das mais importantes e intensas atuações neste campo, o Instituto Ethos de Responsabilidade Social (sobre o qual falaremos no cap. 7), criado pelo empresário Oded Grajew em junho de 1998. Dessa forma, pode-se afirmar que foi a partir do início dos anos 1990 que algumas empresas passaram a desenvolver 5 10 15 20 25 30 15 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 ações sociais concretas, sistemáticas e como uma estratégia empresarial. Investindo e atuando de maneira cada vez mais intensa nesse novo campo, a operacionalização dessas ações foi, muitas vezes, institucionalizada e colocada a cargo de profissionais. Paralelamente a esse processo e em decorrência dele, essas empresas começaram a divulgar sistematicamente as ações realizadas em relação à comunidade, ao meio ambiente e aos próprios funcionários. Assim, podemos inferir que todo esse processo se deu por uma conjunção de interesses pessoais de alguns empresários; cobrança por parte da sociedade organizada; disputas de poder; e da necessidade do meio empresarial de adaptar-se às transformações nacionais e globais. Nesse sentido, os anos 1990 aparecem como palco da disputa por novos modelos de desenvolvimento, retirada do Estado de setores tradicionais de atuação, reafirmação dos valores liberais e de mercado, novas práticas corporativas e uma nascente e crescenterenovação do pensamento empresarial no Brasil. Se essas preocupações e atuações corporativas no âmbito social tornaram-se uma questão econômico-financeira, relacionada à sobrevivência empresarial e ligada a uma nova visão estratégica de longo prazo, não podemos esquecer o lado ético e humano que essas práticas de responsabilidade social envolvem ou, potencialmente, ajudam a desenvolver. Portanto, não é sem motivo que ocorre nesse período um grande fortalecimento e difusão tanto no meio empresarial quanto no meio acadêmico e de algumas organizações da sociedade do termo Responsabilidade Social das Empresas (RSE) e dos seus correlatos: empresa socialmente responsável, ética nas empresas, balanço social das empresas, filantropia empresarial, empresa cidadã etc. Ao mesmo tempo em que surgem, entre outras, ideias e expressões como: “fazer o bem 5 10 15 20 25 30 16 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 faz bem”; “fazer o bem é a alma do negócio”; “transformando a frieza dos números em qualidade de vida”. 3.3 O balanço social das empresas e a consolidação da ideia de empresa cidadã Múltiplos e complexos são os fatores que contribuíram para o amadurecimento da ideia de cidadania empresarial e de publicação de balanço social na cultura das organizações brasileiras. Entre eles merecem destaque: a pressão por parte das agências internacionais de fomento e as campanhas de várias instituições de preservação da natureza para que as empresas privadas e públicas reduzissem o impacto ambiental; a Constituição de 1988, que representou um grande avanço tanto em questões sociais quanto ambientais; o exemplo e o resultado de programas educacionais, esportivos, ambientais e de apoio cultural de grandes empresas multinacionais como a Xerox, a C&A, a Coca-Cola, o McDonald´s, entre outras; e, por último, mas não menos importante, a atuação, nos últimos anos, de empresas nacionais como: Banco do Brasil, Usiminas, Inepar, Petrobras, Natura, Azaléia e O Boticário, por exemplo.7 Contudo, foi a partir de 1997 que diversas organizações passaram a trabalhar de maneira ostensiva com esse tema, realizando seminários, pesquisas, palestras e cursos, principalmente sobre balanço social. Algumas poucas obras acadêmicas e livros começam a aparecer. Ao mesmo tempo, muitas empresas começaram a desenvolver, de maneira mais sistemática, ações sociais e ambientais concretas e passaram a divulgar anualmente o balanço social. Como exemplo, podem ser citadas algumas empresas que, já em meados de 1997, realizaram seus balanços sociais por conta da campanha iniciada por Betinho: Inepar, Usiminas, Cia. Energética de Brasília, Light, 7 Apesar da Constituição de 1988 ter assegurado conquistas político-econômicas e socioambientais, cabe registrar o fato de que uma considerável parcela do grande empresariado nacional se empenhou, durante o período de elaboração da Carta de 1988, em barrar avanços sociais e ambientais, apoiando, de diversas maneiras, parlamentares de centro-direita que compunham, apesar dos vários partidos de direita, o partido de fato chamado centrão. 5 10 15 20 25 17 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 Mills, entre outras, conforme Gazeta Mercantil, 6 de junho de 1997 e em 3 de junho do mesmo ano.8 Desde o final dos anos 1980, o sociólogo Herbert de Souza começou a ter contato com alguns empresários dispostos a fazer doações e a apoiar campanhas como a luta contra a Aids e as ações em favor das crianças e dos adolescentes, como, por exemplo, a criação da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia, fundada em 1987) e durante a campanha Se Essa Rua Fosse Minha, que ocorreu em 1991. Contudo, nesse primeiro momento, a participação dos empresários envolveu um caráter muito mais pessoal e filantrópico do que propriamente uma transformação das práticas e dos princípios das empresas e das organizações envolvidas. A partir de 1993, a Campanha contra a Fome e a Miséria, criada por Betinho e desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), tornou-se uma referência. Esta acabou também promovendo a aproximação entre setores do empresariado nacional e uma questão premente no Brasil: a fome e a miséria. Essa campanha, na fase de maior intensidade, mobilizou diversas empresas públicas e privadas em todo o país, entre 1993 e 1995. Foi a experiência do então coordenador da Campanha contra a Fome, a partir do contato com muitas empresas e empresários, que gerou e fortaleceu a ideia de que uma ação social e ambiental mais efetiva por parte das empresas públicas e, principalmente, das empresas privadas . de maneira independente, mas não se 8 Utiliza-se aqui o ano de 1997 como marco, pois foi a partir do artigo. Empresa pública e cidadã, do sociólogo Herbert de Souza, publicado no jornal Folha de S.Paulo, em 26 de março de 1997, p. 2., Caderno 2, que esse debate foi recolocado na mídia, gerando, em um primeiro momento, respostas concretas, tanto diretas quanto indiretas: grandes empresas engajaram-se na campanha pelo balanço social; lançamento do modelo de balanço social criado no Ibase em junho de 1997, que vem sendo amplamente utilizado por grandes empresas; um amplo seminário nacional, promovido pela Abamec em novembro de 97; o projeto de lei na Câmara Federal, da deputada Marta Suplicy. Logo em seguida, nasce uma nova OSC para tratar exclusivamente de RSE a partir das afinidades do então empresário Oded Grajew, com o tema e com algumas ideias do sociólogo: o Instituto Ethos de Responsabilidade Social. 5 10 15 20 25 18 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 opondo às ações do Estado era não só desejável como deveria ser incentivada. Dessa forma, a questão da responsabilidade social das empresas e da publicação anual do balanço social ganhou destaque na mídia e uma intensa visibilidade nacional quando o sociólogo Herbert de Souza escreveu o artigo “Empresa pública e cidadã”, em março de 1997. Esse artigo desencadeou um amplo debate, durante aquele e outros períodos, nos jornais do país.9 A partir desse debate e da ampla repercussão nacional sobre o tema, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), tendo à frente a imagem nacionalmente reconhecida de Betinho, lançou em 16 de junho de 1997 uma campanha pela divulgação anual do balanço social das empresas, declarando que este seria o primeiro passo para uma empresa tornar-se uma verdadeira empresa cidadã.10 O lançamento da campanha pela publicação do balanço social deu-se no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro, e contou com o apoio de diversas lideranças empresariais, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) autarquia do Ministério da Fazenda responsável pela fiscalização das atividades das empresas nas bolsas de valores, e do jornal Gazeta Mercantil. Esse evento também contou com a participação e o apoio de empresas como a Xerox do Brasil, Banco do Brasil, Grupo Gerdau, Banco do Nordeste, Glaxo Wellcome, Light e Usiminas, 9 O amplo debate pelos jornais: no dia 29/3/97, o empresário Ricardo Young, do PNBE, escreveu um texto com algumas críticas às ideias de balanço social do sociólogo Herbert de Souza. Em 7 de abril do mesmo ano, Betinho escreveu novo artigo, na mesma Folha de S. Paulo, respondendo a Ricardo Young. De março a novembro de 1997, encontramos em vários jornais diversos artigos abordando o tema da Responsabilidade Social das Empresas, e, mais especificamente, sobre Balanço Social: Evelyn Ioschpe (FSP, 1/4/97); Luís Nassif (FSP, 16/5/97); Marta Suplicy (FSP, 10/6/97); Sérgio Foguel (FSP, 23/6/97); Vladimir Rioli (FSP, 16/7/97); Fernando Motta (GM, 4/8/97) e Eliseu Martins (GM, 18/9/97) são alguns exemplos. 10 Cabe registrar que, como visto anteriormente,a ideia original do Balanço Social não foi de Betinho e nem sequer nasceu no Brasil. Contudo, o grande mérito do sociólogo criador do Ibase foi recolocar o tema na agenda nacional e ampliar a discussão para amplos setores da sociedade, a partir de 1997. 5 10 15 20 25 19 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 entre outras, além de algumas instituições de representação empresarial, como, por exemplo, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), a Associação Brasileira de Mercado de Capitais (Abamec) e a Associação Comercial do Rio de Janeiro. Durante os meses seguintes, essa campanha alcançou uma grande repercussão em várias partes do país e desdobrou-se em uma série de debates e seminários, tendo como objetivo principal chamar a atenção dos empresários e de toda a sociedade para a importância e a necessidade da realização anual do balanço social em um modelo único e simples. Esse modelo tem algumas particularidades que devem ser destacadas: • foi criado a partir da iniciativa de uma ONG, cobrando transparência e efetividade nas ações sociais e ambientais das empresas; • separa as ações e os benefícios obrigatórios dos realizados de forma voluntária pelas empresas; • é basicamente quantitativo; • se for corretamente preenchido, pode permitir a comparação entre diferentes empresas e uma avaliação da própria corporação ao longo dos anos. O modelo de balanço social apresentado anteriormente foi desenvolvido no Ibase, em parceria com técnicos, pesquisadores e diversos representantes de instituições públicas e privadas. Este foi concebido e concluído ainda durante o primeiro semestre de 1997, como resultado de inúmeras reuniões e debates. A estratégia adotada por Herbert de Souza foi a de criar um modelo básico, mínimo e inicial, construído à base do consenso e que pudesse ser lançado rapidamente. Por exemplo, na polêmica questão 5 10 15 20 25 30 20 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 racial, o formulário do balanço social seguiu para a gráfica com o item nº de negros que trabalham na empresa e % de cargos de chefia ocupados por negros. Quando alguns empresários envolvidos no processo declararam que não realizariam balanço social com essas informações e retirariam o apoio à campanha, Betinho convenceu o grupo a retirar, ainda que provisoriamente, este item. Em um primeiro momento, esse modelo de balanço social contou com o apoio e a recomendação da CVM, por meio de uma instrução normativa nunca publicada, que indicava que as empresas de capital aberto deveriam realizar balanço social anualmente. Outro apoio decisivo, ainda que indireto, foi o da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), reguladora das empresas do setor, que recomendou a realização de balanço social nesse mesmo modelo. Dessa forma, torna-se claro o motivo pelo qual a relação das empresas que realizam balanço social anualmente é composto, na sua maioria, por empresas de capital aberto e por empresas do setor elétrico. 3.4 A legislação sobre balanço social Foram esses diversos eventos e artigos relacionados ao tema, realizados durante 1997, que motivaram a então deputada federal pelo Partido dos Trabalhadores (PT) do Estado de São Paulo, Marta Suplicy, a apresentar na Câmara dos Deputados, em maio do mesmo ano, o Projeto de Lei nº 3.116/97 que versava sobre balanço social e responsabilidade social das empresas no Brasil. Esse projeto visava a tornar obrigatória, para todas as empresas com mais de cem funcionários, a divulgação anual de balanço social, conforme diversos critérios especificados no texto e tomando por base o modelo francês de balanço social. 5 10 15 20 25 30 21 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 A justificativa apresentada no projeto acrescenta que: Elaborar o balanço social é um estímulo à reflexão sobre as ações das empresas no campo social. O balanço social estimulará o controle social sobre o uso dos incentivos fiscais e outros mecanismos de compreensão de gastos com trabalhadores. Ajudará na identificação de políticas de recursos humanos e servirá como parâmetro de ações dos diferentes setores e instâncias da empresa no campo das políticas sociais (Projeto de Lei nº 3.116/97, Câmara dos Deputados, Brasília, 14 de maio de 1997). Esse projeto foi assinado por outras duas deputadas federais: Sandra Starling, do PT de Minas Gerais, e Maria da Conceição Tavares, do PT do estado do Rio de Janeiro, que, assim como a deputada Marta Suplicy, por motivos diversos, não retornaram à Câmara. Assim, o projeto foi arquivado sem chegar a passar pelas comissões necessárias para sua total tramitação e posterior votação no plenário. Em 1999, o deputado Paulo Rocha, do PT do estado do Pará, apresentou um projeto versando sobre o mesmo tema. Basicamente, foi o mesmo projeto realizado anteriormente, sendo até mesmo citado como referência principal. Até o momento de conclusão deste trabalho, o projeto encontrava-se em tramitação na Comissão de Economia, Indústria e Comércio da Câmara Federal. Durante os anos de 1997 e 1998, alguns projetos que versavam sobre balanço social e responsabilidade social das empresas foram apresentados em vários municípios brasileiros, como, por exemplo, na capital de São Paulo; em Santo André/ SP; em Porto Alegre/RS; em Santos, também no estado de São Paulo; em João Pessoa, na Paraíba; e em Uberlândia/MG. Porém, de todos os projetos apresentados, o que merece maior destaque 5 10 15 20 25 30 22 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 foi o realizado na cidade de São Paulo pela vereadora Aldaíza Sposati. E isso se dá não só pela importância que a capital paulista apresenta, mas também pelos avanços apresentados por esse projeto, que foi um dos principais motivadores de todos os outros apresentados nos vários municípios brasileiros supracitados.11 Aprovado em 23 de outubro de 1998, o Projeto nº 39/97, que cria o dia e o elo Empresa Cidadã do município de São Paulo, transformou-se na resolução no 05/98, que estabelece, em nível municipal, 25 de outubro como o dia da empresa cidadã, concedendo um selo/certificado para toda a empresa que apresentar qualidade em seu balanço social anual. Essa Resolução também constituiu uma comissão para dar encaminhamento aos trabalhos, especificar um modelo de balanço social e julgar as empresas merecedoras do citado selo. Já em meados de 1999, o processo encontrava-se em fase de implementação. Em outubro de 1999, 25 empresas receberam esse selo. Em 2001, esse número cresceu para 32 corporações que atuam na cidade de São Paulo.12 4 CERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL No intuito de estimular a responsabilidade social empresarial, uma série de instrumentos de certificação foi criada nos últimos 11 No município de São Paulo/SP, a Resolução nº 005/98 cria o Dia e o Selo da Empresa Cidadã às empresas que apresentarem qualidade em seu Balanço Social e dá outras providências. A autoria é da vereadora Aldaíza Sposati (PT). Esta Resolução está em vigor e já premiou diversas empresas na cidade de São Paulo. No município de Santo André/SP, o Projeto de Lei nº 004/97 tornou-se a Lei nº 7.672, de 18 de junho de 1998, de autoria do vereador Carlinhos Augusto, cria o Selo Empresa Cidadã às empresas que instituírem e apresentarem qualidade em seu Balanço Social e dá outras providências. No município de Porto Alegre/RS, a Lei nº 8.118/98, de autoria do vereador Hélio Corbelini (PSB), cria o Balanço Social das empresas estabelecidas no âmbito do município de Porto Alegre e dá outras providências. Esta lei foi sancionada em 5/1/98 e publicada, em 9/1/98, no Diário Oficial. No município de João Pessoa/PB, o Projeto de Resolução nº 004/98,do vereador Júlio Rafael, institui o Selo Herbert de Souza às empresas que apresentarem qualidade em seu Balanço Social e dá outras providências. E, por fim, no município de Uberlândia/MG, a Câmara Municipal de Uberlândia instituiu em novembro de 1999 o Selo Empresa Cidadã. Outras informações podem ser obtidas no site do Balanço Social: <http://www.balancosocial. org.br>. 12 A comissão do prêmio Empresa Cidadã da Cidade de São Paulo é composta por representantes de empresas, do poder público, de sindicatos e de organizações da sociedade civil, como, por exemplo, Fiesp, Abrinq, Câmara Municipal, Prefeitura, PNBE, CUT, Instituto Ethos, Ibase, Abong e CIEE. 5 10 15 20 23 RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS ORGANIZAÇÕES Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 anos. O apelo relacionado a esses selos ou certificados é de fácil compreensão. Num mundo cada vez mais competitivo, empresas veem vantagens comparativas em adquirir certificações que atestem sua boa prática empresarial. A pressão por produtos e serviços socialmente corretos faz com que empresas adotem processos de reformulação interna para se adequarem às normas impostas pelas entidades certificadoras. Entre algumas das certificações mais cobiçadas atualmente estão as seguintes: Selo Empresa Amiga da Criança Selo criado pela Fundação Abrinq para empresas que não utilizem mão de obra infantil e contribuam para a melhoria das condições de vida de crianças e adolescentes. ISO 14000 O ISO 14000 é apenas mais uma das certificações criadas pela International Organization for Standardization (ISO). O ISO 14000, parente do ISO 9000, dá destaque às ações ambientais da empresa merecedora da certificação. AA1000 O AA1000 foi criado em 1996 pelo Institute of Social and Ethical Accountability. Esta certificação de cunho social enfoca principalmente a relação da empresa com seus diversos parceiros, ou stakeholders. Uma de suas principais características é o caráter evolutivo, já que é uma avaliação regular (anual). SA8000 A Social Accountability 8000 (SA) é uma das normas internacionais mais conhecidas. Criada em 1997 pelo Council on Economic Priorities Accreditation Agency (CEPAA), a 5 10 15 20 25 24 Unidade I Re vi sã o: J ul ia na - D ia gr am aç ão : L éo - 3 0/ 06 /2 01 0 SA8000 enfoca, primordialmente, relações trabalhistas e visa assegurar que não existam ações antissociais ao longo da cadeia produtiva, como trabalho infantil, trabalho escravo ou discriminação.
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