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O nascimento de uma nova física - Bernard Cohen (1)

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I. BERNARD COHEN
O nascimento de 
uma nova física
De Copérnico a Newton
m
E D A R T -S a O PAU LO — LIV R A R IA EDITORA LTDA. 
SAO_RAIII.fi
A SÉRIE ESTUDOS DE CIÉNCIA
A Série Estudos de Ciencia (The Science Study 
Series) oferece aos estudantes e ao público em 
geral obras de autores famosos, que tratam dos 
assuntos mais excitantes e fundamentáis da Ciéncia, 
desde a menor das partículas conhecidas até o Uni­
verso inteiro. Alguns dos livros tratam do papel 
que a Ciéncia desempenha no mundo do homem, 
sua tecnología e civilizaqáo. Outros sao de cunho 
biográfico, contando as historias fascinantes dos 
grandes descobridores e de suas descobertas. Cada 
autor foi escolhido pela competéncia dentro de sua 
especialidade e por sua habilidade em comunicar 
de maneira interessante seus conhecimentos e seus 
próprios pontos de vista. A finalidade primordial 
désses livros é apresentar uma visáo geral de cada 
assunto dentro das possibilidades tanto do estudante 
como do homem comum. Fazemos votos para que 
muitos désses livros encoragem o leitor a fazer suas 
próprias investigares sobre os fenómenos naturais.
Esta série, que agora apresenta tópicos sobre to­
das as ciéncias e suas aplicagóes, teve inicio num 
projeto de revisáo do programa de Física das esco­
las secundárias. No Instituto de Tecnología de 
Massachusetts, durante o ano de 1956, um grupo 
de físicos, de professóres secundarios, de jornalistas, 
de desenhistas de aparelhos, de produtores de fil­
mes e de outros especialistas organizaram o Comité 
de Estudos de Física (Physical Science Study 
Committee, PSSC) que agora funciona como parte
do “ Educational Services Incorporated” , Water- 
town, Massachusetts. Todas essas pessoas canali- 
zaram seus conhecimentos e suas experiéncias para 
planejamento e criaqáo de meios que auxiliassem o 
aprendizado da Física. Desde o inicio seus esforqos 
tiveram o auxilio financeiro da Fundáqáo Nacional 
de Ciéncia, que continua a auxiliar o programa. A 
Fundaqao Ford, o Fundo para o Progresso da 
Educaqáo e a Fundaqáo Alfred P. Sloan também 
tém ajudado. O Comité organizou um livro, uma 
extensa série de filmes, um laboratorio piloto, 
aparelhos especialmente desenhados, e um Guia para 
o Professor.
A Série é dirigida por uma junta de editores 
constituda por:
Paul F. Brandwein, de “ The Conservation 
Foundation” e da “ Harcourt, Brace 
& Co.”
John H. Durston, Educational Services In- 
corporated.
Francis L. Friedman, do Institudo Tcno- 
lógico de Massachusetts
Samuel A. Goudsmit, do Laboratorio Na­
cional de Brookhaven
Bruce F. Kingsbury, Educational Services 
Incorporated.
Philippe LeCorbeiller, da Universidade de 
Harvard
Gerard Piel, do “ Scientific American”
Herbert S. Zim, da “ Simón and Schuster, 
Inc.”
BIOGRAFIA DO AUTOR
O Nasctmento de wma Nova Física é um assunto 
relacionado com o interésse profissional de I. Ber- 
nard Cohén, da Universidade de Harvard. As 
conseqüencias históricas, científicas ¿"culturáis das 
grandes descobertas de Sir Isaac Newton tiveram 
para o Professor Cohén, durante anos, um interésse 
especial. Autor de Franklin e Newton (1956), de 
Escritos de Isaac Newton sobre Filosofía da, Natu­
reza (1957), o Professor Cohén dedicou os quatro 
últimos veróes á leitura de tudo quanto póde encon­
trar, escrito por Newton ou sobre Newton, nos 
arquivos de manuscritos das grandes academias da 
Inglaterra, Holanda, Franqa e Itália. Seus estudos 
culminaram por fim com a primeira ediqao crítica 
e comentada, dos Principia Mathematica de Newton, 
ainda nao publicada.
O Professor Cohén nasceu em Far Rockway, 
Nova York, em 1914. Recebeu o grau de bacharel 
em Ciéncia, em Matemática, cum laude, em 1937 em 
Harvard, e realizou trabalhos correspondentes a 
ésse grau em Física, Astronomía e Historia da Cién­
cia, na mesma Universidade. Recebeu o grau de 
Ph. D. em Historia da Ciéncia, em 1947 e é agora 
professor desta última cadeira.
Durante seis anos o Professor Cohén foi diretor- 
-secretário e durante outros seis anos (1953-59) 
diretor editor de Isis, o jornal trimestral e oficial 
da Sociedade de Historia da Ciéncia. É autor de A 
Ciencia, Escrava do Homem (1948) e outros livros, 
e escreveu artigos para o Jornal da Historia das 
Idéias, Isis, Scientific American e para publicares 
francesas, italianas e espanholas. Foi especialmente
convidado para realizar conferéncias no Uni- 
versity College de Londres, na Sorbonne em Paris, 
em Oxford, em Florenqa, e em numerosas Uni­
versidades americanas. É vice-presidente da Socie- 
dade de Historia da Ciéncia nos Estados Unidos e 
compareceu como delegado ao Nono Congresso In­
ternacional de Historia da Ciéncia ( Barcelona - 
Madrid).
Longe dos seus arquivos e da máquina de escre- 
ver, o Professor Cohén é um ardoroso viajante e 
escalador de torres, entusiasmo éste compartilhado 
por sua filha mais moga. (Uma vez quase ficou 
entalado nos degraus espiralados do Mosteiro de 
York, na Inglaterra.) Outra das suas ocupaqoes de 
amador ñas horas vagas é fotografar castelos e bar­
cos, especialmente barcos de pesca.
A pesquisa do Professor Cohén sobre a influén- 
cia das idéias científicas na sociedade é particular­
mente relacionada com o fermento educacional que 
a América está agora experimentando. Na Historia 
da Ciéncia éle vé “ uma unidade de toda a capaci- 
dade criadora humana e um meio pelo qual a Ciéncia 
pode recuperar as dimensóes humanizadoras táo 
freqüentemente perdidas em apresentaqóes pura­
mente formáis” .
Outras obras de I. Bernard Cohén
Experiencias de Benjamín Franklin 
Roemer e a Primeira Determinagao da Velocidade 
da Luz
Manual de Laboratorio de Física 
A Ciéncia, Escrava do Homem 
Educagao Geral em Ciéncia
Benjamín Franklin, Sua Contribuigáo á Tradigao 
Americana
Escritos de Isaac Newton sobre Filosofia Natural 
Franklin e Newton
x
PREFÁCIO
O fim a que se propóe éste livro náo é apresentar 
uma Historia “ popular” da Ciéncia, nem mesmo 
mostrar ao leitor comum alguns dos recentes resul­
tados da pesquisa na Historia da Ciéncia. A inten- 
<jáo é explorar um aspecto daquela grande revoluqao 
científica que ocorreu durante os séculos X V I e 
X V II para esclarecer alguns aspectos fundamen­
táis do desenvolvimento da Ciéncia moderna. Um 
tema importante é o efeito da estrutura intimamen­
te entrelazada das Ciéncias Físicas sobre a formaqao 
de uma ciéncia do movimento. Desde o século X V II 
temos visto repetidamente que uma modificado 
de vulto em qualquer parte das Ciéncias Físicas 
acaba por produzir modificares em todo o ámbito 
dessas Ciéncias; outra conseqiiéncia é a impossibi- 
lidade de testar ou provar uma afirmacao cientí­
fica isoladamente ou completamente por si mesma, 
sendo cada teste náo apenas uma verificadlo da 
proposito particular em discussáo, mas de todo o 
sistema das Ciéncias Físicas.
A principal e talvez única propriedade da Cién­
cia moderna é o seu aspecto dinámico, o modo pelo 
qual as mudanzas ocorrem constantemente. Infeliz­
mente, as necessidades de apresentaqao lógica nos 
livros de texto elementares e trabalhos gerais sobre 
Ciéncia, impedem o estudante e leitor de obter uma 
idéia verdadeira desta particular propriedade diná­
mica. Disso decorre que outro dos principáis pro­
pósitos déste livro é tentar mostrar como uma só 
idéia pode ter tanta fórqa, que a sua adoqáo pode 
alterar toda a estrutura da Ciéncia.
Gostaria de externar minha gratidao ao Professor 
Alexandre Koyré, da École Pratique de Hautes 
Etudes (Paris) e Institute for Advanced Study 
(Princeton), nosso mestre na sábia arte da análise 
conceptual. A Professóra Marjorie Hope Nicolson, 
da Universidade de Columbia, nos féz apreender bem 
a vasta significado intelectual da “ nova Astrono­
mía” , e particularmente das descobertas telescópicas 
de Galileu. Durante mais de uma década, com gran­
de alegría e proveito, discutí muitas destas questóes 
com o Professor Marshall Clagett, da Universidade 
de Wisconsin. Sou particularmente grato a Stillman 
Drake, que foi mais doque generoso, ao permitir­
me ver seus estudos galileanos antes de publicados, 
ao responder-me perguntas e ao proceder á leitura 
crítica dos origináis déste livro. Acima de tudo, 
registro aquí meu entusiasmo pelo Physical Science 
Study Committee do Educational Services Incorpo- 
rated, (principalmente os professóres Jerrold Zacha- 
rias e Francis Friedman, do M .I.T.) sob cujos auspi­
cios foi concebido éste livro. Tenho consciéncia do 
privílégio de ter contribuido com pequeña parte nesta 
grande emprésa de reformar o ensino da Física, no 
nivel da escola secundária. É difícil achar palavras 
capazes de exprimir tantas obrigaqóes aos compo­
nentes do PSSC (notadamente Bruce Kingsfoury) 
que por todos os modos facilitaram cada passo no 
longo caminho da preparaqáo déste livro. Em par­
ticular, encontrei em John H. Durston um redator 
compreensivo, cuja auxilio reduziu meu próprio 
trabalho a proporqóes fáceis.
Agradeqo aos editores, que deram permissáo para 
citar material publicado. Os livros sáo citados no 
Guia para Leituras Posteriores, no fim déste vo-
Iume' I.B.C.
Widener Library 189 
Harvard University
XII
I N D I C E
A Série Estudos de Ciéncia ...................................... V II
Biografía do Autor ......................................................... IX
Prefácio' ............................................................................. X I
Cap. 1. A Física de Uma Terra em M ovim ento... 1 
Onde caira isto? — Respostas Alternativas
— A Necessidade de Uma Nova Física
Cap. 2. A Velha Física ............................................... 12
A Física do Senso Comum de Aristóteles
— O Movimento “ Natural ” dos Objetos — 
Os Céus “ Incorruptíveis ” — Os Fatóres 
do Movimento: Fórga, Resisténcia, Veloci­
dade, Distáncia e Tempo — Movimento de
Corpos que Caem através do A r — A 
Impossibilidade de Uma Terra em Movi­
mento.
Cap. 3. A Terra e o Universo .................................. 28
Copérnico e o Nascimento da Ciéncia Mo­
derna — O Sistema das Esferas Concén­
tricas — Ptolomeu e o Sistema de Epiciclos 
e Deferentes — Inovagóes de Copérnico — 
Copérnico versus Ptolomeu — Vantagens e 
Desvantagens de um Universo de Copérnico.
Cap. 4. Explorando as Profundezas do Universo.. . 59 
Evolu?ao da Nova Física ■— Galileu Galilei
— O Telescopio: Um Passo Gigantesco —
A Paisagem da Lúa — O Brilho da Terra
— Aglomerados de Estrélas — Júpiter 
como Evidencia — Um Novo Mundo.
Cap. 5. Caminhando para uma Física Inercial........ 88
O Movimento Retilíneo Uniforme — Uma 
Chaminé de Locomotiva e um Navio em 
Movimento — A Dinámica de Galileu: 
Inércia. Movimento Uniformemente Acele­
rado de Galileu — Formulando a Lei da
Inércia — Dificuldades e Realizagóeh de 
Galileu.
Cap. 6 . A Música Celestial de Kepler .................... 135
A Elipse e o Universo de Kepler — As 
Tres Leis — Aplicagóes da Terceira, ou 
Lei Harmónica — Kepler versus adeptos de 
Copérnico ■— A Contribuigáo de Kepler.
Cap. 7. Um Grande Designio — Uma Nova Física 159 
Antecipagóes Newtonianas — Os “ Princi­
p ia” — Formulagáo Final da Lei da Inér­
cia — “ O Sistema do Mundo” — O Golpe
do Mestre: A Gravitagáo Universal __ A
Grandeza do Feito.
XIV
C a p ít u l o I
A FÍSICA DE UM A TERRA EM 
M OVIM EN TO
Por estranho que pareqa, as noyóes da maioria 
das pessoas a respeito do movimento sáo partes de 
um esquema da Física, que foi proposto há mais 
de 2000 anos, e experimentaknente demonstrado 
inexato e insuficiente, pelo menos há 1 400 anos 
atrás. É fato que, mesmo hoje, homens e mulheres, 
presumivelmente bem educados tendem a pensar a 
respeito do mundo físico como se a Terra estivesse 
em repouso, ao invés de estar em movimento. Com 
isto náo quero afirmar que tais pessoas acreditem 
realmente que a Terra esteja em repouso; se per- 
guntadas, responderáo que naturalmente sabem que 
a Terra dá uma volta por día em torno do seu eixo, 
e ao mesmo tempo se move numa grande órbita 
anual ao redor do Sol. Todavía, quando se trata 
de explicar certos acontecimentos físicos comuns, 
tais pessoas sáo incapazes de dizer como é que ésses 
fenómenos cotidianos podém se dar, como vemos 
que éles se dáo, numa Terra em movimento. Em 
particular, ésse mal-entendido da Física tende a 
centralizar-se no problema da queda dos objetos, no 
conceito geral do movimento. Vemos assim exem- 
plificado o velho preceito: “ Ignorar o movimento 
é ignorar a Natureza” .
1
Onde cairá ele?
Na sua falta de habilidade ao tratar das questóes 
do movimento em relaqao a uma Terra que se mo­
ve, o homem medio está na mesma posigáo de alguns 
dos maiores dentistas do passado, o que Ihe pode 
ser fonte de grande conforto; contudo, a maior di­
ferencia é que para o dentista do passado a incapa- 
cidade para resolver estas questóes era um sinal do 
seu tempo, ao passo que para o homem moderno 
tal incapacidade é um distintivo de ignoráncia. Ca­
racterísticas déstes problemas estáo numa gravura 
em madeira do século X V II (Gravura I) mostrando 
um canháo apontando para o alto. Observem a per­
gunta feita: “ Retombera-t-il?” (Cairá de novo?). 
Se a Terra estivesse em repouso, náo haveria dúvi- 
das de que a bala do canháo, disparada em linha 
reta para cima, no ar, voltaria por fim diretamente 
para dentro do canháo. Mas, acontecerá isto numa 
Terra em movimento? Caso afirmativo, por qué?
Passemos em revista todos os argumentos. Há 
os adeptos da teoría de que a Terra pode se mover, 
desde que o ar também se mova solidário comí ela 
e, assim sendo, uma flecha lanzada no ar seria 
arrastada com éste. Replicariam os adversários: 
Embora possamos admitir o ar em movimento — 
uma hipótese difícil porque náo há causa aparente 
para o ar se mover com a Terra — náo poderia éle 
mover-se muito mais lentamente que a Terra, já 
que é táo diferente em substancia e qualidade? E, 
mesmo assim, náo seria a flecha deixada para trás? 
E o que dizer da ventania que seria sentida por 
uma pessoa numa torre alta?
A fim de examinar éstes problemas de um ponto 
de vista mais ampio, ignoremos por um momento a 
própria Terra. Nesta altura, a mulher e o homem
2
medio podem muito bem replicar: Posso náo ser 
capaz de explicar como uma bola deixada cair de 
uma torre atinge o chao ao pé da torre, mesmo 
com a Terra em movimento. Mas eu sei que uma 
bola deixada cair desee verticalmente, e sei que a 
Terra está em movimento. Assim, deve haver algu- 
ma explicagáo, embora eu náo a conheqa.
Consideremos agora uma outra situaqáo. Admi­
tamos simplesmente que podemos construir uma 
espécie de veículo que se mova muito rápidamen­
te, táo rápidamente que sua velocidade possa atingir 
30 quilómetros por segundo. Um experimentador 
está postado na extremidade désse veículo, numa 
plataforma de observaqáo do último carro, se fór 
um trem. Enquanto o trem se lanqa para a frente, 
á velocidade de 30 quilómetros por segundo, éle 
tira do bolso uma bola de ferro de cérca de meio 
quilo, e a lanqa verticalmente no ar, a uma altura 
de 5 metros. Ela leva mais ou menos um segun­
do para subir e outro tanto para descer. Até onde 
se moveu o homem na extremidade do trem? Se 
sua velocidade era de 30 quilómetros por segundo, 
éle viajou 60 quilómetros, a partir do ponto em 
que lancou a bola ao ar.
Como o homem que desenhou a gravura do 
canháo disparando a bola no ar, perguntamos: 
Onde cairá ela? Voltará a bola para atingir o trilho 
em um ponto muito perto do lugar donde foi 
arremessada? Ou conseguirá a bola, de um ou de 
outro modo, baixar táo perto das máos do homem 
que a lanqou, que éle possa agarrá-la, embora o 
trem se mova a uma velocidade de 30 quilómetros 
por segundo? Se vocé responder que a bola atin­
girá a linha férrea vários quilómetros atrás do 
trem, entáo vocé náo entende claramente a Física 
da Terra em movimento. Mas, se vocé acredita 
que o homem na extremidade do trem agarrará a
bola, entáo, terá de enfrentar a seguinte pergunta: 
Que fórqa faz a bola mover-se para a frente a uma 
velocidade de 30 quilómetrospor segundo, embora 
o homem que a lanqou lhe desse uma fórqa verti­
cal e náo uma fórqa na direqáo dos trilhos? (Os 
que se preocuparem com a possibilidade de atrito 
com o ar, podem imaginar que a experiéncia foi 
realizada dentro de um vagáo do trem.)
A crenqa de que uma bola lanqada em linha reta, 
para cima, do trem em movimento, continuará a 
mover-se em linha reta, para cima e para baixo, 
de modo a atingir a linha férrea num ponto bem 
para trás, está intimamente ligada a uma outra cren­
qa acérca de objetos em movimento. Ambas fazem 
parte do sistema da Física de há cerca de 2000 
anos atrás. Examinemos por um momento éste se­
gundo problema, porque acontece que as mesmas 
pessoas que náo entendem como objetos parecem 
cair verticalmente numa Terra em movimento, tam­
bém náo estáo inteiramente certas do que acontece 
quando caem objetos de pesos diferentes. Todo 
mundo sabe, naturalmente, que a queda de um corpo 
no ar depende da sua forma. Isto pode ser fácil­
mente demonstrado se fór feito um pára-quedas 
com um lenqo, amarrando-se os quatro cantos do 
lenqo a quatro cordéis e atando os quatro pedaqos 
do cordel a um pequeño corpo. Enrole éste pára- 
quedas de maneira a formar uma bola, lance-o ao 
ar; vocé observará que éle cai f lutuando lentamente. 
Faqa déle novamente uma bola, tome um fio de 
séda e amarre-o ao redor do pára-quedas e do 
objeto, de modo que o pára-quedas náo possa abrir­
se no ar. Vocé verá que o mesmo objeto cairá 
verticalmente para a Terra. Mas o que acontecerá 
com objetos de mesmo formato e pesos diferentes? 
Suponha que vamos ao topo de uma alta torre, ou 
ao terceiro andar de uma casa, e que deixemós cair
4
daquela altura dois objetos de forma idéntica, duaa 
bolas, pesando uma 10 quilos e a outra) U cufrlei 
Qual délas,tocaría o solo em primeiro lugar? E 
quanto tempo antes da outra o faria? Se a rela- 
qáo entre os dois pesos, neste caso uma razáo de 
dez para um tivesse influéncia, seria observada a 
mesma diferenqa em tempo de queda, se os pesos 
fóssem respectivamente 10 quilos e 100 quilos? E 
se fóssem 1 miligrama e 10 miligramas?
Respostas alternativas
Em geral, o conhecimento de Física nesse assunto 
se desenvolve mais ou menos assim: primeiramente 
há uma crenqa de que, se soltarmos simultánea­
mente uma bola de 1 quilo e outra de 2 quilos, da 
mesma altura, a de 2 quilos atinge primeiro o solo; 
além disso, supóe-se, em geral, que a de 1 quilo 
leva o dóbro do tempo gasto pela de 2 quilos. Se- 
gue-se entáo um estágio de maior sofisticaqáo, no 
qual é de presumir-se que o estudante tenha apren­
dido num livro de texto elementar, ser totalmente 
insustentável a conclusáo acima e que a verdadevra 
resposta é que ambas atingiráo o solo ao mesmo 
tempo, quaisquer que sejam os respectivos pesos. 
A primeira resposta pode ser chamada a “ opiniáo 
de Aristóteles” , porque se ajusta aos principios 
formulados pelo filósofo grego Aristóteles, cérca de 
400 anos antes da Era Crista. Podemos chamar a 
segunda, a do “ manual elementar” , por ser encon­
trada em muitos désses livros. Algumas vézes se 
diz mesmo que esta segunda opiniáo foi “ provada” 
no século X V I pelo cientista italiano Galileu Galilei. 
Uma versáo típica desta historia é que Galileu “ fez 
cair, da Torre inclinada de Pisa, bolas de diferentes 
tamanhos e materiais, no mesmo instante. Éles 
(seus auxiliares e amigos) viram as bolas partir 
juntas, cair juntas, e ouviram-nas bater juntas no
solo. Alguns se convenceram, outros voltaram aos 
seus aposentos para consultar os livros de Aristóte­
les. a fim de discutir a evidencia.”
Tanto a opiniáo aristotélica quanto a do “ ma­
nual elementar” estáo erradas, como é sabido por 
experiéncia, pelo menos há 1 400 anos. Voltemos 
ao século VI, quando Joannes Philoponus (ou Joáo 
o Gramático), um ehldito bizantino, andava estu- 
dando esta questáo. Philoponus argumentava que 
a experiéncia contradiz as opinióes comumente acei­
tas sobre a queda. Adotando o que poderíamos 
chamar uma atitude bastante “ moderna” , éle dizia 
que um argumento baseado na “ observagáo real” é 
muito mais convincente que “ qualquer espécie de 
argumento verbal” . Eis o seu argumento, baseado 
na experiéncia:
“ Porque, se vocé deixar cair da mesma 
altura dois corpos, um dos quais é muitas 
vézes mais pesado que o outro, verá que a 
razáo dos tempos gastos no movimento náo 
depende da razáo dos pesos, mas que a dife- 
renga em tempo é muito pequeña. E, assim, 
se a diferenga em pesos náo é considerável, 
a saber, se um é, digamos, o dóbro do outro, 
náo haverá diferenga, ou entáo uma diferenga 
imperceptível em tempos, embora a diferenga 
em péso náo seja de modo algum desprezível, 
com um corpo pesando duas vézes mais que 
o outro.”
Nesta afirmagáo encontramos a prova experi­
mental de que a opiniáo “ aristotélica” é errada 
porque objetos que diferem grandemente em péso 
atingiráo o solo quase ao mesmo tempo. Mas 
observe-se que Philoponus também sugere que a 
opiniáo do “ manual elementar” é incorreta porque 
éle verificou que corpos de pesos diferentes caem
ó
da- mesma altura em tempos diferentes. Um mile­
nio mais tarde o engenheiro, físico e matemático 
flamengo Simón Stevin realizou experiéncia seme- 
lhante. Consta do seu relato:
“ A experiéncia que contradiz Aristóteles é 
a seguinte: Tomemos (como o ilustre Sr. Jan 
Cornets de Groot, grande investigador dos se- 
gredos da Natureza e eu próprio fizemos) 
duas esferas de chumbo, uma dez vézes maior 
e mais pesada que a outra e deixemo-las cair 
juntas, de uma altura de 10 metros numa tábua 
ou em alguma coisa sobre a qual elas produzam 
um som perceptível. Verificar-se-á entáo que 
a mais leve náo levará dez vézes mais tempo 
no seu caminho do que a mais pesada, mas 
que elas caem práticamente juntas sobre a tá­
bua, a ponto de seus dois sons parecerem uma 
única pancada seca” .
Stevin estava obviamente mais interessado em 
provar o érro de Aristóteles do que em tentar veri­
ficar se havia uma diferenga bastante exigua, a 
qual teria sido de certo modo acentuada, se éle 
tivesse deixado cair os corpas de maior altura. 
Sua informaqáo náo é, portanto, táo exata com a 
que deu Philoponus no fim do século VI.
Galileu, que tinha realiiado esta particular expe­
riéncia com maior cuidado que Stevin, relatou-a em 
forma final:
Mas, eu, Simplicio, que fiz a experiéncia, 
posso lhe assegurar que uma bala de canháo, 
pesando cinqüenta ou cem quilos, ou mesmo 
mais, náo atingirá o solo um palmo á frente 
de uma bala de mosquete pesando só meio 
quilo, contanto que ambas sejam sóltas de 
uma altura de 200 cóvados (antiga unidade
de comprimento) . . . a maior se avantaja á 
menor de uma distáncia de dois dedos, isto é, 
quando a primeira atinge o solo, a outra está 
mais atrás a uma distáncia de dois dedos” .
A Necessidade de uma Nova Física
Que tem a ver, pode-se ainda imaginar, a veloci­
dade relativa da queda de objetos leves e pesados 
com um universo em que a Terra está em movi­
mento, ou com o sistema anterior em que a Terra 
esta va em repouso? A resposta está no fato de que 
o velho esquema da Física, associado ao nome de 
Aristóteles, era um sistema completo de Física, de­
senvolvido para um universo em cuio centro a 
Terra se achaya em repouso ̂ portanto, para derru- 
bar aquéle sistema, admitindo-se a Terra em mo­
vimento, houve necessidade de uma nova Física. 
Está claro que, se se pudesse mostrar que a velha 
Física era inadequada, ou mesmo que ela levava a 
conclusóes erradas, dever-se-ia ter um argumento 
muito poderoso para rejeitar o velho modelo do 
universo. Inversamente, para fazer a gente aceitar 
um novo sistema, seria necessário fornecer a éste 
uma nova Física.
/ Eu concordo, é natural, que o leitor déste livro 
aceite o ponto de vista “ moderno” , o qual admite 
que o Sol está em repouso e que os planétas se 
movem ao redor déle. Náo indaguemos, no momen­
to, o que entendemos pela afirmagáo de que “ o 
Sol está em repouso” , ou como o podemos provar, 
mas concentremo-nossimplesmente no fato de que 
a Terra está em movimento. Com que rapidez ela 
se move? A Terra dá uma volta em torno do seu 
eixo uma vez em cada vinte e quatro horas. No 
equador, a circunferencia da Terra é de aproxima­
damente 38 500 quilómetros e, assim, a velocidade 
de rotaqáo de um observador no equador da Terra
8
é de 160 quilómetros por hora, isto é, uma velo­
cidade linear de cérca de 450 metros por segundo. 
Imagine-se a seguinte experiéncia: Uma pedra é 
atirada em linha reta para cima, no ar. O tempo 
durante o qual ela se eleva é de, digamos, dois se­
gundos, enquanto igual tempo é gasto para a desci­
da. Durante quatro segundos a rotaqáo da Terra 
terá movido o ponto do qual o objeto foi lanzado a 
uma distáncia de uns 1 800 metros. Mas a pedra náo 
atinge a Terra a essa distancia do ponto inicial; 
ela atinge a Terra muito próximo do ponto do qual 
foi arremessada. Perguntamo-nos: como pode isto 
ser possível? Como pode estar a Terra girando 
com essa respeitável velocidade de 160 quilómetros 
por hora, e todavia náo ouvimos o vento assobiar 
á medida que a Terra deixa o ar para trás? Ou, 
para aceitar uma das outras objeqóes clássicas á 
idéia de uma Terra em movimento, consideremos 
um pássaro empoleirado no galho de uma árvore. 
O pássaro vé um verme na Terra e deixa a árvore. 
Nesse ínterim, a Terra vai girando nessa veloz mar­
cha, e o pássaro, embora batendo as asas táo for- 
temente quanto possa, nunca atingirá velocidade su­
ficiente para alcanzar o verme, a menos que esteja 
éste localizado a oeste. Mas é um fato confirma­
do que os pássaros voam das árvores á térra e co- 
mem vermes que se acham tanto a leste como a 
oeste. *
Vocé só poderá se considerar realmente familia­
rizado com a Física moderna se fór capaz de en­
contrar imediatamente soluqáo para ésses problemas ; 
caso contrário, a afirmagáo de que a Terra gira 
em tomo de seu eixo, dando uma volta em 24 horas, 
na realidade náo tem significado para vocé.
Se a rotacáo diaria apresenta um sério problema, 
pensemos no movimento anual da Terra em sua ór­
bita. Computemos a velocidade com que a Terra
se move em sua órbita ao redor do Sol. Há 60 
segundos num minuto e 60 minutos numa hora, ou 
3 600 segundos numa hora. Multiplique-se éste nú­
mero por 24, para obter 86 400 segundos num dia. 
Multiplique-se isto por 365 1/4 dias, e o resultado 
é um pouco mais de 30 milhóes de segundos num 
ano. 'Para achar a velocidade com que a Terra se 
move ao redor do Sol, temos que calcular o tamanho 
da órbita terrestre e dividi-lo pelo tempo que a Terra 
gasta para descrevé-la. Esta trajetória é, aproxi­
madamente um círculo com raio de mais ou menos 
150 milhóes de quilómetros e circunferéncia de cérca 
de 928 milhóes de quilómetros (a circunferéncia 
do círculo é igual ao raio multiplicado por 2 n ). 
Isto equivale a dizer que a Terra percorre 
900.000.000.000 de metros cada ano. Assim, a ve­
locidade é
900.000.000.000 metros
------------------------------------- = 30.000 m/seg.
30.000.000 segundos
Qualquer das questóes levantadas quanto á rota- 
qáo da Terra, pode ser de novo aventada, em rela- 
gáo ao movimento da Terra ao longo de sua órbita. 
Esta velocidade de 30.000 metros por segundo mos- 
tra-nos a grande dificuldade encontrada no coméqo 
do capítulo. Fagamos a pergunta: É possível para 
nós, movermo-nos á velocidade de 30 quilómetros 
por segundo e náo nos apercebemos disto ? Suponha 
que deixamos cair um objeto de uma altura de 4£» 
metros; éle leva cérca de 1 segundo para atingir o 
solo. De acórdo com nossos cálculos, enquanto éle 
cai, a Terra, abaixo déle se afasta rápidamente e 
o objeto deveria tocá-la a uns 30 quilómetros de 
distáncia do ponto em que éle foi lanqado. E quan­
to aos pássaros ñas árvores? Se um pássaro em- 
poleirado num galho de repente levanta vóo, deveria
10
perder-se para sempre no espago. Todavía, o fato 
é que os pássaros náo se perdem no espago, mas 
continuam a habitar a Terra e a voar.
Éstes exemplos mostram como i é realmente difí­
cil encarar as conseqüéncias de uma Terra em movi­
mento. É perfeitamente claro que nossas observa- 
góes comuns sao improprias para explicar os fatos 
observados da experiéncia quotidiana sobre uma 
Terra que tanto se move em sua órbita, como gira 
em torno do seu eixo. Náo deveria, pois, haver 
dúvida que a mudanga do conceito de uma Terra 
estacionária para uma Terra em movimento, impli­
caría necessáriamente no nascimento de uma nova 
Física.
11
C a p ít u l o 2
A VELH A FISICA
A velha Física é conhecida ás vézes como a Física' 
do senso comum, porque é a espécie de Física em 
que a maioria das pessoas acredita e pela qual se 
guia intuitivamente, ou a espécie de Física que pa­
rece interessar e agradar a qualquer pessoa que use 
sua natural inteligéncia mas náo tenha aprendido 
os modernos principios da Dinámica. Acima de 
tudo, é uma espécie de Física particularmente bem 
adaptada aos conceitos de uma Terra em repouso. 
É algumas vézes conhecida como Física aristotéli­
ca, porque sua principal exposiqáo, na Antiguida- 
de, vem do filósofo e cientista Aristóteles que vi- 
veu na Grecia no quarto século antes de Cristo. 
Aristóteles foi discípulo de Platáo, e foi, por sua 
vez, mestre de Alexandre Magno, que, como Aristó­
teles, viera da Macedónia.
A Física do Senso Comum de Aristóteles
Aristóteles foi figura importante no desenvolvi- 
mento do pensamento, e náo sómente pelas suas 
contribuiqoes á Ciéncia. Seus escritos sobre Polí­
tica e Economía sáo obras-primas, e seus traba- 
lhos sobre Moral e Metafísica desafiam ainda os fi­
lósofos. Aristóteles é considerado o fundador da 
Biología e há cem anos rendeu-lhe Charles Darwin 
esta homenagem: “ Cuvier e Lineu, embora tenham
12
sido os meus dois deuses, nenhum déles pode om- 
brear com o velho Aristóteles” . Foi Aristóteles 
quem primeiro introduziu o conceito da classifica- 
gao dos animais, e também elevou bem alto o méto­
do da observagáo controlada ñas Ciéncias biológi­
cas. Um assunto que éle estudou foi a embriolo­
gía do pinto; ambicionava descobrir a seqüéncia do 
desenvolvimento dos órgáos. Metódicamente, a ca­
da dia, abria uns tantos ovos dos que estavam 
sendo chocados e fazia comparares cuidadosas para 
descobrir a seqüéncia dos estágios através dos quais 
o pinto se desenvolve, de um embriáo náo formado 
até um pinto perfeitamente formado. Foi também 
Aristóteles o primeiro a formular o processo do ra­
ciocinio dedutivo, na forma do silogismo:
Todos os homens sao moríais.
Sócrates é um homem.
Logo, Sócrates é mortal.
Aristóteles frisou que o que torna tal seqüéncia de 
trés afirmaqóes uma progressáo válida, náo sáo os 
vocábulos particulares “ homem” , “ Sócrates” e “ mor­
tal” , e sim a forma. Outro exemplo: todos os mi- 
nerais sáo pesados, o ferro é um mineral, logo o 
ferro é pesado. É esta uma das muitas formas vá­
lidas de silogismo descritas por Aristóteles no seu 
grande tratado sobre lógica e raciocinio, compreen- 
dendo tanto a deduqáo como a indwqáo.
Aristóteles insistiu na importáncia da observagáo 
em outras ciéncias que náo a Biología, notadamente 
na Astronomía. Por exemplo, um dos muitos argu­
mentos que usou para provar que a Terra é mais 
ou menos esférica foi a forma da sombra lanzada 
pela Terra sobre a Lúa, como se observa durante 
um eclipse. Se a Terra é urna esfera, entáo sua 
sombra é um cone; assim, quando a Lúa entra na 
sombra da Terra, a forma da sombra será aproxi­
13
madamente circular. Pode ser observado que um 
eclipse da Lúa só ocorre quando esta é cheia, e 
que o contorno da sombra náo é exatamente um cír­
culo. A explicaqáo dada é que a sombra projetada 
da Terra é a intersecqáo de uma esfera e um cone, o 
que náo nos aparece como um círculo perfeito. Mas 
se a Terra fósse um disco chato, ao invés de um 
corpo aproximadamente esférico, entáo a sombra 
náo teria sempre a forma aproximada de um círculo. 
Vejamos a descriqáo de Aristóteles, do arco-iris 
lunar:
“ O arco-iris é visto de dia, e anteriormente 
sepensava que éle nunca aparecía de noite, 
como arco-iris lunar. Essa opiniáo era devida 
á raridade da ocorréncia; ela náo era observa­
da, porque, embora aconteqa, é muito rara. 
A razáo é que náo é fácil ver as cores no 
escuro, e que muitas outras condiqóes sáo ne- 
cessárias, e tudo isto num só dia do més. 
Para ocorrer um arco-iris lunar, é necessário 
que ha ja lúa cheia, e que a lúa esteja nascen- 
do ou se pondo. Assim, em mais de cinqüen- 
ta anos encontramos sómente dois casos de 
arco-iris lunar.”
Éstes exemplos sáo suficientes para mostrar que 
Aristóteles náo pode ser descrito puramente como 
um filósofo de gabinete” . É entretanto verdade 
que Aristóteles náo submeteu cada afirmaqáo sua ao 
teste da experiéncia. Está fora de dúvida que éle 
acreditou no que lhe tinham dito seus mestres, exa­
tamente como geraqóes sucessivas acreditaram no, 
que disse_ Aristóteles. Isto serve muitas vézes de 
base para criticar Aristóteles e também os cientistas 
que o sucederam. Mas dever-se-ia ter em vista que 
em geral o estudante nunca verifica todas as afirma- 
qóes que lé em livros de texto e manuais. A vida 
é curta demais para permitir isso.
14
O Movimento “ Natural” dos Objetos
Examinemos agora as afirmacóes de Aristóteles 
sobre o movimento. |Para a discussáo de Aristóte-j 
les,"era básico o principio de que todos os objetosl 
que encontramos na Natureza sao com postosdgf 
“ quatro elementos” : ar. térra, fogo. água.I Sao 
estes os elementos de que falamos na conversaqáo 
ordinária, quando dizemos que alguém numa “ tor­
menta “ desafiou os elementos” . Queremos dizer 
que tal pessoa estéve num vendaval, numa tempes- 
tade de areia ou chuva e assim por diante, e náo que 
éle lutou através de um tornado de puro hidrogénio 
ou flúor.lObservou Aristóteles que alguns objetos 
na Terra sao leves e outros pesados. Atribuía éle 
a propriedade de ser leve ou pesado segundo a per- 
centagem em que néle figurava cada um dos dife­
rentes elementos, sendo a térra “ naturalmente pe­
sada” e o fogo “ naturalmente leve” , e a água e. 
o ar intermediários entre os dois extremos.{Qua[ 
— perguntou éle, seria o movimento “ natural de 
tal objeto? Respondeu que, se fósse pesado, seu 
movimento natural seria para baixo, ao passo que, 
se fósse leve, seu movimento natural seria para 
cima. A fumaqa, sendo leve, sobe em linha reta 
a náo ser que seja soprada pelo vento, enquanto 
que uma pedra, uma maqá, ou um pedaco de ferro 
cai para baixo em linha reta, q u a n d o^ a b a n d on a d o^ 
porjconseguintejpara Aristóteles, ^"natural (ou 
náo impulsionado) movimento de um objeto terres­
tre é uma linha reta para cima ou para baixo, sen­
do o sentido para cima e para baixo determinado 
ao longo de uma linha reta passando_ pelo centro 
da Terra e pelo oblservadfllJ
Aristóteles, naturalmente, percebia que muitíssi- 
mas vézes os objetos se movem de outros modos di­
ferentes dos que acabam de ser descritos. Por
15
exemplo, uma seta atirada de um arco cometa o 
vóo aparentemente numa linha reta que é mais ou 
menos perpendicular a uma linha tirada do centro 
da Terra até o observador. Uma bola na extremi- 
dade de um cordel pode ser movida em círculo. Uma 
pedra pode ser lanzada para cima em linha reta. 
Tal movimento, segundo Aristóteles, é “ violento” ou 
contrário á natureza do corpo. Tal movimento se 
verifica sómente quando alguma fórqa está atuando 
para produzir e conservar o corpo em movimento 
contrário á sua natureza. Uma pedra atada a um 
cordel pode ser movida para cima, e assim estar 
sujeita a um movimento violento, mas, no momento 
em que se rompe o cordel, a pedra comeqará a cair 
num movimento natural, procurando seu lugar na­
tural.
Consideremos agora o movimento de objetos ce­
lestes, as estrélas, planétas e o próprio Sol. Ésses 
corpos parecem mover-se em círculo ao redor da 
Terra; o Sol, a Lúa, os planétas e as estrélas ele- 
vando-se a leste, viajando pelos céus e pondo-se a 
oeste (exceto as estrélas circumpolares, que se mo- 
vem em pequeños círculos ser ̂nunca ficar abaixo do 
horizonte). I Segundo Aristóteles, os corpos celestes 
náo sáo constituidos dos mesmos quatro elementos 
dos corpos terrestres. Sáo formados de um “ quin­
to elemento” , ou “ éter” . O movimento de um cor­
po composto de éter é circular, de modo que o 
observado movimento circular dos corpos celestes é 
o seu movimento natural, de acórdo com sua nature­
za, exatamente como o movimento para cima e para 
baixo em linha reta é o movimento natural de um 
objeto terrestre.!
Os Céus “ Incorruptvveis”
> Na filosofia aristotélica os corpos celestes tém 
uma ou duas propriedades que interessam. O éter
10
de que sao feitos é material imutável, ou para usar 
a velha palavra, “ incorruptível” . Isto está em con­
traste com os quatro elementos que encontramos na 
Terra; — éles estáo sujeitos a mudar, ou sao “ cor- 
ruptíveis” . Assim, na Terra, encontramos o apa- 
recimento, ou “ surgimento em ser” , a “ decaden­
cia” e o “ desaparecimento” ; o nascer e o mor- 
rer das coisas. Mas nos céus nada muda nunca, 
tudo continua o mesmo; as mesmas estrélas, os mes­
mos eternos planétas, o mesmo Sol, a mesma Lúa.* 
Os planétas, as estrélas e o Sol eram considerados 
“ perfeitos” , e através dos séculos eram freqüente- 
mente comparados a eternos diamantes ou pedras 
preciosas, por causa das suas imutáveis qualidades. 
O único objeto celeste em que qualquer espécie de 
mudanga ou “ im perfecto” podia ser descoberta 
era a Lúa; mas a Lúa, afinal, era o corpo celeste 
mais próximo da Terra, e uma espécie de marco 
divisorio entre a regiáo terrestre da mudanga (cor- 
ruptibilidade) e a regiáo celeste da permanencia e 
da incorruptibilidade.
Deve ser observado que neste sistema todos os 
objetos celestes que circundam a Terra sao mais ou 
menos semelhantes entre si e todos diferentes da 
Terra ñas características físicas, composigáo e “ pro- 
priedades essenciais” . Assim se podia compreen- 
der porque a Terra ficava firme e náo se movia, en- 
quanto os objetos celestes se moviarft. Ainda mais, 
a Terra náo só nao tinha “ movimento local” , ou 
movimento de um lugar para outro, como também 
náo se supunha que girasse ao redor do seu eixo. 
A principal razáo física para isto, segundo o velho 
sistema, é que náo era “ natural” que a Terra ti- 
vesse um movimento circular; seria contrário á sua 
natureza tanto um movimento em órbita ao redor 
do Sol, quanto uma rotagáo diária ao redor do pró­
prio eixo.
17
Examinemos agora um pouco mais de perto a Fí­
sica aristotélica do movimento dos corpos terres­
tres. Em todo movimento, dizia Aristóteles, há 
dois fatóres principáis: a fórqa motriz, que desig­
naremos aqui por F e a resisténcia, que designare­
mos por R. Para que ocorra movimento, segundo 
Aristóteles, é necessário que a fórqa motriz seja 
maior que a resisténcia. Por conseguinte, nosso 
primeiro principio do movimento é
F > R (1 )
ou, a fórqa deve ser maior que a resisténcia. Exa­
minaremos agora os efeitos de diferentes resistén- 
cias, conservando sempre constante a fórqa motriz. 
Nossa experiéncia será realizada com corpos, cada 
um deixado cair livremente, partindo do repouso, 
através de um meio resistente diferente. A fim de 
considerar as condiqóes constantes, tomaremos es­
feras para todos os corpos que caem, de modo que 
o efeito de sua forma sobre o seu movimento seja 
o mesmo. Aristóteles, é natural, sabia perfeitamente 
que a velocidade de um objeto, sendo iguais todas 
as outras condiqóes, geralmente depende de sua for­
ma, fato que já demonstramos com o nosso pára- 
quedas,
Em nossa experiéncia, usaremos duas bolas de 
aqo idénticas, com a mesma forma, tamanho e 
péso. Deixaremos cair as duas simultáneamente, 
uma através do ar, e a outra através da agua. Para 
fazer esta experiéncia, é necessário um cilindro 
comprido cheio de água; segure as duas bolas uma 
ao lado da outra, uma na água, a outra da mesma 
altura, mas fora da coluna de água. (Fig. 1). Quan­
do sáo sóltas simultáneamente,vemos que náo há
Os Fatóres do Movimento
18
___ponto de partida
>ar
F ig. 1
dúvidas de que a velocidade da que se move através 
do ar é muitíssimo maior que a velocidade da que 
cai através da água. Para provar que os resulta­
dos da experiéncia náo derivam do material com que 
as bolas sáo feitas ou do seu determinado peso, 
podemos repetir a experiéncia usando bolas de ago 
menores, um par de bolas de vidro ou de ago, e 
assim por diante. Em menor escala, qualquer pes­
soa pode repetir esta experiéncia com duas “ boli- 
nhas” de vidro e um copo grande cheii» de água até 
a borda. O resultado desta experiéncia pode ser 
escrito em forma de uma expressáo matemática que 
traduz o fato de que, sendo iguais todas as outras 
condigóes, a velocidade na água (que resiste ou di­
ficulta o movimento) é menor que a velocidade no 
ar (que náo dificulta o movimento tanto quanto a 
água):
1
F ce - 
R
(2)
19
ou a velocidade é inversamente proporcional á re­
sisténcia do meio através do qual se move o corpo. 
É experiéncia comum que a água dificulta o movi­
mento; qualquer pessoa que tenha tentado correr 
através da água á beira da praia, sabe quanto a 
água resiste ao seu movimento, em. comparado com 
o ar.
A experiéncia será agora realizada com dois ci­
lindros, um cheio de água e outro cheio de óleo 
(Fig. 2 ). O óleo resiste ao movimento ainda mais
que a água; quando as duas esferas idénticas de 
ago sao largadas simultáneamente, a da água atinge
o fundo muito antes da que cai através do óleo. 
Como a resisténcia R0 do óleo é maior que a resis­
téncia Ra da água, podemos agora predizer que se 
deixarmos cair qualquer par de objetos idénticos 
através déstes líquidos, o que cair através da água 
atingirá uma determinada altura, mais depressa que
«— ponto de partida — -
F ig. 2
20
o que cai através do óleo. Esta previsáo pode fá­
cilmente ser verificada. A seguir, já que se achou 
que a resisténcia R„, da água é maior que a resis­
téncia Rar do ar,
R» > Ra
(3)
Ra ~Z> Rar
a resisténcia do óleo deve necessáriamente ser maior 
que a do ar,
Ro > R ar (4 )
Isto pode ser também verificado, repetindo-se a 
experiéncia inicial, com um cilindro cheio de ar em 
vez de água.
Examinemos em seguida os efeitos de diferentes 
fórgas motrizes. Nesta experiéncia usamos de novo 
um cilindro comprido cheio de água. Deixamos 
cair néle uma bola de ago pequeña e uma grande, 
simultáneamente. Verificamos que a bola grande 
de ago, a mais pesada das duas, alcanga o fundo 
antes da mais leve. Pode-se alegar aqui que o ta- 
manho poderia produzir algum efeito, mas se algum 
efeito se verificasse, a bola maior deveria encontrar 
uma resisténcia maior do que a pequeña. Náo obs­
tante, o resultado é válido. Evidentemente, quanto 
maior a fórga para vencer uma resisíéncia determi­
nada, tanto maior a velocidade. Esta experiéncia 
pode ser repetida, desta vez com uma bola de ago 
e outra de vidro, de maneira que as duas tenham 
exatamente o mesmo tamanho mas pesos diferentes. 
Uma vez mais se verifica que a bola mais pesada pa­
rece muito mais apta a vencer a resisténcia do meio; 
e assim chega ao fundo em primeiro lugar, ou atinge 
a maior velocidade. A experiéncia também pode 
ser feita em óleo e varios outros líquidos: álcool,
21
leite e assim por diante produzindo o mesmo re­
sultado geral. Em forma de expressóes matemáti­
cas podemos afirmar as conclusóes desta experién­
cia, como segue:
ou, sendo iguais todas as outras condigóes, quanto 
maior a fórga, maior a velocidade.
Podemos agora combinar as Expressóes (2 ) e 
(5 ) numa só, da seguinte maneira:
ou seja, a velocidade é proporcional á fórga motriz 
e inversamente proporcional á resisténcia do meio; 
ou, a velocidade é proporcional á fórga dividida pela 
resisténcia. Esta expressáo é freqüentemente co- 
nhecida como a lei aristotélica do movimento. De- 
ver-se-ia notar que o próprio Aristóteles náo escre- 
veu seus resultados sob a forma de equagóes, meio 
moderno de expressar tais relagóes. Aristóteles e a 
maior parte dos antigos cientistas, inclusive Galileu, 
preferiam comparar velocidades com velocidades, 
fórgas com fórgas e resisténcias com resisténcias. 
Assim, ao invés de escrever a Expressáo (5 ) como 
fizemos, teriam éles preferido a proposigáo:
V vidro • ^ ago : : F vidro * F ago
A razáo das velocidades das bolas de vidro e de ago 
é comparada com a razáo das fórgas com as quais 
essas bolas se movem para baixo. Isto equivale á 
proposigáo geral de que a velocidade da bola de 
vidro está para a velocidade da bola de ago assim
V oc F (5 ).
F 
V CC 
R
(6)
22
como a fórqa motriz da bola de vidro está para a 
fórqa motriz da bola de aqo.
Estudemos agora a expressáo (6 ), a fim de des- 
cobrir algumas das suas limitaqóes. É claro que 
esta expressáo náo pode ser aplicada de um modo 
geral, porque, se a fórqa motriz igualasse a resistén­
cia, a equaqáo náo daria o resultado de que a velo­
cidade V seria igual a zero; nem dá um resultado 
igual a zero quando a fórqa F é menor que a resis­
téncia R. Por conseguinte, a expressáo (6 ) está 
sujeita á limitaqáo imposta pela expressáo (1 ), e 
só é verdadeira quando a fórqa é maior que a 
resistencia . Mas isto equivale a dizer que aquela 
expressáo náo é uma afirmaqáo universal das con- 
diqoes do movimento.
Sustenta-se algumas vézes que esta expressáo 
pode ter surgido do estudo de uma balanqa de bra- 
qos desiguais, digamos, com pesos iguais ñas extremi­
dades dos dois braqos, ou talvez de uma balanqa de 
braqos iguais com pesos desiguais ñas extremidades 
dos dois braqos. Neste caso é impossível que F 
seja menor que R, porque o maior péso é sempre a 
fórqa motriz, ao passo que o menor péso é sempre 
a resisténcia. Mais ainda, na balanqa de braqos 
iguais, se F — R náo náo haverá movimento.
Há dois últimos aspectos da lei ^o movimento 
que devemos aprepentar, antes de deixar o assunto. 
O primeiro é que a própria lei nada nos diz a res- 
peito dos estágios pelos quais um objeto que cai, a 
partir de uma posiqáo de repouso, adquire a veloci­
dade V. A lei só nos diz alguma coisa sobre a pró­
pria velocidade, obviamente algo sobre velocidade 
“ média” , ou velocidade “ final” , já que ela é ava- 
liada pelo tempo gasto para percorrer determinada 
distáncia
D
V ce - (7)
T
23
que é válida para a velocidade média ou para mo­
vimento com velocidade constante, mas náo para 
movimento em que haja aceleraqáo, isto é, que te- 
nha velocidade em constante mudanqa. Náo era 
do conhecimento de Aristóteles que a velocidade 
de um corpo que cai partindo do repouso atinge, 
por estágios gradativos, seu valor final?
Movimento dos Corpos que caem através do Ar
Talvez tenha para nós maior significado do que 
qualquer dos argumentos anteriores, o resultado de 
uma outra experiéncia. Até aqui temos dado tipos 
de experiéncias positivas que nos fariam confiar 
na lei aristotélica do movimento, mas omitimos uma 
experiéncia verdaderamente crucial. Voltemos a 
considerar dois objetos do mesmo tamanho, da mes­
ma forma, mas de pesos diferentes, ou de diferentes 
fórqas motrizes F. Dissemos que, se fóssem deixa- 
dos cair simultáneamente através da água ou do óleo, 
seria observado que o mais pesado desceria mais 
rápidamente. (O leitor — antes de continuar a 1er 
o resto déste capítulo e déste livro — deverá parar, 
e fazer por si mesmo essas experiéncias). Chegamos 
agora á última experiéncia daquela seqüéncia ante­
rior: consiste ela em deixar cair dois objetos do 
mesmo tamanho mas de péso desigual, no mesmo 
meio, mas tomando o ar para meio. Admitamos 
que o péso de um dos nossos objetos é exatamente 
o dóbro do péso do outro, o que implicaría, na ve- 
lha opiniáo, em que a velocidade do objeto mais 
pesado seria exatamente o dóbro da velocidade do 
mais leve. Para uma distáncia constante de queda, 
a velocidade é inversamente proporcional ao tempo, 
de modo que
1
V oc — (8 )
T
ou
24
isto é, as velocidades sao inversamente proporcionáis 
aos tempos de queda.Conseqüentemente, o tempo 
de queda da bola mais pesada deveria ser exata­
mente metade do tempo de queda da menor. Para 
realizar a experiéncia, fique de pé sobre uma cadeira 
e deixe cair juntamente os dois objetos de modo 
que batam no chao nu. Uma boa maneira de os 
deixar cair é segurá-los horizontalmente entre o 
primeiro e o segundo dedos de uma das maos; 
abrindo entáo bruscamente os dois dedos, as duas 
bolas comegaráo a cair juntas. Qual o resultado 
desta experiéncia?
Ao invés de descrever os resultados da mesma, 
permita-me sugerir que a faqa por si mesmo. Com­
pare entáo o seu resultado com os obtidos por Joáo, 
o Gramático, com a descriqáo dada por Stevin no 
sáculo X V I, e finalmente com a que foi dada por 
Galileu no seu famoso livro Duas Novas Ciencias, 
há pouco mais de 300 anos.
Uma pergunta que, neste ponto, vocé deveria fa- 
zer a si mesmo é a seguinte: Evidentemente a ex­
pressáo (6 ) náo é válida para o ar, mas vale real­
mente para os outros meios que exploramos? A 
fim de ver se a expressáo (6 ) é uma afirmaqáo 
quantitativa exata, pergunte a si mesmo se ela era 
meramente uma definidlo de “ resisténcia” , ou se 
há algum outro meio de medir a “ resisténcia” , como 
sáo medidas as velocidades. É suficiente, para me­
dir a velocidade, usar a expressáo (8 ), e medir o 
tempo de queda?
Em todo caso, a maioria das pessoas, creio, terá 
achado que, com exceqáo da experiéncia de dois ob­
jetos desiguais caindo através do ar, o sistema aris­
totélico parece bastante razoável e pode ser aceito. 
Náo há para nós motivo para condenar indevida- 
mente, seja Aristóteles, seja qualquer físico aristo­
télico que nunca tivesse realizado a experiéncia de 
soltar no ar dois objetos de pesos desiguais.
A Impossibilidade de wma Terra em Movimento
Mas, podemos aínda perguntar — o que tem a ver 
tudo isto com o fato de estar a Terra em repouso ao 
invés de em movimento? Para obter a resposta, 
voltemo-nos agora para o livro de Aristóteles Nos 
Céus. Ali se acha a afirmaqáo de que alguns con­
sideran! que a Terra está em repouso, enquanto ou­
tros consideram que ela se move. Há, contudo, 
muitas razóes pelas quais a Terra náo se pode mo­
ver. flA fim de ter uma rotaqáo ao redor de um 
eixo, cada parte da Terra teria de se mover num 
círculo, diz Aristóteles; mas o estudo do comporta- 
mento real de suas partes mostra que o movimento 
terrestre natural é ao longo de uma linha reta, em 
diregáo ao centro. “ O movimento, portanto, sendo 
forjado (violento) e antinatural, náo poderia ser 
eterno; mas a ordem do.mundo é eterna” . ̂ O mo­
vimento natural de todas as partículas da materia 
terrestre é em direcáo ao centro do universo, que 
coincide com o centro da Terra. Como “ prova” de 
que os corpos terrestres se movem de fato em di- 
reqáo ao centro da Terra, diz Aristóteles, “ vemos 
que os corpos que se movem em diregáo á Terra 
náo se movem em linhas paralelas” , mas aparente­
mente sob algum ángulo, uns em relacao aos outros. 
“ As nossas razóes anteriores” , nota éle entáo, “ po­
demos acrescentar que objetos pesados, se lanqados 
para cima em linha reta, com emprégo da fórqa, vol- 
tam ao seu ponto de partida, mesmo que a fórqa os 
arremesse a uma distáncia ilimitada” . Assim, se 
um corpo fósse lanqado para cima em linha reta, e
26
depois caisse em linha reta, estas diregóes determina­
das em relagáo ao centro do universo, éle náo tocaría 
a Terra exatamente no ponto em que foi langado, 
se a Terra se movesse, se se afastasse durante o 
intervalo de tempo. É isto uma conseqüéncia direta 
da qualidade “ natural” do movimento em linha reta 
para objetos terrestres.
Os argumentos precedentes mostram como os 
principios aristotélicos de movimento natural e vio­
lento (antinatural), podem ser aplicados para pro­
var a impossibilidade de movimento terrestre. E a 
respeito da “ lei de movimento” aristotélica, dada na 
expressáo (6 ) ou na equaqáo (9) ? Como se rela­
ciona isso específicamente com o fato de estar a 
Terra em repouso? A resposta é dada claramente 
no coméqo do “ Almagesto” de Ptolomeu, o antigo 
trabalho padráo sobre Astronomía geocéntrica. 
Ptolomeu escreveu, seguindo os principios de Aris­
tóteles, que, se a Terra tivesse movimento, “ ela se 
adiantaria em relagáo a qualquer outro corpo que 
caisse, em virtude da sua enorme diferenga de tama- 
nho, e os animais e todos os pesos separados serr n 
deixados paja tras flutuando no ar, enquanto a 
Terra, por sua vez, com a sua grande velocidade, 
cairia fora do próprio universo” . Isto decorre ple­
namente da nogáo de que os corpos caém com velo­
cidades proporcionáis aos seus respectivos pesos. E 
muito dentista deve ter concordado com o comentá- 
rio final de Ptolomeu: “ Na verdade, basta pensar 
um po- ,o nessa possibilidade, para ver que ela é 
completamente ridicula” .
27
C a p ít u l o 3
A TERRA E O UNIVERSO
Muito freqüentemente considera-se o ano de 1543 
como o ano de nascimento da Ciéncia moderna. 
Nesse ano foram publicados dois livros de grande 
importancia, que levaram a mudanqas significativas 
no conceito humano da Natureza e do mundo :^um 
foif 'S ó ire a Revolugño dq¿-Esferas Qelestes” , do 
clérigo polonés Nicolau Copérnico e outro “ Sobre 
a fístrutura do Corpo Humano” , do flatnengo An- 
dré Vasalius. O último tratou do corpo humano 
sob o ponto de vista da exata observaqáo anatómica, 
e assim reintroduziu na Fisiología e na Medicina o 
esprito de experimentaqáo que tinha caracterizado 
os escritos dos anatomistas e fisiologistas gregos, dos 
quais o último e o maior tinha sido Galeno. í O li­
vro de Copérnico introduziu um novo sistema de 
Astronomía, que se chocava com as noqóes geral- 
mente aceitas de que a Terra estava em repouso^ 
Será nosso propósito aqui discutir sómente alguns 
aspectos escolhidos do sistema de Copérnico, nota- 
damente' algumas conseqüéncias de considerar a 
Terra, animada de movimento. Náo consideraremos 
com qualquer pormenor as vantagens ou desvanta- 
gens do sistema como um todo, nem mesmo compa­
raremos os seus méritos, passo a passo, com os do 
sistema mais antigo. Nossa primeira consideraqáo é 
explorar que conseqüéncias teve o conceito de uma 
Terra em movimento, para o desenvolvimento de 
uma nova ciéncia — a Dinámica.
28
Copérnico e o Nascimento da Ciencia Moderna
Mesmo na antiga Grecia foi sugerido que a Ter­
ra poderia ter uma rotagáo diária em torno do seu 
eixo e fazer uma revolugáo anual numa vasta órbita 
ao redor do Sol.
Proposto por Aristarco no século III A.C., éste 
sistema do universo foi vencido por outro, segun­
do o qual a Terra estava em repouso. Mesmo quan­
do, quase 2000 anos depois, Copérnico publicou sua 
explicaqáo de um sistema do universo baseado nes- 
ses dois movimentos terrestres, náo houve assenti- 
mento geral. Por fim, naturalmente, o livro de 
Copérnico provou ser a semente de toda a revolugáo 
científica que culminou na magnífica fundamenta- 
gáo da Física de Isaac Newton. Olhando para trás, 
podemos ver como a aceitagáo do conceito formula­
do por Copérnico, de uma Terra em movimento im- 
plicava necessáriamente numa Física náo-aristotéli- 
ca. Por que nenhuma destas conseqüéncias apare- 
ceu diante dos olhos dos contemporáneos de Copér­
nico? E por que o próprio Copérnico náo propor- 
cionou essa revolugáo científica, que a tal ponto 
alterou o mundo, que ainda náo percebemos comple­
tamente todas as suas conseqüéncias? Vamos expli­
car neste capítulo estas questóes e em particular 
veremos porque a proposigáo de Copérnico, de um 
sistema do mundo em que se sustentava estar a 
Terra em movimento e o Sol em repouso náo era 
por si só suficiente para a rejeigáo da velha Física.
De inicio devemos deixar bem claro que Copérni­
co (1473-1543) era, sob vários aspectos, mais um 
conservador que um revolucionário. yMuitas das 
idéias que éle introduziu já existiam na literatura, e 
repetidamente seu avango foi tolhido pelo fato de 
que éle era incapaz de ir além dos principios bási­
cos da Física aristotélica. & Quandohoje falamos 
do “ Sistema de Copérnico” , entendemos comumente
29
um sistema do universo completamente diferente do 
que vem descrito na sua obra “ De revolutionibus 
orbium caelestium” , para dar o título original la­
tino do livro. A razáo de tal procedimento está 
em que desejamos honrar Copérnico pelas suas ino- 
vaqóes, e o fazemos á custa da exatidáo, referin- 
do-nos ao sistema/heliocéntrico, como “ Sistema de 
Copérnico” .
0 Sistema das Esferas Concéntricas
Porém, antes de descrever o sistema de Copérni­
co, estabeleqamos alguns aspectos básicos dos dois 
principáis sistemas anteriores. Um, atribuido a Eu- 
dóxio, foi melhorado por um outro astrónomo gre- 
go, Callipus, e recebeu de Aristóteles os retoques fi­
náis. É éste o sistema conhecido como o das “ esfe­
ras concéntricas” . Nesse sistema, cada planéta, o 
Sol e a Lúa, eram considerados como fixos aos 
equadores de esferas separadas, que giravam em 
torno de seus eixos, ficando a Terra estacionária no 
centro. Enquanto cada esfera girava, as extremida­
des do eixo de rotaqáo estavam fixas em outra es­
fera, que também girava com um período diferente 
e em torno de um eixo que náo tinha a mesma 
orientaqáo que o eixo da esfera interior.
Para alguns planétas poderia haver até quatro es­
feras, cada uma envolvida na seguinte, com o resul­
tado de que haveria vários tipos de movimento. Por 
exemplo, uma dessas esferas poderia ser responsável 
pelo fato de que, qualquer que fósse a posiqáo do 
planéta entre as estrélas, éle seria levado a dar uma 
volta ao redor da Terra em cada 24 horas. Have­
ria outra esfera idéntica para mover o Sol na sua 
aparente revoluqáo diária, outra para a Lúa, e ou­
tra para as estrélas fixas. O conjunto de esferas 
interiores para cada planéta explicaría o fato de 
que um planéta náo parece mover-se através dos
30
céus sórnente com um movimento diário, mas tam- 
bérn muda sua posigáo día a dia, relativamente ás 
estrélas fixas. “ Assim, um planéta é visto algu- 
mas vézes, ora numa constelado, ora em outra. 
Como éles viam os planétas a vagar entre as estré­
las fixas, de noite para noite, atribuíram a origem 
dt> nome “ planéta” ao vocábulo grego que significa 
“ vagar” . Uma das características observadas désse 
“ vagar” é que a diregáo náo é constante. A dire­
gáo habitual do movimento é progredir lentamente 
em diregáo leste, mas, uma vez ou outra, o pla­
néta interrompe o seu movimento para leste (che- 
gando a um ponto estacionário) e entáo (Fig. 3)
se move num curto espago de tempo em diregáo 
oeste, até atingir outro ponto estacionário, após o 
qual retoma a originária diregáo para leste através 
dos céus. O movimento paras leste é conhecido 
como “ direto” e o movimento para oeste, “ retró­
31
grado” . Por uma conveniente combinaqáo de es­
feras, Eudóxio pode construir um modélo para 
mostrar como combinaqoes de movimentos circula­
res podiam produzir o movimento observado dos 
planétas, direto e retrógrado. É o mesmo con­
junto de “ esferas” que aparece no título do livro de 
Copérnico.
Após o declínio da Grecia, a Ciencia caiu ñas máos 
dos astrónomos islámicos ou árabes. Alguns apu- 
raram os trabalhos de Eudóxio e Aristóteles, e in- 
troduziram muitas outras esferas, a fim de fazer com 
que as previsóes do sistema concordassem mais exa­
tamente com a observado. Essas esferas, ganhan- 
do realidade, acreditava-se que fóssem de cristal; o 
sistema recebeu o título de “ esferas cristalinas” . 
Como se sustentava que a orientaqáo das estrélas e 
planétas tinha influéncia considerável nos negocios 
dos homens, acreditou-se que a influéncia do pla­
néta emanava, náo do próprio objeto, mas da esfera 
a que esta va ligado. Nesta crenqa podemos ver a 
origem da expressáo “ esfera de influéncia” , ainda 
hoje usada em sentido político e económico.
Ptolomeu e o Sistema de Epiciclos e Deferentes
O outro grande sistema rival da Antiguidade foi 
elaborado por Cláudio Ptolomeu, um dos maiores 
astrónomos do mundo antigo, e era baseado, de cer- 
to modo, em conceitos que tinham sido introduzidos 
pelo geómetra Apolónio de Perga e o astrónomo 
Hiparco. O produto acabado, geralmente conhecido 
como sistema de Ptolomeu, ou ptolomaico, em con­
traste com o sistema de esferas homocéntricas (de 
centro comum) de Eudóxio-Aristóteles tinha enor­
me flexibilidade e, em conseqüéncia, enorme com- 
plexidade. Os dispositivos básicos eram usados em 
várias combinaqóes. Antes de tudo, consideremos 
um ponto P movendo-se uniformemente em círculo,
32
perigeu
Fie. 4
ao redor do ponto E, como na Fig. 4A. Aqui está 
uma ilustradlo de movimento circular uniforme que 
náo permite pontos estacionários nem de retroaqáo. 
Nem explica o fato de que os planétas náo tém velo­
cidade constante, quando parecem mover-se em tor­
no da Terra. Quando muito, tal movimento só po­
dia ser observado no comportamento das estrélas fi­
xas, porque Hiparco tinha visto o próprio Sol moc 
ver-se com velocidade variável, observaqáo esta liga- 
gada ao fato de que as estaqóes náo tém a mesma 
dura gao. Na Fig. bB, a Terra náo est̂ í exatamen­
te no centro C do círculo, mas excéntrica, no ponto 
E. É entáo claro que, se o ponto P corresponde a 
um planéta (ou ao Sol), náo parecerá mover-se uni­
formemente em relaqáo as estrélas fixas quando vis­
to da Terra, embora seu movimento ao longo do 
círculo seja de fato uniforme.
Se a Terra e os corpos celestes formassem um tal 
sistema ̂ excéntrico, ao invés de um sistema^homo- 
céntrico, haveria períodos em que o Sol ou o planéta 
estariam muito perto da Terra (perigeu), e perío­
dos em que o Sol ou o planéta estariam muito longe 
da Terra (apogeu). Assim, devemos esperar uma
33
variaqáo no brilho dos planétas, o que de fato é 
observado.
A seguir, apresentaremos um dos principáis arti­
ficios de Ptolomeu para explicar o movimento dos 
planétas. Vamos admitir que, enquanto o ponto P 
se move uniformemente num círculo, ao redor do 
centro C (Fig. 5), um segundo ponto Q se move
Fig. S. O esquema de Ptolomeu para explicar os desvíos 
dos planétas admitia uma complicada combinagáo de movi­
mentos. O planéta Q viajava ao redor de P num círculo 
(linhas pontilhadas), ao passo que P se movía em círculo 
ao redor de C. A linha cheia com lagos é o caminho que 
seguiría Q no movimento combinado.
num círculo ao redor do ponto P. O resultado será 
gerar uma curva, com uma série de laqos ou cúspi­
des. O grande círculo em que se move P é chama­
do o círculo de referéncia. ou o deferente, e o pe­
queño círculo em que se moye Q é chamado epici-
/ ' Epiciclo
y ^ deferente
♦_____ •
34
cío. Assim, o sistema ptolomaico é muitas vézes 
descrito como baseado no deferente e no epiciclo. É 
claro que a curva resultante da combinadlo de epi­
ciclo e deferente é uma curva em que o planéta algu- 
mas vézes está mais perto do centro do que outras; 
nela há também pontos estacionários e quando 
o planéta está na parte interior de cada arco, um 
observador em C vé-lo-á mover-se com movimento 
retrógrado. Para que o movimento concorde com 
o que se observa, basta escolher os tamanhos rela­
tivos do epiciclo e deferente, e as relativas veloci­
dades de rotaqáo dos dois círculos, de modo a tor- 
ná-los concordes com as aparéncias.
Resulta claramente do livro, que Ptolomeu nunca 
se empenhou na questáo de saber se havia “ real­
mente” verdadeiros epiciclos e verdadeiros deferen­
tes nos céus. Como podemos concluir da leitura, 
parece muito mais provável que para éle o sistema 
que descreveu era um “ modélo” do universo, e náo 
necessáriamente a “ verdadeira” descriqáo — seja 
o que fór que estas palavras possam significar. 
Isto é, era o ideal grego, atingindo seu ponto mais 
alto nos escritos de Ptolomeu, de construir um mo­
délo que habilitasse o astrónomo a predizer as 
observares ou — para usar a expressáo grega — 
“ salvar as aparéncias” .
Embora freqüentemente menos elaborada, esta 
maneira de encarar a Ciéncia é muito semelhante á 
do físico do século X X , cuja ambiqáoé também 
produzir um modélo que resulta em equaqáo capa- 
zes de predizer os resultados da experiéncia — e 
muitas vézes éle é obrigado a se contentar com 
equaqóes, na auséncia de um “ modélo” , que possa 
ser construido.
Alguns outros aspectos do velho sistema de Pto­
lomeu podem ser abreviadamente ressaltados. A 
Terra náo precisa estar no centro do círculo deferen­
te ou, em outras palavras, o círculo deferente (Fig.
35
©
© ®
Fig. 6. Com epiciclo e deferente (e engenho) os as­
trónomos podiam descrever quase todos os movimentos 
observados nos planétas, sem sair dos limites do sistema 
ptolomaico. Em (A ) o ponto P se move num círculo com 
centro em C, o qual se move num círculo menor, com 
centro em X. Em (B ) o efeito da combinado de deferente 
e epiciclo é mudar o centro aparente da órbita de P, de C 
para C’. Em (C ) a combinado gera uma curva elíptica. 
A figura em (D ) é o caminho de P , movendo-se ao longo 
de um epiciclo; o centro do círculo de P é R, que se move 
num círculo, cujo centro Q está num círculo cujo centro 
é C.
36
6A) poderia ser excéntrico em vez de homocéntrico, 
isto é, com um centro diferente do centro da Terra. 
Mais aínda, embora o ponto P se mova no grande 
círculo de referéncia, ou deferente (Fig. 6B), seu 
centro C podia estar se movendo num pequeño cír­
culo, combinagáo que náo precisa produzir retroagáo, 
mas que poderia ter o efeito de deslocar o círculo ou 
mudá-lo de posiqáo, ou produzir movimento elíptico 
(Fig. 6C). Finalmente, havia um artificio chama­
do “ equante” (Fig. 7). Era éste um ponto, nao
Fig. 7. O equante era um artificio ptolomaico para explicar 
aparentes mudangas na velocidade de um planéta. Embora 
o movimento de P, de A para A', de B a B’ e de C a Cv 
náo seja uniforme relativamente ao centro do círculo, C, 
sé-lo-ia relativamente a um outro ponto, T, o equante, 
porque os ángulos a,(5,y sao iguais. O planéta percorre 
os arcos A A ’, BB ’, CC’, em intervalos de tempos iguais, 
porém, obviamente, com diferentes velocidades.
? /
no centro do círculo, ao redor do qual o movimento 
podia ser “ uniformizado” . Isto é, considere-se um 
ponto P, movendo-se num círculo com centro em C. 
O ponto P move-se de tal modo que uma reta de P 
ao enquante varre ángulos iguais em tempos iguais; 
isto é equivalente a dizer que P só parece se mover 
uniformemente ao longo do seu caminho circular 
para um observador que esteja localizado no equan­
te. Éstes artificios podiam ser usados em muitas 
combinares diferentes. O resultado era um siste­
ma de muita complexidade. Muito homem de saber 
nao podia crer que um sistema de quarenta ou mais 
“ rodas dentro de rodas” poderia talvez estar rodan­
do no céu, que o mundo fósse táo complicado. Con- 
ta-se que Afonso X, rei de Lelo e Castela, chamado 
Afonso o Sabio, que manteve um famoso grupo de 
astrónomos, náo podia acreditar que o sistema do 
universo fósse táo intrincado. Quando a principio 
lhe ensinaram o sistema ptolomaico, comentou éle, 
segundo a lenda “ Se o Senhor Todo Poderoso me 
tivesse consultado antes de comegar a criaqáo, eu 
teria recomendado alguma coisa mais simples.
Em parte alguma foram táo claramente expressas 
as dificuldades de entender o sistema de Ptolomeu, 
como aconteceu com o poeta John Milton no seu 
famoso poema “ O Paraíso Perdido” .
Milton tinha sido professor, tinha ensinado real­
mente o sistema de Ptolomeu, e conhecia portanto 
aquilo sobre o que escrevia. Nestes seus versos o 
anjo Rafael está respondendo ás perguntas de Adáo 
^sóbre a construqáo do universo e dizendo que Deus 
certamente deve achar graga ñas atividades dos ho­
mens :
38
. . . quando quiserem construir um modelo do 
céu
E estudar as estrélas, como irao tratar 
O grandioso sistema, como irao construir, 
demolir, maquinar
Para salvar as aparéncias, como irao cingir 
o universo,
Com tragados de círculos concéntricos e 
excéntricos,
Ciclo e Epiciclo, Órbita em Órbita.. .
< Antes de abordarmos as inovaqóes de Copérnico, 
faremos algumas observaqóes fináis sobre o velho 
sistema de Astronomía. Em primeiro lugar, é claro 
que parte da complexidade surge do fato de que as 
curvas que representam os movimentos aparentes 
dos planétas (Fig. 5) sao combinaqóes de círculos. 
Se se pudesse ter usado uma equaqáo para uma 
curva com cúspide, tal como a lemniscata, o trabalho 
teria sido grandemente simplificado. Deve-se con- 
tudo ter em mente que nos dias de Ptolomeu náo 
havia Geometría analítica nem se usavam equaqóes 
para representar curvas e que se tinha criado uma 
tradiqáo, sancionada tanto por Aristóteles como por 
Platáo, de que o movimento dos corpos celestes deve 
ser explicado em termos de um sistema natural de 
movimento, talvez pelo argumento de que um movi­
mento circular náo tinha,coméqo nem fim, e era 
portanto mais adequado para os imutáveis, incor- 
ruptíveis planétas, eternamente em movimento. Em 
todo caso, como veremos, a idéia de explicar o mo­
vimento planetário sómente por combinaqóes de 
círculos, continuou em Astronomía por longo tempo.
A parte o fato de que o sistema ptolomaico fun- 
cionou ou poderia ter funcionado, náo é desprezível 
a circunstáncia de que éle se ajustava perfeitamente 
também ao sistema da Física aristotélica. As es­
trélas, planétas, Sol e Lúa, moviam-se em círculos 
ou em combinaqóes de círculos, seu “ movimento na­
39
tural” , enquanto a Terra náo participava do movi­
mento, estando no seu “ lugar natural” , no centro do 
universo, e em repouso. No sistema ptolomaico náo 
havia assim necessidade de procurar um novo sistema 
de Física, diferente daquéle que se ajustava ao sis­
tema de esferas homocéntricas. Éstes dois siste­
mas sáo algumas vézes descritos como “ geostáti- 
cos” , porque em ambos a Terra está em repouso; 
a expressáo mais comum é “ geocéntricos” , porque 
em ambos os sistemas a Terra está no centro do 
universo.
© Q q © y ó
Sol Mercurio Venus Terra Lúa Marte
y fe | ^ B
Júpiter Saturno Urano Netuno Plutáo
F ig. 8. As origens dos mais velhos símbolos planetarios se 
perdem na antiguidade, mas as derivagóes comumente 
aceitas sao originárias das Mitologías latina e grega. O 
símbolo do Sol representava provávelmente um escudo com 
saliéncia central O símbolo de Mercurio representava o seu 
caduceu, seu bastáo, ou o seu barrete alado. O símbolo 
de Venus era o espelho, associado á deusa do Amor e da 
Beleza. Para o símbolo de Marte, deus da Guerra, foi 
tomada uma reprodugáo, ou da cabera de um guerreiro com 
o elmo e a pluma ondeante, ou um dardo e escudo. O 
símbolo de Júpiter também tem derivagóes alternadas, ou 
um grosseiro hieróglifo da águia, “ ave de Jove” , ou a 
primeira letra de Zeus, o nome grego de Júpiter. O símbolo 
de Saturno é uma antiga foice, emblema do deus do Tempo. 
O símbolo de Urano é a primeira letra de seu descobridor, 
Sir William Herschel (1738-1822), com o planéta suspenso 
da barra transversal. O tridente foi sempre carregado por 
Netuno, deus do Mar. O símbolo de Plutáo é obviamente 
um monograma. É interessante notar que os alquimistas 
usavam o símbolo de Mercúrio para o metal mercurio, e o 
símbolo de Venus para o cobre. Hoje, os geneticistas 
designam a fémea com o símbolo de Vénus e o macho com 
o símbolo de Marte.
40
Inovagdes de Copérnico
O sistema de Copérnico, de acórdti com a descri- 
qáo do próprio autor, tem muitas semelhanqas com 
o sistema de Ptolomeu. Copérnico admirava enor­
memente Ptolomeu; na organizado do seu livro, 
na ordenaqáo dos capítulos e na escolha da seqüén­
cia em que sao apresentados os vários tópicos éle 
seguiu o de Ptolomeu.
A transferéncia de um sistema geostático para um 
sistema .heljostático (Sol imóvel) envolvía certas ex­
planares novas (Fig. 8A ). Piara verificá-las, come-
Fig. 8 - a . Éste diagrama do sistema de Copérnico foi 
extraído de “ A Perfit Description of the Caelestial Orbes” 
de Thomas Digges, (1576), que dá uma trad u jo em inglés 
de uma parte do De Revolutionibus de Copérnico. Digges 
acrescentou ao sistemamais urna característica, tornando 
infinita a esfera das estrélas fixas.
41
cemos como o féz Corpérnico, por considerar a mais 
simples forma do universo heliostático.
O Sol está no centro, fixo e imóvel, e ao seu 
redor, movendo-se em círculo, nesta ordem: Mer­
curio, Vénus, a Terra com sua lúa, Marte, Júpiter, 
Saturno. Corpérnico explicou os movimentos diá- 
rios aparentes do Sol, Lúa, estrélas e planétas com 
fundamento no giro da Terra em torno do seu eixo, 
uma vez por dia. Outros fatos mais importantes 
derivavam, dizia éle, de um segundo movimento da 
Terra, que era uma revoluqáo orbital ao redor do 
Sol, exatamente como as órbitas dos outros planétas. 
Cada planéta tem um período diferente de revolu- 
qáo, sendo tanto maior o período quanto mais afas- 
tado o planéta está do Sol. Assim, o movimento 
retrógrado é fácilmente explicável. Consideremos 
Marte (Fig. 9 ), que se move mais lentamente que 
a Terra ao redor do Sol. Sete posiqóes da Terra 
e de Marte sáo mostradas, numa situaqáo em que 
a Terra está passando Marte, estando Marte em 
oposiqáo, isto é, quando uma linha do Sol a Marte 
passa através da Terra. Ver-se-á que uma linha 
tirada da Terra a Marte, em cada uma das suces- 
sivas posigóes mover-se-á primeiro para a frente, 
depois para trás, e de novo para a frente. Assimi, 
Copérnico náo só podia explicar “ naturalmente” de 
que maneira ocorre o movimento retrógrado, como 
tamibém mostrar porque esta retroaqáo é observada 
sámente quando Marte está em oposiqáo, o que é 
equivalente ao fato de que o planéta transpóe o 
meridiano, á meia-noite. Em oposiqáo, o planéta 
está no lado oposto ao da Terra em relaqáo ao Sol. 
É por isso que éle atingirá a posiqáo mais alta no 
céu á meia-noite, ou atravessará o meridiano á meia- 
■^noite. De maneira semelhante (Fig. 10) pode-se 
ver que, para um planéta inferior (Mercurio ou 
Vénus), a retroaqao só ocorreria numa conjunqáo
42
43
44
inferior, o que corresponde á travessia do meridiano 
pelo planéta ao meio-dia. (Quando Vénus ou Mer­
curio se encontra numa linha reta entre a Terra 
e o Sol, a posigáo se chama conjungáo. Ésses pla­
nétas estáo no centro de retroagóes em conjungáo 
inferior quando se encontram entre a Terra e o 
Sol. Atravessam entáo o meridiano juntamente 
com o Sol ao meio-dia). Éstes dois fatos fazem 
sentido perfeito num sistema heliocéntrico ou he- 
liostático, mas se a Terra fósse o centro do movi­
mento, como no sistema ptolomaico, por que de­
pendería a retroagáo dos planétas da sua orientagáo 
relativamente ao Sol?-
Atendo-nos ainda ao modelo simplificado de 
órbitas circulares, observemos, a seguir, que Co­
pérnico pode determinar a escala do sistema solar. 
Consideremos Vénus (Fig. 11). Vénus é visto 
sómente como estréla da tarde ou estréla da manhá, 
porque está um pouco adiante ou um pouco atrás 
do Sol, mas nunca 180 graus afastado do Sol, como 
pode estar um planéta superior. O sistema de Ptolo­
meu (Fig. 11 A ) levara isto em conta sómente pela 
hipótese arbitrária de que os centros dos epiciclos 
de Vénus e Mercurio estavam permanentemente 
fixados numa linha da Terra ao Sol; o que equi­
vale a dizer que as deferentes de Mercurio e Vé­
nus, exatamente como o Sol, moviam-se ao redor 
da Terra uma vez em cada ano. No sistema de 
Copérnico, tínhamos meramente que admitir que as 
órbitas de Vénus e Mercurio (Fig. 11B) estives- 
sem dentro da órbita da Terra.
No sistema de Copérnico, além disso, poderíamos 
computar a distáncia de Vénus ao Sol. Observagoes 
feitas noite após noite indicariam quando Vénus 
podia ser vista na sua mais afastada elongagáo 
(distáncia angular) do Sol. Quando ocorresse éste
45
© ©
F ig. 11
evento, a separaqáo angular podia ser determinada. 
Como se pode ver na Fig. 12, ocorre a elongaqáo 
máxima quando uma linha da Terra a Vénus é 
tangente á órbita de Vénus e, assim, perpendicular 
a uma linha do Sol a Vénus. Por simples trigono­
metría podemos escrever esta equaqáo e, de uma 
tábua de tangentes, calcular fácilmente o compri­
mento TS.
VS
---------- = seno a (1)
TS
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S /
/
órbita de 
^ Vénus
\
\
^'^v.orbita da 
T erra
Fig. 12. Calcular a distáncia de Vénus ao Sol, tornou-se 
possivel no sistema de Copérnico. Quando a distáncia 
angular (isto é, o ángulo a de Vénus a partir do Sol) 
atinge o máximo, a linfaa de visada da Terra a Vénus 
(T V ) é tangente á órbita de Vénus e, portanto, per­
pendicular ao raio VS. Calcular VS é um problema 
fácil de trigonometría elementar. Em qualquer outra 
orientado, digamos V ’, a distáncia anguláf náo é máxima.
A distáncia TS, ou o tamanho médio do raio da 
órbita da Terra, no sistema de Copérnico é conhe- 
cida como “ unidade astronómica” . Assim, a Equa- 
qáo (1 ) pode ser reescrita como
VS = (seno de a) X 1 U A (2)
Pelo uso déste método simples, Copérnico podia 
determinar as distancias planetárias (em unidades
astronómicas) com grande exatidáo, como podemos 
ver na tabela seguinte, que mostra os valores de 
Copérnico e os valores atualmente aceitos para as 
distancias dos planétas ao Sol.
C O M P A R A gA O DOS VALORES DE COPÉRNICO E 
M ODERNOS P A R A OS ELEM ENTOS DO 
SISTEM A SO LAR
Planfta
Período Si­
nódico (* ) 
Médio
Período
Sideral
Distáncia 
Média ao 
Sol (**)
C M C M C M
Mercurio .... 116d 116d 88d 87,9 Id 0,36 0,391
Venus .......... 584d 584d 225d 225,00d 0,72 0,721
Terra ____ 365 l/4d 365,26d 1,0 1,000
Marte .......... 780d 780d 687d 686,98d 1,5 1,52
Júpiter ___.. 399d 399d 12a 11,86a 5 5,2
Saturno . . . .. 378d 378d 30a 29,51a 9 9,5
Além disso, Copérnico pode determinar com igual 
exatidáo o tempo necessário a cada planéta para 
completar uma revolugáo de 360 graus ao redor do 
Sol, ou o seu período sideral. Como Copérnico 
conhecia os tamanhos relativos das órbitas planetá­
rias e os períodos siderais dos planétas, éle era ca­
paz de predizer com érro tolerável as posigóes 
futuras dos planétas. No sistema de Ptolomeu, as 
distancias dos planétas náo representavam papel 
algum, uma vez que náo havia meio de determiná- 
las por observagóes. Desde que os tamanhos reía-
(*) Períodos sinódicos sao os tempos entre conjuncoes dos 
mesmos corpos.
(**) Expresso em unidades astronómicas.
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tivos e períodos relativos de movimento sobré'a 
deferente e o epiciclo fóssem os mesmos, as obser­
vares ou aparéncias seriam idénticas, como pode­
mos ver na Fig. 13.
F ig. 13. No sistema de Ptolomeu, as previsoes das posigóes 
planetarias se assentavam na medida dosVLngulos, nao ñas 
distancias. Esta ilustragáo mostra que as observagoes seriam 
as mesmas independentemente da distáncia, se os períodos 
relativos de movimento fóssem os mesmos.
Que o sistema ptolomaico tratava principalmente 
com ángulos ao invés de distáncias, pode ser visto 
muito claramente no exemplo da Lúa. Era um dos 
principáis aspectos do sistema ptolomaico, que a 
posiqáo aparente da Lúa podia ser descrita com grau 
relativamente alto de exatidáo. Mas isto requería 
um artificio especial, e se a Lúa tivesse realmente
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seguido tal caminho, deveria sofrer uma enorme 
variaqáo no seu tamanho aparente, muito maior do 
que o observado.
Dissemos antes que o sistema de um só círculo 
para cada planéta, com um único círculo para a 
Lúa, e dois movimentos diferentes para a Terra, 
constituía uma versáo simplificada do sistema de 
Copérnico. O fato é que tal sistema náo está de 
acórdo com a observaqáo, a náo ser de um modo 
grosseiro. A fim de tornar seu sistema mais exato, 
Copérnico achou necessário introduzir um certo 
número de complexidades, muitas das quais recor- 
dam os artifcios do sistema ptolomaico. Por exem­
plo, era obvio para Copérnico (como o inverso 
tinha sido obvio para Hiparco) que a Terra náo 
se pode mover uniformemente segundo um círculo, 
tendo o Sol no centro.* Assim, Copérnico colocou 
o Sol, náo no centro da órbita da Terra, mas afasta- 
do, a certa distáncia. O centro do sistema solar e 
do universo, no sistema de Copérnico, nao era assim 
o Sol, e sim um “ sol medio” , ou o centro

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