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DO SUPLICIO A MITIGACAO DA PENA_A obra Vigiar e Punir_Foucault_sua relacao com a Sociologia

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DO SUPLÍCIO À MITIGAÇÃO DA PENA – A obra Vigiar e Punir, de Michel
Foucault, e sua relação com a Sociologia 
Solange Ivo Mendes*
 
Pretende-se neste artigo discorrer sobre a obra Vigiar e Punir, apresentando as
práticas do poder penal ao longo do tempo, cujas modalidades passam do
suplício físico individual à dominação legal e permanente da sociedade.
Evidenciar-se-á a mitigação da pena através do uso da disciplina como forma
de controle social. Procurar-se-á estabelecer relações entre a obra e as
perspectivas abordadas por Emile Durkheim, Karl Marx e Max Weber, com
vistas a estabelecer a legitimação do poder do Estado na sociedade. 
PALAVRAS-CHAVE: Disciplina. Controle Social. Estado.
O objetivo deste artigo é explorar a obra Vigiar e Punir de Michel
Foucault e, através da mesma, analisar as práticas de punição e vigilância
adotadas pelo poder estatal, dando ênfase à disciplina como instrumento de
controle social legítimo. 
Para embasamento, serão utilizadas as perspectivas dos sociólogos
Emile Durkheim, Karl Marx e Max Weber. 
Embora clássicos da Sociologia, os teóricos mencionados e seus
temas encontram parâmetro na atualidade servindo de base para analisar o
exercício do poder penal ao longo da História.
DO SUPLÍCIO À MITIGAÇÃO DAS PENAS
Em sua obra vigiar e Punir, Michel Foucault, mostra um movimento
histórico no sentido de eliminar penas cruéis em consonância aos princípios da
dignidade da pessoa humana, embora os fatos narrados demostrem que nem
sempre se pensou assim ou, ainda, que as mudanças tiveram cunho
meramente humanitário. 
Ao longo dos seus quatro capítulos a obra retrata o nascimento e a
evolução da prisão, ou, melhor dizendo, do poder penal e seus instrumentos de
punição, coerção e controle social.
A evolução do direito penal é apresentada por Foucault como uma
passagem - da punição do corpo para a punição da “alma” do condenado.
Sobre a obra, o próprio autor dirá que: 
Objetivo deste livro: uma história correlativa da alma moderna e de
um novo poder de julgar; uma genealogia do atual complexo
científico-judiciário onde o poder de punir se apoia, recebe suas
justificações e suas regras, estende seus efeitos e mascara sua
exorbitante singularidade (FOUCAULT, 2014, p. 26).
Percebemos que a primeira parte inicia de uma maneira macabra:
retrata com detalhes a punição do parricida Damiens, que sofre todo tipo de
suplício corporal até a morte. 
Além de sofrer os castigos mais cruéis e desumanos, o condenado
era exposto a execração pública; logo a pena física transcendia para a
sociedade que participava de maneira ativa do “espetáculo”.
Damiens fora condenado, a 2 de março de 1757, a pedir perdão
publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris, aonde devia
ser levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola,
carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; em seguida, na
dita carroça, na praça de Grève, e sobre um patíbulo que aí será
erguido, atenazado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das
pernas, sua mão direita segurando a faca com que cometeu o dito
parricídio, queimada com fogo de enxofre, e às partes em que será
atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente, piche em
fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo
será puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e
corpo consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas
lançadas ao vento. Finalmente foi esquartejado [relata a Gazette
d'Amsterdam]. Essa última operação foi muito longa, porque os
cavalos utilizados não estavam afeitos à tração; de modo que, em vez
de quatro, foi preciso colocar seis; e como isso não bastasse, foi
necessário, para desmembrar as coxas do infeliz, cortar-lhe os nervos
e retalhar-lhe as juntas. Afirma-se que, embora ele sempre tivesse
sido um grande praguejador, nenhuma blasfêmia lhe escapou dos
lábios; apenas as dores excessivas faziam-no dar gritos horríveis, e
muitas vezes repetia: “Meus Deus, tende piedade de mim; Jesus,
socorrei-me." (FOUCAULT, 2014, p. 9)
Esse espetáculo não era aleatório, mas uma forma do soberano
mostrar todo o seu poder e o que aconteceria àqueles que ousassem infringir
suas leis. Era uma maneira de impor terror e medo ao povo. 
As penas aplicadas aos considerados culpados, ou melhor, os
suplícios a estes, eram os mais diversos: trabalhos forçados, torturas físicas,
prisões em masmorras, derramamento de chumbo ou piche sobre os corpos,
dentre outros. A morte era certa e podia advir da aplicação de um ou de vários
tipos de suplícios, além de enforcamento, desmembramento, queimaduras.
As cenas eram estarrecedoras e, muitas vezes, o castigo não
correspondia ao crime praticado, uma vez que não existia um julgamento real
dos fatos nem havia qualquer preocupação em fazer justiça. Apenas se punia
qualquer crime com o suplício e consequentemente a morte.
Ainda no primeiro capítulo, o autor mostra a evolução do
pensamento e do exercício do poder e, consequentemente, do poder sobre as
massas, ainda que se utilizando da “humanização” em suas práticas. Deixa-se
de lado a tortura física e busca-se nova maneira de punir.
De acordo com Michel Foucault (2014) é o momento em que
desaparecem os suplícios e o espetáculo é eliminado; deixa de existir o
domínio sobre o corpo do indivíduo e passa a existir o domínio sobre o corpo
da sociedade. Estabelece-se o controle social.
Um novo pensamento se estabelecia ficando intolerável para
juristas, pensadores, filósofos e legisladores a prática irracional do suplício
como forma de punir os criminosos.
O protesto contra os suplícios é encontrado em toda parte na
segunda metade do século XVIII: entre filósofos e teóricos do direito;
entre juristas, magistrados, parlamentares; nos chaiers de doléances
e entre legisladores das assembleias. É preciso punir de outro modo:
eliminar essa confrontação física entre soberano e condenado; esse
conflito frontal entre a vingança do príncipe e a cólera contida do
povo, por intermédio do supliciado e do carrasco. O suplício se tornou
rapidamente intolerável. (FOUCAULT, 2014, p. 73) 
Cessare Beccaria (2012, p.86) assim expressou o pensamento da
época: 
A pena capital é perniciosa à sociedade, pelos exemplos de
barbarismo que ela proporciona. Se as paixões ou a necessidade da
guerra, ensinaram os homens a derramar o sangue de seu
semelhante, as leis, que são feitas para moderar a ferocidade
humana, não deveriam ser barbáries que servem de trágico e funesto
exemplo, apresentando a morte com pompa e circunstância. Não é
um absurdo que as leis que refutam e punem os homicídios devam,
para prevenir os assassinatos, elas próprias, matar? Quais são as leis
mais verdadeiras e mais úteis? (BECCARIA, 2012, p. 86)
Outro ponto interessante, é que o povo começou a não mais se
intimidar com as execuções, mas antes a se revoltar contra o carrasco e,
muitas vezes, simpatizar e se identificar com o supliciado. Segundo Beccaria
(2012):
Quais são os sentimentos naturais das pessoas em relação à pena de
morte? Nós o vemos nos atos de indignação e de desprezo com os
quais todos olham o carrasco que, no entanto, é um inocente
executor da vontade pública, um bom cidadão que contribui para o
bem público, um instrumento tão necessário à segurança pública
externa. Qual é então a origem dessa contradição? (BECCARIA,
2012, p. 86)
Já Michel Foucault (2014, p. 63) ressalta que 
Quantas vezes, para manter a calma em volta dos cadafalsos, foi
necessário tomar providências “penosas para o povo” e precauções “
humilhantes para a autoridade”? Via-se bem que o grande espetáculo
das penas corria o risco de retornar através dos mesmos a quem se
dirigia. O pavor dos suplícios na realidade acendiafocos de
ilegalismo: nos dias de execução, o trabalho era interrompido, as
tabernas ficavam cheias, lançavam-se injúrias ou pedras ao carrasco,
aos policiais e aos soldados; procurava-se apossar do condenado
para salvá-lo ou para melhor matá-lo; brigava-se, e os ladrões não
tinham ocasião melhor que o aperto e a curiosidade em torno do
cadafalso.” (FOUCAULT, 2014, p. 63)
 Dessa forma, percebe-se que aos poucos a sociedade se
reconhecia no punido, se via como vítima de uma violência legalizada praticada
pelos detentores do poder à época. 
Além disso, vivia-se um novo momento em que era necessário impor
limites à ilegalidade praticada de uma forma ou de outra nas várias camadas
sociais.
Sob a bandeira do respeito à “humanidade” do criminoso, escondia-
se o verdadeiro cerne da mudança: a necessidade de uma política repressora
em relação às ilegalidades que eram cometidas cotidianamente pela
sociedade, principalmente, a recusa em pagar impostos, o contrabando, a não
adesão aos regulamentos das fábricas. (FOUCAULT, 2014, p. 83).
O afrouxamento da severidade penal no decorrer dos últimosséculos
é um fenômeno bem conhecido dos historiadores do direito.
Entretanto, foi visto, durante muito tempo, de forma geral, como se
fosse um fenômeno quantitativo: menos sofrimento, mais suavidade,
mais respeito e “humanidade”. Na verdade, tais modificações se
fazem concomitantes ao deslocamento do objeto da ação punitiva.
Redução de intensidade? Talvez. Mudança de objetivo, certamente.
(FOUCAULT, 2014, p. 21)
Ou seja, a reforma estava baseada verdadeiramente na proteção à
economia e à necessidade de uma nova tecnologia do poder de punir e para
que tal ocorresse sem percalços era imperativo que ocorresse a adesão da
sociedade através de um pacto - teoria geral do contrato social, onde a
sociedade, vista como um organismo social, demanda a existência de ordem,
de regras; a consciência coletiva, isto é, comum a toda a sociedade, exige o
resgate da moral cindida. 
Dessa forma, 
Supõe-se que o cidadão tenha aceito de uma vez por todas, com as
leis da sociedade, também aquela que poderá puní-lo. O criminoso
aparece então como um ser juridicamente paradoxal. Ele rompeu o
pacto, é portanto inimigo da sociedade inteira, mas participa da
punição que se exerce sobre ele. O menor crime ataca toda a
sociedade; e toda a sociedade – inclusive o criminoso – está presente
na menor punição. (FOUCAULT, 2014, p. 88)
 
Segundo Michel Foucault (2014), a punição deverá corresponder
aos seus efeitos, isto é, a pena deve ser tão relevante quanto o crime praticado
e suas consequências e, além disso, seus efeitos deverão incutir no espírito
dos indivíduos o temor pela sua aplicação: “Encontrar para um crime o castigo
que convém é encontrar a desvantagem cuja ideia seja tal que torne
definitivamente sem atração a ideia de um delito”. (FOUCAULT, 2014, p. 102)
É portanto necessário controlar e codificar todas essas práticas
ilícitas. É preciso que as infrações sejam bem-definidas e punidas
com segurança, que nessa massa de irregularidades toleradas e
sancionadas de maneira descontínua com ostentação sem igual seja
determinado o que é infração intolerável, e que lhe seja infligido um
castigo de que ela não poderá escapar. (FOUCAULT, 2014, p. 86) 
Para Beccaria (2012), há penas piores que os suplícios e morte, por
exemplo, a escravidão ou prisão perpétua, uma vez que são punições que não
têm fim. 
A mudança do poder penal ocorre tendo como fator de legitimidade
a aceitação pela sociedade carente de normas de segurança. 
Segundo Foucault (2014, p. 89), “O direito de punir se deslocou da
vingança do soberano à defesa da sociedade.” 
O suplício dá lugar à vigilância e ao controle permanentes. Aquele
que infringe as normas “impostas” pela sociedade não é aceitável socialmente
e deve ser banido de sua convivência. 
Cria-se o padrão do panóptico, isto é, poucos vigiando muitos em
instituições que se apossariam do indivíduo infrator adaptando-o às
necessidades do sistema de produção. 
Dessa maneira, utilizou-se modelos de instituições como a fábrica, o
hospital, a escola, onde a disciplina e o controle eram cobrados diligentemente
de seus “membros”. Tais instituições utilizavam-se do poder disciplinar como
forma de conformar os indivíduos às regras da sociedade, de tal forma, que
essas regras fossem internalizadas e transformadas em hábitos.
A disciplina era extrema com obrigações e proibições
regulamentando todas as atividades dos detentos:
Art. 17 – O dia dos detentos começará às seis horas da manhã no
inverno, às cinco horas no verão. O trabalho há de durar nove horas
por dia em qualquer estação. Duas horas por dia serão consagradas
ao ensino. O trabalho e o dia terminarão às nove horas no inverno, às
oito horas no verão. (FOUCAULT, 2014, p. 11)
Logo, o detento tinha todo o seu tempo planejado com atividades
que poderiam levá-lo a ter um bom comportamento e, consequentemente, à
progressão e, até mesmo, ao perdão total da pena.
VISÃO SOCIOLÓGICA
Ao analisar a obra de Michel Foucault, percebe-se claramente o
papel coercitivo do controle social, vislumbrado por Emile Durkheim ao estudar
os problemas ligados à manutenção da ordem social e o papel da consciência
coletiva. 
De acordo com o pensamento de Durkheim, a anomia se instala a
partir do momento em que práticas consideradas aceitáveis pela sociedade
passam a ser consideradas ilegais e condenadas pelas normas vigentes, de tal
forma que ocorre uma desarmonia social, uma quebra de leis e normas
reconhecidas pela sociedade através de um contrato social (BARATTA, 2001).
No entanto, ao tratar de controle social, Durkheim evidencia o papel
do crime e da pena, ou seja, aos instrumentos utilizados pelo seio
social quando há a desobediência às normas e se gera ameaça à
ordem social. Curiosamente, o desvio não é visto como algo
totalmente patológico, mas em condições quantitativa e
qualitativamente suportáveis, ele serve, através da imposição de sua
pena, para reativar a consciência coletiva e até para incorporar nova
moral coletiva. (BARATTA, 2001) 
Logo, a pena é uma reação coletiva que objetiva o reforço da
solidariedade social e não apenas está voltada para o controle do criminoso,
mas busca a integração social. Dessa forma, a pena transforma-se em uma
sanção legal, prescrita em lei e aceita pela sociedade como forma de punir uma
infração explicitamente. 
Entretanto, o controle social também pode assumir um caráter
negativo, a partir do momento em que é visto como um instrumento das
práticas de dominação promovidas pelo Estado e pelas classes dominantes. 
Nessa perspectiva, podemos dizer que a legitimidade das leis pela
sociedade decorre de uma dominação, isto é, de uma desigualdade entre as
classes sociais, onde impera a vontade da classe dominante sobre a classe
explorada. 
O Estado, isto é, o Estado da classe dominante, mascara a
realidade, são suas ideias que predominam e que fazem com que os indivíduos
da classe explorada assuma essa ideologia. (MARX, ENGELS, 2002, p. 32). 
Embora o direito e a justiça não sejam iguais para todos, a ideologia
dominante do Estado cria uma ilusão de hegemonia social, em que todos estão
submetidos à ordem jurídica, às mesmas leis e punições.
Para Marx, mesmo quando o Estado consegue se desvencilhar de
certos aspectos da ideologia dominante, essa desvinculação não é
senão ilusória. Assim, o Estado elimina, à sua maneira, as distinções
estabelecidas por nascimento, posição social, educação e profissão,
ao decretar que o nascimento, a posição social, a educação e a
profissão são distinções não políticas; ao proclamar, sem olhar tais
distinções, que todo membro do povo é igual parceiro na soberania
popular e ao tratar do ponto de vista do Estado todosos elementos
que compõem a vida real da nação. (COSTA, FREITAS, 2013)
A ideologia veiculada pelo Estado leva a acreditar que as leis
protegem todas as pessoas, assim como punem toda e qualquer pessoa que
contraria a leis da sociedade. Logo, as leis seriam generalistas, aplicadas a
todos de maneira igualitária. 
Entretanto, analisando o sistema de controle penal apresentado na
obra Vigiar e Punir, verifica-se que, mesmo durante a aplicação do suplício e
até as novas formas de punição dos infratores, a justiça penal é realizada de
acordo com a classe social, o gênero, a cor, dentre outras características.
Evidenciando, dessa forma, uma tendência a controlar e punir de
maneira mais intensa os grupos socialmente desfavorecidos, ou, como diria
Marx, a classe dominada.
A história do sistema punitivo - escreve Rusche - é mais que a história
de um suposto desenvolvimento autônomo de algumas "instituições
jurídicas". É a história das relações das "duas nações", como a
chamava Disraeli, das quais são compostos os povos: os ricos e os
pobres. (BARATTA, 2001)
A imagem do direito penal e seus instrumentos de controle
apresentada pelo Estado e seus órgãos oficiais, através da ideologia
dominante, tem como fim a função de autolegitimar o sistema punitivo ou,
como, Max Weber denominava, “a pretensão de legitimidade” – a visão do
direito como a afirmação de uma vontade de um grupo sobre uma coletividade,
que aceita a dominação legal, cumprindo as normas sem contestá-las.
Costuma-se dizer que as normas mais eficazes são aquelas
cumpridas de forma espontânea, sinal de que guardam vínculo real
com a sociedade que as instituiu, sendo fruto, portanto, da
necessidade social. Outras normas têm sua eficácia condicionado ao
exercício da coação estatal; outras nem assim são cumpridas pela
sociedade, seja porque efetivamente não correspondem aos anseios
populares em sua totalidade ou a parcela significativa da sociedade,
seja porque constituem, de fato, simples instrumento simbólico ou
programático do dever-ser social. (LEMOS FILHO, 2004, p. 145) 
Portanto, a dominação burocrática, legal, vem legitimar um discurso
de obediência a uma hierarquia, onde não se pode contestar o status quo
estabelecido, isto é, não existe um lugar de resistência e contestação, visto que
a legalidade é validada pela fé na validade do estatuto legal – acredita-se e
cumpre-se as regras em prol da ordem social:
Qualquer sociedade necessita de certas condições mínimas de ordem
social para que possa progredir. Esta ordem social deve ser
compreendida como a possibilidade de que as condutas de seus
membros serão, minimamente, previstas pelos outros; e haverá um
compartilhamento de valores comuns que darão legitimidade às
normas que regulamentarão a convivência. Esta situação somente
será possível onde prevaleça o príncípio da segurança jurídica,
tornando-se a lei o impedimento de qualquer arbitrariedade contra o
cidadão, quer tenha origem na espera pública ou privada. (DIAS,
2009, p. 189)
CONCLUSÃO
Michel Foucault em Vigiar e Punir traz um estudo sobre o exercício
do poder penal desde a época medieval até a modernidade. Dessa forma, traça
todo um panorama dos instrumentos utilizados para castigar os criminosos
(suplícios) ou até mesmo para ressocializá-los (a ferrenha disciplina das
prisões).
O surgimento da prisão poderia ser visto simploriamente como a
vitória da “humanidade”, face ao extermínio das práticas dos suplícios
aplicadas aos infratores, entretanto, a obra de Foucault nos apresenta a
realidade dos fatos: as leis e as prisões são criadas e colocadas como novos
elementos de controle da sociedade. No âmbito das prisões está o controle
ferrenho da sociedade através da rígida disciplina, legitimada pelo contrato
social firmado por toda a sociedade.
Do ponto vista histórico, é importante conhecer e compreender os
cenários que deram origem às prisões, que se transformaram em sinônimo de
locais propícios ao “tratamento” e recuperação de criminosos através da
disciplina, da vigilância constante e da correção, uma vez que somente através
do conhecimento pode-se ter uma visão crítica de nossas instituições e práticas
jurídicas.

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