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Primeiro Exercício de Filosofia Moral e Ética

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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA DE ECONOMIA DE SÃO PAULO
FEDERICO ENRIQUE SANTOS GARCIA
FELIPE MORETI BOLINI
EXERCÍCIO 1 –FILOSOFIA MORAL E ÉTICA
São Paulo
2019
FEDERICO ENRIQUE SANTOS GARCIA
FELIPE MORETI BOLINI
  
 
 
 
 
 
Trabalho apresentado no curso  
Filosofia Moral e Ética, na Escola de  
Economia de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas. 
  
Orientador: Prof. Dr. Marcos Paulo Lucca Silveira 
  
  
 
 
 
 
 
 
 
 
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA DE ECONOMIA DE SÃO PAULO
São Paulo
2019
SUMÁRIO
  
  
1. Introdução ....................................................................................................................4 
2. Das Medidas Governamentais ......................................................................................5 
3. Das Políticas para a Sociedade ...................................................................................10 
3.1. Moral das Políticas contra o COVID-19....................................................... .6 
3.2. Justiça e Legitimidade das Políticas contra o COVID-19..............................7 
4. Conclusão .....................................................................................................................4 
5. Referências Bibliográficas............................................................................................4 
  
  
  
 
1. Introdução 
O vírus que está afetando o mundo como um todo, direta ou indiretamente, pertencente à família dos Coronavírus (CID 10). Dentro dessa família de vírus, o responsável pela pandemia é o COVID-19. Tal agente aparentemente foi descoberto ao final do ano de 2019 em um mercado de frutos do mar em Wuhan, a capital da maior cidade da província de Hubei, na China, que conta com uma população de aproximadamente 11 milhões de pessoas. Essa família de vírus, cujo primeiros casos são datados em 1937 – de acordo com o Ministério da Saúde - é caracterizada principalmente por infecções respiratórias, semelhantes a um resfriado. A doença tem causado imenso impacto no mundo pelas incertezas e pelos malefícios causados principalmente aos mais vulneráveis, não havendo ainda comprovações científicas da eficácia de remédios e vacinas contra o vírus.
Entretanto, o impacto do COVID-19 não é apenas na saúde. Em meio ao panorama atual, são evidentes os impactos negativos políticos, sociais e econômicos, podendo ser considerada assim como uma crise global. O primeiro e o segundo são melhores observados dentro de cada nação, devido às particularidades e os problemas que cada uma carrega consigo, como diferentes níveis de sistemas políticos e de desigualdade social. O terceiro é visível diretamente tanto interna quanto externamente aos países, principalmente por conta da forte  interdependência entre os Estados.
Temos, então, em Wuhan, na China – uma das maiores economias do mundo – o primeiro grande epicentro do vírus. O país adotou medidas como o bloqueio das cidades ainda em janeiro, restringindo a mobilidade no país, e a quarentena em fevereiro, pela falta de sinais de queda no número de casos. Temos, assim, um cenário, social de pânico e incertezas; e um cenário econômico de redução drástica de produção e consumo. Passou a ser questão de tempo para os países se defrontarem com as mesmas condições internamente, além dos impactos econômicos globais.
Ainda com o trânsito de pessoas liberado, os Estados Unidos e países da Ásia e da Europa passaram a ser os grandes afetados pela Crise. A Itália se tornou o segundo epicentro, tendo o maior número de mortes, e os Estados Unidos caminha para ser o terceiro epicentro, haja vista que possui o maior número de casos. No início de março, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a situação como pandemia, haja vista que a doença já havia se espalhado por todo o mundo, com mais de 118 mil casos e mais de  4 mil mortes.
No Brasil, o primeiro caso do COVID-19 foi registrado em fins de fevereiro, enquanto a primeira morte confirmada foi datada em meados de março, segundo o ministério da Saúde. O país está sob regime de quarentena desde então, sendo que mais de 35 mil pessoas infectadas foram confirmadas e já ocorreram mais de duas mil mortes.
A crise no Brasil aparenta ter uma dimensão ainda maior do que outros países por conta do cenário interno. Questões políticas e sociais agravaram ainda mais o momento delicado que vivenciamos. Além de fatores como desigualdade de gênero, de raça, social e etária, temos um cenário político conturbado. Ademais, nos deparamos com o cenário de precária condição do Sistema Único de Saúde – não raro menosprezado pela sociedade -, a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) e de testes, subnotificação dos casos e o pânico instalado na sociedade, visível pela “corrida às compras”, esvaziando prateleiras e impulsionando os preços pela alta demanda não só de alimentos.
Embora já foram adotadas medidas tanto políticas como econômicas pelos órgãos públicos e por algumas instituições privadas - como as paralisações e estímulos monetários e fiscais - o intuito deste white paper é discuti-las, avaliando quais os papéis das diferentes instituições no momento atual e as responsabilidades sociais e morais desses em relação à população, sobretudo em relação aos mais vulneráveis (idosos, pobres e pessoas com co-morbidade)  
 
2. Das Medidas Governamentais 
  
O primeiro caso confirmado do novo coronavírus ocorreu em novembro, na China. Desde então, a doença se alastrou por toda a Europa, América e África. Hodiernamente a pandemia do covid-19 já causou mais de 160 mil mortes, sendo que mais de dois milhões de pessoas já foram infectadas.  
Em fins de fevereiro, o vírus chegou ao Brasil e, desde então, o país passou por diversas situações inusitadas, como isolamento social, construção de hospitais de campanha e falta de produtos essenciais à vida, como remédios e alimentos. Diante desse contexto, o país está passando por crises políticas, havendo embates entre a organização da saúde e a econômica. Com tudo isso, diversas questões emergem: quem está certo, a organização da saúde que visa garantir a saúde plena de todos, decretando quarentena total, ou a equipe econômica que visa salvar a economia e luta por uma quarentena parcial e fraca?; Está certo o governo desprender grandes gastos emergenciais para auxiliar aqueles socioeconomicamente desfavorecidos e para construir hospitais de campanha?; Deve o governo subsidiar os mercados de alimentos e EPI’s?;  Numa situação de lotação total dos hospitais, devemos favorecer idosos ou jovens? Populações vulneráveis ou o aqueles com boas condições sociais?   
Como bem retrata dos artigos “Planning for an Influenza Pandemic: Social Justice and Disadvantaged Groups” e “Revisiting Public Health Preparedness: Incorporating Social Justice Principles Into Pandemic Preparedness Planning for Influenza”, a preparação para uma pandemia é essencial. Esses artigos se restringem bastante ao vírus da Influenza, haja vista que era o vírus mais provável de causa uma pandemia. Dessa forma, como obviamente não era possível prever uma pandemia do Covid-19, haja vista que esse vírus sequer existia, não há nenhum plano de ação para essa doença específica, contudo, é possível utilizar diversas medidas previstas para doenças com características similares, como a própria Influenza.  Os dois artigos citados acima mostram que é essencial existir um plano de ação para uma pandemia que inclua medidas que garantam o acesso das populações vulneráveis aos insumos necessários para conter a doença (como remédios, vacinas, auxílios que permitam essas populações a realizarem isolamento social, e etc), haja vista que, uma vez que essas populações vulneráveis não realizam as atividades necessárias, elas afetam a população como um todo. 
Esses dois estudos mostram que a maioria dos países não demonstra a importância devida em incluir populações socioeconômicas desfavorecidas nas medidas de preparação para uma pandemia. E isso se mostra verdade na realidade brasileira.Apesar de o país possuir um plano de ação para uma pandemia de influenza, que, por sinal, não é atualizado desde 2010, não apresenta nenhuma medida de inclusão dessas populações na formulação desse plano ou, sequer, nos planos de ação. Obviamente o plano demonstra que é necessário verificar as populações vulneráveis, mas não propõe métodos para isso ou, sequer, indica quais seriam possíveis populações. Esse fato é deveras importante, haja vista que o Brasil apresenta índices de desigualdade socioeconômica altíssimos, com mais de 25% da população em estágio de pobreza, grandes diferenças étnicas e uma população crescente de idosos, que atualmente representa 13% da população. Assim, num contexto de pandemia, pobres, negros e idosos seriam os principais afetados, os dois primeiros por, em sua maioria, não possuírem acesso a um sistema de saúde adequado e, o último, por não possuir uma saúde individual forte. E, em diversos casos, esses três fatores se combinam em um único indivíduo. 
Tendo em vista todos esses fatores e o fato de o Brasil já estar em um contexto de pandemia, hemos de propor medidas governamentais que julgamos necessárias e úteis para o contexto de pandemia brasileira.  
No momento em que a pandemia se instala no Brasil, é fundamental que o governo tome a responsabilidade para si de garantir que a população como um todo terá acesso ao sistema de saúde, criado programas emergenciais de subsídio aos hospitais, construção e hospitais de campanha e aumentar o percentual do PIB que se destina ao Sistema Único de Saúde, que, apesar de ser muito criticado, possui um estrutura descentralizada que, num momento como este, se receber investimentos para compra de equipamentos e insumos, garantirá que grande parte da população terá o auxílio necessário. Essa realidade não existe em países como Itália e Estados Unidos, que, apesar de serem considerados países mais ricos, precisariam construir hospitais, e não só comprar equipamentos e insumos. Para além disso, da mesma forma como muitos White Papers destinados a pandemias de influenza sugerem, é fundamental que o governo decrete isolamento social. Apesar de essa medida ser determinada pensando na Influenza, ela se mostra muito efetiva para o coronavírus, haja vista que esse novo vírus se mostra ainda mais contagioso do que a Influenza. 
Uma vez que medidas fundamentais para a saúde foram  tomadas, é fundamental que o governo passe olhar para a subsistência daqueles que não pegarão a doença e daqueles que, mesmo em isolamento social, terão que continuar a trabalhar por estarem em setores fundamentais. Assim, a federação deve garantir que não falte insumos alimentícios e EPI’s e que, além disso, não haja exploração sobre esses produtos. Isso deve ser feito através da limitação de quantidade que cada indivíduo pode adquirir dos alimentos básicos e de auxílio emergencial a aqueles que ficarão sem renda durante a situação de isolamento. Os EPI’s devem receber  subsídio governamental e auxílio da população para serem produzidos, haja vista que a demanda aumentará de forma estridente e que eles serão fundamentais para a manutenção da saúde, sobretudo, dos profissionais da saúde. Quanto a exploração sobre esses produtos, a melhor intervenção a ser feita é garantir, através de fiscalização feita por funcionários públicos e a própria população, que os produtos fundamentais já citados mantenham seus preços próximos da média obtida antes da instalação da situação de pandemia.  
Nós autores fazemos uma ressalva aqui. Até agora olhamos para o aspecto da saúde e da população como um todo, mas não podemos perder de vista o olhar econômico. Todas essas medidas supracitadas devem ser tomadas maximizando o benefício entre o ganho social e a perda econômica, ou seja, devemos adotá-las de tal forma que o ganho social seja maior do que a perda econômica, uma vez que, para que o governo possa desprender tamanhos gastos será necessário aumentar o endividamento  da federação, o que historicamente, segundo o Ipea, ocasiona decrescimento econômico do país. Ou seja, dependendo do tempo pelo qual tais medidas se estenderem, o endividamento nacional pode chegar a tal tamanho que a crise econômica a qual o país irá entrar acarretará em perdas e desastres muito maiores do que as perdas que teriam sido ocasionadas pela antecipação do fim das medidas. Devemos encontrar o ponto em que o custo marginal de endividar o país se iguala ao benefício marginal de manter as medidas citadas acima. 
Até o momento tratamos da população como um todo, contudo, como bem trata o artigo “Revisiting Public Health Preparedness: Incorporating Social Justice Principles Into Pandemic Preparedness Planning for Influenza”, é necessário incluirmos, também, Justiça Social nesse pensamento. O artigo retrata que as minorias deveriam ser incluídas no planejamento para a pandemia, ou seja, que elas deveriam auxiliar na formulação do planejamento. Contudo, como neste caso não há um planejamento, é fundamental que essas minorias tenham acessos a todas as  medidas tomadas pela federação, haja vista que, se essa população não for protegida, ela afetará as outras populações. 
O Brasil é o sétimo país mais desigual do mundo, nesse sentido, nossas minorias são altamente relevantes. As populações  mais vulneráveis socioeconomicamente do nosso país são os pobres e os negros. Do aspecto de saúde individual, os mais vulneráveis são os idosos. Assim, é fundamental que pobres, negros e idosos tenham a garantia de acesso aos programas de saúde, alimentos e EPI’s.  
A melhor maneira de se incluir minorias nessas medidas é criar comitês compostos por elas  mesmas, ou seja, abrir espaço para que representantes de cada uma dessas populações vulneráveis tenham espaço para demonstrar suas demandas, haja vista que ninguém melhor do que eles mesmo para saber suas necessidades e preferências. Para além das preferências esses comitês se mostram efetivos ao aumentarem a confiança dessas populações nas medidas governamentais. O fato das populações socioeconomicamente desfavorecidas terem pouco acesso a educação faz com que elas estejam muito mais sujeitas às “Fake News”, que, muitas vezes, insuflam a população contra as medidas sociais da federação. Assim, esses comitês também aumentariam a confiança no governo e proveriam informação de qualidade a essas populações. 
Obviamente é necessário que esses comitês sejam feitos de acordo com a localização cada população. Em cidades pequenas, por exemplo, talvez um comitê para todas essas populações seja efetivo. Contudo, em cidades grandes, como São Paulo e Rio de Janeiro, há diversidades muito maiores, fazendo-se necessário a existência de um maior número de comitês para cada região da cidade a para cada população de vulneráveis (pobres, negros e idosos).  
Para além desses comitês, se faz necessário a montagem de hospitais e investimento em hospitais próximos a áreas de pessoas desfavorecidas, ou seja, nas periferias e comunidades, de forma que essas pessoas tenham fácil acesso ao auxílio médico e que  não necessitem de grande locomoção, evitando que elas não se contagiem e que não contagiem outras pessoas.  
A conclusão que deixamos aqui é: num primeiro momento o governo deve intervir pensando apenas em garantir que a população como um todo seja salva. Num segundo momento, deve-se voltar a atenção principalmente para as populações vulneráveis. Isso deve ser feito de forma a garantir que, independente de sua condição socioeconômica ou faixa etária, você não deve ter prejuízos perante os auxílios governamentais.  
 
  3. Das políticas para a sociedade 
  
Como já exposto antes, o COVID–19 terá maiores impactos em relação a parte da sociedade mais vulnerável. Nessa parcela da população são incluídos principalmente os idosos, devido a sua – não raro – condições físicas mais debilitadas, e aqueles das classes sociais mais baixas, por conta das desigualdades sociais, raciais e de renda, colocando-os à margem da sociedade, sendo – por vezes – negligenciados. Por conta disso, é necessário certodirecionamento de políticas públicas e intervenção das instituições sociais voltadas a esse segmento da população. Temos como exemplo concreto o projeto de Lei que instituiu o auxílio emergencial de R$600,00 para trabalhadores informais, desempregados, microempreendedores individuais (MEIs) que integrem famílias de baixa renda, além de mães que sejam as únicas responsáveis pelo sustento das famílias que poderão receber até R$1.200,00, segundo o Ministério da Economia. 
Tanto esse como outros projetos de lei evidenciam a vulnerabilidade dessas pessoas e a preocupação do governo para com elas. Cabe a nós, então, discutir os seguintes pontos: (I) a respeito da moral dessas ações políticas, em termos do ato e da responsabilidade moral, e (II) se essas determinadas políticas são exercidas de forma legítima e justa. Comecemos primeiro com conceitos e problematização de determinados autores para posteriormente aplicá-los em cada um dos casos dos diferentes grupos dos mais vulneráveis. 
3.1 Moral das Políticas contra COVID-19 
Primeiramente, analisemos o que é moral. Como foi colocado por Adolfo Sanchez Vazquez em seu livro “Ética”, temos que a moral surge quando o homem sai de seu estado de natureza e passa a viver em sociedade. Como, no decorrer da história, os seres humanos se organizaram em diferentes maneiras de sociedades, é evidente que o progresso histórico traz consigo a mudança moral. Esta, entretanto, não é única em uma determinada sociedade em determinado momento. Essa moral histórica, então, nos trás o seguinte problema: o que seria um progresso moral? 
Dentre os pontos colocados pelo autor, destaca-se o progresso da elevação do caráter consciente e livre, ou seja, o progresso da liberdade. Com esse desenvolvimento, se faz necessário a ampliação das nossas responsabilidades. Assim, atingiremos o progresso moral.  
Por conseguinte, Vazquez define, assim, o que é moral: conjunto de normas aceitas livre e conscientemente que regulam o comportamento individual e social dos outros. Isso implica que não podemos julgar nem responsabilizar indivíduos pelo que não procuram livre e conscientemente. Assim, um ato moral é aquilo que pode ser passível de julgamento, havendo responsabilidade quando o ato for dotado de liberdade de escolha. 
Com base no que já foi exposto, poderíamos julgar o aspecto moral das políticas implementadas até aqui e as novas propostas anteriormente. Contudo, é imprescindível discutir o caráter social da moral e como a moral motiva as ações humanas e o que as sustentam. Para o autor Daniel Hausman, não há uma causa específica. Podemos ter como fatores o interesse próprio, normas do governo ou mesmo o altruísmo. Tendo em vista o panorama atual, foquemos no segundo caso, principalmente por se tratar da discussão das ações do Estado contra o COVID-19 
Dada essa conceituação e citação de importantes autores que estudam o tema, podemos analisar a situação na qual o Brasil se encontra. O progresso histórico nos leva a concluir que houve progresso moral, pela democracia em que vivemos, com caráter consciente e livre de cada cidadão. Temos, então, um progresso de liberdade, sendo necessário maior responsabilidade de todos. A liberdade é vista no ato de votar do cidadão, que em teoria é consciente, sendo este responsável pelo seu voto transferindo a responsabilidade para o político eleito. Assim, pode-se dizer que esses projetos de leis contêm moral. E, pelas mesmas premissas, são passíveis de julgamento e detém responsabilidade moral. 
Surge então o problema das relações entre política e moral. Para Norberto Bobbio, essa discussão se encontra na perspectiva deontológica, a do dever ser. O autor cita Maquiavel, que defende que para julgar a bondade ou maldade de uma ação política, é preciso ter em mente a finalidade. Surge assim um contraste entre moral e política, no qual Bobbio adota o ponto de vista dos princípios ou dos resultados. O que ressalta esse contraste é a inspiração do indivíduo na ética dos resultados, no lugar da ética dos princípios, em que a benignidade de uma ação política é julgada pelo êxito. 
Julguemos então o exemplo de duas políticas adotadas até aqui pelo governo. No caso dos idosos, pensemos na ampliação principalmente para idosos do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Esse auxílio cria uma rede de proteção para esse grupo mais vulnerável. Cabe ressaltar que o idoso não é responsável por ter determinada idade, no sentido de que não foi ele (a) quem decidiu estar nessa condição. É errado falar que esse grupo precisa desses benefícios pois o estágio de vida no qual se encontram é mais importante do que os outros. A prioridade para os que estão fora de jogo é uma preocupação moral relevante na distribuição de benefício, assim como defende Dennis McKerlie em seu artigo “Justice Between the Young and the Old”. Ou seja, temos sim que essas políticas públicas são moralmente necessárias, mesmo pensando no caso de Maquiavel, em que o fim de se ajudar os mais vulneráveis justificam os meios, já que estes se encontram em “estado de necessidade”. Podemos chegar a mesma conclusão para as classes mais pobres da sociedade. As classes sociais mais baixas também se encontram impossibilitada de exercer determinadas ações, passando a ser considerado também um grupo prioritário, exigindo leis que os beneficiem principalmente nesse cenário extraordinário. Concluindo, em ambas as situações são evidentes o caráter e a responsabilidade moral dos políticos para com esses grupos, priorizando e trazendo benefícios a eles, algo que se faz necessário devido ao seu estado ainda mais vulnerável frente o panorama atual. 
Discorrendo a respeito das propostas anteriormente abordadas nesse white paper, também podemos concluir que a intervenção do governo na saúde, nos mercados e no fornecimento dos Equipamentos de Proteção Individual é uma questão de responsabilidade moral dos políticos frente aos grupos mais vulneráveis. A contra argumentação de correntes econômicas pode surgir pelo fato de a intervenção do governo tornar os mercados menos eficientes. De fato, isso é verdade. Porém, em meio ao cenário extraordinário, essa intervenção do governo na saúde, nos mercados e na EPI’s, embora dependendo das medidas torna-se ineficiente, é uma questão de responsabilidade moral, pois novamente prioriza e beneficia os grupos mais vulneráveis. 
  
3.2 Justiça e Legitimidade das Políticas contra COVID-19 
 
O segundo fator a ser considerado é se essas ações sociais propostas podem ser classificadas como justas e legítimas. Novamente, abordamos inicialmente o conceito de justiça e legitimidade de alguns autores para, posteriormente, classificar as políticas contra o COVID-19, com foco naqueles mais vulneráveis. 
Levantaremos os conceitos de justiça social pelos artigos “Revisiting Public Health Preparedness: Incorporating Social Justice Principles into Pandemic Preparedness Planning for Influenza”, de Harvey Kayman e Angela Ablorh-Odjidja; e “Planning for an Influenza Pandemic: Social Justice and Disadvantaged Groups”, dos autores Lori Uscher-Pines, Patrick S. Duggan, Joshua P. Garoon, Ruth A. Karron e Ruth R. Faden. 
No caso do primeiro texto, justiça social é definida como o que cada pessoa na sociedade deve receber o que lhe é devido e que os encargos e benefícios devem ser justa e equitativamente distribuídos. Então, a justiça social preocupa-se com o impacto da estrutura social nas desigualdades sistemáticas e desvantagens no bem-estar, onde se enquadram os grupos dos mais vulneráveis que estão aqui sendo analisados. 
Assim como já abordado na questão de moral, um dos princípios da justiça social é a garantia de “necessidades humanas básicas”, independente das diferenças sociais. Trazendo essa abordagem de justiça social para a situação da pandemia atual, chega-se à conclusão de que envolver grupos desfavorecidos no planejamento de uma pandemia é do interesse de todos, uma vez que uma resposta eficaz a uma pandemia exigirá uma ampla cooperação de toda a sociedade. Dessa maneira, faz-se necessárioa criação de planos de preparação junto dos princípios de justiça social, a fim de proteger não só a saúde de todos os indivíduos de forma equitativa, mas também seus empregos e outras formas de proteção. Ou seja, as políticas públicas elaboradas pelo governo e as que foram propostas anteriormente nesse white paper com foco nos grupos mais vulneráveis é, além de uma questão de responsabilidade moral, uma questão de justiça social.  
Ademais, outra discussão também pertinente é a legitimidade dessas ações. Tomando novamente Bobbio em seu livro “O Filósofo e a Política”. O filósofo argumenta que um poder pode ser chamado de legítimo quando é exercido com justa razão. Temos, em nossa análise, o governo (agente) – que está autorizado por uma norma - sancionando medidas provisórias (poder) com justa razão (como supracitado, tais medidas são justas pois têm o caráter de responsabilidade social). Dessa forma, pode-se classificar tanto as medidas já elaboradas pelo governo como as que foram propostas neste white paper como legítimas.  
 
4. Conclusão
	
	A conclusão deste artigo é que, perante a presente pandemia de coronavirus, o governo deve intervir no sentido de auxiliar a sociedade como um todo, mas, sobretudo, as populações vulneráveis (idosos, pobres e negros), levando sempre em consideração os malefícios que essas intervenções trarão à economia. Para além disso, também julgamos essas intervenções quanto a moral e a justiça para os autores Daniel Hausman, Adolfo Sánchez Vázquez e Norbeto Bobbio, e a conclusão que chegamos é que todas são morais e justas.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5. Bibliografia:
 
Kayman, Harvey. Ablorh-Odjidja, Angela. Revisiting Public Health Preparedness:
Incorporating Social Justice Principles Into Pandemic Preparedness Planning for Influenza. J. Public Health Management Practice, 2006. Acesso em: 19/04/2020.
 
AUTHERS, John. How Coronavirus is shaking up the moral universe. The Economic Times, 2020. Acesso em 19/04/2020.
 
USCHER-PINES, Lori. DUGGAN, Patrick S.. GARRON, Joshua P.. KARRON, Ruth A.. FADEN, Ruth R.. Planning for an Influenza Pandemic: Social Justice and Disadvantaged Groups. The Hastings Center, 2007. Acesso em  19/04/2020.
 
MCKERLlE, Dennis. Justice Between the Young and the Old. Acesso em 19/04/2020.
 
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“Miséria extrema no país cresce e atinge 13,2 milhões de Brasileiros”. Correio Braziliense, 2019. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2019/08/14/interna-brasil,777032/miseria-extrema-no-pais-cresce-e-atinge-13-2-milhoes-de-brasileiros.shtml>. Acesso em 19/04/2020.
 
“Brasil é o 7º país mais desigual do mundo”. Uol, 2019. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2019/12/09/brasil-e-o-7-mais-desigual-do-mundo-melhor-apenas-do-que-africanos.htm>. Acesso em 19/04/2020.
 
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"Mapas mostram avanço do novo coronavírus no mundo e no Brasil", Estadão, 2020, disponível em <https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,mapas-mostram-avanco-do-novo-coronavirus-no-mundo-e-no-brasil,70003222694>, Acesso em 18/04/2020.
 
"50 dias do novo coronavírus: compare a situação do Brasil com China, Itália, EUA e outros países no mesmo período da epidemia", Globo, 2020, disponível em <https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/04/16/50-dias-do-novo-coronavirus-compare-a-situacao-do-brasil-com-china-italia-eua-e-outros-paises-no-mesmo-periodo-da-epidemia.ghtml>, Acesso em 18/04/2020
 
"Veja as medidas que cada estado está adotando para combater o Covid-19", Agencia Brasil, 2020, disponível em <https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-03/veja-medidas-que-cada-estado-esta-adotando-para-combater-covid-19>, Acesso e 18/04/2020
 
"Medidas adotadas pelo Governo Federal no combate ao coronavírus", Agencia Brasil, 2020, disponível em <https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-03/veja-medidas-que-cada-estado-esta-adotando-para-combater-covid-19>, Acesso e 18/04/2020
 
HAUSMAN, Daniel. "Economic Analysis, Moral Philosophy and Public Policy". Terceira edição
 
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. "Ética". Primeira edição. Civilização Brasileira
 
BOBBIO, Norberto. "O Filósofo e a Política". Primeira edição. Contraponto, 2007

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