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SolosColapsveis - Richard Candido APS 2

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SOLOS COLAPSÍVEIS: UM PROBLEMA PARA A ENGENHARIA DE FUNDAÇÕES
1. INTRODUÇÃO
O fenômeno da colapsibilidade é tradicionalmente explicado pela destruição parcial do agente cimentante do solo, tendo como causas primárias a molhagem e a existência de uma pressão- limite. Todo solo susceptível de colapso possui uma estrutura aberta ou porosa (Dudley, 1970; Vargas 1973), potencialmente instável e parcialmente saturado (Clemente & Finbarr, 1981), com baixa coesão e granulometria bem distribuída. Em principio, qualquer solo com índice de vazios superior a 1 (porosidade superior a 50%) é suspeito de ser colapsível; e os solos tropicais superficiais estão frequentemente enquadrados nesta condição.
O colapso estrutural do solo se caracteriza por ser muito rápido e capaz de provocar sérios danos em construções, especialmente as de pequeno porte em que as pressões de trabalho nas fundações variam entre 100 e 200 kPa. A situação de risco mais comum é aquela em que as fundações são acidentalmente inundadas – seja por vazamento da rede de esgotos, seja pela percolação de águas de chuvas em casas desprovidas de passeios laterais – levando o solo a um grau de saturação crítico (desde 60% até provavelmente
85%) e, em seguida, a uma drástica diminuição de volume.
Sabe-se, atualmente, da existência de pressões-limites, inferior e superior, abaixo e acima das quais a inundação do solo não produz recalques por colapso. Embora se tenha conhecimento de ocorrência de colapso em aterros de barragens, a compactação é, em principio, um procedimento eficaz na sua prevenção, posto que diminui o índice de vazios e elimina a causa de meta-estabilidade do solo, antecipando-se à destruição dos vínculos cimentícios dos grãos sólidos.
2. Características de solos colapsíveis
Entende-se por solo colapsível aquele de estrutura metaestável, com baixo grau de saturação e que, por efeito de molhagem e/ou de carregamento (sobrecarga ou peso próprio) é conduzido a um radical rearranjo de partículas, acarretando sensível redução de volume (TEIXEIRA, 1993).
Os pré-requisitos fundamentais para a instalação do colapso são:
1) Índice de vazios elevado
2) Umidade natural inferior à umidade de saturação
3) Resistência provisória produzida por:
a. Agentes cimentantes
b. Tensões capilares capazes de serem desenvolvidas para teores de umidade in situ inferiores ao limite de contração, gerando pressões neutras negativas (DUDLEY, 1970).
Tem sido generalizadamente empregada a expressão “colapso por saturação”, contradizendo conclusões já bem estabelecidas no histórico da descrição de solos colapsíveis, pois não só já foi constatado um percentual ótimo de saturação quanto também a influência das tensões capilares do solo – na prática de laboratório verifica-se que essas tensões são destruídas para um grau de saturação próximo de 100% no qual o círculo de Mohr se desloca para a esquerda e intercepta a envoltória de resistência do solo (MOORE, apud DUDLEY, 1970; HOLTZ & HILF, 1961).
Mais tarde, seguindo esta linha de raciocínio, foi verificado que o decréscimo das tensões de sucção existentes nos contatos pontuais entre as partículas durante a inundação origina escorregamento e distorções irrecuperáveis dos sólidos com a consequente redução de volume ou colapso (BURLAND, 1965).
Durante muito tempo prevaleceu a suposição de que somente os solos em estado natural são potencialmente colapsíveis. Esta linha de pensamento levou os projetistas de estruturas sobre solos e/ou com solos a imaginar que a compactação resolveria o problema de colapso do solo de fundação. Este equívoco consensual nasceu da crença de que o colapso era um fenômeno primordialmente sensível à mudança no comportamento “tensão x deformação” do solo e que só poderia ocorrer à custa da aplicação de determinada tensão inferior à tensão de ruptura típica deste solo (TEIXEIRA, 1993).
Sendo assim, a propensão ao colapso de uma massa de solo submetida a um determinado nível de pressões poderia ser destituída pela compactação. A desmistificação deste conceito começou desde os primeiros estudos sobre o comportamento de solos parcialmente saturados. Historicamente é possível constatar que esta evidência já era percebida ao final dos anos de 1940 quando foi notada a existência de colapso em aterros compactos (HOLTZ, 1948).
Avanços posteriores nos estudos de solos insaturados mostraram a existência de uma relação linear decrescente entre a porcentagem de colapso e a densidade seca de solos compactos no ramo seco da curva de compactação. Também foi demonstrado experimentalmente que a variação de volume durante o colapso de solos não saturados está relacionada com a variação da matriz de sucção enquanto se controlam as pressões do ar e da água (BARDEN et al. 1973; FOSS, 1973; ESCARIO & SAEZ, 1973).
Esses estudos, aos quais se deve acrescentar a importante contribuição de FREDLUND (1976; 1979) foram importantes para projeto de construções de pequeno porte que utilizam fundações rasas por sapatas ou blocos. Acreditava-se que as fundações por estacas em solos colapsíveis não eram suscetíveis a recalques em decorrência deste fenômeno. Uma das primeiras universidades a estudar exaustivamente este tema foi a USP – Campus de São Carlos, já no limiar dos anos 1980 (VILAR, 1979).
Vilar (1979) pesquisou exclusivamente solos a pequenas profundidades (máximo de
2,0m) e realizou grande quantidade (72) ensaios de adensamento em três áreas distintas. Uma delas viria a ser no futuro no campo experimental de fundações da USP – São Carlos. A ideia era verificar de modo direto o risco de danos estruturais de construções apoiadas em terrenos colapsíveis usando provas de carga, não mais somente os ensaios de adensamento. Embora os estudos anteriores que faziam previsão quantitativa de recalques (JENNINGS & KNIGHT, 1957; REGINATTO & FERRERO, 1973) fossem extensivamente adotados, havia uma tendência generalizada de contestar este procedimento como recurso único (JIMENEZ SALAS, 1987; HOUSTON et al., 1988).
A contribuição da USP – São Carlos foi notável neste sentido. Seu campo experimental de provas foi logo tomado como modelo por várias instituições. A produção é imensa, cabendo certo pioneirismo a ALBIERO, 1972; NOGUEIRA et al. (1985); CINTRA,
1987; e NEVES (1987).
A década de 1990 acumulou uma série de experimentos, sendo exemplos: MENEZES,
1990; CARVALHO, 1991; MANTILLA, 1993; SACILOTTO, 1993; e TEIXEIRA (1993).
3. reconhecimento de solos colapsíveis em campo
Quanto à gênese o solo ensaiado é residual, proveniente da decomposição dos gnaisses de Lavras. Seu caráter laterítico foi identificado em laboratório até a profundidade de
4m. Alguns indícios de seu potencial de colapsibilidade foram observados através de ensaios físicos onde foram observados os seguintes resultados:
1) Índice de vazios elevados (variando de 1,15 até 1,88)
2) Grau de saturação variando de 53% a 65%.
As amostras ensaiadas foram coletadas no mês de agosto quando o tempo está seco na região Sul de Minas. Por simples observação do perfil de solo e de análise táctil-visual das amostras se constatou que se trata de solo estruturado. Além disso, sob o ponto de vista textural se trata de um solo bem graduado, com presença marcante de finos e com a fração areia passando totalmente na peneira de 0, 104mm.
Nas amostras indeformadas, coletadas a cada metro de profundidade, foram feitos ensaios de adensamento até a pressão máxima de 800 kPa para definição da curva log(p) x índice de vazios. Em seguida, corpos de prova extraídosde blocos indeformados correspondendo a diferentes profundidades foram ensaiados até determinadas pressões, quando então eram inundados, observando- se ou não a existência de colapso.
Considere- se o coeficiente de colapso estrutural, i, definido por (VARGAS, 1973;
1977):
i = Δ e/(1+ei) (1) Onde:
e = variação do índice de vazios ocorrida durante o ensaio de carregamento correspondente à inundação
ei = índice de vazios antes da saturação.
Por este critério se considera que o solo é colapsível quando apresentar valores de i =
0,02. Para confirmar estes resultados no campo, foi feita uma prova de carga lenta, usando-se uma placa de fundação com diâmetro de 0,8m, assentada a 2 metros de profundidade. Inicialmente, foram aplicados 5 estágios de carregamento, de 20 kPa, totalizando 100 kPa. O recalque acumulado, registrado às 17 horas, foi de 14,5 mm.
No dia seguinte, o ensaio foi retomado, repondo- se o carregamento anterior de 100 kPa, tendo ocorrido um recalque adicional de 2,5 mm. Em seguida, foram colocados 380 litros de água na cava de fundação. Cerca de 10 minutos após, tendo o solo de fundação atingido o grau de saturação passível de colapso, começaram a ser registrados os recalques. No decurso de 43 minutos, foram registrados recalques finais de 61 mm, quando então cessaram. A leitura destes recalques foi considerada como uma média de quatro relógios comparadores, instalados em posições diametralmente opostas sobre hastes localizadas na placa de ensaio.
4. Avaliar as fundações em solos colapsíveis
Tabela 1 - Valores de “i” calculados em varias profundidades e pressões de adensamento
Prof. (m) Valores de “i” para pressões de inundação (kPa)
100 200 400 556 800
1.0 - 0,098 - - -
2,0 0,136 0,116 0,084 - -
3,0 - - - 0,051 -
4,0 - - - - -
5,0 - - - - -
A Tabela 1 mostra os resultados dos vários ensaios de laboratórios, onde se pode notar um grande potencial de colapso para as amostras coletadas a 2 m de profundidade, sob pressões de 100 kPa e 200 kPa. Deve ser também observado que nenhuma amostra apresentou colapso quando ensaiada á pressão de 800 kPa e que apenas a amostra corresponde á profundidade de 2 m apresenta colapso sob a pressão de 100 kPa . Estas informações são iniciativas de que as construções com sapatas assentadas a 1 m de profundidade, estando submetidas a pressões da ordem de 100 kPa, não estariam sujeitas a colapso.
Tabela 2 - Recalques (mm) observados antes e após a inundação, na pressão de 100 kPa
 (
Solo
)Estagio de
carregamento (kN) Duração (min)
Recalque final
(mm)
Natural 25 30 1,91
Idem 50 30 4,97
Idem 75 30 8,08
Idem 97 900 16,35
Idem 100 60 17,50
Inundado 100 15 24,97
Idem 100 30 44,25
Idem 100 45 61,02
Idem 100 60 67,46
Idem 100 240 68,01
Na tabela 2 são mostrados ao recalques finais de cada estagio, indicando- se o tempo de duração de cada um até entre uma leitura e a anterior. Deve ser destacado o fato de ser muito rápida a evolução dos recalques nos primeiros 45 minutos após a inundação; a
simples inundação do solo incrementou em cerca de 2,5 vezes o recalque observado em mais de 17 horas.
FIGURA 1 – Gráfico da variação dos carregamentos e dos recalques com os estágios
5. CONCLUSÕES
Os solos colapsíveis são problemáticos em Engenharia Civil por causa da drástica redução de volume que apresentam quando são inundados acidentalmente e submetidos a pressão de trabalho. Na faixa típica das pequenas construções, de 100 a 200 kPa, o solo apresentou, em laboratório, grandes variações de volume nas profundidades de 1 e
2 metro. Uma prova de carga feita com objetivo de comprovar no campo a susceptibilidade deste solo á inundação, demonstrou que na pressão de 100 kPa os recalques observados são de grande rapidez e magnitude. Alvenarias e elementos estruturais de concreto, sensíveis a estes efeitos, apresentam danos relevantes e de recuperação onerosa. Os projetos de fundações, em solos suspeitos de serem colapsíveis, devem adotar fatores de segurança mais elevados, alem de medidas preventivas quanto á possibilidade de vazamento de esgotos e infiltração de águas pluviais.
REFERÊNCIAS
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