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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA Sociologia Prof. Dr. Marko Monteiro Resenha do filme “O som ao Redor”. Aluna: Carolina Franchini Santiago RA: 159643 _______________________________________________________________ O filme “O som ao Redor” retrata um típico bairro de classe média da capital de Pernambuco, Recife. Contudo, é interessante notar que o cotidiano dos que moram no bairro mostra-se peculiar diante da criminalidade e de uma relação entre os indivíduos que residem nele que lembra uma espécie de engenho, como os que existiam aos moldes do período colonial. Esta relação “suserano e vassalo” torna-se clara durante o filme, à medida que os vigilantes, que gostariam de prestar um serviço para os moradores, para a realização de tal devem ter a aprovação de Francisco, uma espécie de “coronel” da região detentor de boa parte dos imóveis presentes no local. Desse modo, o papel do “coronel”, Francisco, é estabelecer a ordem e garantir certa “harmonia” entre os integrantes, contudo a partir deste momento torna-se difícil a questão da separação sobre o que é público e o que é privado. Um exemplo claro disso é o fato de que Francisco tem um neto que rouba pertences de carros e problemas com drogas. Assim que os seguranças chegam para oferecer os serviços de proteção, ele pede para que não se intrometam com seu neto (Dinho). Um problema que é de ordem pública (assaltos e tráfico de drogas) acaba sendo resolvido de uma maneira privada e em que são encobertos delitos, com isso pode-se observar o reflexo da violência no cotidiano das pessoas, em que existe ausência quase que completa do poder público que deveria fornecer segurança para a população como um todo, sem distinção de classe ou poder socioeconômico. A partir dessas observações nota-se certo atrasado com relação as questões que são de ordem pública e que, de certa forma, é estabelecida uma relação de poder e superioridade, da mesma maneira que Sergio Buarque de Holanda descreve em seu texto sobre As raízes do Brasil, “Falta a tudo a ordenação impessoal que caracteriza a vida no Estado burocrático. O funcionalismo patrimonial pode, com progressiva divisão das funções e racionalização, adquirir traços mais burocráticos. Mas em sua essência ele é tanto mais diferente do burocrático, quanto mais caracterizados estejam os dois tipos. No Brasil, pode-se dizer que só excepcionalmente tivemos um sistema administrativo e um corpo de funcionários puramente dedicados a interesses objetivos fundados nesses interesses. Ao contrário é possível acompanhar, ao longo de nossa história, o predomínio constante das vontades particulares que encontram seu ambiente próprio em círculos fechados e pouco acessíveis a uma ordenação impessoal. Dentre esses círculos, foi sem dúvida o da família aquele que se exprimiu com mais força e desenvoltura em nossa sociedade. ” (cap. 5 – p. 106). A partir dessa caracterização a questão de perpetuação de poder também está no filme e é revelada no momento em que uma vingança é arquitetada e os seguranças associam-se ao filho de Francisco, detentor das propriedades, para garantir o poder local, independente do poder do Estado. Por fim, a questão da separação das relações que são públicas e privadas é uma das principais questões do filme e relaciona-se com a questão da família patriarcal, no sentido de pertencimento de poder e ausência do Estado em problemas que aparentemente são unicamente de interesse público, remetendo-nos à ideia do engenho, em que um senhor toma decisões baseado em suas particularidades.