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PAPEL DA MULHER NO DIREITO

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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO	4
2. O PAPEL DAS MULHERES NO DIREITO	5
2.1 FUNDAMENTOS DA TEORIA FEMINISTA DO DIREITO	5
2.2 DIREITO MASCULINO E PATRIARCADO	6
2.2.1 Patriarcalismo Jurídico	8
2.3 TÓPICOS DE SOCIOLOGIA JURÍDICA NA PERSPECTIVA FEMINISTA	9
2.3.1 Sexo/Gênero	9
2.3.2 Público/Privado	10
2.3.3 Violência Contra a Mulher	11
2.3.3.1 Abordagem Teórica	11
2.3.3.2 A Leitura da Violência de Gênero na Prática Judicial Brasileira	13
2.3.4 Direitos das Mulheres e Empréstimo Jurídico	15
2.3.5 Direitos das Mulheres e Ações Afirmativas	17
2.3.6 As Mulheres Como Operadoras do Direito	18
3 CONCLUSÃO	20
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS	21
1 INTRODUÇÃO
Em um recente estudo sobre a violência no país, indica-se que a taxa de homicídio de mulheres é de 3,9 em cem mil mulheres, sendo esta considerada muito elevada sobretudo se confrontada com as estatísticas no âmbito internacional. Pesquisas desenvolvida especificamente no Estado do Rio de Janeiro pela Secretaria de Segurança Pública, indicou que uma mulher morre ao dia vítima de homicídio e que quase a metade das mulheres vítimas de homicídio são assassinadas pelo marido ou namorado, ex ou atual. Outras pesquisas indicam que as mulheres sofrem mais discriminações no ambiente de trabalho, ganhando menos pela realização das mesmas tarefas profissionais ainda quando possuem um nível de escolaridade superior ao dos homens. 
Pesquisas realizadas pela ONU durante anos de 1990 indicaram a existência de uma sub-representação das mulheres em cargo de chefia e direção em todo o mundo (os denominados “cargos de poder”), reconhecendo que a problemática atingia inclusive a própria Nações Unidas. As mulheres também apresentam maiores dificuldades para a obtenção de emprego, sendo que em diversos países as taxas de desemprego são sempre superiores às dos homens. Além disso, a mulher é a vítima preferencial de assédio sexual no ambiente de trabalho. A Constituição brasileira além de estabelecer a igualdade entre os sexos, proíbe expressamente (art. 7°, XXX) a diferença de salários, de exercícios de funções e de critério de admissão entre trabalhadores por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. A constituição garante plena igualdade entre homens e mulheres, mas apesar disso a realidade indica que persiste inúmeras formas de discriminação e opressão das mulheres. 
Há algumas décadas pesquisadoras oriundas dos movimentos de mulheres começaram a estudar a possível contribuição do sistema jurídico para a perpetuação dessas violações dos direitos da mulher. Surgiram, assim, estudos que realizavam tanto leituras internas, relativas à estrutura do direito positivo, como leituras externas, relativas à eficácia e as relações entre o direito e a cultura machista/sexista. 
2. O PAPEL DAS MULHERES NO DIREITO
2.1 FUNDAMENTOS DA TEORIA FEMINISTA DO DIREITO
Frances Olsen, jurista norte-americana, em um dos seus textos “o sexo do direito” apresenta a formulação mais conhecida da tese que o direito "tem sexo" e que esse sexo é o masculino. Olsen observa que, na civilização ocidental, predomina um sistema dualista de pensamento: o racional se opõe ao irracional, o ativo ao passivo, o abstrato ao concreto. Nesse sistema atribuímos valores femininos e masculinos às coisas e às pessoas e as tratamos diferentemente em função desse valor atribuído, sendo sempre superior o valor masculino. Os homens são racionais, ativos e com capacidade de abstração no pensamento, enquanto as mulheres caracterizadas "inferiores" se atribuem a irracionalidade, o sentimentalismo, a passividade. Essa é uma forma de organizar os pensamentos e as relações sociais entre indivíduos de sexo diferentes, garantindo a supremacia masculina.
O direito é considerado racional, ativo e abstrato; características impetradas como masculinas, o direito se identifica como o masculino e por isso é valorizado e reflete uma forma masculina de ver o mundo. 
Algumas estudiosas feministas lembram que o direito moderno foi criado pelos homens. Se mesmo no séc. XX, em diversas partes do mundo, as mulheres não tinham direito ao voto, isso significa que também não podiam ser eleitas e elaborar leis e sabemos que até hoje a representação das mulheres nos órgãos políticos continuam sendo bastante reduzidas. Esses estudos identificaram dois tipos de problemas; primeiro a existência de normas que discriminam a mulher, segundo; a aplicação das normas de forma que discriminam as mulheres. Há dois exemplos de normas discriminatórias, uma que se refere ao art.134 do CPB que pune quem expõe ou abandona recém-nascidos, para ocultar desonra própria, outra é a revogação do art. 215 do CPB que punia quem mantinha relações sexuais com mulher honesta mediante fraude.
O exemplo da discriminação na aplicação das normas penais se referem ao crime de estupro, objeto da referida reforma de 2009. O legislador brasileiro atualmente considera como estupro a relação sexual realizada com emprego de violência ou grave ameaça, sem distinção do sexo da vítima. Dessa forma o legislador brasileiro aderiu a tendência mundial de reformas de tais delitos ocorridos. Porém, é importante considerar que antes da reforma, o crime de estupro só se referia à conjunção carnal e seu autor só poderia ser o homem.
Ademais, vale lembrar que os homens nunca foram classificados de tal forma pela lei. Só a mulher deveria passar pela humilhação de dever ser judicialmente examinada em relação à sua honestidade, ocorrendo uma inversão de papeis. A mulher pede a proteção da justiça e o legislador quer julga - lá segundo os valores sexistas, para ver se é merecedora da tutela. 
A expressão "o direito é masculino" pode ser interpretada de diversas formas uma posição moderada que considera o caráter masculino do direito é um resquício histórico que pode ser superado graças à pressão exercida pelos movimentos de mulheres, essa posição moderada fundamenta na igualdade entre homens e mulheres que foram historicamente negador, criando problemas que hoje se evidenciam em muitos setores da vida social, como o pagamento de salários menores para as mulheres ou a sua menor representação em cargos de poder.
O direito apresenta-se como democrático, humano, igual para todos e, para legitimar-se procura manter correspondência com os valores morais dominantes.
A análise feminista desvendou que os princípios constitucionais que legitimam o discurso jurídico padecem de eficácia social, já que em todos os níveis da atividade jurídica podem ser identificadas como elementos que (re)produzem a discriminação da mulher, contrariando as promessas de liberdade e igualdade. 
2.2 DIREITO MASCULINO E PATRIARCADO 
Temos por criar a falsa impressão sobre os termos “machismo” e “sexismo”, e que a relação entre homens e mulheres depende apenas da vontade das pessoas, havendo homens “bons” que respeitam as mulheres e homens “ruins”. As feministas colocaram essa teoria por terra, alegando ser uma ideia falsa. O problema não é a postura de certos homens, mas uma cultura que influência toda a sociedade.
Essa cultura vem do patriarcado que consiste em uma forma de relacionamento, caracterizada pela dominação do gênero feminino pelo masculino. O patriarcado indica o predomínio de valores masculinos, fundamentados na relação de poder que se exerce através de mecanismos complexos de controle social que oprimem e marginalizamos as mulheres, esses mecanismos complexos se caracterizam também pela dominação do gênero feminino pelo masculino e costuma ser marcada pela violência física e/ou psíquica em uma situação na qual as mulheres e as crianças encontram-se na posição mais fraca, sendo desprovidas de meios de reação efetivos.
É notório que existem diversas condições que fazem variar a intensidade dessa relação de dominação entre os gêneros, de região para região, devido a diversidade de fatores culturais que influenciam e condicionam as relações sociais.
Portando, identifica-se o processo de dominação masculina como fenômeno mundial. E isso torna o estudo da cultura patriarcal relevante para o direito na medida em que asviolações dos direitos das mulheres mantêm uma relação direta com elementos dessa cultura.
Outrora, em 1967, desejando incorporar a mulher ao discurso acerca do desenvolvimento humano, a ONU elabora a Declaração sobre a eliminação da discriminação contra a mulher, sustentando que esta constitui uma forma de violação de direitos humanos e que, portanto, deve ser combatida pelos Estados. A este documento se segue, no ano de 1979, a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher. Segundo o art. 1º dessa convenção a expressão “toda a distinção, exclusão ou restrição fundada no sexo e que tenha por objetivo ou consequência prejudicar ou destruir o reconhecimento, gozo ou exercício pelas mulheres, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade dos homens e das mulheres, dos direitos humanos e liberdades fundamentais no campo político, econômico, social, cultural e civil em qualquer outro campo”. 
Atualmente, tem-se discutido sobre a criminalização de uma “nova figura delitiva” (também relacionada com a discriminação das mulheres por questões de gênero) denominada em inglês de Stalking. Entendendo-se como tal, a prática de uma série de comportamentos indesejados que prejudicam a qualidade de vida das mulheres. Trata-se da prática de ameaças, perseguições constantes, telefonemas obscenos ou indesejados, tentativas reiteradas de contato (inclusive por e-mail – denominados de cyberstalking), realizadas de modo persistente e reiterado no confronto de uma pessoa com a qual o autor já manteve relações afetivas ou de convivência, e que em razão de tais comportamentos a vítima sofre de angústia, depressão, stress, anorexia e outras doenças relacionadas com a situação emocional vivenciada pela pessoa vitimada. 
2.2.1 Patriarcalismo Jurídico
Se o patriarcado moderno indica o predomínio de valores masculinos, fundamentados em relações de poder, o direito serve para garantir a dominação feminina, em outras palavras, o direito funciona como elemento integrante (e ao mesmo tempo legitimador) das relações de gênero de corte patriarcal. É nesse contexto que desenvolvemos o conceito de Patriarcalismo Jurídico, a partir, desses termos temos a integração do direito moderno com o sistema patriarcal de relações sociais, que implica na produção e reprodução das relações de dominação do gênero feminino pelo masculino.
Considerando-se que essa dominação constitui uma violação e direitos humanos, o empego do referido conceito indica o caráter discriminatório das ciências jurídicas em seu estado atual, podemos identificar a presença do patriarcalismo jurídico no âmbito da produção de normas, de textos e também na prática jurídica.
Sabemos que em diversos países foram abolidas ou parcialmente reformadas determinadas normas sexistas ao mesmo tempo em que novas normas de tutela específica os interesses das mulheres foram criados. Exemplo disso temos a proibição da discriminação salarial, do assédio sexual e da violência doméstica.
Ocorre, porém, que tais reformas não conseguem impedir que o discurso discriminatório contra a mulher se reproduza. A análise do sistema jurídico a partir dessas três dimensões (doutrina, prática jurídica e produção de normas), indicam que o direito é patriarcal, podemos dizer que; quando a mulher não é discriminada pela norma, ela é discriminada pela prática e/ou pela doutrina jurídica. Essa é a cilada do patriarcalismo jurídico na atualidade. A constatação de tais dificuldades nos indica que a luta pela efetivação dos direitos fundamentais da mulher é de caráter multidisciplinar.
2.3 TÓPICOS DE SOCIOLOGIA JURÍDICA NA PERSPECTIVA FEMINISTA
2.3.1 Sexo/Gênero
Um ponto central da análise feminista refere-se ao termo “sexo”. Quando usamos esse termo, pensamos nas diferenças físicas entre homens e mulheres. As identidades de “sexo” são construídas socialmente e podem ser modificadas. Isso quer dizer que o sexo é visto a partir de características anatômicas, biológicas e físicas; enquanto o gênero constituiria algo do plano das construções socioculturais, variando através da história e de contextos regionais no que diz respeito aos papeis sociais relacionados com o homem e a mulher.
Por essa razão, as feministas propuseram empregar a expressão “gênero” ao invés de “sexo” para indicar as diferenças entre os sexos que vão além das biológicas. Isto permite falar de homens e mulheres fora do determinismo biológico. 
Trata-se de um aspecto muito importante, porque grande parte das diferenças entre os sexos não são devidas a diferenças biológicas, mas decorrem de uma construção social da realidade. Em palavras simples, quebra-se com um discurso de caráter naturalista que apresenta as diferenças entre homens e mulheres como eternas e necessárias. 
O termo gênero permite analisar as identidades, feminina e masculina sem reduzi-las ao plano biológico e indicando que essas identidades estão sujeitas a variações determinadas pelos valores dominantes em cada período histórico. Em suma, enquanto sexo é uma categoria biológica, gênero é uma distinção sociológica.
Sexo é, em regra, fixo; já o papel de gênero muda no espaço e no tempo, principalmente com a tomada de consciência de distinções que são construídas socialmente, e que podem e devem ser em inúmeros casos ‘desconstruídas’, para que haja igualdade do ponto de vista social.
A identidade de gênero faz menção ao modo como alguém se identifica, se apresenta. Não só a si mesmo como para a sociedade. Nesse sentido o indivíduo pode se apresentar como um homem ou mulher ou ambos, sem levar em consideração a sua biologia ou orientação sexual. 
Toda sociedade é marcada por diferenças de gênero, havendo, ainda, grande variação dos papeis associados em função da cultura e do tempo em que se vive. Ressalte-se, contudo, que a determinação social de gênero pode ser alterada por uma ação consciente tomada, inclusive por meio de políticas públicas. 
2.3.2 Público/Privado 
Partindo do princípio que a divisão entre espaço público e privado foi construído baseado em uma distinção hierárquica de gênero, a mulher sempre atuou prioritariamente no espaço privado e até meados do século XX ficou de fora da vida política, de uma série de profissões, seu acesso a instrução era limitado e havia restrições quanto ao direito de administrar seu próprio patrimônio, além de serem vistas, no casamento, como um acessório masculino. Essa espécie de clausura da mulher no espaço privado, permite que as violências e discriminações sofridas por elas fiquem de certa forma invisíveis a sociedade. Somente no final do século XIX e início do XX foram feitas algumas modificações permitindo, ainda que de forma limitada, a inclusão das mulheres na esfera pública sendo que a predominância e o poder masculino.
	O mundo moderno atribuiu a mulher funções próprias do domínio privado, como os cuidados da casa e dos filhos, na manutenção de uma estrutura que permitiu aos homens o envolvimento com assuntos políticos e econômicos, próprios do domínio público. Mulheres e crianças passaram, ainda, a serem consideradas como frágeis e necessitadas da proteção masculina, numa divisão de papeis que tornou possível, o domínio do homem sobre a mulher, disfarçando-o sob a capa de proteção. 
	A mulher conseguiu o seu espaço nas mais distintas esferas da sociedade, ela também se destacou diante das carreiras jurídicas, deixando de ser objeto de sanções e passando a ter participação ativa diante do direito.
	No ano de 1902, nenhuma mulher havia feito curso de graduação na área do direito. A percussora a transpor essa barreira foi Maria Augusta Saraiva, que ingressou na Faculdade do Largo São Francisco. Ela também foi a primeira figura feminina a atuar no Tribunal do Júri. E no ano de 1954 que uma mulher se tornar magistrada, Thereza Grisólia Tang, e ela vem a afirmar “quando as mulheres faziam inscrição para concorrer ao cargo de juízas eram automaticamente dispensadas apenas por serem mulheres” confirmando dessa maneira o caráter preconceituoso, visto que o simples fato de pertencerao sexo feminino já era quesito para a reprovação no concurso de magistratura.
	Apesar dos inúmeros avanços femininos diante dos diversos postos do direito, as mulheres ainda não estão livres dos preconceitos. Ainda é possível perceber que mesmo com o passar do tempo com a modificação da influência feminina na sociedade, sua ascensão nos mais distintos postos da mais diversas profissões e funções, sejam elas na esfera pública ou privada, ainda prevalece a diferenciação por gênero, sobretudo no âmbito jurídico que deveria ser um ambiente de libertação, desmitificação de preconceitos, de quebra de paradigmas e de ascensão daqueles que de alguma forma são subjugados pela sua diversidade.
2.3.3 Violência Contra a Mulher
2.3.3.1 Abordagem Teórica
Uma das preocupações centrais da leitura feminista do direito é a violência praticada contra a mulher, no espaço público e no espaço privado, temas que se relacionam com o direito à segurança que deveria garantir a qualidade de vida das mulheres. 
Nas relações privadas, a violência contra a mulher é um da cultura patriarcal. A violência doméstica é de forma física e/ou psíquica, exercida pelos homens contra as mulheres nas relações de intimidade e exercendo um poder de posse de caráter patriarcal. Essa violência é como um castigo que tem por objetivo condicionar o comportamento das mulheres e demonstrar que não possuem o domínio de suas próprias vidas. No âmbito privado nunca existiram garantias jurídicas quando se trata da integridade física e psíquica da mulher e ao livre exercício da sua sexualidade. A mulher tratada como “rainha do lar” tendo que seguir as pautas de comportamento da sociedade patriarcal. Quando desobedecem, os mecanismos de “correção” entram em ação: insultos, espancamento, estupro, homicídio.
A violência contra a mulher tem o começo da sua história no ambiente familiar já na infância. A menina “aprende” desde muito criança que se trata de correção e se acostuma a aceitar a violência como inerente às relações familiares. É difícil aceitar como violência aquilo que, no ponto de vista social, não é reconhecido como tal. A violência entre cônjuges constitui uma das fases da violência familiar e essa se relaciona com os valores do mundo patriarcal, onde a mulher muitas vezes tem sobre seu corpo, grande parte da violência produzida numa sociedade marcada pela cultura patriarcal e também por um modelo caracterizado pela competitividade e pelo aumento da agressividade.
Nos dias atuais ainda persiste a tendência de não reconhecer a gravidade da violência no meio familiar. Muitas vezes a própria vítima tem dificuldades em identificar e denunciar essa agressão. Isso tem um aspecto jurídico. A intimidade e a livre configuração da vida privada constituem direitos fundamentais garantidos pelo art. 5°, inciso X, da Constituição Federal, devendo o Estado se abster de intervir na esfera privada. Mas o mesmo art. 5° garante em seu caput o direito à vida, à liberdade e à segurança e o Código Penal tipifica como crime as agressões contra a integridade física e moral.
Apesar de tentativas de solução e da criação de normas e instituições específicas para combater a violência doméstica, na prática a vida familiar permanece fora do alcance efetivo das normas jurídicas. O resultado é que o direito demonstra seu caráter “masculino”, protegendo a “privacidade” dos homens em detrimento das mulheres.
Pesquisas feministas indicam que os argumentos da preservação da privacidade e da tutela da liberdade (masculina) constituem o maior obstáculo para o enfrentamento da violência doméstica, porque permitem apresentá-la como assunto que só interessa aos diretamente envolvidos.
No entanto os limites para resolver o problema tornam-se claros de escassa eficácia secundária das normas que combatem “no papel” a violência doméstica e no caso de eventual punição do agressor quase nunca resolve o problema de forma satisfatória para a mulher. A melhor forma de combate a violência contra a mulher é ensinar a todos, inclusive os que estão em formação, que homens e mulheres merecem igual respeito e consideração. Somente a mudança de mentalidade permitirá erradicar a violência contra as mulheres. Esse é um problema de eficácia das normas com a mudança social e merece muita atenção da sociologia do direito. 
2.3.3.2 A Leitura da Violência de Gênero na Prática Judicial Brasileira
No direito é possível a identificação da incidência de gênero em três níveis: na produção das normas jurídicas, no debate doutrinário e na aplicação do direito. Nesse contexto será apresentado como referência a jurisprudência brasileira, para demonstrar como se produz a discriminação de gênero no discurso jurídico.
A mulher que é vítima de violência e pede assistência ao sistema de justiça penal muitas vezes sofre discriminações por parte dos operadores do direito, prova disso se evidência nos processos por crime de natureza sexual. Muito comum encontrar sentenças onde o foco de discussão não é a violência sexual sofrida pela vítima, mas seu comportamento, a sua moral sexual.
No Brasil, a prática de ato sexual com menor de 14 anos era considerada estupro até 2009, além de ser punida como crime hediondo. O Código Penal previa que a violência e presumida quando vítima não é maior de 14 anos. Mas grande parte da doutrina e jurisprudência considerava que muitos adolescentes menores de 14 anos mantêm vida sexual ativa e têm consciência do significado social dos atos sexuais, dessa forma afirmam que a violência deveria ser relacionada em função do comportamento da vítima no caso concreto.
Faremos referência de dois casos de agressão sexual praticado contra meninas entre 10 a 12 anos de idade, onde se evidência a perspectiva patriarcalista, defendem a absolvição de homens que estupram meninas, equiparando-as a mulheres experientes e até mesmo prostitutas.
O primeiro caso aconteceu em 1996, quando o Supremo Tribunal Federal seguiu, por maioria, o voto do relator Ministro Marco Aurélio e considerou que o homem que manteve relações sexuais com menina de 12 anos não praticou estupro porque havia consentimento da menina, que já tinha vida sexual ativa e aparentava idade de 14 anos. Isso permitiu afastar a presunção de violência prevista no art. 224 do Código Penal. Em suas palavras o Ministro diz: “Nos nossos dias não há crianças, mas moças de doze anos. Precocemente amadurecidas, a maioria delas já conta com discernimento bastante para reagir antes eventuais adversidades, ainda que não possuam escala de valores definida a ponto de vislumbrarem toda a sorte de consequências que lhes pode advir.”.
No segundo caso, no ano de 1992, um homem de 66 anos é visto mantendo relações sexuais com uma menina de 10 anos, a qual ofereceu 12 reais, em troca de sexo. O agressor e condenado no Amapá em primeira instancia e apela para Tribunal de Justiça, que em 1998 decide pela manutenção da condenação. Dos quatros desembargadores que julgaram o caso, um se posicionou de maneira favorável a absolvição do acusado, com tais palavras: “Divirjo dos votos precedentes. Talvez o acusado pudesse ser processado por corrupção de menores. Essa mocinha já não era mais virgem, e tinha relações sexuais normais com o cidadão. Agora, ele vai pegar seis anos de cadeia porque outro a desvirginou. Isso e muito injusto, porque não vejo nenhuma configuração de crime de estupro: ela já era uma mulher experiente. Porque, quando o Ministro Marco Aurélio diz que a menina de 12 anos já é uma moça, isso e lá em Minas Gerais. Aqui na Região Norte a idade diminui cada vez mais. Se ela tinha 10 anos e já praticava ato sexual, não vejo como punir o cidadão por estupro só porque manteve relações sexuais incompletas com ela. Por isso voto dando provimento ao Apelo”.
Fazendo uma análise de gênero, identifica-se nos dois casos citados uma discriminação contra a mulher e também como se produz a violência patriarcal dentro do sistema de justiça:
A. Descaracterização da infância: os relatos sobre as vítimas que encontramos nos processos citados acima negam o “status criança”,empregando expressões como mocinha, jovem, mulher experiente. Afirma-se também que a vítima possui consciência do significado social do ato sexual. A menina “não virgem” perde o status de criança, sendo considerada mulher. Em ambos os casos citados questiona-se também a “honestidade” da vítima. No primeiro julgado pelo STF, em que o acusado é absolvido, pois pesa em seu favor o fato da vítima aparentar idade maior de doze anos, mas também o fato de ela ter vida sexual ativa. No caso julgado no Amapá o desembargador afirma: “agora ele vai pagar seis anos de cadeia porque outro a desvirginou. Se ela tinha 10 anos e já praticava ato sexual, não vejo como punir o cidadão por estupro”. Aqui entra uma classificação patriarcal das mulheres em honestas e desonestas que, apesar de ter sido eliminada do Código Penal, permanece nas mentes de alguns operadores do direito. Não importa se a legislação considera crime de particular gravidade, tanto antes como após a reforma de 2009, manter relação sexual com menores de 14 anos. Se de alguma forma a criança ou adolescente concorda com tal pratica, deve ser tratada como mulher, provavelmente, dada a pouca idade, desonesta. Isso e evidente no voto do Desembargador Dôglas Evangelista, que emprega uma terminologia que denigra a imagem da mulher, criando constrangimento no voto do Desembargador. 
B. Descaracterização do estupro: Nos casos acima estamos diante de situações que os argumentos patriarcais são empregados para descaracterizar o crime de estupro, como por exemplo o argumento de negar a violência sexual, afirmando ter existido consenso. Negar o estupro significa negar a violência sofrida pela vítima, mesmo quando esta não possui a consciência de estar sendo vítima de uma violência sexual.
C. Reprodução do discurso patriarcal: Em 1998, o Desembargador Dôglas Evangelista reproduz, em seu voto, as palavras pronunciadas pelo Min. Marco Aurélio no caso de 1996, onde o réu fora absolvido. Após uma década, em 2006, o ministro continua adotando os mesmos argumentos discriminatórios. Devemos observar, finalmente, que nos casos relatados, a reprodução do discurso patriarcal e realizada por magistrados que atuam em instâncias superiores, sendo que suas decisões possuem maior visibilidade e projeção.
2.3.4 Direitos das Mulheres e Empréstimo Jurídico 
A entrada da mulher no espaço público, sua inclusão no mercado de trabalho e a política das organizações internacionais são fatores que influenciam positivamente a efetivação dos direitos das mulheres. Em muitos países, foram realizadas amplas reformas legislativas visando estabelecer a igualdade entre os gêneros. 
Muitas dessas reformas legislativas receberam influência direta de normas de origem internacional produzidas pela ONU e, no continente americano, pela OEA. 
As declarações, os tratados e as convenções vinculam os países-membros dessas organizações, obrigando a tomar medidas legislativas e também elaborar políticas públicas para melhorar a situação das mulheres.
Muitos países só começaram a desenvolver uma legislação especifica sobre problemas de tutela dos direitos humanos após a ratificação de tratados. No caso dos direitos das mulheres, diversos países com cultura patriarcal recepcionaram normas que tutelam os interesses femininos (igual tratamento, promoção e capacitação). 
No Brasil, a Lei 10.778 de 2003, que obrigou os serviços de saúde a notificar casos de violência contra a mulher adota uma definição idêntica àquela que se encontra na Convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra mulher, de 1994, assinada pelos países da OEA e ratificada pelo Brasil em 27.11.1995.
Cumprindo com a sua obrigação internacional de tomar medidas para coibir a violência doméstica, o legislador brasileiro introduziu em 2004, no art. 129 do Código Penal, o § 9º, que criminaliza essa prática (norma modificada em 2006 pela Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha).
A Lei 11.340 é popularmente conhecida por Lei Maria da Penha, em homenagem à mulher que sofreu violência doméstica por anos e lutou para a aprovação de alguma medida que coibisse essa atitude. Maria da Penha Maia Fernandes ficou paraplégica devido a um tiro que levou do marido, que tentou matá-la novamente após esse crime.
Maria da Penha travou uma verdadeira batalha judicial desde 1983 contra seu agressor, a fim de que ele fosse condenado. Depois de vários entraves no processo, em 2001, o caso foi levado à Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Estado brasileiro foi condenado por omissão, negligência e tolerância perante violência doméstica contra mulheres.
Dentre as várias imposições que a Corte impôs ao governo brasileiro, uma delas foi a criação de políticas públicas que visassem à proteção da mulher e facilitassem a denúncia de agressões. Dessa forma, a Lei Maria da Penha foi criada em 2006 no Congresso Nacional, por unanimidade e já foi considerada pela ONU como a terceira melhor lei contra a violência doméstica no mundo. Apesar de ainda existirem obstáculos para as denúncias contra agressões, entre os anos de 2006 e 2013 o número de denúncias aumentou em 600%.
Os principais pontos positivos da criação da Lei Maria da Penha foram:
· A possibilidade de o agressor ser preso em flagrante ou ficar em prisão preventiva, logo após a denúncia da mulher;
· A violência contra a mulher ser um agravante de pena, ou seja, aumenta a possibilidade de uma pena maior ao agressor;
· A mulher poderia, antes da lei, desistir de denunciar seu agressor já na delegacia – por medo de fazê-lo, por ameaça e humilhação. Porém, agora só pode fazer isso perante o juiz;
· Medidas de urgência que tiram a vítima do convívio com o agressor – antes da lei, as mulheres ficavam à mercê de novas ameaças e agressões, que poderiam resultar em ela desistir de ir em frente com o processo, por exemplo;
· Em 2012, o Supremo Tribunal Federal decidiu que qualquer pessoa pode denunciar violência contra mulher, não apenas a vítima.
2.3.5 Direitos das Mulheres e Ações Afirmativas
Apesar das diversas tentativas de paridades entre os gêneros, como visto a grande maioria falhou em conseguir essa equiparação, porém isso não quer dizer que não tenham conseguindo avanços significativos sobre o tema, vamos ver o que de afirmativo foi feito paras que isso tenha atingido ou tentado atingir.
Ações afirmativas tem caráter político, que tem o principal objetivo de tutelar os interesses de diversos grupos marginalizados no intuito de produzir igualdade material (quotas de acesso a cargos eletivos, favorecimento em concursos públicos) tais medidas objetivam compensar as dificuldades de inserção e os diversos tipos de preconceitos que esse grupo sofreu ao longo dos anos.
As ações afirmativas surgiram nos estados unidos na década de 60, em primeiro momento os direitos dos negros de inserção foi o assunto, posteriormente os das mulheres, atualmente diversos países empregam políticas, ações afirmativas para favorecer a igualdade de gênero apesar de críticas o consenso consegue obter bons resultados.
As ações afirmativas mantem uma forte correspondência com a problemática da relação entre a mudança social e o direito no Brasil leis a exemplo da lei nº 9.100/1995, cuja a qual obrigava partidos políticos a disporem que 20% dos candidatos bem como cadeiras em diversas esferas politicas deviam ser do sexo feminino, diversas leis posteriores estabelecem relação entre o direito e o impacto social que elas trazem consigo, tais como as que trazem a obrigatoriedade de maior participação das mulheres em todas as esferas , tanto no legislativo, executivo e judiciário, no judiciário uma excelente estatística mostra que 32% dos magistrados da justiça comum eram mulheres e nas varas da justiça do trabalho esse número chega a 48%, isso é um exemplo de que legislação em prol das mulheres pode ser o motor propulsor para que o contexto de igualdade entre homens e mulheres sejam diminuídas substancialmente. Porem existe a problemática da limitação do direito que não produzem efeitos estruturais sóciasnecessárias.
Por fim existem duas hipóteses que demonstram o porquê da disparidade entre homens e mulheres nas esferas dos poderes a primeira é a de que: a recente entrada das mulheres com mais afinco no mundo jurídico logo o número de mulheres aptas a ocuparem as esferas mais elevadas no Brasil ainda é pequeno, outra hipótese seria a da persistência cultural, que ainda tentam colocar a mulher em segundo plano, pensamentos machistas para com as mulheres, muito já foi feito, porem as mulheres não devem de forma alguma ser barradas em diminuir a diferença entre homens, mas sim lutar com mais fervor para garantir direitos.
2.3.6 As Mulheres Como Operadoras do Direito
Até o início do século XX as mulheres eram proibidas de exercer profissões liberais em diversos países. Em muitas profissões, o contingente de mulheres já supera o masculino. No caso do Brasil, nos últimos anos formaram-se em direito mais mulheres do que homens.
Muitos preconceitos foram vencidos desde 1906, quando a primeira mulher no Brasil, Myrthes Gomes de Campos, entrou no Tribunal da Justiça brasileira para exercer a profissão de advogada. Depois da estreia da doutora Myrthes, foram necessários 55 anos para que uma juíza fosse empossada no Brasil: a catarinense Thereza Grisólia Tang, em 1954. 
Mesmo diante de batalhas, muitas mulheres ocupam cargos de direção ou destaque na vida nacional. Entre elas, duas já alcançaram cargos altos no Supremo Tribunal Federal (STF), mais alta Corte do poder Judiciário do Brasil.
Na área judiciária, por exemplo, a presença da mulher é tímida. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça – CNJ – apenas 32 % dos cargos de magistrados são ocupados por mulheres. Na justiça do trabalho, elas representam 48%. As desembargadoras nos Tribunais de Justiça chegavam a 12,5%. As Ministras dos quatro tribunais superiores do País totalizavam 8,5 % de seus integrantes.
De modo geral, as pesquisas indicam que a crescente feminização não causou uma alteração significativa no exercício das profissões jurídicas. Parece que as mulheres conquistaram o mundo jurídico, sem muda-lo, isto é, sendo obrigadas a adotar padrões de comportamento masculino.
A tendência é a entrada cada vez maior de mulheres no mercado, seja no Judiciário, nos escritórios de advocacia ou departamentos jurídicos das empresas, alcançando ainda mais cargos de liderança com maior frequência.
3 CONCLUSÃO
Diante o exposto, o direito apresenta-se como democrático, humano, igual para todos e, para legitimar-se procura manter correspondência com os valores morais dominantes. Assim, podemos afirmar que a sociologia jurídica ignora uma parte significativa das relações entre o direito e a realidade social se não analisasse as complexas relações entre o regulamento e as práticas jurídicas e aposição social da mulher. Não existe um verdadeiro direito humano sem distinção entre homens e mulheres, houve melhorias e conquistas no decorrer dos anos, mas a opressão do gênero feminino ainda continua. 
A dominação masculina se manifesta por meio da discriminação e da opressão que as mulheres vivem. Considerando que essa dominação constitui uma violação de direitos fundamentais , o emprego do referido conceito indica o caráter discriminatório das ciências jurídicas em seu estado atual. Podemos identificar a presença do patriarcalismo jurídico a partir de três dimensões : No âmbito da produção de normas, de textos doutrinais e também na prática jurídica, ou seja, indica que o direito é patriarcal , quando a mulher não é discriminada pela norma, ela é discriminada pela prática e/ou pela doutrina. Um exemplo disso e a mulher que é vítima de violência e pede assistência ao sistema de justiça penal muitas vezes sofre discriminações por parte dos operadores do direito, prova disso se evidência nos processos por crime de natureza sexual. Muito comum encontrar sentenças onde o foco de discussão não é a violência sexual sofrida pela vítima, mas seu comportamento, a sua moral sexual.
De modo geral, as pesquisas indicam que a crescente feminização não causou alteração significativa no exercício das profissões jurídicas. Parece que as mulheres conquistaram o mundo jurídico, sem muda-lo, isto é, sendo obrigadas a adotar padrões de comportamento masculino. A tendência é a entrada cada vez mais das mulheres no mercado, seja no judiciário, nos escritórios de advocacia ou departamentos jurídicos das empresas, alcançando ainda mais cargos de lideranças com maior frequência. 
Apesar dos inúmeros avanços femininos diante dos diversos postos do direito, as mulheres ainda não estão livres dos preconceitos. Ainda é possível perceber que mesmo com o passar do tempo e com as modificações e da influência feminina na sociedade, sua ascensão nos mais distintos postos da mais diversas profissões e funções, sejam elas nas esferas pública ou privada, ainda prevalece a diferenciação por gênero.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HOJE EM DIA. Revista Digital. O direito é delas. Disponível em: < http://hojeemdia.com.br/opini%C3%A3o/blogs/opini%C3%A3o-1.363900/o-direito-%C3%A9-delas-1.337051 > Acesso em: 18/11/2017.
POLITIZE. 6 Questões vitais sobre a violência contra a mulher. Disponível em: < http://www.politize.com.br/violencia-contra-a-mulher-questoes-vitais/> Acesso em: 18/11/2017.
SABADELL, Ana Lucia. Manual de Sociologia Jurídica, 6ª Ed. Rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

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