Buscar

A mulher leitora

Prévia do material em texto

“ A mulher leitora
do século XIX
e a biblioteca
da Fazenda Pinhal”
Denise Zanetti
UNESP
UNIVERSIDADE ESTATUAL PAULISTA
FFC – FACULDADE DE FISIOLOGIA E CIÊNCIAS
 “A mulher leitora do século XIX e a Biblioteca da Fazenda Pinhal”
Linha de pesquisa: Informação e sociedade
Autora: Denize Zanetti
Orientadora: Helen de Castro Silva
Trabalho de Conclusão de Curso
Apresentado ao Departamento
De ciências da Informação,
Como um dos requisitos para a obtenção do título de bacharel em Biblioteconomia
Marilia
2001
Agradecimentos 
Agradeço a Deus pela dadiva da existência
Aos meus pais pelo amor e incentivo.
A professora Helen pelo apoio como orientadora e, acima de tudo, como amiga.
Ao professor João Batista E. de Moraes por contribuir com material importante para complementação da pesquisa.
A professora Maria Helena T. C. de Barros pelas dicas, sugestões e pela valiosa insistência.
A Bruna C. Bonini, por partilhar as dúvidas e me ajudar a buscar as soluções. 
A Adriana Lupion, pelas contribuições constantes ao desenvolvimento do trabalho.
A Ana Lucia Bonini, pelo auxílio durante a coleta de dados 
A Lourdes Mariano e a Lucinele Messias pela colaboração na elaboração da base de dados 
A Cínara de S. Neri e a Dilson A. Zanetti pelo auxilio prestado.
 A Walter C. Oliveira pelas sugestões de bibliografia. 
Dedicatória 
Dedico este trabalho as pessoas que fazem parte da minha vida e da minha história. 
A minha família, não só a que está presente mas também os familiares que estão distantes.
Aos amigos Milena Ap. Brito, Lourdes Mariano, Sandra T. Alves, Bruna C. Bonini, Adriana Lupion, Tchelid L. de Abreu, André de Araújo, Gisele A. Aguiar, Eloisa H. Sentinnello e a todos os meus amigos da turma. 
Também aos amigos de outras turmas: Lucillene C. S. Messias;
Fabiano F. Castro; Viviane R. Ventura; Kamila Veronese; Paulo R. F. Santos; Lucileide Feliciano; Marcos D. M. Fernandes e Rogério Ap. Pereira. Fico grata a todos vocês pela amizade sincera e pelo carinho. Ficarei com as saudades dos bons momentos e vocês fiquem com a certeza de que cada um sempre fará parte das minhas lembranças mais especiais.
 
In memoriam:
Dulcinéia Zanetti
Resumo:
Propõe a caracterização de uma amostra do universo de leitura da mulher da mulher aristocracia rural brasileira do interior do estado de São Paulo no final do século XIX, por meio do estudo da coleção bibliográfica da Fazenda Pinhal, em São Carlos, interior do Estado de São Paulo, que foi tombada como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. A prioridade pertence à família do Conde do Pinhal, um eminente líder político e empresário reconhecido nacionalmente no século XIX. Sabe-se, através de depoimentos de membros da família, que as filhas do Conde eram educadas por preceptoras estrangeiras, e de que lhes era permitida a leitura de algumas obras, indicio de que a biblioteca da família também era uma das poucas atividades de educação e lazer. Desse modo tem-se como objetivos contribuir na construção da História da Leitura no interior de São Paulo; fornecer subsídios para o estudo da formação da biblioteca da Fazenda Pinhal; verificar a existência de obras supostamente destinadas as mulheres na coleção da Fazenda Pinhal. Partindo-se da realização de uma pesquisa bibliográfica par a identificação dos autores e obras que em geral eram lidos por mulheres no século XIX, tem-se a identificação de obras que foram comparadas á listagem dos títulos existentes na Fazenda. Verificou-se que muitas obras que eram de leitura corrente da mulher da aristocracia brasileira do século XIX, fazem parte do acervo da Fazenda Pinhal.
Palavras - chave: leitura, mulher, mulher leitura, biblioteca particular, fazenda Pinhal.
SUMÁRIO
 INTRODUÇÃO ........................................................................................................1
1. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS ..........................................................................3
2. BIBLIOTECAS PAERICULARES NO BRASIL NO SÉCULO XIX.......................8
3. A MULHER NA SOCIEDADE DO SÉCULO XIX ..............................................13
3.1 A mulher e o trabalho ................................................................................17
3.2 A mulher e a moda.....................................................................................19
3.3 A mulher e a educação..............................................................................21
4. A LEITORA BRASILEIRA NO SECULO XIX E INICIO DO SECULO XX.......32
5. A FAMILIA DO CONDE DO PINHAL E A BIBLIOTECA DA FAZENDA...........48 
6. A LEITURA PARA MULHERES NA BIBLIOTECA DA FAZENDA PINHAL......54
7. CONSIDERAÇOES FINAIS..............................................................................65
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................71
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA..............................................................................74
INTRODUÇÃO
Este estudo está inserido na linha de pesquisa “Informação e Sociedade”, do Departamento de Ciência da Informação, da Unesp de Marilia. Propõe a caracterização de uma amostra do universo de leitura da mulher brasileira no final do século XIX, através do estudo de parte da coleção bibliográfica da Fazenda Pinhal.
A sede desta fazenda está localizada na cidade de São Carlos, interior do Estado de São Paulo e foi tombada no ano de 1987 como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Na segunda metade do século XIX a fazenda pertencia a Antônio Carlos de Arruda Botelho, que foi um eminente líder político e empresário nacional. Lutou pelo desenvolvimento da região e pela fundação da cidade se São Carlos. Por seus feitos e relações com a oligarquia vigente da época, foi agraciado com vários títulos honoríficos, chegando a Conde do Pinhal. Antônio Carlos e Ana Carolina de Mello, sua esposa, tiveram dose filhos, seis homens e seis mulheres.
Ao que tudo indica, a biblioteca da Fazenda Pinhal foi indicada com os livros que pertenciam a ele e aos seus filhos e netos. O acervo da biblioteca é bastante rico, pois é composto por livros, revistas, catálogos, recortes de jornais e fotografias, além de obras sobre política, geografia, história, viagens, biografias e muitos romances franceses e alguns periódicos. Parte desse acervo, segundo os depoimentos de membros da família, era destinado as mulheres. 
 Os objetivos deste estudo são:
· Contribuir na construção da História da Leitura no interior de São Paulo;
· Fornecer subsídios para o estudo da formação da biblioteca da Fazenda Pinhal;
· Verificar a existência de obras supostamente destinadas as mulheres na coleção da Fazenda Pinhal.
 Para a obtenção dos objetivos mencionados, a pesquisa foi realizada através das seguintes etapas:
1. Pesquisa bibliográfica: identificação das obras lidas pelas mulheres brasileiras do século XIX;
2. Pesquisa documental: identificação das obras existentes no acervo da Fazenda e das pertencentes ao hábitos de leitura das mulheres. As obras identificadas através da pesquisa bibliográfica como sendo parte do universo de leitura das mulheres do século XIX foram comparadas com as obras existentes no acervo da biblioteca estudada.
Esta pesquisa está organizada em sete capítulos. O primeiro traz os pressupostos teóricos; o segundo capítulo aborda a questão das bibliotecas particulares no século XIX; os capítulos três e quatro traçam, respectivamente, um panorama da mulher na sociedade e a educação que lhe era destinada no século XIX e a mulher leitora no Brasil desse período: no capitulo cinco há um histórico sobre a família do Conde do Pinhal e a Biblioteca; os estudos obtidos estão reunidos no capitulo seis e as considerações finais encontram-se no capitulo sete.
1. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS 
“A leitura possui uma história.Mas como podemos recuperá-las?”
(DARNTON, 1992, P.200)
A partir as década de 1960, desenvolveu-se uma tendência no meio histórico internacional que consiste numa preocupação com temas políticos, econômicos e sociais relacionados a esfera pública, como eram a maioria dos estudos da área até então. 
Essa tendência, que reflete-se também no meio historiográfico brasileiro, pode ser notada na significativa ampliação do número de publicações dedicadas a esse gênero, como, por exemplo, a coleção História da Vida Privada, de Ariès & Duby (1991), e no Brasil a coleção História da Vida Privada no Brasil, de Souza (1997). Entre as questões investigadas nessa linha de pesquisa está o cotidiano das pessoas, não dos grandes líderes nem famosos personagens históricos, mas de pessoas comuns que viveram em uma determinada época, no que diz respeito ao modo de vida, o tipo de moradia, os costumes, como se vestiam, o que comiam, como se relacionavam entre si e o que elas liam e como liam.
Dessa forma, ampliaram-se as fronteiras da Historia e surgiu, entre outras, a área de História da leitura, que é a proposta de fundamentação teórica desta pesquisa. 
Um dos primeiros autores a se preocupar com a questão da História da Leitura Darnton (1992). Segundo ele, para resgatar a leitura como um fenômeno social, faz-se necessário identificar o perfil dos leitores de um determinado período, suas preferências e seus hábitos de leitura. Em busca de registros de leitores, esse mesmo autor, numa pesquisa desenvolvida na França, referente ao século XVIII, encontrou um comerciante de classe média que era um leitor apaixonado de Rousseau. O comerciante escreveu uma serie de caras para o autor nas quais mostra como a leitura de Rousseau influenciou o seu modo de vida. Muitos leitores de todas as parte da França fizeram p mesmo e foi no ano de 1785 que segundo Darnton (1192), ocorreu a “primeira onda gigantesca de correspondências de admiradores na história da leitura” (p.201).
Para Darnton (1992), existe dois tipos de estudos de História da Leitura: o macroalítico e o micronalítico. O primeiro foi muito utilizada na França. Através de métodos quantitativos, Henri-Jean Marin e outros traçaram a evolução dos hábitos franceses a partir só século XVI, utilizando as informações do deposito legal¹ no país, dos registros de leitores do livro e da publicação anual da Bibliographie de la France. Já os alemães se utilizaram dos catálogos das feiras do livro das cidades de Frankfurt e Leipzig, enquanto os ingleses e americanos compilaram um grande números de informações quantitativas de documentos do comercio livreiro, registros de alfândega, catálogos e bibliografias. A análise macroanalítica leva a generalização muito amplas, que comprometem a precisão no resgaste do estudo sobre o leitor.
A micronálise seria um tipo mais preciso de estudo, pois analisa os catálogos de bibliotecas particulares, descobrindo quem lia o que lia. Por volta de 1910, a França foi um dos primeiros países a contar com estatísticas sobre bibliotecas de particulares pertencentes a várias camadas da sociedade; desde nobres até criadores domésticos. Essas estatísticas são baseadas em inventários nem sempre muito exatos². Os inventários também foram utilizados na Alemanha no final de século XVII. Foram muito utilizados na Grã-Bretanha as listas de subscrição³. Além de pecar pelo excesso de detalhes, a microanálise esbarra num inconveniente: o fato de um livro estar numa estante particular não significa que ele foi lido, da mesma forma que muitos livros podem ter sido lidos sem terem sido comprados.
Conforme afirma Darnton (1992), apenas um historiador do livro foi “ousado o bastante” para assegurar que houve uma revolução na leitura: Rolf Engelsing declarou que o período que vai da Idade Média até pouco depois de 1750, lia-se repetidamente uma quantidade de livros muito pequena, ou seja, lia-se muitas vezes os mesmos livros, processo chamado de leitura intensiva. Na Inglaterra do século XIX, por exemplo, era de hábito possuir uma Bíblia, algum almanaque e uma ou duas obras de oração que eram lidas muitas vezes. A partir de 1800, a variedade de livros, novelas, romances e jornais provocou uma mudança no comportamento dos leitores que liam muito uma grande quantidade de livros.
Além de que lia e o que lia, para traçar o retrato do leitor de uma época é necessário saber como se lia, fator que é influenciado por diversos elementos de um contexto, pois em cada período da História ocorreram variações nos suporte de informação e, consequentemente a forma própria de utilizá-lo: desde 
__________________________________
¹ Exigência, definida por lei, de efetuar a entrega a um órgão público de um ou mais exemplares de toda a publicação editada em um pais. No caso do Brasil, esse órgão é a Biblioteca Nacional. 
² DARNTON (1992, P.209) encontrou informações do tipo “uma pilha de livros”. 
³ Listas de pedidos de livros por encomenda. 
O remoto volumen, que necessitava ser desenrolado para ser lido, até o códice, ancestral do livro moderno, que possibilitava virar página por página; desde a leitura narrada para um grupo de ouvintes até o surgimento da universidades. Quando a leitura silenciosa passou a ser comum.
Descobrir o comportamento do leitor não é tarefa fácil. Cada texto, cada leitura requer uma interpretação cada leitor entende de forma singular o significado de um texto. Escapa-nos o caráter sentimental da leitura, a experiência pessoal do leitor com o livro. Como o leitor lia? Isso é o mais difícil de precisar num estudo histórico sobre o leitor de uma época. Incontáveis motivos levam um leitor a ter interesse por uma obra. Para Darnton (1992) a leitura assumiu muitas formas em diferentes grupos de leitores de diferentes épocas. 
Homens e mulheres leram para salvar suas almas, para melhorar seu comportamento, para consertar suas máquinas, para seduzir seus enamorados, para tomar conhecimento dos acontecimentos de seu tempo, e ainda, simplesmente para se dividir. (p.2015)	
Essa busca para descobrir quem eram os leitores de uma época e o que liam, abrange também o estudo de bibliotecas particulares. Através do conhecimento de coleções particulares, como é o caso da presente pesquisa, é possível descobrir muito do universo intelectual do leitor, podendo também apontar outras facetas que não a da leitura, como por exemplo, qual era o pensamento de um indivíduo que viveu em uma determinada época ou ainda o que se pensa atualmente a respeito de um século já decorrido, aspectos que podem ser manifestados na escolha dos livros que compõem a coleção particular.
O capitulo seguir era tratar acerca das bibliotecas particulares no século XIX, período no qual, supõe-se, teve a coleção que está sendo considerada nesse estudo. 
 
2. BIBLIOTECAS PARTICULARES NO BRASIL NO SÉCULO XIX
“Toda biblioteca conserva a lembrança das que a procederam, e que talvez a tenham sonhado” (BARATIN & JACOB. 2000, p.17)
 Uma biblioteca particular é um testemunho das preferências e necessidades do proprietário num dado momento de sua vida, bem como das transformações pelas quais passou ao longo dela. Alguns autores afirmam que a coleção de livros evidencia a evolução cultural do seu proprietário, como, por exemplo, Darnton (1992) que certifica que o estudo de uma biblioteca particular pode revelar o perfil do leitor, mesmo que este não leia todos os livros que possui, e que leia muitos outros que não fazem parte do seu acervo particular. Só o fato do livro pertencer aquele acervo indica a predileção do proprietário e pode fornecer pistas sobre a maneira de pensar, seus valores e seu grau de interesse por determinado assunto. Conforme Jobim (2001) em seu artigo “Porque é importante pesquisar a biblioteca pessoal de Machado de Assis”, quando se estuda uma biblioteca particular, torna-se possível verificar a relação, coincidente ou não, entre as obras da coleçãoe aquelas apontadas na leitura como sendo os padrões de leitura da época; influências de determinado escritores; variedade de temas de interesse do proprietário e suas opiniões sobre o que foi lido através das anotações.
Além de revelar traços específicos do proprietário em questão, o estudo das bibliotecas particulares também pode, como afirma Cândido (1996), revelar elementos do período histórico vivenciado pelo leitor, pois a evolução da cultura de um indivíduo se evidencia nos livros que ele leu através desta cultura é possível esclarecer a história intelectual de um período.
Conforme Silva (2001) “As bibliotecas particulares constituem um campo riquíssimo de estudo que podem revelar tanto perfil intelectual de um certo leitor, como a formação da mentalidade de uma determinada época.” (f.20)
Um fato que não pode ser ignorado nos estudos de acervos particulares é que o fato de possuir livros pode ser um indicador social. Para Manguel, (1997) a simples posse de livros implica uma posição social e uma certa riqueza intelectual.
Na Rússia do século XVIII... um certo Sr. Klostermann fez fortuna vendendo longas fieiras de encadernações recheadas de papel velho, o que permitia aos artesões criar a ilusão de uma biblioteca. Em nossos dias, os decoradores enchem paredes com metros e metros de livros para dar ao ambiente uma atmosfera sofisticada...; os produtores de programas de entrevistas na televisão acreditam que o fundo de estante de livros acrescentam um toque de inteligência ao cenário... Tão importante é o simbolismo do livro que sua presença ou ausência pode, aos olhos do observador dar ou tirar poder intelectual de um personagem. (p. 242)
Muitas bibliotecas particulares eram, e ainda são, montadas com a única função de ornamento, os livros eram utilizados como peças de decoração pois, conforme Manguel (1997), a visão que se tinha dos livros (e que ainda persiste nos dias de hoje) é que eles tanto podiam indicar posição social elevada quanto um melhor nível de cultura.
No Brasil no início do século XIX, as residências começam a ganhar mobílias, instrumentos e espaços especialmente reservados para a leitura. Neste mesmo período, o ato de ler sofreu transformações, se tornando cada vez mais uma prática privada, realizada no interior dos lares. 
Estudo sobre bibliotecas particulares brasileiras e seus proprietários como realizado por Villalta (1997), revelam que os donos de acervos residenciais no início do século XIX eram os proprietários de terras e de escravos sacerdotes, médicos, comerciantes e servidores públicos.
Conforme Ferreira (2000), as principais bibliotecas particulares brasileiras do século XIX, pertenciam a profissionais liberais, e em maior escala a médicos e advogados. Essas bibliotecas apresentavam uma quantidade significativa de livros de uso profissional da leitura de origem francesa, o que, segundo a autora, reflete o currículo adotado pelas escolas e cursos universitários do Rio de Janeiro da época. Tais bibliotecas particulares apresentavam uma grande riqueza e variedade temática, o que, no entanto, não era verificado com muitas bibliotecas públicas do período.
Essa pluralidade do acervo era devido à amplitude da formação intelectual desses profissionais e à atuação de alguns em outras áreas que não a de sua especialização, como o jornalismo, a leitura e principalmente a política. Nesses acervos eram significativo o número de obras da antiguidade clássica e de filosofia mas a grande maioria dos títulos era referente a atuação profissional dos proprietários. Outros tipos de publicações como brochuras e periódicos não foram encontrados nesses acervos. Talvez, como explica Ferreira (2000), por se tratar de materiais baratos, esses outros tipos de publicação eram negligenciados em favor dos livros técnicos. A autora, porém, ressalta que as brochuras e os periódicos faziam parte do universo da leitura do século XIX, pois, segundo ela, muitos materiais de leituras que circulavam nesse tipo de publicações como romances e poemas, eram bastante consumido neste século. Esse mesmo estudo ainda aponta uma grande preferência pelas obras francesas de autores como: Corneille, Racine, Moliére, Rosseau, Victor Hugo, Alexandre Dumas, Eugène Sue e Ponson du Terrail.
Souza (1997) afirma que aqueles que eram ligados às atividades associadas a propriedade da terra tinham bibliotecas que se limitavam as obras devocionais e litúrgicas – sermões, missais, livros de santos e orações. Em alguma dessas “livrarias” particulares, acrescentavam-se, em menor número, manuais didático e obras de literatura, história e medicina. Nem todos os proprietários de terra, porém, tinham bibliotecas com esse perfil, como, por exemplo, na região de São João Del Rei, os inconfidentes José Aires e José Rezende Costa:
o primeiro reunia uma obra didática e três de medicina, e o segundo vários livros de literatura (os franceses Boileau, Fénélon, Moliére, Racine, Voltarie e Marmontel, e os antigos Cícero e Quintiliano e Horácio) e um de filosofia (Genovesi) (SOUZA, 1997, p.364).
Conforme Souza (1997), a maior biblioteca particular brasileira do século XIX pertenceu 
Ao Padre Francisco Agostinho Gomes, na passagem do século XVIII para o século XIX (que) reunia, na cidade da Bahia, a melhor e maior livraria particular do Brasil bem então, composta por milhares de obras entre títulos de Lavoisier, Buffon, Thomas Paine, William Robertson, a Encyclopédie de Diderot e D´Alembert e títulos variados em língua inglesa e francesa sobre história natural, economia, política, viagem, filosofia (p.365)
Existiam também bibliotecas pequenas como a do estudante Francisco de Veras Nascentes, que em 1808, reunia catorze livros, em sua maioria didáticos e do torneio que escondeu Tiradentes refugiado, Domingos Fernandes da Cruz, que possuía uma cartilha de 7 livros devocionais. 
Apresentado esse breve panorama das bibliotecas particulares no Brasil, o próximo capítulo aborda o tipo de leitor considerado nesse estudo: a mulher do início do século XIX. 
3. MULHER NA SOCIEDADE DO SECULO XIX
“Eram reconhecidas como virtudes essenciais ao sexo feminino a fraqueza, a sensibilidade, a doçura, a indulgência, o recato e a submissão” (CUNHA, 1999, p.15)
Durante o colonialismo no Brasil a mulher era a principal responsável pelo funcionamento do espaço doméstico. A administração da casa abrangia muitas atividades. A mulher branca da casa-grande desempenhavam um papel importante no comando e na supervisão de todas as tarefas que necessário fossem desenvolvidas no lar.
 A senhora não dirigir apenas o trabalho da escravaria na cozinha, mas também na fiação, na tecelagem, na costura; supervisionava a confecção de rendas e o bordado, a feitura da comida dos escravos, os serviços do pomar e do jardim, o cuidado das crianças e dos animais domésticos, providenciava tudo para o brilho dela atividades comemorativas que reuniam toda a parentela. (SAFFIOTI. 1979, p.170)
Segundo Souza (1997), Gilberto Freyre imortalizou em Casa grande & senzala algumas cenas domésticas em que encontramos sinhás entrando e saindo das cozinhas dos engenhos, dando ordem ás escravas e fiscalizando faina doméstica. São elas que, com ou sem o auxílio das escravas, bordavam ricamente a roupa de cama e mesa da casa, as toalhas redondas da mesa, as almofadas de cetim e os mosquiteiros que protegiam dos insetos, A fiação de algodão para a confecção de roupas masculinas, femininas e dos escravos, e o preparo do sabão (com cinzas de vegetais queimados, como o bambu, sebo e gordura vegetais) vassouras (feitas de piaçaba) espanadores (feitos com penas de animais) redes, esteiras, combustíveis para os candeeiros; tudo isso fazia parte da rotina das mulheres nas grandes propriedades. Elas utilizavam o fuso, a roca e os teares de madeira para a tecelagem de fibras como o coroatá (fibra vegetal também conhecida por gravatá) o buriti e o tucum, (espécies de palmeira).
Segundo Souza (1997), mulheres de todas as origens faziam rendas para adornar redes, lençóise demais panos caseiros. “O trabalho manual (...) sempre foi um recomendado às mulheres pelos moralistas (...) como forma de se evitar a ociosidade e consequentemente os maus pensamentos e ações” (p.197)
A falta de produto de primeira necessidade estimulou a produção doméstica no sítio e na fazenda. Os doces eram preparados pelas escravas mas às vezes a senhoras faziam doces para ostentar suas especialidades as visitas e também enviavam-os, caprichosamente embrulhados aos amigos. Essas eram uma das poucas tarefas realizadas na cozinha pela mulher branca. O preparo das refeições diárias ficava, na maior parte das vezes, a cargo das escravas.
A urbanização, que se processa intensamente a partir da segunda metade do século XIX, e a industrialização que recebeu o seu maior impulso durante os anos 30 daquele século foram “processos de notáveis repercussões na organização da família”. (SAFFIOTI, 1979, p.178)
A vida da mulher da camada senhorial sofreu modificações devido a esse o processo de urbanização. Não foram mudanças profundas, haja visto que não trouxe alterações em sua posição social nem na educação que recebia, mas ela já não vivia tão reclusa.
Se na primeira metade do século XIX a mulher quase não saia de casa, a não ser para ir à missa; sua existência transcorria, quase sempre, na casa paterna e por extensão na casa do marido, gradativamente esses costumes modificavam-se na segunda metade do século XIX. (MORAIS, 1996, f.85)
 
A vida nas cidades oferecia mais alternativas de convivência social, nas festas, nas igrejas, nos teatros; a família patriarcal perdia sua dimensão rígida, permitindo a mulher algum desembaraço de atitude; o impacto de novas tecnologias – bonde, eletricidade - levou a uma reorganização do tempo e das atividades femininas, proporcionando, nas classes mais abastadas, espaços para o lazer e para o ócio. Durante a passagem do século XIX para o século XX, o Brasil, principalmente na cidade do Rio de Janeiro, foi marcado por um processo de transição devido a lenta imposição de uma nova ordem burguesa, adequando a economia nacional ao capitalismo. A cidade passava por um processo de remodelação devido ao crescimento do comércio e investimentos estrangeiros no país. Houve mudanças tanto no espaço urbano quanto nos hábitos cotidianos que copiavam o modelo europeu. As relações de trabalho baseadas na escravidão passaram a ser relações de trabalho livre e assalariado, foi adotado o sistema político republicano e surgiram correntes de pensamentos que transformaram comportamentos. A política higienista, elabora pela medicina social, valorizava o papel da mulher enquanto o responsável pela organização da casa, da família e pela manutenção da saúde do lar. Tal discurso teve muita importância na formação de um consenso de ideias sobre a família e sobre a mulher. O discurso higienista propunha modelos de comportamento, ressaltando a ideia de inferioridade da mulher perante o homem
Com base na utilização de todo um instrumental tido como científico, próprio ao racionalismo que embasava os novos tempos..., o discurso higienista, apesar de promover a mulher na família - mesmo que através da função primordial de mãe - e a sexualização das relações conjugais, contribuiu justamente para cimentar a antiga desigualdade e a hierarquização entre os sexos, característica do patriarcalismo. A inferioridade da mulher, ou a superioridade masculina, fundamenta-se em pressupostos considerados cientificamente comparáveis. (MAGALDI, 1992, p.62)
 
As ideias higienistas repercutiram em vários setores do mundo intelectual brasileiro no discurso jurídico, na imprensa feminina, no movimento operário e nas manifestações literárias da época, principalmente nos romances.
Para Magaldi (1992), os romances brasileiros, principalmente os de Machado de Assis e Aluísio Azevedo, “são produtos sociais” historicamente localizados, que representa representam importantes testemunho da sociedade em que se situa em que se relacionam com o mundo intelectual de seu tempo”. (1992, p.59). Nas páginas desses romances os autores pintam em meio a ficção, um retrato fiel do Rio de Janeiro na virada do século XIX para o século XX.
Os romances urbanos no Rio de Janeiro no século XIX também davam mostra da imagem da mulher da época, ou pelo menos, da imagem feminina considerada correta pela sociedade. Bernardes (1989), em sua obra Mulheres de ontem? fez uma compilação das imagens de mulheres que aparecem em uma grande parte dos romances brasileiros. Segundo a autora, muitos escritores brasileiros como Aluísio Azevedo, Joaquim Manuel de Macedo e José Alencar, difundiam em seus romances o espectro da mulher ideal. Sempre como a umas boas, generosas e puras. De temperamento fácil e obediente. De feições sempre belas e delicadas, e sempre muito bem educadas: sabiam ler, escrever, tinham noções de religião e, o máximo de elegância entre as donzelas, sabiam tocar piano e falavam francês. 
3.1 A mulher e o trabalho
Qual o crescimento do capitalismo começaram a surgir, principalmente na Europa, oportunidade de trabalho fora do lar para a mulher da pequena burguesia. Eram oportunidades ilimitadas: costureira, professora, preceptora. Na verdade os trabalhos externos realizados pela mulher não passavam de variações das mesmas tarefas que ela já tinha no lar, ou seja, remetiam sempre a serviços manuais e ao cuidado de crianças. Embora esses trabalhos implicassem, perante a sociedade da época, em desprestígio de classe, consistiam no primeiro passo para o trabalho feminino remunerado. A Mulher trabalhadora recebia um ordenado significa mente menor do que o homem. O que passou a ser um negócio vantajoso para as grandes indústrias, principalmente as de ramo têxtil, que passaram a procurar mão-de-obra feminina. A mulher operária nem sempre foi bem reconhecido nas indústrias; houve resistências por parte dos trabalhadores homens pois a penetração em massa de mulheres nas indústrias envolvia a substituição do trabalho masculino por trabalho feminino pior remunerado. Segundo Saffioti (1979), a penetração em massa de mulheres na indústria francesa, na segunda metade do século XIX, trouxe a revolta de trabalhadores franceses das indústrias gráficas que deflagravam greve toda a vez que uma mulher era admitida numa das empresas do ramo. Atitudes desfavoráveis ao trabalho feminino, como essa, eram ocasionados em grande parte pelo pensamento que ligava, de maneira indissociável, a mulher a esfera do lar e do privado.
 O magistério era a ocupação feminina por excelência pois o ensino de crianças era visto como um prolongamento da funções maternas, chegando a ser um longo tempo a única profissão feminina plenamente aceita pela sociedade.
O casamento era a forma mais digna e mais fácil da mulher alcançar uma posição social mais elevada.
O casamento era uma espécie de favor que o homem conferia a mulher, único meio de adquirir status econômico e social para aquela que não se casava era a mulher fracassada e tinha de se conformar com a vida cinzenta e solteirona, acompanhando a mãe a visitas, entregando-se aos bordados infindáveis, a educação dos sobrinhos (SOUZA, 1987, p.90).
Havia também a possibilidade de realizar diversas atividades remuneradas como lavar o passar roupas para fora, das aulas de piano ou de alguma língua estrangeira, vender o produto de trabalhos manuais, como bordados, por exemplo, e até mesmo remendar roupas.
Para as mulheres da época, não conseguiram casamento que o de mais temível e desonroso poderia aliás acontecer, pois não se casando tinham seu prestígiona sociedade diminuído e, dedicando-se ao trabalho remunerado desciam imediatamente de classe:
A própria profissionalização da mulher proveniente dos segmentos sociais médios e dominantes, representada principalmente pela função de professora, era, naquele contexto social, uma hipótese remota, apenas admitida como solução em um caso extremo de necessidade muito imperiosa, e mesmo assim, significando quase que uma vergonha para a mulher ou a família que adotasse MAGALDI,1992, p.68)
 A função de ganhar o pão era vista como uma função exclusiva do homem e, portanto, uma desonra para a mulher que tivesse de fazê-lo
Como trabalho era visto quase uma quase uma humilhação para mulher, as únicas opções dignas de sustento para ela consistiam no casamento ou na carreira religiosa. Com efeito, os pais que não conseguiam bom casamento para as filhas já pensavam da idade de casar as internavam em conventos, o que, além de garantir um certo prestígio para família (eram muito bem vistas no Brasil as famílias que possuíam parentes religiosos), resolvia o problema de sustento da filha solteira. Também existiam mulheres que se tornavam freiras por opção por ser também a única maneira de evitar a submissão ao pai ou ao marido. A carreira religiosa poderia ser, ainda, a única opção também para a mulher que transgrediram as normas da boa moral. Tanto as moças solteiras que não apresentavam a boa conduta ou as mulheres casadas que tinham sua finalidade posta em xeque eram internadas em conventos pelos pais e maridos; está se apresentava como a única solução para resgatar-lhes a dignidade perdida. Esse costume foi muito praticado no Brasil em especial no período colonial.
3.2 A mulher e a moda
Souza (1987) garante que para mulher do século XX a moda era a grande arma na luta entre os sexo e na afirmação do indivíduo dentro do grupo. Conforme disse o novelista e poeta francês, Anatole France (1844 – 1924), a moda é o retrato mais fiel de uma sociedade: 
Se me fosse dado escolher no amontoado de livros que serão publicados em anos após a minha morte, sabe o que eu escolheria? (...) Eu escolheria tranquilamente, meu amigo, uma revista de moda para ver como as mulheres estarão vestidas no século após meu falecimento. E estes pedacinhos de tecido me diriam mais sobre a humanidade futura do que todos os filósofos, romancistas, pregadores e sábios.4
As principais atividades de lazer permitidas a mulher burguesa eram frequentar bailes e salões, ler romances e preocupar-se com sua própria vestimenta. O casamento, como era a alternativa mais valorizada para a mulher do século XIX, favorecia o desenvolvimento da arte de seduzir através do vestuário para conseguir conquistar um bom partido. Não só a moda, que era bastante comentada em revistas femininas, como por exemplo, o Jornal das Famílias, mas também as regras de etiqueta estavam bem acessíveis em manuais de boas maneiras, pois era imperioso se fazer presente, mostrar-se (principalmente em ocasiões festivas), sem transgredir nenhuma regra da moral. Assim, essa preocupação com a aparência era também um dos temas prediletos de leitura das mulheres.
A moda feminina do século XX foi marcada pela tendência de mostrar-escondendo, que se dava através da utilização de determinados tecidos, véus transparentes, penteados que prendiam os cabelos deixando o pescoço à mostra.
O interesse pela moda era mais uma maneira da mulher burguesa de fugir ao ócio ao qual estava sujeita, principalmente nos núcleos urbanos. O homem podia (e devia) interessar-se pela profissão, pelas artes, pelas ciências, pela espiritualidade. A mulher cabia somente o cuidado com a casa, com os filhos com a própria pessoa.
A moda, conforme Souza (1987), era o “único meio lícito de expressão”, assim, continua autora, “a mulher atirou-se a descoberta de sua individualidade... criando assim uma obra de arte com o próprio corpo” (p.100), utilizando-se de artifícios como espartilhos que mudavam a silhueta, anáguas que aumentavam os quadris e a crinolina6 usada para armar as saias e acentuar a cintura.
Tal esmero no vestir não passava despercebido. Muitos romancistas da época descreviam minuciosamente o traje de suas personagens femininas: Verdadeiros peritos de em matéria de roupa feminina, comprazem-se de descrições detalhadas ... conhecem o nome das fazendas, a bela nomenclatura das cores...” SOUZA, 1987, p.72)
3.3 A mulher e a educação 
A educação no Brasil, conforme Almeida (1998),” ... sempre foi vista como descaso pelas famílias, pela sociedade e pelo poder público” (P.56). Nas casas mais abastadas, a jovens recebiam de professores particulares algumas noções elementares, mais dedicavam-se sobretudo as prendas domésticas e a aprendizagem de boas maneiras.
Mesmo essas moças privilegiadas tinham reduzido acesso à leitura, pouco ou Nada sabiam de história ou geografia, possuíam vagas noções de literatura e cálculo, dedicavam-se a aprendizagem de uma língua, de preferência o francês, vivendo nos limitados horizontes domésticos, aguardando o casamento que deveria ser sua suprema aspiração e para o qual eram preparadas por toda vida. (ALMEIDA, 1998, p. 56) 
____________________________
5 coletes feitos de barbatanas de baleia ou tubarão, usadas para modelar a cintura e que machucavam a pele e dificultava a respiração da mulher.
6 tecido resistente utilizado como forro.
A partir do século XIX, a educação da mulher passou a ser confiada também a colégios particulares. Várias tendências influenciaram a educação nesse período. 
As principais correntes de pensamento que influenciaram a educação da mulher ao longo do século XIX foram:
· A Igreja Católica impedir o progresso da educação feminina que poderia resultar na degeneração da família 
· O Liberalismo defendia a instrução feminina, não com vistas a emancipação da mulher, mais para prepara-la e adequá-la às suas funções de mãe e esposa. ;
· O Positivismo proposto pelo filósofo francês Augusto Comte (1798-1857), reivindicava para as mulheres as mesmas oportunidades dadas aos homens em educação e direitos, porém limitava os alcances a essa educação e a esses direitos.
 Almeida (1998), por sua vez, considera o ideal divulgado pela Igreja Católica e o positivismo como recorrentes de pensamento que mais influenciaram na educação feminina.
No início do século XIX, a Igreja Católica estava mais preocupada em poupar a jovem mulher do contato com tudo o que era impuro, afinal ela no futuro seria a rainha de um lar e como poderia ela proporcionar a aura de pureza e harmonia que deveria existir em um lar cristão se tivesse ela mantido contato com que não era puro? Devido a esses fatores, ela era preservada dentro de casa, no seio da família, para não contaminar sua personalidade com o mal do mundo externo e também era impedida de ter contato com a literatura, então considerada como torpe. Mais ainda: para assegurar com total certeza que a mulher permanecia longe dessa literatura, a igreja defendia a ideia de que parar a mulher bastava o mínimo de instrução, para que pudesse ler as obras de devoção e nada mais.
No século XIX a Igreja Católica combateu o modernismo e apontou o período medieval como modelo para ser seguido (MANOEL, 1996). Esse combate ao mundo moderno inclui a censura à imprensa periódica e a edição de livros, o que originou a criação do Index, lista de livros proibidos e condenados. Para Igreja Católica, tais livros poderiam ser prejudiciais ao espírito humano, principalmente as mentes mais jovens. Segundo Manuel (1996), “esse empenho católico para educação em especial a educação feminina iniciou-se para volta de 1850.” A partir dessa data, o reforço da visão do papel da mulher como formadora de futuros cidadãos, pois era ela a primeira educadora das crianças, ocasionou mudanças de modo de pensar dos religiosos católicos, conforme ressalta Almeida (1998):
essa educação, que, a princípio... fora negada sob o pretexto de que conhecimentoe sabedoria eram desnecessários e prejudiciais a sua frágil constituição física e intelectual, acabou por revelar-se desejável a partir do momento em que a mulher passou a ser vista, na sociedade da época, como a principal mantenedora da família. (p.33)
Para a Igreja, no entanto, era necessário educar a mulher sim, mas da maneira “correta” e, de que acordo com os religiosos, só a própria Igreja poderia fornecer a educação mais adequada.
A primeira escola para educação feminina criada pela Igreja Católica do Brasil foi aberta em 13 de novembro de 1859 e chamava-se de início, “Casa de Educação de Nossa Senhora do Patrocínio”, sendo denominada mais tarde “Colégio de Nossa Senhora do Patrocínio”. Estabelecida na cidade de Itú, interior de São Paulo, foi criada pelo Bispo do Estado e dirigida pelas irmãs de São José de Chamberry (p.62)
Nos colégios mantidos pela Igreja Católica em São Paulo, entre 1859 e 1888, ensinava-se Francês, Instrução religiosa, Gramática Portuguesa, Aritmética, Geografia Cosmografia, Botânica e História Natural, Noções de Física, História Sagrada e Profana, Caligrafia, Leitura (Gênero Epistolar) Trabalhos Manuais, Obras de gosto (confecções de flores, tapetes, bordados e outros trabalhos de agulhas), Lições Especiais, Inglês, Piano, Alemão, Canto e Desenho. Tudo isso era dividido em oito anos de estudos.
 A educação da mulher é inferior à do homem e a escola mista, no final do século XIX, era inconcebível para a sociedade da época.
Essa diferenciação na educação dos dois sexos era considerada fundamental para a garantia da estabilidade moral e social.
Na Encíclica Divini Illius Magistri, do Papa Pio XI (1927), encontra-se este trecho, que foi citado por Manuel (1996):
 O criador ordenou a dispôs a convivência perfeita dos dois sexos somente na unidade do matrimônio e gradualmente distinta na família e na sociedade. Além disso, não há, na própria natureza que o fez distintos em inclinações a e aptidões, nenhum argumento de onde se possa deduzir que possa ou deva haver promiscuidade e muito menos igualdade na formação dos dois sexos (p.32) 
O ideal positivista, diferente da Igreja Católica, assegurava uma educação mais ampla para a mulher mas, como afirmavam alguns intelectuais liberais da época, como Teixeira Mendes, Tito Lívio de Castro e José Veríssimo, essa educação não deveria ultrapassar os limites da formação de donas-de-casa e mães de família, garantido, conforme Almeida (1998), a manutenção do papel esperado para a mulher na sociedade:
O pressuposto da inferioridade biológica e intelectual feminina levou o positivismo, no século XIX, a considerar natural ou alicerçamento dos homens no poder, baseados nas diferença natural entre os sexos. (p.41) 
O pensamento positivista pregava uma diferença básica entre o homem e a mulher, tanto física intelectualmente, como também de caráter. Segundo essa doutrina, a inteligência do homem e da mulher era diferente mas também com complementares. Já que a forma de aprendizado da mulher não era a mesma do homem, então a educação deveria ser a mesma para ambos. A principal razão para que a educação da mulher pegava pelo positivismo era o fato que a mãe é a principal e primeira educadora dos filhos e não poderia passar a estes uma boa educação se não a tivesse.
Cronistas e viajantes que passavam pelo Brasil afirmavam que as mulheres não eram encorajados a escrever e nem a ler algo a mais do que um livro de rezas no qual deveria saber algumas preces decor, sabia bordar, fazer crochê, tocar piano e aprender um pouco de música ou francês. A isso resumia-se a educação da jovem brasileira. Pais e maridos eram os principais interessados na falta de instrução da mulher, pois temiam que ela utilizasse o poder da leitura e da escrita para, entre outras coisas, manter correspondências com amores clandestinos. Cabia ao pai ou marido zelar pela dignidade da mulher, por isso a mantinham presa em casa, só saindo periodicamente para cumprir os deveres religiosos. Muitas mulheres conseguiram burlar essa vigilância fazendo uso de criatividade das suas sutileza, como por exemplo, através da construção e utilização da linguagem das flores. Essa era uma linguagem simbólica baseada nas diferentes espécies de flores, de um modo que é determinada a flor oferecida ou enviada significava um sentimento, pensamento ou até uma ordem. A combinação de diversas flores ou folhas constituíam mensagem que poderiam expressar uma hora do dia, um local de encontro, um pedido.7 Porém, uma vez que a educação feminina evoluiu, essa linguagem se tornou obsoleta e foi sendo substituída pela escrita. 
Muitos estrangeiros de passagem pelo Brasil estranharam a reclusão da mulher brasileira, como por exemplo, Eduard Manet citado por Lajolo & Zilberman (1998), que fez a seguinte observação: 
(as brasileiras) só podem ser vista quando vão à missa ou à tarde após o jantar quando se põe a janela. Nunca saem sós, estão sempre acompanhadas de sua negra ou então de seus filhos, pois aqui casa-se aos 14 anos ou menos. (p. 243)
A vinda da Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro, no ano de 1808, trouxe algumas oportunidades para melhorar a instrução da mulher brasileira. Senhoras portuguesas e francesas montaram colégios particulares onde ensinavam costura e bordado, religião, bases de aritmética e algum idioma. Mais tarde, professores alemães passaram a ser contratadas para educar as filhas dos nobres aristocratas rurais.
Uma preceptora famosa por deixar suas impressões sobre o Brasil registradas através de uma vasta correspondência foi alemã Ina Von Binzer (1994), que assinava suas cartas com o pseudônimo Ulla Von Eck. Ela visitou o Brasil às vésperas da abolição da escravatura ensinou crianças de fazendas do interior dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo e um colégio no Rio de Janeiro, que possivelmente foi o “Lebre-Rouannet”. Ela conta, que de uma forma bem-humorada, sua sofrida experiência para ensinar alemão e francês as crianças que nem sempre estavam dispostas a aprender.
___________________________________
7 De acordo com MORAIS (1996), alguns exemplos podem ser oferecidos: a rosa significava amor, a escabiosa corresponde a saudade, a alfazema fresca exprime ternura e a alfazema seca, o ódio; também a fruta de nome de cajá era utilizada, devido a significação de cada uma de suas silabas: cá (aqui) e já (agora), para enviar mensagem “venha imediatamente”.
A educação que era ministrada as jovens brasileiras copiava o modelo francês, que destacava o aprendizado de que era muito imprescindível para boa convivência em sociedade: tocar piano, dançar, aprender a língua francesa a ler romances, construindo culturalmente uma imagem de uma mulher burguesa. Von Binzer (1994) crítica essa necessidade de que o povo brasileiro possui na época de querer “parecer” culto, cultivando uma experiência superficial de cultura que na verdade escondia a sua falta de desconhecimento: 
Tudo refletia a tônica francesa Modas mobiliário e vocabulário segundo Cunha estudar em colégio de procedência francesa era considerado o destino e superior os colégios franceses mais famosos e mais procurados eram o colégio Sacre currier e Colégio Sion ambos os colégios foram fundados em fins do século XIX por congregações religiosas enfatizavam a educação Religiosa e o aprendizado de trabalhos manuais o colégio Sion fundado em 1888 na Cidade do Rio de Janeiro terão mais procurado pelas famílias mais abastadas para a educação das filhas procurando pelas famílias mais abastadas nele estudavam meninas não só do Rio de Janeiro mas de várias partes do Brasil principalmente de Minas Gerais São Paulo e Curitiba a língua falada a maior parte dos textos e o modelo pedagógico Eram todos francesas as meninas que lá se formavam eram conhecidas pelo francês Impecável pela obediência aos superiores e pela austera formação Cristã de acordo com Almeida 1998 São Paulo a partir de 1830 foi a província que apresentou maior crescimento no processo de urbanização e industrialização e começou a diversificarse demais províncias do Brasil em termos de desenvolvimento sócio-econômico as filhas da oligarquia Paulista recebiam uma educação de pouco mais espera com Nações de instrução artística uma leve e cultura literária e as normas de etiquetas essenciais para convívio social sua educação passava se na residência com o concurso de professores estrangeiros e brasileiros ou em escolas particulares Maria de Barros que viveu no Século XX e cujo pai era um homem de prestígio político e donos de terras e engenhos e Cafezais de Liliam a situação social e econômica da família da oligarquia Paulista e da educação ministrada jovens suas memórias foram publicadas em 1969 e alguns trechos podem ser encontrados no livro vida cotidiana de São Paulo no século no século XX 1998 organizado por Carlos de Moura no qual se encontra a transcrição literal de alguns depoimentos: 
Zeloso da educação a instrução dos filhos o comendador B. procurava proporciona-lhes os meios de obter cultura, cousa difícil então, pela coerência de bons colégios. Era costume, por essa época as famílias abastadas mandarem estudar na Europa e os seus filhos (...) Para lá seguiram, pois, os três rapazes mais velhos, tendo sido internados em colégios, em quando as meninas estudavam com a governanta alemã, denominada Mademoiselle. (p. 93)
Em suas reminiscências, Maria Paz de Barros, admite que essa educação a domicílio possuía algumas falhas como a pouca ênfase dada a Língua Portuguesa: 
As lições ministradas por Mademoiselle eram todas em francês e alemão... Enquanto a gramática francesa era decorada afundo, limitava-se o ensino de português a minguados os estudos do pequeno volume da Enciclopédia, As aulas começavam cedo e cessavam às duas horas para o jantar, com um pequeno intervalo ao meio-dia. Depois dessa refeição, sentavam-se as meninas, dando-se aos trabalhos de agulhas. Em voz alta e distinta, Dindinha (madrinha de uma das meninas) fazia então a leitura de algum livro instrutivo (p. 94).
É possível perceber a influência do modelo francês na educação, no qual predominava o aprendizado voltado para o convívio social.
A partir de 1823, a Constituição passou a segurar a educação feminina, segundo Saffioti (1979, p.192), nos seguintes termos: “o melhor tratado de educação física, moral e intelectual para a mocidade brasileira de um ou outro sexo”. Mas a própria legislação admite as diferenças curriculares para as escolas masculinas e femininas. O projeto de lei 1827 assinado pelos deputados Januário da Cunha Barbosa, José Cardoso Pereira de Mello e Antônio Ferreira França, visando a organização do ensino primário público do Império, isenta a mestra da necessidade de ensinar nações de geometria e restringe o ensino da aritmética nas escolas de meninas as quatro operações. Embora essa fosse a primeira legislação que assegurava o direito da mulher a instituição, ela proibia o acesso a liceus, ginásios e academias sendo esses reservado somente a população masculina. Tudo isso era uma de decorrência da ótica vigente sobre a mulher e seu papel social. Mesmo na escola a mulher era incentivada a se desviar da Leitura em favor dos trabalhos manuais, que eram considerados mais importantes para sua formação.
 As raras iniciativas oficiais no sentido de oferecer educação profissional as meninas tendiam a levá-las profissionalizar-se como professoras primárias.
A possibilidade de aliar ao trabalho doméstico e a maternidade uma profissão revestida de dignidade e prestígio social fez que “ser professora” se tornasse extremamente popular entre as jovens e, se, a princípio, temia-se a mulher instruída, agora tal instrução passava a ser desejável, desde que a normatizada e dirigida para não oferecer riscos sociais. (ALMEIDA, 1998 p.28) 
As mulheres que se manifestassem interesse pelas demais profissões que fugissem aos padrões de todos femininos eram tenazmente criticada pela sociedade, sob os mais variados argumentos desde o risco de prejuízos a sua saúde e a dos futuros filhos, a desagregação da família e as consequências para a própria sociedade e para a pátria. Argumentos semelhantes eram usados para impedir o acesso das mulheres ao curso superiores. Mesmo assim, muitas formavam-se médicas, dentistas, engenheiras e advogados. Porém, se conseguiam exercer sem problemas a profissão, é uma interrogação que permanece.
 A primeira Escola Normal em São Paulo, criada pela lei nº 34 de 16 de março de 1846, foi destinada apenas ao sexo masculino, tendo sido instalada numa sala de um edifício na Praça da Sé. No ano seguinte, pela Lei nº 5 de 16 de fevereiro de 1847, foi criada uma Escola Normal Feminina no Seminário das Educandas que “possuía um programa restrito composto por Gramática Portuguesa, Aritmética, Doutrina Cristã, Francesa e Música. (ALMEIDA, 1998, p. 58). A escola funcionou menos de dez anos e foi suprimida pela Lei nº 31 de 7 de maio de 1856. Foi criada novamente em 1874, pela Lei nº 9 de 22 de março do mesmo ano, e passou a funcionar em uma sessão masculina e uma feminina. Em 1880, a terceira Escola Normal foi inaugurada em São Paulo, com aulas mistas. A partir de então 
Ganharam força os movimentos pelo aprimoramento da educação das mulheres, na esteira da criação, do eixo Rio de Janeiro - São Paulo e em Porto Alegre, das escolas norte-americanas protestantes e das ideias republicanas, positivas (ALMEIDA, 1998, p. 56)
Para Almeida (1998, p. 64) “a inversão profissional das mulheres no magistério”, apesar de bem vista pela sociedade, “não foi aceita tranquilamente pelos homens que exerciam a profissão por que isso significava a perda de um espaço profissional” que de início pertencia ao sexo masculino. A entrada das mulheres na Escola Normal foi gradativa até culminar em uma época na qual a grande maioria de matriculados era de mulheres. “Não resta dúvida de que o segmento masculino abandonou o magistério ao longo das décadas, principalmente no ensino primário, senão e se não estaria hoje quase totalmente ocupadas pelas mulheres” (ALMEIDA 1998, p. 66).
 A instrução feminina continuou precária, tanto nas escolas públicas quanto nas particulares, fazendo com que a Escola Normal se torna-se uma das principais (e escassas) oportunidades de continuação dos estudos pela mulher.
 Como é possível perceber, a escola não incentivava muito a leitura feminina, valorizando mais os trabalhos de agulha e um mínimo de instrução que seria útil ao seu papel de mulher - mãe – esposa. Antes do surgimento das escolas para meninas, a sociedade já possuíam uma opinião consensual sobre a educação da mulher, e continuou persistindo durante muitos anos, mesmo após sua admissão no ensino formal, Essa ideia limitava o acesso da mulher a leitura nos grandes clássicos e das obras políticas, por exemplo, pois os estudos mais elevados eram reservados ao intelecto masculino. Para a mulher ficavam as obras e assimilação fácil, como o romance e o folhetim, dois gêneros muito populares no século XIX que serão tratados adiante.
 
 
4. A LEITORA BRASILEIRA NO SÉCULO XIX E INICIO DO SÉCULO XX
“A leitora é o que transforma em obra as letras, frases e enredos.” (TELLE, 1997, p. 402)
No início do século XIX,a vida cotidiana das mulheres brasileiras era bastante restrita, inclusive no que diz a respeito à leitura, conforme demonstrava o testemunho de Maria Paes de Barros:
Sendo uma instituição muito elementar, por não haver colégios para o sexo feminino e no início do século XIX, nem tampouco livrarias, as ocupações das meninas cingiam-se a vida domésticas. Raramente lhes chegava alcance um livro, exceto o de missa ou uma dessas narrativas de forma universal, como o Paulo e Virgínia de Bernardin de St. Pierre, que liam, então com ávido interesse (...) Pode-se dizer que este livro, do qual algumas de nossas avós citavam de cor algumas páginas inteiras, foi as suas delícias, o motivode suas conversações e de lágrimas enternecidas. (MOURA, 1998, p. 91) 
O relato de Viajantes também retratavam o cotidiano e o acesso à leitura das mulheres no início do século XIX. Um deles é um relato de John Luccock, que viveu no Brasil entre 1808 e 1818, dá mostras da escassez de conhecimentos que disponham as brasileiras:
... as mulheres das classes altas e médias, e especialmente as mais moças, vivem muito (...) reclusas. O pouco contato que os costumes com elas permitem, dentro em breve, põe a nu a sua falta de educação e instrução (...) o saber ler para elas não devia ir além de livro de rezas, por isso seria inútil, nem tampouco se desejava que escrevessem a fim de não fizessem, como sabiamente se observava, uma mau uso dessa arte. (p. 68)
Ao longo do século XIX, transformações econômicas e principalmente sociais trouxeram, conforme Telles (1997), “mudança se acabaram afetando o mundo todo em virtude das características do processo de expansão” (p. 401).
Essas transformações mudaram também o cotidiano das pessoas da época, as regras em sociedade, o comportamento, o relacionamento com o próprio corpo. A reforma educacional, promovida pela Igreja no século XVII, foi então apoiada pelos membros da classe burguesa que aí a encaravam como uma forma de garantir um lugar na sociedade no futuro para seus filhos. Antes do surgimento da escola, os próprios pais eram os responsáveis pela educação e preparação dos filhos. A partir da ascensão da burguesia, iniciam-se as discussões sobre a educação da mulher. A sociedade da época havia chegado ao consenso que era necessário uma educação para as mulheres, mas com a intenção de prepara-las unicamente para as lides do lar e a criação das crianças. Tais transformações repercutiu na literatura que começou a apresentar novos gêneros literários, mais eu gosto das mulheres. Editores e vendedores, sempre atentos a novos contingentes de leitores, começaram a ver a mulher uma consumidora em potencial de ais obras pois, sendo-lhes aliás vedada a atividade pública, eram obrigadas a ficar em casa, recorrendo assim ao hábito da leitura para escapar do ócio que estavam destinadas, principalmente as mulheres das famílias mais ricas.
O Romantismo, movimento no qual o sentimento é predominamente a razão clássica (CUNHA, 1999), destacando a imaginação ao invés da razão firma-se durante o século XVIII e com ele, a associação mulher/romance. É no século XIX que o Movimento Romântico atinge o seu auge, refletindo sua temática em todos os meios culturais. O amor, a emoção, a idealização da mulher, tudo isso passa a fazer parte da pintura, onde o começam a aparecer imagens e cenários com mais cor e movimento, e da leitura, trazendo romance como principal marco dessa fase. Foi no século XIX que a difusão do romance ganhou força e cresceu na mesma medida que a acessão da sociedade burguesa. 
No Brasil, a vinda da Corte Portuguesa trouxe reformas como a abertura dos portos, o livre comércio e novos hábitos, inclusive de leitura, pois nessa época os leitores brasileiros começaram a consumir em larga escala romances e novelas francesas e inglesas, além dos folhetins. Tais obras eram mais populares entre as mulheres, como afirma Martins (1989):
A leitura feminina deliciava-se com revistas e figurinos, mas também apreciava as poesias de Gonçalves Dias, Casimiro de Abreu, Castro Alves e os romances de Joaquim Manuel de Macedo e José de Alencar, incluindo para algumas delas a leitura no original de Mme. de Stael, Bossuet e das cartas de Mme. de Sevigné. (p. 5).
Outro relato de viagem de autoria dos romances de Daniel Kidder e J. C. Fletcher, salienta o fato de as moças brasileiras, assim como a de outros países, lerem muitos folhetins e romance. Ambos eram missionários metodistas e estiveram no Brasil entre 1831 e 1865. Afirmam que, apesar de maneiras e costumes gentis, as mulheres brasileiras
não tem uma base de conhecimentos variados para tornar agradável destrutiva e sua palestra(...). Suas reservas literárias consistem principalmente em novelas de Balzac Eugenio Sue, Dumas, pai e filho, George Sand, em intrigas de pacotilhas e folhetins dos jornais. Assim elas se preparam para esposas e mães. (p. 72) 
A leitura no entanto, era mais comum nos meios urbanos que nas fazendas. Elizabeth Agassiz, que acompanhada do marido, esteve em um tuor pelo Brasil rural entre 1865 e 1866 atesta que “nada assusta mais o estrangeiros do que ausência de livro nas casas brasileiras” (p. 75) 
Ao contrário das grandes obras épicas, que narravam grandes feitos de homens heróis, no romance proponha uma narrativa mais intimista, individual, contando histórias do cotidiano em cenários que muitas vezes se aproximavam daqueles que vivia do leitor. O apelo amoroso do romance também contribuiu para sua difusão. A mulher pertencia tudo o que era doméstico, a casa era seu espaço, ao contrário da rua, do ambiente externo que era o espaço do homem, onde ele trabalha aonde ele exerce o papel de cidadão na sociedade. Por consequência disso, tudo que era íntimo era delegado uma mulher: nos afetos, os sentimentos. Ao trabalhar com as emoções, o romance encontrava nas mulheres o seu público preferencial, 
Os romances de amor - em particular os franceses - eram a leitura mais largamente consumida entre as mulheres da elite brasileira a partir dos meados do século XIX. A leitora de romances incluia tanto a série escrita pela Condessa de Ségur - que acompanha a bibliotheque rose - como os folhetins literários, outra criação francesa, publicada em nossos jornais. Nessa época, acelera-se no Brasil o contato econômico, político e cultural com o exterior, principalmente com a França, o que deu a oportunidade as mulheres já alfabetizadas de classe mais abastada para consumir bens culturais como livro, o teatro e imprensa. (CUNHA, 1999, p.28) 
Cunha (1999), esclarece ainda que a grande popularização dos romances deveu-se também as muitas jogadas comerciais do mercado editorial. Uma delas era a venda de uma obra em diferentes tipos de encadernações: brochura, volume duplo, encadernado simples e encadernado duplo. Cada tipo de encadernação surgiria um preço diferente, o que significa que leitoras com diferentes poderes aquisitivos e diferentes classes sociais tinham acesso a esses romances. Toda essa situação, aliada ao avanço rápido do capitalismo, trouxe o desenvolvimento da imprensa e do mercado de livros, tornando-os mais baratos e acessíveis.
Da mesma forma que a cultura francesa influenciou a educação feminina, também influenciou os hábitos de leituras. Os romances franceses eram os mais procurados como a testa esta postagem do livro Quincas Borba, de Machado de Assis, nas palavras de umas das personagens: “(o francês) era indispensável para conversar, para ir às lojas, para ler um romance” (1988 p. 68).
Onde o depoimento de Maria Paes de Barros vem ilustrar a influência que a língua francesa exercia sobre as leituras:
Grandes e pequenos, todos no sobrando falavam francês. Também era essa língua os livros didáticos, bem com os volumes de duas estantes que viviam na espaçosa sala de estudos. No afã de ilustrar os filhos, o comendador B. mandou vir da França uma boa coleção de obras para mocidade: história, viagens e biografias de homens célebres. As mais velhas recebiam a Revista Popular, tão apreciada das famílias, e L´Écho de Feuilletons, publicação de novelas que as dedicavam com as façanhas dos heróis de Alexandre Dumas e as apaixonadas ternuras de Mme. Cottin. (MOURA, 1998, p. 94) 
Outro fato que prova essa referência foi a grande aceitação no Brasil dos romances franceses de M. Delly, que faziam parte da Coleção Biblioteca das Moças, publicadas no Brasil a partir de 1920 pela Companhia Editora Nacional. 
Segundo Cunha (1999), nessa mesma Coleção Biblioteca das Moças eram publicadas obras de Concórdia Merrel e Guy de Chantepleure, que eram preferidas pelas moças por descreverem emoções mais vivas, incluindo “beijos ardentes e tudo” (1999, p. 101).
As obras deste último autor, figuravam na estante Paraas Normalistas e entre seus principais títulos, encontra-se: A Fazendinha, Noiva, Beijo ao luar, A passageira e O castelo encantado. Os títulos mais lindos de Concórdia Merrel eram O casamento de Ana, O selvagem, Uma noiva em leilão e A maltrapilha.
Anuncio da coleção
Biblioteca das Moças
Capa da obra
Mitsi
 
 
Edições baratas, vendidas em livrarias e bancas de jornal, e seus romances fizeram muito sucesso no Brasil. M. Delly, por exemplo, apesar do nome sugerir uma mulher era um pseudônimo de um casal de irmãos: Frédéric H. P. de La Rosiére e Jeanne-Marie H. P. de La Rosiére eram franceses, católicos fervorosos e escreviam os chamados bons romances com o apoio da Igreja Católica, para reafirmar o ideal da mulher Cristã e auxiliar no combate aos romances preciosos. Os principais romances da coleção de M. Delly foram Magali, Mitsi e Freirinha.
Taz romances eram escritos com uma estrutura bem definida: o herói (nobre e rico) e a heroína (plebeia e pobre), impedidos de ficarem juntos a princípio mas que, depois de alguns empecilhos, conseguem se unir através de um casamento feliz. Esses romances chegam ao Brasil por volta de 1920, publicados pela Companhia Editora Nacional, na coleção Biblioteca das moças. Eram ediçoes mais baratas, vendidas em livrarias e bancas de jornal.
O s romances mais destaques destacam-se entre a coleção são Magali, Mitsi e Freirinha. Em seu livro, Armadilhas da Sedução - os romances de M. Delly, Cunha (1999) analisou detalhadamente cada um dos romances da coleção.
Cunha também analisou os romances que diz respeito a funções da mulher, vida profissional, casamento educação. A partir dessas categorias Cunha concluiu que todos os romances de M.Delly, sem exceção, apontavam para ideal de mulher: “abnegada, fiel, voltada ao lar e considerando o amor como sentimento sagrado”. (p. 38) As heroínas das histórias eram sempre moças cândidas, virtuosas, frágeis e que ruborizavam coravam com facilidade devido a sua inocência. Para Cunha, essas imagens tinham como público-alvo as moças das classes médias cultas e as da elite que, em geral, eram educadas para partilhar desses ideais.
Na opinião de Cunha (1999), “os romances de M. Delly nortearam a educação da jovem mulher, brasileira, da camada média urbana” e faziam sucesso porque eram 
lidos numa época que (havia)... uma busca da identificação com tudo que viesse do ‘Velho Mundo’, com a digita cultura aristocrática tradicional livros pertenciam trazer. Em outras palavras, a elite brasileira buscava legitimação identificando-se com a europeia” através do consumo dessa leitura (p. 14)
O romance-folhetim, como era conhecido no Brasil, era uma adaptação do Feuilleton, criação de jornalistas de Paris, que editavam a história (sempre recheada de muito romance) no pé da página da folha do jornal.
Prado citado por Cunha (1999), da a explicação para o fato desse gênero literário ter sido adotado pelo Brasil com o nome de folhetim:
Justiniano José da Rocha, iniciando-se no jornalismo depois da completar estudos secundários em Paris, travou o contato ainda na França, com a novidade do “feuilleton” ou literatura de folhetim e quis introduzi-la na ‘cinzenta imprensa brasileira’ ... que ele não sabia como verter, não lhe agradando nem “folhetão”, ‘que sou a tão mal’, nem “folhazinha”, a tradução literal. Em 1841, a forma definitiva fora descoberta - Folhetim (p. 32) 
Conforme Meyer (1996), Capitão Paulo de Alexandre Dumas foi o primeiro romance-folhetim traduzido do francês a sair de um jornal brasileiro, o Jornal do Comércio, em 1838.
O folhetim tornou-se bastante popular no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro. Muitos escritores românticos como Joaquim e Manuel de Macedo e José de Alencar começaram a sua carreira publicando suas obras em forma de folhetim, assim como Machado de Assis, que obteve grande sucesso como os romanos que foram publicados nesse formato, que depois foram transformados em livro.
Um dos motivos da grande aceitação do folhetim pelo público leitor do século XIX, foi a forma fragmentada na qual ele era publicado. Uma

Mais conteúdos dessa disciplina