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Adesão e microscopia do contato nata-rocha de arenitos da Serra do Espigão

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Geosul 2017 
 
ADESÃO E MICROSCOPIA DO CONTATO NATA-ROCHA 
DE ARENITOS DA SERRA DO ESPIGÃO, SC 
 
Cleber de Freitas Floriano (1); Marco Antonio Grigoletto Conte (2); Luiz Antonio Bressani (3) 
 
RESUMO 
 
Neste trabalho foram estudados dois arenitos pertencentes às formações geológicas 
Botucatu (Bt) e Rio do Rasto (RR) envolvidos em processos de instabilização de encostas 
rochosas na Serra do Espigão, no estado de Santa Catarina. A adesão nata de cimento-rocha foi 
avaliada de duas formas: em laboratório através de ensaios CCBT (Composite Cylinder Bond 
Test); e em campo através de ensaios de arrancamento de grampos. Foram obtidos valores 
médios de adesão pelo método CCBT de 0,38 MPa para o Arenito Bt e 0,37 MPa para o Arenito 
RR. Estes resultados são compatíveis com os valores obtidos em campo de 0,39 MPa para o 
arenito Bt e de 0,40 MPa para o arenito RR. Assim, o ensaio CCBT pode ser uma alternativa 
viável para definição do parâmetro de adesão em etapas iniciais de projeto. À luz da microscopia, 
é discutida a influência da lavagem na superfície de corte dos corpos de prova compostos de 
Arenito Bt e nata de cimento. Nota-se, preliminarmente, que as condições de aderência da nata e 
da rocha melhoram em função da limpeza da superfície de contato. Contudo, a resistência 
mecânica na interface é afetada por diversos fatores, como a hidratação da nata de cimento e a 
friabilidade do contato nata-rocha. 
 
ABSTRACT 
 
In this work, two sandstones belonging to Botucatu (Bt) and Rio do Rasto (RR) geological 
formations were studied. They are related to rocky slope instability processes in Serra do Espigão, 
Santa Catarina state. The bond strength between grout and rock was evaluated in two ways: at 
laboratory through CCBT (Composite Cylinder Bond Test); at field through pullout tests. Were 
obtained average adhesion values by the CCBT method of 0,38 MPa for Bt Sandstone and 0,37 
MPa for RR Sandstone. These results are compatible with field values of 0,39 MPa for Bt 
Sandstone and 0,40 MPa for RR Sandstone. Thus, the CCBT method can be a viable alternative 
for defining the adhesion parameter at initial stages of design. The influence of the washing on the 
cutting surface of the composite specimens of Bt Sandstone and grout is discussed in the light of 
the microscopy. It is noted, preliminarily, that the conditions of adhesion between grout and rock 
improve as a function of the cleaning of the contact surface. However, the bond strength at the 
interface is affected by several factors, such as the hydration of the cement slurry and the contact 
friability. 
 
 
 
 
PALAVRAS-CHAVE: Adesão Nata-Rocha. Ensaios CCBT. Lâminas Petrográficas. 
 Ensaios de Arrancamento. Rocha sedimentar. 
 
 
 
 
 
 
 
 
(1) Professor Assistente da Faculdade de Eng. Civil da PUCRS, Engenheiro Civil, Azambuja Eng. e 
Geotecnia Ltda, souza.floriano@gmail.com; 
(2) Eng. Civil, Mestrando em Engenharia Civil/Geotecnia pela COPPE/UFRJ, 
marco.conte@hotmail.com; 
(3) Professor Associado, Departamento de Engenharia Civil, UFRGS, bressani@ufrgs.br 
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1 – INTRODUÇÃO 
 
O trecho da BR-116/SC que perpassa a Serra do Espigão é marcado por diversos 
problemas geotécnicos. Em uma faixa de 5 km, por exemplo, são contabilizadas mais de 10 obras 
de estabilização. Relatos sobre movimentos de massa ocorridos na região, particularmente queda 
de blocos rochosos, foram apresentados ainda na década de 1970 por Fernandes et al. (1974). 
Estes autores atribuem as quedas de blocos de pequena dimensão à degradação diferencial dos 
estratos da Formação Rio do Rasto. Já a queda de blocos de maior magnitude está associada à 
perda de suporte basal, em virtude da intemperização do maciço sotoposto (Formação Botucatu). 
 Desde então, diversas soluções têm sido aventadas com vistas à estabilização e proteção 
de algumas das encostas do local inclusive de obras sendo executadas neste anos de 2017. As 
propostas que utilizam um sistema de ancoragem através da inserção de grampos ou tirantes no 
maciço rochoso tem sido bastante empregadas nestas situações. Para o dimensionamento destas 
ancoragens, normalmente são realizados ensaios de arrancamento. Entretanto, viabilizar ensaios 
em verdadeira grandeza muitas vezes torna-se incompatível com a etapa de estudos preliminares. 
Isto ocorre em obras de menor porte e pontuais, como são a maioria das obras de contenção, e 
também podem ser citados os locais onde os acessos dependem de trabalho em altura e que 
acabam exigindo o uso de manipuladores ou guindastes. Neste caso é comum ocorrer 
interferência no tráfego viário, gerando custos ainda mais elevados. 
No dimensionamento de uma ancoragem é de extrema importância a determinação da 
aderência entre o fluido cimentante e o maciço. Este trabalho dedica-se à determinação deste 
parâmetro para os arenitos da Formação Botucatu e Rio do Rasto que são encontrados no local. 
Optou-se pelo ensaio de laboratório CCBT (Composity Cylinder Bond Test) porque é de simples 
execução e possui baixo custo, portanto viável nas etapas iniciais de um projeto. Também são 
discutidos, do ponto de vista microscópico, alguns fatores intervenientes no processo de 
ancoragem que ocorre na interface nata de cimento-rocha. 
 
2 – CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICA 
 
 O local de estudo situa-se no município de Monte Castelo, Santa Catarina. Os problemas 
geotécnicos estudados neste trabalho estendem-se por um trecho de aproximadamente 700 
metros na BR-116/SC (km 108+000 - km 108+700). De acordo com o mapa litológico, estão 
presentes duas formações geológicas originárias de antigos depósitos sedimentares (PERROTTA 
et al., 2004). Trata-se da Formação Botucatu e da Formação Rio do Rasto. Além destas, embora 
não observadas a partir dos taludes da plataforma rodoviária da BR-116, à montante destaca-se a 
Formação Serra Geral, e à jusante a Formação Teresina, bem como depósitos aluvionares 
recentes provenientes do Período Quaternário. Uma imagem de satélite identifica o trecho 
estudado (Fig. 1), enquanto a Fig. 2 apresenta a coluna estratigráfica do local mostrando 
nitidamente a transição entre a Formação Rio do Rasto e a Formação Botucatu, além de suas 
diferenças táteis e visuais. 
 
 
Figura 1. Localização da área de estudo, destacando as formações geológicas presentes e a demarcação 
da rodovia no trecho (FLORIANO et al., 2015). 
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Figura 2. Coluna estratigráfica observada em um talude exposto junto ao km 108+200 da BR-116/SC 
(adaptada de FLORIANO et al., 2015). 
 
3 – MATERIAIS E MÉTODOS 
 
As amostras cilíndricas de rocha foram coletadas através de perfuratriz com coroa 
denteada, de pontas diamantadas, diâmetro externo de 21/4” e diâmetro interno equivalente de 50 
mm. As amostras de arenito Bt foram extraídas segundo 3 orientações distintas: uma paralela ao 
plano de estratificação natural, outra perpendicular a este plano e uma terceira, inclinada. Para 
esta última, idealizou-se o mesmo ângulo praticado na execução de obras de grampeamento ou 
atirantamento, que varia entre 10 a 30 graus em relação à horizontal. Na prática, contudo, manter 
um ângulo de extração perfeitamente constante é difícil. No arenito RR os planos de estratificação 
não podem ser amostrados em virtude da escala, embora existam, já que os processos de 
sedimentação e posterior diagênese naturalmente promovem planos desse tipo. A Fig. 3 
apresenta alguns cilindros amostrados, identificando os planos de estratificação em relação à 
posição de corte de cada amostra. 
 
Arenito Botucatu Arenito Botucatu 
 
Arenito Rio do Rastro Arenito Botucatu 
 
Figura 3. Amostras com diâmetro médio de 50mm obtidas através de extrator. O tracejado vermelho indica a 
posição do plano de estratificação no arenito Botucatu. 
 
3.1 – Composite Cylinder Bond Test (CCBT) 
 
O composite cylinder bond test (CCBT) é um ensaio que determina a tensão de aderência 
entre nata e rocha através do cisalhamento de um plano forçado (MACEDO, 1993). Um corpo deprova composto de nata de cimento e rocha é produzido e, quando submetido à compressão 
simples uniaxial, sofre cisalhamento na interface dos dois materiais. Este ensaio simplificado foi 
desenvolvido na UFRGS por Macedo (1993). 
Os testemunhos rochosos que compõem os corpos de prova compostos são definidos por 
dois cortes: um perpendicular (90º) e outro a 30º ou 45º em relação ao eixo de compressão axial. 
A interface, portanto, tem uma forma elíptica. Foram seccionadas 88 amostras para formatação 
dos corpos de prova. No que tange à nata de cimento, empregou-se cimento Portland Pozolânico 
tipo CP IV-32. A relação a/c adotada foi coerente com aquelas normalmente definidas em projetos 
executivos, que ficam entre 0,4 a 0,6, com quantidades dosadas em peso. 
A moldagem dos corpos de prova compostos ocorre através do despejo cuidadoso da nata 
sobre o testemunho rochoso cortado, o qual está inserido em um molde cilíndrico. Durante esta 
operação deve-se evitar a formação de bolhas na nata. Os ensaios foram executados aos 28 dias 
Arenito Rio do Rasto (RR) c/ 
estratificação plano-paralela 
Níveis intermediários de 
Pelito e Arenito 
Arenito Botucatu (Bt) c/ 
estratificação marcante 
paralela e cruzada 
 
 
Coluna Estratigráfica 
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de cura, conforme a NBR 7681-4 (ABNT, 2013). Foram moldados 72 corpos de prova, sendo 24 
do Arenito RR e 48 do Arenito Bt. A Fig. 4 exibe um conjunto de corpos de prova compostos 
sendo confeccionados. 
 
 
Figura 4. Conjunto com 30 moldes metálicos, sendo 24 moldes para a formatação dos corpos de prova do 
ensaio CCBT e outros 6 moldes para a verificação da resistência à compressão simples (RCS) da nata de 
cimento. A imagem mais a direita mostra o conjunto de corpos de prova prontos para o ensaio. 
 
Os corpos de prova foram levados à câmara úmida e, após três dias de cura dentro do 
molde, foram desformados e permaneceram na câmara até o dia da ruptura. A velocidade de 
carregamento de todos os corpos de prova compostos e dos corpos de prova de nata de cimento 
foi estabelecida como 0,45 MPa/s, conforme a NBR 7681-4 (ABNT, 2013). Todos os ensaios de 
resistência à compressão simples indicaram resistência superior a 25 MPa para a nata de 
cimento. Na Fig. 5 podem ser vistos exemplos de corpos de prova compostos após a ruptura. As 
duas imagens mais à direita exibem corpos de prova cuja ruptura não ocorreu na interface nata-
arenito, e, portanto, devidamente são excluídos dos resutados. 
 
 
Figura 5. (a) Ruptura de um corpo de prova de arenito Bt em corte de 30º. (b) Metade de nata de cimento e 
metade de arenito RR após a ruptura de um corpo de prova composto. (c) Ruptura no arenito. (d) Ruptura 
no arenito e na nata de cimento. 
 
O ensaio CCBT pode ser interpretado a partir do círculo de Mohr (Fig. 6), onde a tensão 
principal maior corresponde à tensão de compressão uniaxial no momento da ruptura (σ1A e σ1B). 
O critério de ruptura adotado é o de Mohr-Coulomb (Eq. 1), com parâmetros Sw (adesão) e φ 
(ângulo de atrito). No ensaio CCBT as deformações cisalhantes que ocorrem são muito pequenas, 
sendo assumido, então, que a parcela de resistência devida ao atrito é inexistente. Portanto, a 
resistência ao cisalhamento corresponde apenas à parcela de adesão nata-rocha do contato. A 
aderência, derivada dos ensaios CCBT, é obtida quando se resolve o sistema com as Eq. 2 e 3. A 
média das tensões de ruptura do conjunto moldado com juntas de 30º é igual a σ1A, e a média das 
tensões de ruptura do conjunto moldado com juntas a 45º vale σ1B. Destaca-se que φ representa o 
ângulo de atrito da junta. 
 
Figura 6. Interpretação gráfica do ensaio CCBT (adaptada de Macedo, 1993). 
a b c d 
a b c d 
5 
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 (1) 
 
 (2) 
 
 (3) 
 
3.2 – Ensaios de arrancamento 
 
Foram realizados três ensaios de arrancamento de campo não instrumentados, sendo um 
posicionado no Arenito RR e os outros dois no Arenito Bt. Tais ensaios seguiram as 
recomendações estabelecidas na NBR 5629 (ABNT, 2006) quanto à sequência de cargas, similar 
ao procedimento de ensaio de qualificação em tirantes. O grampo utilizado foi um modelo Resinex 
– RT 06 – 38,1mm, com carga de trabalho de 360 kN. A nata de cimento de injeção foi preparada 
com fator a/c de 0,5 e os ensaios foram feitos após 28 dias da injeção. As perfurações foram 
realizadas por roto-percussão, sendo o fluido perfurante o ar, de modo a atingir comprimento de 
ancoragem de 4 metros com diâmetro do furo igual a 75 mm. Todas as perfurações tiveram auxílio 
de um guindaste que ficou patolado em uma faixa de rolamento, junto a BR-116/SC. 
 
3.3 – Lâminas petrográficas 
 
 Lâminas petrográficas delgadas foram extraídas de seis corpos de prova compostos de 
Arenito Bt nos quais a ruptura não ocorreu no contato nata-rocha (Fig. 7a). Em três corpos de 
prova, durante a sua confecção a interface nata-arenito foi limpa através de lavagem em água 
corrente e com leve pressão, de modo a remover o material pulverizado do corte que fica 
impregnado na superfície (Fig. 7c). Nos outros três não foi realizado nenhum procedimento de 
lavagem na interface (Fig. 7b), ou seja, o material pulverizado do corte permaneceu impregnado 
na superfície seccionada (procedimento geral adotado na confecção de todos os outros corpos de 
prova destinados ao ensaio CCBT). Após ensaiados, os corpos de prova sofreram um corte 
centralizado longitudinal para a extração das lâminas junto ao contato nata-rocha. Para a 
produção destas lâminas, foi necessário realizar impregnação com resina em virtude da 
friabilidade da rocha. Desta forma, os vazios são facilmente identificáveis pelo matiz azul (Fig. 7d). 
Figura 7. (a) Corpos de prova selecionados para extração de lâminas petrográficas delgadas. (b) Lâminas 
dos corpos de prova não submetidos à lavagem. (c) Lâminas dos corpos de prova submetidos à lavagem. 
(d) Detalhe de uma lâmina, exibindo as porções com nata de cimento e arenito Bt. 
 
4 – RESULTADOS 
 
4.1 – Composite Cylinder Bond Test (CCBT) e ensaios de arrancamento 
 
Somente os resultados dos corpos de prova compostos cuja superfície de ruptura se deu na 
interface nata-rocha foram considerados nos cálculos. Para o Arenito RR a adesão obtida é de 
0,37 MPa, e para o Arenito Bt é de 0,38 MPa. Estes valores são muito similares e estão 
representados graficamente através de círculos de Mohr na Fig. 8. 
 
NATA DE 
CIMENTO 
a b 
c 
d 
ARENITO Bt L04 L02 L13 
L03 L02A L13 
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Em relação aos ensaios in-situ, as cargas de arrancamento estimadas para os chumbadores 
executados no Arenito Bt foram de 0,37 e 0,41 MPa. Já o chumbador ensaiado no Arenito RR 
suportou uma carga de arrancamento de 0,40 MPa. Comparando-se os valores de tensão última 
de campo (qs) com os valores do ensaio CCBT (Sw), primeiramente observa-se uma aproximação 
muito satisfatória em termos de valores médios. As divergências são de apenas 3,4% para o 
Arenito Bt e 8,9% para o Arenito RR. Em segundo lugar, os valores de Sw são sempre inferiores 
aos valores de qs. A Tab. 1 apresenta um comparativo destes resultados incluindo os valores 
obtidos por Macedo (1993). 
30°0.37
1.52
3.06
Circulo de Mohr - Arenito Rio do Rastro
37°
te
ns
ão
 c
is
al
ha
nt
e
tensão normal
MPa
MPa
 
30°0.38
1.72
5.21
Circulo de Mohr - Arenito Botucatu
41°
te
ns
ão
 c
is
al
ha
nt
e
tensão normal
MPa
MPa
 
Figura 8. (a) Círculos de Mohr para o arenito RR. (b) Círculos de Mohr para o arenito Bt. (FLORIANO, 2014) 
 
Tabela 1. Valores de adesão obtidos em campo (ensaio de arrancamento) e laboratório (CCBT) 
MATERIAL qs Médio (MPa) 
Sw Médio 
(MPa) 
qs/Sw 
(MPa) 
Dacito*(Formação Serra Geral) 1,70 1,27 1,34 
Basalto* (Formação Serra Geral) 4,40 1,55 2,84 
Arenito subarcosiano (Formação Botucatu) 0,39 0,38 1,03 
Arenito lítico fino (Formação Rio do Rasto) 0,40 0,37 1,09 
* Dados obtidos de MACEDO (1993). 
 
4.2 – Lâminas petrográficasDurante a confecção de um corpo de prova composto, à medida em que a nata de cimento é 
lançada, a água proveniente da sua exsudação penetra no arenito, expulsando parcialmente o ar 
existente. Esta migração potencializa a formação de canalículos na nata de cimento, 
especialmente junto ao contato com o molde metálico. Em alguns casos surgem bolhas no 
entorno de grãos suspensos. A migração dos fluidos também contribui para a definição da 
espessura da área exsudada na zona de contato entre arenito e nata durante as reações de 
hidratação do cimento. Este processo tem início imediato e reduz sua intensidade quando atinge o 
tempo de início de pega, que para o CP-IV é de 1h, segundo a NBR 5736 (ABNT, 1991). A 
migração de fluidos continua ocorrendo até o tempo de final de pega, que é de 12h. Após este 
período, por tratar-se de cimento pozolânico, as reações perduram por muitos dias. 
 
4.2.1 – Lâminas extraídas dos corpos de prova submetidos à lavagem 
 
 Observa-se que a penetração do cimento na superfície rochosa é bastante limitada (Fig. 9a). 
Nas três lâminas extraídas dos corpos de prova submetidos à lavagem, a migração não atingiu 
mais do que três grãos de espessura, ou cerca de 0,5mm. Aparentemente a nata de cimento, no 
momento do despejo na superfície de contato com o arenito, tem fluxo impedido por efeito de 
tensão superficial, pois a composição cimento e água apresenta viscosidade superior à da água 
livre. Assim, a nata de cimento é incapaz de ultrapassar a abertura intergranular do arenito. A 
irregularidade (proveniente do corte) na zona de contato é outra feição típica destas lâminas. 
a b
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 Nota-se que parte da água de hidratação do cimento sofre exsudação na interface rocha-nata. 
Este fenômeno é observável em virtude da tonalidade mais escura desta região em relação à 
matriz da nata, mais clara (Fig. 9b). A espessura da zona de exsudação junto ao contato varia 
entre 0,2 mm e 1,5 mm nas três lâminas. 
Observa-se também fissuras de retração na nata de cimento. Sua ocorrência deflagrou-se 
mesmo com as amostras sendo curadas em câmera úmida, embora no momento do lançamento 
da nata de cimento sobre a superfície, o arenito não se encontra saturado, mas sim, na condição 
de umidade natural. No caso da superfície lavada, as fissuras de retração da nata surgem 
perpendicularmente ao plano de contato (Fig. 9c). Não se pode afirmar se a origem delas está 
associada à consolidação da nata ou se ocorrem em função das tensões absorvidas pelo corpo de 
prova no momento do ensaio. Porém é evidente que no instante em que atuarem tensões 
cisalhantes devido ao carregamento axial, estas fissuras irão gerar planos de fraqueza. 
As fissuras de retração também demarcam uma zona mais escura correspondente à área de 
exsudação, pois durante o tempo de cura da nata ocorre passagem livre de fluido por elas, 
deixando a nata de cimento super-hidratada. Esse processo é semelhante ao que ocorre ao longo 
da superfície de contato com o arenito. 
 
 
Figura 9. (a) Lâmina 03, luz natural: migração limitada da nata de cimento sobre a superfície rochosa. (b) 
Lâmina 06, luz natural: diferença de tonalidade indica a zona de exsudação da nata. (c) Lâmina 03, luz 
natural: fissura de retração perpendicular ao contato nata-rocha. 
 
4.2.2 – Lâminas extraídas dos corpos de prova não submetidos à lavagem 
 
Neste caso, o processo de consolidação da nata de cimento é exatamente o mesmo que na 
condição anterior, assim como a sua penetração na rocha continua sendo bastante limitada. No 
entanto, algumas diferenças importantes junto ao plano de contato entre nata e arenito puderam 
ser observadas. 
 
 
Figura 10. (a) Lâmina 13, luz natural: zona de exsudação com menor espessura e fissura paralela ao contato nata-rocha. 
(b) Lâmina 04, luz natural: ocorrência de fissuras de retração paralelas junto ao contato nata-rocha em profusão. 
 
Nota-se que a espessura de exsudação é menor na condição não lavada, estando 
compreendida no intervalo entre 0,1 mm e 0,6 mm de espessura nas três lâminas (Fig. 10a). Essa 
diferença ocorre porque o material pulverizado impregnado na superfície dificulta a migração da 
água de exsudação. Além disso, as reações de hidratação que ocorrem nesta faixa também 
envolvem este material pulverizado e friável oriundo do corte da superfície rochosa. No que tange 
às fissuras de retração, na condição não lavada incidem também em planos posicionados 
paralelamente junto à interface entre nata e rocha, aparentemente demarcando a posição do 
0,5 mm ARCABOUÇO ARENÍTICO 
ZONA EXSUDADA 
ZONA 
NÃO-EXSUDADA 
ZONA EXSUDADA 
FISSURA 
PERPENDICULAR 
FISSURA 
PARALELA 
ZONA EXSUDADA 
FISSURA 
PERPENDICULAR 
FISSURAS 
PARALELAS 
a b c 
a b 
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material impregnado (Fig. 10a). Ademais, ocorrem em profusão ao longo da superfície de contato 
nata-rocha (Fig. 10b). 
Essas fissuras paralelas demarcam tempos de reação de hidratação divergentes, em função 
da presença de partículas finas pulverizadas e impregnadas que colmatam os primeiros poros. A 
película de material pulverizado restringe as reações de hidratação, formando uma barreira que 
retém a migração das partículas de cimento até os primeiros poros (inter e intragranulares) do 
arenito. Embora ocorra numa zona exsudada, o contato entre a nata de cimento e os primeiros 
grãos areníticos é o que efetiva a ligação nata-rocha. 
 
5 – CONCLUSÕES 
 
Os valores de adesão nata-rocha obtidos através dos ensaios CCBT (Sw) e de 
arrancamento in-situ (qs) são muito similares. Estes resultados demonstram que a utilização do 
CCBT como ensaio de referência para a determinação da adesão nata-rocha é uma alternativa 
viável, particularmente para os arenitos estudados neste trabalho. Todavia, mais ensaios em 
diferentes tipos de rocha devem ser executados para que seja possível obter parâmetros ainda 
mais seguros e também estabelecer relações mais concretas. Destaca-se, contudo, aquilo já 
frisado por Macedo (1993): a resistência obtida pelos ensaios CCBT é um limite inferior, pois o 
método desconsidera a parcela de atrito e os efeitos de dilatância. 
 Diferenças significativas de penetração da nata de cimento não foram observadas entre as 
lâminas delgadas lavadas e as não lavadas. Mesmo numa superfície com poros abertos (lavada) 
a viscosidade da nata é suficiente para gerar tensões capilares que impedem o avanço do fluido 
para os poros da rocha, limitando a migração em até três grãos. Nas superfícies lavadas a adesão 
passa a ser governada pela friabilidade da superfície de contato com a rocha e também pela 
irregularidade desta. Portanto, a diferença de comportamento mecânico através dos ensaios 
CCBT observada nos corpos de prova lavados e não-lavados, deve estar associada à presença 
de uma película de partículas pulverizadas e impregnada na superfície durante o corte dos 
arenitos para formatação dos corpos de prova compostos. Quando esta película impregnada é 
removida pela lavagem há um ganho de aderência no contato nata-rocha. 
 A microscopia indica melhores condições de aderência em função da limpeza da superfície 
de contato, porém, a resistência mecânica deste contato sofre interferência de diversos fatores, o 
que deve ser melhor investigado. Outros estudos já estão sendo conduzidos neste sentido, 
especialmente para compreender se esta melhoria de aderência, proveniente da lavagem da 
superfície impregnada pelo material pulverizado, seria relevante para um elemento de ancoragem. 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
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Janeiro, 1991. 
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PERROTTA, M. M. et al. Folha Curitiba SG-22. In: SCHOBBENHAUS, C.; GONÇALVES, J. H.; SANTOS, J. 
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