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P o lítica s P ú b lica s e m Sa ú d e Gestão em Saúde da Família G es tã o em S aú d e d a F am íl ia G estã o em S a ú d e d a F a m ília Allan Saffiotti A llan Saffiotti olíticas em aúde úblicas S P P UNIDADE 3 e 1930 a 1960:D E E N Vra stado ovo argas e o 39 A quebra da bolsa de Nova York, em 1929, gerou uma grave crise sem precedentes nos Estados Unidos e consequentemente um abalo em vários países no mundo, já que, naquela época, eles detinham quase a metade da produ- ção industrial mundial. Desde o fim da primeira guerra mundial, com a Europa empobrecida e endividada, o Brasil se tornara mais dependente economicamente da exportação do café para os Estados Unidos, e a crise trouxe sérias consequências políticas, econô- micas e sociais. Como o café não é um produto de primeira necessidade, os americanos deixaram de importar, e seu preço caiu severamente, afetando gravemente nossa economia e as oligarquias no poder, o que levou a Revolução de 30. Aproveitando o descontentamento po- pular e da burguesia, em 1930, Getúlio Vargas toma o poder e rompe com a política do café com leite, assumindo o governo. Ele governou o país durante 15 anos seguidos, sendo que de 1930 a 1934 como chefe do Governo Provisório, depois eleito pelo Congresso Nacional (1934), e de 1937 a 1945, período conhecido como Estado Novo, implantado após um golpe de estado. Como consequência positiva da crise, 40 na economia o Brasil diversifica os produtos de exportação e passa a desenvolver seu parque industrial, principalmente através das interven- ções estadistas de Getúlio Vargas. Como parte destas intervenções, a estrutura do Estado toma nova forma: são criados o “Ministério do Tra- balho”, o da “Indústria e Comércio”, o “Minis- tério da Educação e Saúde” e juntas de arbitra- mento trabalhista. Getúlio Vargas estabeleceu o salário mí- nimo, que melhorou os ganhos da população, e promulgou a Lei da Sindicalização, vinculando os sindicatos brasileiros ao presidente, pois que- ria apoio popular em suas decisões. Ele também cria a Consolidação das Leis Trabalhista (CLT), em 1943, assegurando direitos básicos aos tra- balhadores: salário mínimo, férias remuneradas, jornada diária de no máximo 8 horas, proteção ao trabalho da mulher e do menor e estabilida- de no emprego. Governista hábil e carismáti- co, suas medidas garantiam apoio popular ao mesmo tempo em que cuidava dos interesses dos grandes empresários e grandes agriculto- res. É o chamado governo populista: todo o governo é centrado na figura do presidente, e o recém-criado Departamento de Propaganda 41 trabalha a imagem de um líder próximo, crian- do a impressão de uma relação direta do povo, emocional e paternalista. Ficou conhecido, por isso, como: “Pai dos pobres e mãe dos ricos”. A intenção era fazer essas ações surgirem como dádivas do governo e do Estado, não como di- reitos ou como fruto de lutas populares, enfra- quecendo o movimento trabalhista e manten- do-o no controle do Estado. No plano da saúde, uma importante mo- dificação, ocorrida em 1933, foi a unificação e uniformização das estruturas de assistência em saúde no Brasil, instituindo os IAP’s (Instituto de Aposentadoria e Pensões). Com isso conse- guiu diminuir os conflitos entre operários e in- dustriais, já que a organização agora passa a ser por categorias profissionais, não mais por em- presas. O Estado passa a ter controle de todos os recursos financeiros das CAPs. No artigo 46 do seu decreto de constituição, ele assegurava: a) aposentadoria; b) pensão em caso de morte para os membros de suas famílias ou para os beneficiários, na forma do art. 55: c) assistência médica e hospitalar, com interna- 42 ção até trinta dias; d) socorros farmacêuticos, mediante indenização pelo preço do custo acrescido das despesas de administração. § 2o - O custeio dos socorros mencionados na alínea c não deverá exceder à importância cor- respondente ao total de 8% , da receita anual do Instituto, apurada no exercício anterior, sujeita a respectiva verba à aprovação do Conselho Na- cional do Trabalho. Segundo Polignano (2007), a partir da capacidade de organização, mobilização e im- portância das categorias profissionais, os IAP’s foram sendo criados: em 1933 foi criado o pri- meiro instituto, o de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), em 1934 o dos Co- merciários (IAPC) e dos Bancários (IAPB), em 1936 o dos Industriários (IAPI),e em 1938 o dos Estivadores e Transportadores de Cargas (IAPETEL). Ou seja, todos vinculados aos pó- los dinâmicos de acumulação capitalista. Diferente do que ocorria com as CAPs, o Estado passa a financiar diretamente os IAPs, junto com empregados (os recursos eram capta- 43 dos pela contribuição compulsória sobre a folha de salário) e empregadores. A assistência médica individualizada era garantida aos trabalhadores urbanos com carteira assinada (trabalho formal), e era oferecida através da rede privada, que ven- diam serviços aos IAPs. Trabalhadores rurais, desempregados e trabalhadores informais conti- nuam sem acesso à assistência médica e hospita- lar. É preciso também salientar que a maioria da população, nessa época, vivia no campo. Getúlio Vargas irá aplicar parte dos re- cursos do IAPs, controlados pelo governo, no financiamento da industrialização do Brasil. Como exemplo, temos a Siderúrgica de Volta Redonda, no Rio de Janeiro. Com a aceleração do desenvolvimento industrial, principalmente a partir da metade da década de 50, e o consequente aumento do tra- balho formal, é que ocorre maior mobilização dos sindicatos pela assistência médica via ins- titutos. Alguns IAPS tinham muito dinheiro e construíam seus próprios hospitais, como o Ins- tituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários (IAPB), enquanto muitos outros, como Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários (IAPI) compravam serviços de terceiros. 44 Nesse momento, surge a medicina de grupo: são empresas que oferecem serviços médicos privados às empresas que os contra- tam, se comprometem a atender os associados a esse plano. Dessa forma, o sistema previdenci- ário brasileiro, através dos enormes aportes de recursos da poupança previdenciária, vai servir de base para a mercantilização da saúde. Ou seja: o dinheiro dos IAPs irá financiar a rede particular de hospitais e assistência médica será compreendida como uma oferta de serviço. Com a Segunda Guerra Mundial, os EUA adotam como estratégia se aproximar do Brasil, investindo capital, conhecimento em pro- paganda ideológica, por exemplo, temos o per- sonagem Zé Carioca, dos filmes de Walt Disney. Como consequência dessa influencia, o Brasil começa a se distanciar ainda mais do modelo de atenção à saúde baseado nos centros de saúde, para investir no modelo que tem como centro grandes hospitais, com a atenção compartimen- talizada entre as diversas especialidades médicas. Dentro desta corrente de pensamento, a ideia é verticalizar o atendimento e dividir por doenças, criando leprosários para leprosos, hospitais para varíola, gerando segregação e 45 distanciamento da realidade do povo. No plano da Saúde Pública, não há in- tegração entre as ações preventivas e as ações curativas, nem planejamento em conjunto. En- quanto as ações preventivas eram coordenadas e pelo Ministério da Educação e Saúde, os IAPs, responsáveis pela assistência médica, estavam vinculados ao Ministério do Trabalho. Apesar de alguns avanços na área da prevenção, a assis- tência médica-hospitalar (as ações curativas) será hegemônica neste período, sendo que essa situa- ção só se acentuara nas próximas décadas. Polignano (2007) aponta que na era do Estado Novo poucas foram as investidas no setor da saúde pública, destacando-se, como ação im- portante do período, a reforma Barros Barreto, de 1941, tendo como pontos principais as ações:• instituição de órgãos normativos e supletivos des- tinados a orientar a assistência sanitária e hospitalar; • criação de órgãos executivos de ação direta contra as endemias mais importantes (malária, febre amarela, peste); • fortalecimento do Instituto Oswaldo Cruz, como referência nacional; • descentralização das atividades normativas e executivas por 8 regiões sanitárias; 46 • destaque aos programas de abastecimento de água e construção de esgotos, no âmbito da saú- de pública; • atenção aos problemas das doenças degene- rativas e mentais com a criação de serviços es- pecializados de âmbito nacional (Instituto Na- cional do Câncer, hospitais para tuberculosos e hospitais psiquiátricos). Outras ações importantes foram as campanhas sanitárias e os programas especiais voltados para mães e crianças, tuberculose e endemias rurais, mantendo também centros de saúde e maternidades, utilizados pela população que não tinha direito ou acesso aos Institutos de Previdência. Em 1950 Getúlio é eleito pelo voto po- pular, depois de ser deposto em 1945, ao final da Segunda Guerra Mundial. Ele cria o Minis- tério da Saúde em 1953, com a intenção de for- talecer as ações em saúde pública, diferentes da assistência individual. Entretanto, isto não promoveu uma nova postura do governo, e os problemas mais sérios de saúde pública, como altas taxas de mortalidade infantil, aumento da tuberculose, malária e acidentes de trabalho continuaram sem atenção. 47 Exercícios de Fixação 1) O que são IAPs e que mudanças trazem para a previdência social? 2) Compare o investimento em Saúde Pública nos governos de Getúlio Vargas e o investimen- to em assistência individual. 3) Explique o surgimento da medicina de grupo e suas relações com os IAPs. Sugestão de Pesquisa: No período de governo de Getúlio Vargas, o Brasil acelerou o processo de industrialização e urbanização. Pesquise sobre as condições de vida da população brasileira em 1930 e compare com 1954 (por exemplo, porcentagem de pessoas morando em cidades, escolarização, os indicado- res de saúde – mortalidade infantil, expectativa de vida, entre outros). UNIDADE 4 e 1960 a 1984:D D R S Mitadura eforma anitária ilitar e 51 No plano político, a década de 60 inicia com uma profunda agitação política. Após a rá- pida passagem pela presidência, Jânio Quadros renuncia em 1961. João Goulart, vice-presidente, assume. O fato provocou uma série de manifes- tações contrárias das elites, que temiam uma mo- dificação da situação política brasileira. Goulart pretendia introduzir reformas de base (agrária, bancária, eleitoral, universitária), que levariam a diminuição das desigualdades sociais, por isso era considerado “comunista”. O medo da ascensão de um regime co- munista leva ao golpe militar em 1964, com apoio norte-americano, que depõe o João Gou- lart. Ele e Jânio haviam sido eleitos democrati- camente. Não se tratava mais de uma operação de combate a manifestações de massa, ou a po- lítica social, mas de uma intervenção que levou a uma modificação do regime: as forças arma- das assumem o controle do país. O General Castelo Branco assume a presidência e inicia-se um período de censura à imprensa e repressão, com torturas e desaparecimento de pessoas. Os atos institucionais, notadamente o AI-5 de 1968, limitaram as liberdades institucionais e o poder legislativo. 52 Com apoio de capital externo, no plano econômico acontece o chamado milagre brasi- leiro, o que dava apoio popular ao governo. O PIB aumenta consideravelmente, mas a diferen- ça entre ricos e pobres é uma das maiores do mundo. Por conta do arrocho salarial e da falta de oportunidades, a classe média empobrece e o êxodo rural faz as cidades crescerem sem pla- nejamento urbano, aumentando o número de doenças decorrentes das habitações precárias e falta de cuidados básicos. O período de ditadura foi desastroso para quase todas as áreas sociais, e com a saúde não foi diferente, com um recrudescimento dos avanços obtidos anteriormente, sucateamento dos equipamentos, censura de dados que com- prometiam a saúde pública, e diminuição do in- vestimento em saúde pública. 4.1 Previdência Social: Lei Orgânica e INPS A lei 3.807, chamada Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) é aprovada em 1960, depois de muitas resistências e debates por conta 53 da perda de direitos conquistados por certas ca- tegorias profissionais. Os IAP’s eram restritos a determinadas categorias profissionais mais organizadas e com poder político e econômico, e a importância des- ta nova lei reside na uniformização das contri- buições e prestações de benefícios dos diferen- tes institutos, cobrindo todos os trabalhadores formais, exceto os trabalhadores rurais e do- mésticos. Também não entravam os servidores públicos e de autarquias, regidos por regimes de previdência específicos. Após seis anos, é cria- do o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que promove a unificação institucional de todos os IAPS (POLIGNANO, 2007). Podemos apontar como mudanças signi- ficativas: • Aposentadoria por idade, que passou a ser após os 60 anos de idade para as mulheres e 65 para os homens; •Aposentadoria compulsória para os segurados que alcançassem 65 anos, para as mulheres, e 70 anos, para os homens; • Aposentadoria por tempo de serviço para to- dos os segurados, sem distinção de gênero, desde que contassem com mais de 30 (parcial – 80% 54 do salário de benefício) ou 35 anos de serviço (integral), desde que alcançasse a idade mínima de 55 anos. A lei previa uma contribuição tríplice com a participação do empregado, empregador e a União. O governo federal nunca cumpriu a sua parte, o que evidentemente comprometeu seria- mente a estabilidade do sistema (POSSAS,1981). Para os trabalhadores rurais, finalmente, é promulgada a lei 4.214 de 2/3/63 que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (FUNRURAL). Entretanto, a situação dos traba- lhadores do campo não se modifica. Em 1971, é criado o Prorural, responsável pela extensão dos benefícios previdenciários aos trabalhadores ru- rais. Ficou, então, determinada a constituição de fundos para a manutenção do Funrural. As apo- sentadorias — por idade aos 65 anos para ambos os sexos e por invalidez — concedidas pelo Pro- rural beneficiaram a unidade familiar e não os indivíduos. Os benefícios eram devidos apenas ao chefe ou arrimo da família. Apenas as mu- lheres trabalhadoras rurais que eram chefes de domicílio tinham direito a um benefício próprio. Os valores dos benefícios eram bastante baixos, correspondendo a 50% do salário mínimo (CA- 55 MARANO & PASINATO, 2002). As reformas na previdência levam a um aumento da base de arrecadação (maior núme- ro de contribuintes), mas, consequentemente, ao aumento do número de beneficiários e a ne- cessidade do aumento da rede de atendimento, já que o sistema instalado não daria conta da nova demanda. Ao unificar os IAPs com a criação do INPS, o governo militar passa a controlar todos os recursos que aportavam nos Institutos. O vo- lume de recursos financeiros que aporta nesse instituto é tão grande que chega quase ao tama- nho da arrecadação dos impostos do país. Os técnicos do INPS, com ideologia pri- vatista, promovem o financiamento da produ- ção de serviços de saúde no setor privado, para ampliar a capacidade de atendimento. Ou seja, com o dinheiro do INPS, o governo financia a construção e os equipamentos hospitalares para a iniciativa privada, que em troca atenderiam os segurados do INPS, com a garantia do pagamen- to dos atendimentos da população. Como consequência importante dessa política, a assistência em saúde no Brasil fica es- truturada em moldes privados e lucrativos, com 56 grande capitalização e crescimento do setor pri- vado de saúde. Muitos empresários, quando se sentiram capitalizados, se descredenciaram e dei- xaramde atender pelo INPS. Polignano (2007), aponta que A existência de recursos para investimento e a criação de um mercado cativo de atenção mé- dica para os prestadores privados levou a um crescimento próximo de 500% no número de leitos hospitalares privados no período 69/84, de tal forma que subiram de 74.543 em 69 para 348.255 em 84. A partir deste momento, o modelo de as- sistência médico privatista torna-se hegemônico no Brasil. Ele é voltado para as ações curativas individuais e pelo setor privado e, dentro des- ta lógica, favorece a indústria de equipamento médico hospitalar e farmacêutica, que, em sua maioria, eram importados. Como principais ca- racterísticas, podemos apontar: • O enfoque é privilegiado na doença e na cura: as ações são curativas individuais, e por episódio, por isso, mais caras; 57 • A saúde pública, com enfoque na promoção da saúde, prevenção e cura, passa por um processo de abandono e sucateamento; • A organização da assistência no modelo Hos- pitalocêntrico, de influência norte-americana: o Hospital é o centro de todas as ações de saúde, e se dividiram por especialidades e seriam cons- truídos nas grandes cidades. A atenção em saúde é pensada como serviço prestado e organizado de forma a gerar lucro para os empresários do setor. • O único saber legitimado é o saber médico: os demais profissionais de saúde trabalhariam como auxiliares médicos; • O paciente é não é chamado a se responsabi- lizar pelo próprio cuidado, dele espera-se uma recepção passiva do tratamento estipulado pelo especialista, detentor do saber; • É um sistema excludente: apenas poderiam ser atendidos os contribuintes do INPS, ou seja, tra- balhadores com carteira assinada (trabalho for- mal) e familiares. • Não há fiscalização nem possibilidade de con- trole da sociedade nos serviços prestados a co- munidade, o que favoreceu o desvio de verbas e a corrupção. • São formados vários institutos: IAPAS (previ- 58 dência); INPS (benefícios) e INAMPS (Assistên- cia médica individual). Todos estes formavam o SIMPAS. Com três institutos, diminui a transpa- rência do uso dos recursos, também facilitando a corrupção. 4.2 Saúde Pública na Ditadura Militar No plano da saúde pública brasileira, go- verno militar instituiu vários órgãos, como por exemplo, a SUCAM (Superintendência de Cam- panhas da Saúde Pública), em 1970. Entretanto, esses órgãos não tiveram capacidade de efetivar ações, pois o aporte financeiro era pequeno. A maior parte dos recursos era empre- gada nas ações de serviços médico curativos, mesmo sendo mais caros, e era financiada pelas contribuições dos trabalhadores ao INPS. Dessa forma, fica evidente que o Ministério da Saúde era mais um órgão normativo e burocrático que executor de políticas públicas de saúde (POLIG- NANO, 2007). Com o AI-5, as ações integradas de saú- de não funcionaram, pois não traziam planos 59 4.3 Movimento da Reforma Sanitária e Transição Democrática efetivos: programas de saneamento básico são abandonados e a saúde pública é sucateada. Ou- tra consequência da opção pelo modelo médico curativo é o agravamento dos principais proble- mas de saúde coletiva, com sensível piora dos in- dicadores de saúde (mortalidade infantil, propor- ção de pobre, expectativa de vida, morbidade), falta de controle das endemias e epidemias, e a volta de doenças transmissíveis, como a menin- gite. Como agravante, o governo militar exerce controle rígido sobre o que é mostrado na mídia, censurando as informações sobre as epidemias de meningite e poliomielite. Em decorrência do excesso de gastos (aumentos constantes dos custos, pois muitos insumos e equipamentos eram importados), das fraudes e da corrupção (Hospitais e INAMPS superfaturavam o atendimento), a previdência começa a entrar em crise no início da década de 70. O país, dependente de recursos externo, 60 começa a ver a diminuição do crescimento (re- trocesso do “milagre econômico”), o que pro- voca a diminuição da arrecadação e dos recur- sos do INPS. De acordo com a Lei Orgânica da Previdência, união deveria repassar recursos do tesouro nacional para o sistema previdenciário (sistema tripartite - empregador, empregado e união), entretanto, a união nunca cumpriu com esse acordo, o que, aliado a outros fatores, tor- nou esse sistema insustentável. O governo inicia uma série de obras gi- gantescas, como a Ponte Rio-Niterói, a Transa- mazônica, e a Usina de Itapu, para o desenvolvi- mento do país, e, para cobrir as despesas, muitos dos recursos usados vinham de desvios de verba do sistema previdenciário. Os últimos anos do regime militar são de crise: desemprego, êxodo rural, maioria da população sem acesso a atendimento em saú- de, aumento da pobreza e inflação. Mesmo com a repressão, no final dos anos 70, movimentos populares, de trabalhadores em saúde, usuários, intelectuais, sindicalistas e militantes dos mais diversos movimentos sociais, que também se constituíram no mesmo período, passaram a lu- tar pela cidadania, pela democracia e pelo fim da 61 ditadura. Na saúde, tiveram grande repercussão o movimento feminista, a luta antimanicomial e o novo sindicalismo, além de inúmeras organi- zações não-governamentais, e outras entidades da sociedade civil que, insatisfeitos com o aban- dono da saúde pública, começa a reivindicar um plano de atenção à saúde e investimentos na área (GOLVEIA & PALMA, 1999). Inicia-se, em 1978, o Movimento Popu- lar de Saúde, que lutava por melhores condições de saúde e saneamento básico, conquistando a abertura de novos postos de saúde. Nesses ser- viços, a comunidade passou a exercer controle sobre as políticas públicas em saúde, elegendo representantes populares para os conselhos que gerenciavam as verbas e escolhiam que tipo de atendimento e promoção à saúde que cada co- munidade receberia. Experiências alternativas ocorrem por vários municípios do país, buscan- do alternativas ao sistema hospitalar. Em 1976 é criado o Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (CEBES) e em 1978 a Asso- ciação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO). A partir dessas associa- ções e dos movimentos populares, desenvolve- -se o chamado Movimento da Reforma Sani- 62 tária, que publicam o “Pelo Direito Universal à Saúde”, defendendo a saúde como direito do indivíduo e dever do Estado, ou seja, o Estado é compreendido como responsável por ofertar assistência à saúde da população, independente da contribuição previdenciária. No intuito organizar o sistema e sanar a crise, o governo cria o Ministério da Previdên- cia e Assistência Social (MPAS). Os órgãos mais importantes vinculados a esse ministério são: o INPS, o INAMPS e o IAPAS. Em 1980 foi formulado o PREV-SAÚDE, por técnicos de saúde, que previa a reorganização do sistema da saúde, priorizando assistência básica e, para tal, integrando os Ministérios da Saúde e da Previ- dência e as Secretarias Estaduais e Municipais da Saúde. Este plano nunca chegou a ser efetivado, tendo sido vetado por setores do governo liga- dos ao setor privado. Em 1980, o governo começa a dar de- clarações que o INAMPS não tem mais recursos para manter a assistência à saúde e as aposenta- dorias e pensões, dando a entender que o sistema estava tecnicamente falido. É criado o Conselho Consultivo de Administração da Saúde Pre- videnciária (CONASP), para reorientar o Prev- 63 Saúde e como tentativa de racionalizar os custos e combater as fraudes. Vinculado ao INAMPS, o CONASP começa uma fiscalização mais rigoro- sa dos prestadores de serviço médico, cobrando mais transparência. Outra importante modificação, na re- organização do sistema de saúde, foi a reto- mada das modificações propostas pelo PREV- -SAÚDE, que foi feito através da criação da AIS (Ações Integradas de Saúde) em 1983, que tinham por objetivo integrar as ações médico- -curativas e as preventiva-educativas. As prefei- turas, governo estadual, hospitaispúblicos, fi- lantrópicos e universitários passariam a receber recursos federais (verbas da previdência), para atuarem na atenção básica. Este repasse de ver- bas a estados e prefeitura permitiu o fortaleci- mento da rede básica de saúde. No seu quadro, o CONASP contava com técnicos ligados ao Movimento Sanitário, que iniciam um movimento de ruptura, porém, encontram grande resistência da Federação Bra- sileira de Hospitais e de medicina de grupo, e também dos burocratas do INAMPS, porque percebiam nesta iniciativa que perderiam sua he- gemonia e poder. A descentralização promovida 64 pelo AIS (que depois se transformaria no Siste- ma Unificado e Descentralizado) foi um impor- tante passo estratégico na implantação do SUS, que ocorreria somente depois da constituição de 1988 e das leis regulamentadoras, em 1990. No plano político, este é momento da transição democrática, com a volta da eleição di- reta para governador e a vitória esmagadora dos opositores do regime nas eleições desse período. 65 Exercícios de Fixação 1) Fale sobre a Lei Orgânica de Previdência e sobre a formação do INPS. 2) Quais foram as principais ações do governo militar na saúde pública? 3) Qual o modelo de assistência em saúde hege- mônico durante o período? Sugestão de Pesquisa: No final da década de 70 aconteceram even- tos importantes para a organização do sistema de saúde atual, como a reunião de Alma-Atá, o Movimento da Reforma Sanitária, a criação da ABRASCO foram fundamentais nos eventos que iriam culminar com o SUS e o movimento pela vida. Pesquise sobre: - O que defendiam esses movimentos; - A participação de Sérgio Arouca e dos princi- pais desses movimentos.
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