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CASO 1 Uma menina de 12 anos de idade, com história médica pregressa (HMP) co- mum, apresenta febre, dor de garganta e um curso de linfadenopatia cervical sensível. Ela é diagnosticada com faringite estreptocócica do grupo A e é tra- tada com penicilina IM. Alguns minutos após a injeção, a paciente apresenta dispneia, taquicardia e hipotensão, e percebe-se que apresenta sibilo ao exa- me. Também queixa-se de disfagia. Adrenalina (epinefrina) IM é administrada imediatamente para sua reação anafilática. Que efeito a adrenalina terá no sistema vascular dessa paciente? Que adrenoceptor divide primariamente a resposta vascular? Que efeito terá a adrenalina em seu sistema respiratório? Que adrenoceptor divide primariamente a resposta do sistema respiratório? 12 TOY, LOOSE, TISCHKAU & PILLAI RESPOSTAS PARA O CASO 1 Sistema nervoso simpático autônomo Resumo: Uma menina de 12 anos de idade com “garganta estreptocócica” recebe injeção de penicilina e desenvolve uma reação anafilática aguda. • Efeito da adrenalina sobre o sistema vascular: vasoconstrição. • Adrenoceptor que medeia primariamente a resposta vascular: alfa-1 (α1). • Efeito da adrenalina no sistema pulmonar: relaxamento muscular brônquico. • Adrenoceptor que medeia primariamente a resposta pulmonar: beta-2 (β2). CORRELAÇÃO CLÍNICA A anafilaxia é uma reação aguda imunomediada a um alérgeno caracterizada por broncoespasmo, sibilo, taquicardia e hipotensão. A adrenalina é o fármaco de esco- lha utilizado para tratar essa condição, pois neutraliza os processos fisiopatológicos subjacentes à anafilaxia por meio da ativação de adrenoceptores alfa (α) e beta (β). Como em todas as situações de emergência, o ABC (via aérea, respiração, circula- ção) deve ser abordado em primeiro lugar. Ocasionalmente, a anafilaxia provoca edema da laringe ao ponto de as vias aéreas serem comprometidas e a intubação (colocação de um tubo na traqueia) ser impossível. Nessas circunstâncias, uma pas- sagem de ar de emergência, tal como uma cirurgia de cricotiroideostomia (para criar uma abertura na pele através da cartilagem cricoide), é necessária. A dose apropriada: em crianças, 0,01 mg por quilograma (kg) de massa corporal (prepa- ração de 1 mg/mL) ou uma dose máxima de 0,5 mg pode ser administrada por via intramuscular e pode ser repetida a cada 5 a 25 minutos, conforme necessário. Em adultos, 0,3 a 0,5 mg (preparação de 1 mg/mL). ABORDAGEM AO Sistema nervoso simpático autônomo OBJETIVOS 1. Listar os neurotransmissores do sistema nervoso simpático autônomo e des- crever sua localização anatômica. 2. Fazer uma lista dos receptores e subtipos de receptores do sistema nervoso simpático autônomo. 3. Prever as respostas à ativação e à inibição dos receptores do sistema nervoso simpático autônomo. CASOS CLÍNICOS EM FARMACOLOGIA 13 DEFINIÇÕES SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO: Subdivisão do sistema nervoso periférico que é grandemente controlado de forma inconsciente, apresentado na Figura 1.1. SISTEMA NERVOSO SIMPÁTICO: Uma divisão do sistema nervoso autônomo (a outra é o sistema nervoso parassimpático). Fibras pré-ganglionares originam-se no SNC e são transportadas nos nervos espinais torácicos e lombares, fazendo sinap- se nos gânglios próximos da medula espinal. Também ocorrem sinapses na medula Figura 1.1 Esquema do sistema nervoso autônomo. Sistema nervoso simpático Sistema nervoso parassimpático Dilata a pupila dos olhos Inibe a secreção das glândulas salivares Relaxa os brônquios nos pulmões Acelera o coração Inibe a atividade do estômago e dos intestinos Inibe a atividade do pâncreas Estimula a me- dula suprarrenal Inibe o esvaziamento da bexiga Promove ejaculação e contrações vaginais Estimula a liberação de glicose do fígado; inibe a vesícula Promove ereção da genitália Promove o esvaziamento da bexiga Estimula a vesícula Estimula a atividade do pâncreas Estimula a atividade do estômago e dos intestinos Contrai os brônquios nos pulmões Retarda o coração Estimula as glândulas salivares Contrai a pupila dos olhos 14 TOY, LOOSE, TISCHKAU & PILLAI suprarrenal, que é considerada um gânglio modificado. Fibras pós-ganglionares inervam uma ampla variedade de órgãos efetores e tecidos, incluindo arteríolas e músculos lisos brônquicos. AGONISTA: Uma molécula (fármaco) que se liga e ativa um receptor, resultando em uma resposta. ANTAGONISTA: Uma molécula (fármaco) que se liga aos receptores, com pouco ou nenhum efeito de si mesma, mas que pode bloquear a ação de um agonista que se liga aos mesmos receptores. MIDRÍASE: Dilatação da pupila dos olhos. DISCUSSÃO Classe Catecolaminas endógenas são os neurotransmissores típicos liberados de terminais nervosos pós-ganglionares. O neurotransmissor noradrenalina (norepinefrina) é liberado dos nervos eferentes do sistema nervoso autônomo simpático nas ter- minações simpáticas (também conhecidas como “adrenérgicas”) pós-ganglionares. Adrenalina e algumas norepinefrinas são liberadas da medula suprarrenal. Os agonistas catecolaminas interagem nos adrenoceptores pós-sinápticos (assim denominados devido aos nervos adrenérgicos que eles inervam) que são classificados como alfa (α) ou beta (β). Existem dois subtipos de adrenoceptores α, α1 e α2. A ativação dos adreno- ceptores α1, por agonistas adrenérgicos, resulta em contração da maior parte do músculo liso vascular (α1), causando aumento da resistência periférica e da pressão arterial, contração do músculo dilatador pupilar resultando em midríase, relaxa- mento do músculo liso gastrintestinal e contração dos esfincteres gastrintesti- nais (α1, indiretamente por meio da inibição da liberação de acetilcolina [ACh]) e ejaculação. A ativação de autorreceptores de adrenoceptores pré-sinápticos (α2) por catecolaminas resulta na inibição (retroalimentação) da liberação de noradre- nalina e outros neurotransmissores das suas respectivas terminações nervosas. Existem três subtipos de adrenoceptores β, β1, β2 e β3. A ativação dos adreno- ceptores β por agonistas adrenérgicos resulta em aumento da frequência e força de contração do coração (β1), relaxamento do músculo liso dos brônquios que causa broncodilatação (β2) e ativação da lipólise de células de gordura (β3). Pelo fato de as catecolaminas adrenalina e noradrenalina terem funções fisio- lógicas importantes, medicamentos que bloqueiam suas ações, isto é, os antagonis- tas adrenoceptores, podem ter efeitos farmacológicos importantes e clinicamente úteis. Os antagonistas não seletivos do adrenoceptor α (p. ex., fentolamina) são utilizados para tratar a hipertensão de feocromocitoma (um tumor que secreta catecolaminas) e disfunção erétil masculina, enquanto os antagonistas adreno- ceptores α1 mais seletivos (p. ex., prazosina, terazosina, doxazosina) são utilizados para tratar a hipertensão arterial e hiperplasia benigna da próstata (Tab. 1.1). CASOS CLÍNICOS EM FARMACOLOGIA 15 Estrutura Adrenalina e noradrenalina são catecolaminas, sintetizadas a partir da tirosina, que possuem um núcleo de catecol com uma cadeia lateral de etilamina (adrenalina é o derivado da cadeia lateral metilada de noradrenalina). A enzima limitante da velocidade nesse processo é a tirosina hidroxilase. Mecanismo de ação A ligação da adrenalina a α1-adrenoceptores ativa proteína G (proteína de ligação a GTP do tipo Gq [Gq]) para estimular a fosfolipase C, resultando na formação de 1,4,5-trifosfato de inositol (IP3) promove a liberação de Ca 2+ a partir de depósitos intracelulares. A interação da adrenalina com adrenoceptores α2 ativa a proteína de ligação a GTP do tipo Gi (Gi) inibindo a atividade de adenilil-ciclase e diminuindo o monofosfato de adenosina cíclico intracelular (AMPc). A adrenalina talvez tam- bém aumente o influxo mediado pelo adrenoceptor β1 de Ca 2+ através de canais de membrana. Além do aumento da formação do segundo mensageiro, IP3, a adrenalina também aumenta a formaçãomediada por fosfolipase de outro segundo mensa- geiro o diacilglicerol (DAG), que ativa a proteína cinase C influenciando inúme- ras outras vias de sinalização. A adrenalina também ativa adrenoceptores β1 e β2 aumentando uma estimulação mediada pela proteína-G da atividade de adenilil ciclase, aumentando, desse modo, os níveis intracelulares de AMPc e atividade de proteína cinases dependentes de AMPc. Administração A adrenalina é, geralmente, administrada por via parenteral (IM) para o trata- mento de choque anafilático. Para essa e outras condições, também está disponível TABELA 1.1 • Efeitos selecionados da ativação adrenoceptora Órgão Efeitos (subtipo do adrenoceptor) Músculo liso brônquico Dilata (β2) Frequência cardíaca e forção contrátil Aumenta (β1) Olhos (tamanho da pupila) Dilata (α1) * Vasos sanguíneos Contraem (α1) **,*** Trato gastrintestinal (GI) (tônus, motilidade e secreções) Diminui (α1, β2) Pâncreas (liberação de insulina) Diminui (α2) *Dilatação (midríase) resulta de estimulação adrenoceptora α1 do músculo radial **Vasos sanguíneos do músculo esquelético têm adrenoceptores β2 que, quando ativados, resultam em cons- trição dos vasos ***As artérias coronárias têm também adrenoceptores β que, quando ativados, resultam em dilatação dos vasos, que é o efeito dominante 16 TOY, LOOSE, TISCHKAU & PILLAI em preparações IV, SC, oftálmica, nasal e aerossol. A noradrenalina está disponível apenas para administração parenteral IV em geral. Farmacocinética A adrenalina liberada pela glândula suprarrenal é metabolizada principalmente pela catecol-O-metiltransferase (COMT) e monoamina-oxidase (MAO). A ação da noradrenalina liberada de terminações nervosas é finalizada, principalmente, por captação em terminações nervosas (captação 1) e outras células (captação 2). QUESTÕES DE COMPREENSÃO 1.1 Percebe-se que uma paciente de 33 anos de idade com choque séptico tem hipotensão persistente apesar de infusão de dopamina IV. A paciente é tratada com uma infusão IV de adrenalina. Com qual adrenoceptor a adrenalina atua para contrair o músculo liso vascular? A. adrenoceptores α1 B. adrenoceptores α2 C. adrenoceptores β1 D. adrenoceptores β2 1.2 Um paciente de 16 anos de idade está tendo uma crise de asma aguda. A adrena- lina é administrada por via SC. Por meio de qual dos seguintes adrenoceptores a adrenalina atua para dilatar o músculo liso brônquico? A. adrenoceptores α1 B. adrenoceptores α2 C. adrenoceptores β1 D. adrenoceptores β2 1.3 Qual das seguintes alternativas descreve melhor a ação celular da adrenalina? A. Ativação de adenilciclase B. Diminuição da atividade de proteínas cinases dependentes de AMPc C. Aumento de depósitos intracelulares de Ca2+ D. Inibição da atividade de fosfolipase 1.4 A ativação de adrenoceptor β1 mediada por adrenalina resulta em qual das seguintes opções? A. Constrição da musculatura lisa brônquica B. Redução da motilidade gastrintestinal C. Dilatação das pupilas D. Aumento da frequência cardíaca CASOS CLÍNICOS EM FARMACOLOGIA 17 RESPOSTAS 1.1 A. Os adrenoceptores α1 medeiam a vasoconstrição em muitos leitos vascula- res. No músculo esquelético, a adrenalina pode atuar nos adrenoceptores β2 provocando vasodilatação. 1.2 D. A adrenalina atua nos adrenoceptores β2 causando relaxamento do mús- culo liso dos brônquios, resultando em broncodilatação. Devido aos efeitos cardiovasculares adversos da adrenalina (β1), agonistas de adrenoceptores β2 mais seletivos são utilizados atualmente (p. ex., albuterol). 1.3 A. A adrenalina ativa adrenoceptores α1 causando uma liberação de Ca 2+ intracelular armazenado e adrenoceptores β1 e β2 ativando adenilil-ciclase. 1.4 D. A ativação pela adrenalina de adrenoceptores β1 resulta em aumento da frequência cardíaca. A ativação de adrenoceptores α1 resulta na dilatação das pupilas. A ativação de adrenoceptores β2 provoca a dilatação do músculo liso brônquico e diminui a motilidade gastrintestinal (GI). DICAS DE FARMACOLOGIA Fisiologicamente, a adrenalina atua como hormônio nas células distantes, após sua libe- ração da medula suprarrenal. Neurônios pós-ganglionares simpáticos que inervam as glândulas sudoríparas e o múscu- lo liso vascular renal liberam ACh e dopamina, respectivamente. Todos os outros neurô- nios pós-ganglionares simpáticos liberam noradrenalina. A adrenalina/noradrenalina medeia a resposta fisiológica de “luta ou fuga”. Por exemplo, ao tentar escapar de um leão, as pupilas dilatam para melhorar a visão, todos os esfinc- teres contraem, a frequência cardíaca aumenta para otimizar o bombeamento do sangue, a resistência vascular periférica melhora para evitar síncope, ocorre broncodilatação para melhorar a oxigenação e o aumento do fluxo vascular para o músculo esquelético para ajudar a manobrar a saída da situação. Adrenalina administrada por via exógena aumenta a pressão arterial por meio de sua ação sobre adrenoceptores β1 no coração, resultando em aumento da frequência cardíaca e força de contração, e por meio de sua ação sobre adrenoceptores α1 em muitos leitos vasculares que resulta na vasoconstrição. No músculo esquelético, a injeção de adrenalina pode resultar em vasodilatação (β2) que, em alguns casos, pode conduzir a diminuição da resistência periférica total e diminuição da pressão diastólica. A noradrenalina tem pouco efeito nos adrenoceptores β2 (noradrenalina e adrenalina têm efeitos semelhantes nos adrenoceptores α1 e β1), aumentando, assim, tanto a pressão arterial sistólica como a diastólica. 18 TOY, LOOSE, TISCHKAU & PILLAI REFERÊNCIAS Brown SG. Cardiovascular aspects of anaphylaxis: implications for treatment and diagnosis. Curr Opin Allergy Clin Immunol. 2005;5(4):359. Brown SG, Mullins RJ, Gold MS. Anaphylaxis: diagnosis and management. Med J Aust. 2006;185(5):283. Goldstein DS, Robertson D, Straus SE, et al. Dysautonomias: clinical disorders of the autonomic nervous system. Ann Intern Med. 2002;137(9):753–63. Lieberman PL. Anaphylaxis. In: Adkinson NF Jr, Bochner BS, Busse WW, et al. (eds). Middleton’s Allergy: Principles and Practice, 7th ed. Mosby, St. Louis 2009. p. 1027. Simons KJ, Simons FE. Epinephrine and its use in anaphylaxis: current issues. Curr Opin Allergy Clin Immunol. 2010;10(4):354.
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