Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Regulação Endócrina do Cálcio Introdução O cálcio é extremamente importante para o funcionamento de muitas reações do organismo, além de ser um dos principais componentes estruturais dos cristais de hidroxiapatita dos ossos e dos dentes. No que se refere aos processos fisiológicos, o cálcio atua na contração dos músculos esqueléticos, cardíacos e lisos, na coagulação sanguínea, na sinalização intracelular, como segundo mensageiro, na exocitose e na transmissão de impulsos nervosos. Seu papel é considerável no sistema nervoso, pois em situações de hipocalcemia o sistema nervoso fica mais excitável, a ponto de ocorrer descargas espontâneas e levar a uma possível tetania. Por outro lado, na hipercalcemia o sistema nervoso fica deprimido e com atividades reflexas lentificadas. Absorção e Excreção Aproximadamente 35% do cálcio consumido é absorvido pelo intestino pela vitamina D e o restante é excretado nas fezes. Já a absorção intestinal de fosfato ocorre com facilidade. Cerca de 90% do cálcio filtrado nos rins é reabsorvido, já os outros 10% dependem da concentração de cálcio no sangue. Se a calcemia estiver baixa, nenhum cálcio é perdido na urina. Absorção e Excreção do Cálcio O paratormônio da paratireoide é o fator mais importante do controle da reabsorção de cálcio nos rins. Além disso controla também a excreção do fosfato. Osso Basicamente o osso compacto é composto de uma matriz orgânica óssea (30% do osso) e de sais ósseos (70%). A matriz orgânica é constituída de fibras colágenas e de uma substância fundamental composta de líquido extracelular, proteoglicanos, glicosaminoglicanos e glicoproteínas adesivas. As fibras colágenas conferem resistência à tração, os proteoglicanos e os glicosaminoglicanos suportam a compressão e as glicoproteínas adesivas associam-se às células e aos componentes da matriz. Os sais ósseos são compostos de cálcio e fosfato que, em conjunto, formam os cristais de hidroxiapatita, os quais promovem a dureza e rigidez do osso. Entre estes sais ósseos existem também íons magnésio, sódio, potássio e carbonato. As superfícies internas e externas dos ossos são cobertas por células osteogênicas de tecido conjuntivo, que constituem o endósteo e o periósteo, respectivamente. Histologicamente, o tecido ósseo é composto de células osteoprogenitoras, osteoblastos, osteócitos e osteoclastos. As células osteoprogenitoras são derivadas de células mesenquimais e dão origem aos osteoblastos por mitose. Os osteoblastos são responsáveis pela formação e pela mineralização da matriz óssea e da hidroxiapatita. Eles sintetizam o componente orgânico da matriz, o osteoide (composto de fibras colágenas e substância fundamental) por meio de uma precipitação de sais de cálcio e fósforo. Após os osteoblastos serem aprisionados nos osteoides produzidos por outros osteoblastos eles passam a se chamar osteócitos. Os osteócitos controlam a concentração extracelular de cálcio e fosfato, sendo estimulados pela calcitonina. Já os osteoclastos são células móveis gigantes e multinucleadas derivadas de precursores mononucleados provenientes da medula óssea. Sua função é secretar enzimas de reabsorção para digerir a matriz óssea, aumentando o cálcio sanguíneo. Vale ressaltar que o sangue entra no tecido ósseo por meio dos canais de Havers, que são canais centrais envolvidos por lamelas concêntricas (onde se localizam os osteócitos) que formam o sistema de Havers. Anatomia e Histologia do Osso Compacto Deposição Óssea A deposição óssea se inicia pelos osteoblastos, que secretam monômeros de colágeno e substância fundamental. Os monômeros vão se polimerizar, formando as fibras colágenas e o osteoide. Depois, alguns osteoblastos serão encarcerados no osteoide, recebendo a denominação de osteócitos e os sais de cálcio vão se precipitar para formar os cristais de hidroxiapatita. A regulação desse processo ocorre por uma substância secretada pelos osteoblastos, a fosfatase alcalina, que é responsável por neutralizar o pirofosfato (o qual inibe a cristalização da hidroxiapatita). Após a formação óssea, o osso ainda vai passar por uma deposição contínua de osteoblastos nas superfícies externas e nas cavidades ósseas. Reabsorção Óssea Os osteoclastos secretam, por meio de seus vilos, enzimas proteolíticas liberadas de lisossomos e vários ácidos liberados de mitocôndrias e vesículas. Tendo em vista tal informação, a reabsorção óssea ocorre da seguinte maneira: a enzima anidrase carbônica catalisa a produção de H2CO3 a partir de CO2 e H2O. No osteoclasto, o H2CO3 se dissocia em íons prótons H+ e bicarbonato HCO3-. Os íons bicarbonato são enviados aos capilares vizinhos e os íons H+ são transportados para o local onde o osteoclasto está aderido ao osso, diminuindo o pH da matriz. A acidez é capaz de dissolver os sais ósseos e as enzimas proteolíticas são liberadas para digerir a parte orgânica da matriz descalcificada. Os sais ósseos degradados são endocitados pelos osteoclastos e liberados nos capilares. Histologia do Osso Compacto Sinalização O paratormônio estimula a atividade dos osteoclastos em situações de hipocalcemia. Os osteoblastos indicam aos pré-osteoclastos para se diferenciarem em osteoclastos por meio de sinalizadores. Duas proteínas promovem a sinalização: o ativador de receptor para o ligante B do fator nuclear k (RANKL) e o fator estimulador de colônias de macrófagos (M-CSF). O paratormônio se liga a receptores nos osteoblastos, estimulando a síntese de RANKL. O RANKL se liga a seus receptores e promove a diferenciação de pré-osteoclastos em osteoclastos. Os osteoblastos também produzem osteoprotegerina (OPG), que é um fator de inibição da osteoclastogênese. Esse fator impede a ligação do RANKL em seu receptor, inibindo a formação de osteoclastos e a reabsorção óssea. Reabsorção Óssea dos Osteoclastos O paratormônio (PTH), a vitamina D e os glicocorticoides aumentam a produção de RANKL e inibem a formação de OPG. Vitamina D A vitamina D é responsável por aumentar a absorção intestinal de cálcio e também atuar na deposição e reabsorção óssea em conjunto com o paratormônio. Inicialmente, a vitamina D3 (colecalciferol) é formada na pele por meio da irradiação do 7-desidrocolesterol da pele pelos raios ultravioleta do sol. No fígado, o colecalciferol é convertido em 25-hidroxicolecalciferol por meio de uma hidroxilação regulada pela enzima 25-hidroxilase. A produção de 25- hidroxicolecalciferol é regulada por feedback. Se ingerirmos muita vitamina D3, a concentração de 25-hidroxicolecalciferol não aumenta, pois ele não é produzido em excesso. Isso porque a vitamina D3 armazenada no fígado pode durar meses, mas o 25-hidroxicolecalciferol dura poucas semanas. Portanto, esse feedback estoca vitamina D3 para usos futuros. Finalmente, o 25- hidroxicolecalciferol é convertido em 1,25- di-hidroxicolecalciferol nos rins por ação do paratormônio e da enzima 25(OH)D 1α- hidroxilase. Esta é a forma mais ativa da vitamina D. Vale ressaltar que a concentração de 1,25-di-hidroxicolecalciferol é influenciada pela concentração de cálcio no sangue, pois quando a calcemia está baixa, as paratireoides vão secretar PTH e este vai induzir a síntese da vitamina D ativa. Porém quando a calcemia está alta, as paratireoides não vão secretar PTH, inibindo a produção de vitamina D ativa. Formação de 1,25-di-hidroxicolcalciferol e papel do paratormônio Ações da Vitamina D No intestino, a vitamina D aumenta a absorção de cálcio por meio de um aumento da formação de calbindina, uma proteína ligante de cálcio. A calbindina atua na borda em escova do intestino para transportar cálcio para o citoplasma celular. Além de cálcio, a vitamina D também aumenta a absorção intestinal de fosfato. Nos rins, a vitamina D aumenta a reabsorção de cálcio e fosfato nostúbulos renais e diminui a excreção destes. Na ausência de vitamina D a ação do PTH de promover a reabsorção é reduzida ou até impedida por mecanismos ainda desconhecidos. Em quantidades menores, a vitamina D promove a calcificação óssea e intensifica a mineralização óssea. Glândula Paratireoide As glândulas paratireoides são quatro glândulas situadas atrás da tireoide. Elas possuem dois tipos de células, as células principais e as células oxifílicas. As células principais são responsáveis pela secreção do paratormônio. Anatomia e Histologia das Paratireoides Paratormônio A síntese do paratormônio se inicia nos ribossomos das glândulas paratireoides com o processo de tradução dos nucleotídeos de um mRNA. A tradução gera, nos ribossomos, a forma de pré-pró- hormônio. No retículo endoplasmático ele é clivado em pró-hormônio e no aparelho de Golgi o pró-hormônio é clivado em sua forma final (paratormônio) e é armazenado em grânulos secretores no citoplasma. A secreção do paratormônio ocorre por exocitose dos grânulos secretores, sendo estimulada por hipocalcemia, hiperfosfatemia e deficiência de vitamina D. Pequena redução da concentração de cálcio faz com que as paratireoides secretem rapidamente muito paratormônio. Por outro lado, um aumento da calcemia inibe a secreção do paratormônio. As alterações na calcemia são identificadas por um receptor sensível ao cálcio acoplado à proteína G presente nas células da paratireoide. Quando estimulados por cálcio (hipercalcemia), os receptores estimulam a liberação de cálcio dos estoques desse íon, diminuindo a secreção do paratormônio. Já nas situações de hipocalcemia, a diminuição de cálcio nos receptores inibe essa via, estimulando a secreção do PTH. Ações do Paratormônio No esqueleto o paratormônio estimula a mobilização do cálcio e fosfato no osso por meio de duas fases, uma rápida e outra lenta. Na fase rápida, o PTH remove os sais ósseos da matriz óssea dos osteócitos e das adjacências dos osteoblastos. Isso ocorre porque nas membranas dos osteoblastos e dos osteócitos existem receptores de PTH que ativam uma bomba de cálcio que bombeia cálcio do líquido ósseo (presente entre a membrana dos osteócitos e do osso) para o líquido extracelular, levando a uma rápida remoção dos sais ósseos para a corrente sanguínea. Na fase lenta o PTH promove a ativação dos osteoclastos por meio de receptores nas células pré-osteoclastas induzindo estas a se transformarem em osteoclastos maduros. Nos rins o paratormônio é responsável por aumentar a reabsorção tubular do cálcio em troca de diminuir a reabsorção de fosfato. Vale destacar seus efeitos em outros íons: aumenta a reabsorção de magnésio e hidrogênio e diminui a reabsorção de sódio, potássio e aminoácidos. O aumento da reabsorção do cálcio ocorre nos túbulos distais finais, nos túbulos coletores, nos ductos coletores iniciais e na alça descendente de Henle; nessas células o PTH interage com receptores, ativando a adenilciclase e levando ao aumento de cAMP, levando a uma cascata de reações. A diminuição da reabsorção de fosfato ocorre em conjunto com a de sódio. Como o sódio está sendo menos reabsorvido, mais água entrará por osmose ao longo do néfron para diluir tal íon, aumentando assim o fluxo urinário. Ações do Paratormônio Calcitonina A calcitonina é um hormônio peptídico sintetizado e secretado nas células parafoliculares (células C) da glândula tireoide. A síntese da calcitonina se inicia na forma de um pré-pró- hormônio, que sofre processamento enzimático com a liberação dos fragmentos carboxi e aminoterminais. Posteriormente, a calcitonina final é armazenada em grânulos secretores. A secreção da calcitonina ocorre por exocitose dos grânulos secretores sendo estimulada pela elevação da concentração de cálcio. Dados indicam que um aumento de 10% na calcemia provoca um aumento de duas vezes na secreção de calcitonina. Ações da Calcitonina Seu principal efeito biológico é o de reduzir os níveis de cálcio e fósforo da corrente sanguíneo. Isso se faz nos rins, intestino e ossos, principalmente. No osso, a calcitonina vai inibir a reabsorção óssea pelos osteoclastos e o efeito osteolítico, favorecendo a deposição de cálcio nos sais ósseos. Além disso, ela também vai diminuir a formação de novos osteoclastos, levando a uma posterior queda do número de osteoblastos. Nos rins, a calcitonina vai inibir a reabsorção de cálcio, aumentando assim a excreção urinária dele. No intestino, a calcitonina tem um efeito indireto, pois vai inibir as paratireoides, inibindo a secreção do paratormônio; sem paratormônio a vitamina D não pode ser ativada e, com isso, ela não pode aumentar a absorção intestinal de cálcio, portanto, esta se torna diminuída. Hipertireoidismo O hiperparatireoidismo se caracteriza pelo aumento da produção de paratormônio pelas glândulas tireoides, podendo ser do tipo primário, secundário ou terciário. No tipo primário, a secreção excessiva de PTH se dá por um tumor nas glândulas, sendo mais frequente em mulheres visto que elas estimulam mais a paratireoide nas situações de gestação e lactação. O hiperparatireoidismo secundário ocorre por um mecanismo compensatório para controlar os níveis de cálcio, fósforo e vitamina D. Ele pode ocorrer por doença renal crônica, o que impossibilita a produção de vitamina D ativa nos rins. A falta de vitamina D diminui a absorção intestinal e a reabsorção óssea de cálcio, levando a hipocalcemia. A hipocalcemia vai causar um aumento da secreção do PTH para se elevar os níveis de cálcio. Ocorre também uma hiperfosfatemia, pois a reabsorção do fosfato nos néfrons se mostra alterada. No hiperparatireoidismo nutricional secundário a causa da doença é por alterações na ingestão de fósforo e cálcio, levando a uma hipocalcemia e uma posterior hipersecreção de paratormônio nas paratireoides. O hiperparatireoidismo terciário é o agravamento do secundário, sendo causado por uma produção autônoma das glândulas paratireoides em decorrência de uma hipocalcemia persistente. A alta reabsorção óssea pode levar à calcificação dos músculos, dos tendões, das válvulas cardíacas e dos vasos sanguíneos. Os sintomas mais comuns do hiperparatireoidismo são: → Osteoporose: causada pela alta reabsorção óssea pelo excesso da atividade osteoclástica que diminui a matriz óssea orgânica; → Cálculos renais: causados porque o excesso de cálcio e fosfato são enviados aos rins e acabam por formar precipitados que darão origem aos cálculos; → Depressão do sistema nervoso central e periférico, pois o excesso de cálcio dificulta a formação do potencial de ação, levando também à fraqueza muscular; → Constipação, úlcera péptica, falta de apetite e depressão do relaxamento do coração; O tratamento consiste em terapia, rações com proporção de cálcio e fósforo de 1:1. Podem ser utilizados fármacos como quelantes de fósforo (para impedir a absorção do fósforo), repositores de vitamina D e calcitriol (diminui os níveis de PTH) ou tratamento cirúrgico, que consiste na retirada da glândula afetada. Hipotireoidismo O hipotireoidismo ocorre quando as glândulas paratireoides não secretam quantidades suficientes de paratormônio. Com isso, a reabsorção óssea reduz e os osteoclastos ficam inativos. Os baixos níveis de cálcio podem causar tetania. O tratamento consiste na utilização de vitamina D, para manter a concentração do cálcio iônico normal.
Compartilhar