Buscar

Esse obscuro objeto da pesquisa - Um manual de métodos, técnicas e teses em Antropologia

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 5 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS - UFSCar 
 Pesquisa Qualitativa Aplicada às Ciências Sociais 
 
 
 
 
 ​ Resenha 
Esse obscuro objeto da pesquisa - Um manual de métodos, 
técnicas e teses em Antropologia - Oscar Calavia Sáez 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O livro “​Esse obscuro objeto da pesquisa” ​de Oscar Calavia Sáez trata-se de um 
manual que segue, exclusivamente, o rastro das perguntas e dúvidas levantadas por seus 
alunos, problemas encontrados em suas orientações e outros temas interconectados uns 
nos outros. Sua abordagem durante o livro tem caráter sugestivo, dando recomendações 
e dicas para o pesquisador iniciante acerca de tudo que constitui a elaboração de um 
trabalho etnográfico, desde a coleta de material bruto, em campo, até elaboração do 
texto, já fora de cena, definições e conceitos, etc. 
O livro se trata de um manual, de caráter diferente dos demais; pretende ser uma 
espécie de guia para viageiros e em certo sentido, um livro de autoajuda; fornece dicas, 
exemplos e casos específicos. A primeira coisa a se esclarecer, de forma breve, foi a 
própria antropologia. A ciência, atualmente, se revela um tanto indisciplinada, “que faz e 
desfaz o mundo com os mesmos movimentos com que se faz e desfaz a si mesma”, 
estando em permanente crise de identidade; ninguém consegue precisar com exatidão o 
que é a disciplina. A questão que se coloca, inicialmente, perpassa entre a própria 
cientificidade da disciplina. A antropologia, em si, é uma ciência? O autor deixa claro, em 
sua opinião, que sim. Mas para responder tal questão, não definitivamente, empreende 
três discussões: a primeira, sobre a própria objetividade da ciência, de um modo geral, 
abordando autores como Popper, Wittgenstein e Thomas Kuhn, acerca do ponto de vista 
de como as discussões da área da epistemologia vieram se desenvolvendo; o divórcio 
entre ciências naturais e ciências humanas (a distinção entre a ciência nomotéticas e 
ideográficas) e, por último, a defesa mínima de um conjunto de regras do jogo, da qual é 
preciso cultivar para que o campo específico do conhecimento possa se firmar enquanto 
ciência. A partir daí ele vai discutir as relações da antropologia com outras áreas: 
literatura, história, filosofia e da antropologia enquanto etnografia. O nos interessa, no 
entanto, é o último tópico. A antropologia, atualmente, tende a se definir como etnografia. 
Porém, ela nem sempre esteve disposta a se proclamar como tal. Pode-se estabelecer 
uma espécie de pirâmide para alocar as posições que anteriormente elas detinham: 
primeiramente, a antropologia, logo após a etnologia e por fim a etnografia. No entanto, 
esses patamares ruíram e a etnografia ascendeu na consideração dos acadêmicos. A 
partir do momento que a disciplina se desfez das amarras ligadas às constituições dos 
estados nacionais, ela passou a ser, sobretudo, ofício etnográfico. 
A seguir, em teoria, métodos e técnicas, o autor define brevemente sobre alguns 
conceitos importantes. As técnicas estão dentro de um universo muito vasto e aberto, 
abrangendo até mesmo a fotografia, cinematografia, armar uma barraca, dirigir um carro 
etc., isto é, inúmeras habilidades necessárias para uma investigação etnográfica, sendo 
difícil definir qual “facilita a vida do pesquisador”. No entanto, ressalva o autor, definir a 
observação participante como uma técnica, é um ato extremamente redutor. Ela é muito 
mais do que isso, “é um ambiente dentro do qual ganham um valor modificado outras 
técnicas também em si muito amplas”, se trata de uma arte de viver olhando em volta. O 
método, assim como ela, não se reduz a um conjunto de métodos. Antes de mais nada, 
ele é um protocolo de conduta, uma espécie de valor ético. Agir metodologicamente 
significa seguir até o final as pistas oferecidas pela técnica. Já a teoria, é um hipertexto, é 
“uma organização do texto em que todos os elementos remetem, não só a um objeto 
descrito, mas a outros os discursos elaborados a seu respeito”. Ela deve ser minimalista, 
 
 
sem que sua descrição ocupe o centro da cena. Para classificar as teorias, o autor utiliza 
diferentes tipos de metáforas e ao final delas enfatiza que o melhor não é apenas optar 
por uma ou outra, e sim a possibilidade de variar entre elas. 
A partir daqui, há dois capítulos que compõem um conjunto de dicas e orientações 
bastantes pragmáticas acerca do que o pesquisador deveria observar ao longo do 
processo de elaboração de sua tese. A tese é um longo escrito, mas não 
necessariamente um livro, já que “um bom livro é mais difícil de escrever, e mais 
agradável de ler, que uma boa tese sobre o mesmo tema”. Ela atende um 
protocolo/formato bastante repetitivo; uma espécie de formulário preestabelecido. Ela é a 
peça que faz a conexão entre o período de formação do pesquisador, e o longo período 
de formação teórica acadêmica. O pesquisador, a qual está produzindo a tese, jamais 
deve abrir mão de sua autoria, seja ela em conjunto ou individual. No entanto, a 
propriedade intelectual tem tomando com frequência, segundo ele, a forma de uma 
autoria por exclusão, isto é, autoria diacrítica. Um bom volume desse capítulo diz respeito 
a bibliografia, e dicas de como citar outros autores de maneira apropriada. E por fim, há 
também o projeto, que se situa entre a formação do pesquisador e a pesquisa, e deve ser 
formulado de maneira mais breve possível. Ele é quem dá a estrutura para a tese, 
fazendo uma definição provisória, se delineando em uma base segmentar. 
Por fim, os dois últimos capítulos constituem um bloco, isto porque o primeiro é um 
conjunto de recomendações para o etnógrafo iniciante conduzir a sua pesquisa, uma vez 
em campo, e o segundo, diz respeito ao que fazer com os dados/materiais coletados após 
sair de cena. O campo é o “episódio” fundamental para o etnógrafo, visto como um ritual 
de iniciação, tanto que sua autoridade etnográfica se constitui através de “estar lá”,O 
campo é um modo relativamente simples e acessível de dar ao pesquisador iniciante uma 
voz independente, capaz de interpelar as sumidades da academia”. Em algumas páginas 
o autor dialoga sobre como transformar aquilo que é “normal” para nós, em algo exótico – 
sem olharmos bem de perto, as coisas não são tão normais quanto parecem. Acerca de 
como se comportar, uma vez nele, o autor ressalta que não existe uma fórmula específica 
para tal questão. No entanto, todos os cuidados que você tem no contexto usual das suas 
relações, podem ser transferidos para tal; cuidados, gentileza, respeito, moderação, uma 
certa razoabilidade, etc. O campo na antropologia, em certo sentido, é ao contrário do 
laboratório. Ele é, precisamente, aquela situação em que o controle sobre as variáveis lhe 
fogem completamente das mãos, isto é, o trabalho de campo é, por definição, a situação 
de estudo em que se renuncia a controlar as condições do estudo. Ele é marcado pelos 
imponderáveis e pelo contexto. A cobaia, no caso, não é um animal, e sim o próprio 
antropólogo, e as variáveis são os seus conceitos. O diário de campo é, de longe, o 
principal elemento técnico e metodológico da pesquisa etnográfica . Ele é caracterizado 
por centralizar todas as atividades e ideias do atuante, sendo uma espécie de suporte 
físico. 
Em etnografia: na mesa, o autor retoma algumas observações sobre os dados, e 
se concentra especialmente na ideia de descrição densa. O mundo não é feito de dados, 
nós os produzimos, e que se esses dados são produzidos pelos sujeitos da pesquisa, eles 
que são potencialmente infinitos: nunca se reunirão todos os dados, e eles nunca podem 
 
 
ser exaustivos (ser exaustivo é o modo mais rápido de ser chegar a um erro). Tendo essa 
noção, é preciso tomar um grande cuidado com a enorme facilidade, atualmente, dos 
registros dessas informações, especialmente através da gravação. Hoje em dia, é raro 
encontrar alguém que se limite a levantar uma documentação etnográfica utilizando-se de 
meiosmanuais, dado que, o pesquisador iniciante acaba gerando uma massa intratável 
de materiais. No entanto, o autor dá dicas, brevemente, sobre como lidar com a 
tecnologia e o grande armazenamento desses dados. A etnografia que você produz na 
mesa sempre será uma descrição, afirma ele. Ela não é um listado de dados, mas uma 
operação que estabelece conexões entre eles. Na hora de os produzir, as anotações 
diárias se tornarão a tua base, ou até mesmo, o seu grande companheiro; teu livro de 
cabeceira. Essas várias leituras registradas permitirá que você veja as coisas de outra 
maneira, e captar fatos antes não vistos. Uma descrição densa traz os fatos junto com a 
interpretação. Ela incorpora intencionalidade dos atores que estão em cena, produz 
comparações entre esse objeto e objetos do mesmo tipo; que dá interpretações dos 
próprios, assim como interpretações do próprio observador e lida. A descrição etnográfica 
enquanto descrição densa é aquela que trata de fatores, elementos, aspectos que não 
são previsíveis ou que não são fotografáveis, que são muito específicos. 
De fato, como podemos ver, o livro se revela um longo guia de recomendações e 
dicas para pesquisadores iniciantes, ou até mesmo aqueles que já estão na área faz um 
tempo. Ele abordou tópicos importantes, mesmo que alguns pareçam óbvios, de certa 
maneira, definiu vários conceitos, esclareceu dúvidas, deu casos, exemplos e objeções 
etc., fez o papel de um bom manual; guia para viageiros. Há alguns pontos específicos 
que gostaria de comentar de forma positiva, como por exemplo, a questão da 
participação. O autor, menciona o seguinte trecho, “o pesquisador, na verdade, está bem 
visível aí no palco, não necessariamente no seu centro, e mais vale contar com isso”, 
assumindo que, não é possível, para o pesquisador querer se “invisibilizar”, ou fazer de 
conta que não está lá, pois este é extremamente marcante para o objeto de estudo em 
questão. E além do mais, como cita, não é possível produzir um relato etnográfico sem a 
interação social, sendo a sua presença a mediadora do comportamento nativo frente ao 
evento. Essa ideia se conecta, em alguns aspectos, com o autor Bruce Albert, em seu 
texto “​Situação Etnográfica e Movimentos Étnicos. Notas sobre o trabalho de campo 
pós-malinowskiano​”, onde afirma que a​ participação do etnógrafo, frente a vida nativa, é a 
própria condição para a pesquisa etnográfica​. O ponto que quero chegar é, o pesquisador 
é incapaz de se tornar neutro dentro do campo de pesquisa (se tornar invisível), e há uma 
necessidade postulada e debatida entre muitos autores, da interação social e a 
participação efetiva do antropólogo frente a vida nativa, colocando em cheque o seu 
trabalho, pois o comportamento nativo se desenvolve através disso. 
Outro ponto debatido pelo autor percorre sobre a utilização do diário de campo. 
Este é, sem dúvida nenhuma, o objeto mais importante para se ter em campo, como no 
autor mesmo cita, “o diário de campo é, de longe, o principal elemento técnico y 
metodológico da pesquisa etnográfica (…) sem diário de campo não é uma pesquisa 
etnográfica”. Por mais que seja um artefato simples do dia a dia, ele é a base de sua 
pesquisa. Para abordar sobre o tema, recorro ao relato de Favret-Saada, em seu texto 
“​Ser Afetado​”, onde a autora, devido às circunstâncias, deixou o seu posto de 
 
 
observadora, adentrando ao conceito de participação observante, colocando em risco 
todo o seu trabalho intelectual, e se integrou aos rituais de “desenfeitiçamento”. Ela 
permitiu perder o controle da situação e deixar-se afetar pelo fenômeno, se apoiando 
exclusivamente em seu diário. A descrição no diário não era feita imediatamente, pois 
como mencionei, ela estava imersa na participação efetiva das celebrações, e qualquer 
ato, como escrever a descrição dos episódios, a faria perder todo o fenômeno presente. 
No entanto, assim que possível, ela “despejava” todo o turbilhão de experiências que 
passava em sua mente, muitas vezes complexas, ao seu diário de campo, a fim de 
compreender o que havia acontecido. No meio de uma vasta absorção de novas 
experiências, a autora agiu metodicamente, ato que permitiu estar consciente durante 
todo o seu percurso na pesquisa e concluir o seu trabalho. Portanto, a documentação dos 
fatos ante a seu diário de campo, possibilita que você contorne a situação e veja os dados 
com mais clareza, e, ainda mais, após sair de campo, obter percepções que antes você 
não havia observado, sendo o artefato físico mais precioso do antropólogo.

Continue navegando