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Análise da produção escrita dos surdos_a interferência da língua brasileira de sinais

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1 
 
 
 
ANÁLISE DA PRODUÇÃO ESCRITA DOS SURDOS: A 
INTERFERÊNCIA DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS 
 
Mônica de Gois Silva Barbosa1 
Vagner dos Santos Barbosa2 
Eixo temático 11: Estudos da linguagem 
Resumo 
Este artigo apresenta aspectos relevantes sobre a produção escrita de alunos surdos, no gênero 
relato de experiência vivida. Objetiva-se analisar as principais características do texto escrito 
pelos surdos, com o intuito de compreender as interferências da LIBRAS - Língua Brasileira 
de Sinais, língua materna da comunidade surda brasileira, na escrita da Língua Portuguesa, 
sua segunda língua. O texto analisado foi escrito por uma jovem com surdez moderada, 
oralizada e usuária da LIBRAS, com nível médio completo. A produção foi fruto de uma 
atividade de Língua Portuguesa de um curso profissionalizante. A análise permitirá 
compreender determinadas particularidades dessa escrita nos níveis fonológico, morfológico e 
sintático, possibilitando a construção de sentido do texto, como também contribuirá para que 
professores de surdos conheçam as características da interlíngua nas produções de tais alunos. 
 
Palavras-chave: Produção escrita. Língua Portuguesa. LIBRAS. 
 
Abstract: 
This paper presents relevant aspects of the written production of deaf students in gender 
reporting experience. It aims to analyze the main features of the text written by the deaf, in 
order to understand the noise in LIBRAS - Brazilian sign language, mother tongue of the deaf 
community in Brazil, written in Portuguese, their second language. The work reviewed was 
written by a young man with moderate deafness, maintain oral function and user of LIBRAS, 
with medium full. The production was a result of activity of Portuguese Language an 
apprenticeship. The analysis will understand the particularities of their writing levels 
phonological, morphological and syntactic, allowing the construction of meaning of the text, 
but also will help teachers of the deaf know the characteristics of interlanguage in productions 
of such students. 
 
Keywords: Written production. Portuguese Language. LIBRAS. 
 
Introdução 
 
2 
 
 
A educação de pessoas surdas tem percorrido um caminho de dores, lutas e vitórias. 
Dentre as conquistas ressalta-se o reconhecimento da LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) 
como primeira língua da comunidade surda do Brasil. Porém, esse reconhecimento não tem 
proporcionado as mudanças desejadas, dentre elas, o ensino do português como segunda 
língua. Como consequência disso, as produções escritas dos surdos são avaliadas sem levar 
em conta a interferência da língua materna no aprendizado da segunda língua. 
Diante do exposto pode-se questionar: será que o desempenho linguístico da produção 
escrita analisada é desprovida de sentido? Ou ainda, será que as peculiaridades da produção 
escrita dos surdos impossibilitam a coerência do texto? 
Dessa forma, neste artigo serão examinadas as influências da LIBRAS na produção 
escrita de surdos. Para tanto, objetiva-se aqui analisar as características dessa interferência na 
escrita e compreender os procedimentos de construção de sentido na escrita da pessoa surda. 
O artigo organiza-se em duas partes: a primeira trata-se dos pressupostos teóricos e a 
segunda aborda a análise do texto. A fundamentação teórica subdivide-se em três tópicos. O 
primeiro refere-se a um breve apanhado histórico com o intuito de contextualizar a atual 
situação educacional da pessoa surda. O segundo trata-se de diferenciar aspectos gramaticais 
da língua de sinais em relação à língua portuguesa e as implicações da LIBRAS na produção 
escrita da língua portuguesa. Nessa seção serão abordadas as categorias de análise. E o 
terceiro tópico explanará algumas características do gênero relato de experiência vivida. 
A elaboração deste artigo justifica-se diante da relevância do assunto por se tratar de 
falantes da LIBRAS aprendizes do português como segunda língua. O artigo tratará de um 
conteúdo relevante para pesquisadores e professores interessados em estudos linguísticos, 
pois possibilitará um esclarecimento sobre as características da escrita do surdo, permitindo 
um novo olhar sobre tais produções. 
 
Trajetória da educação de surdos 
 
Desde a Antiguidade e por quase toda a Idade Média os surdos eram vistos como 
incapazes de serem educados, nem mesmo exercer direitos legais, como casar e herdar bens. 
No início do século XVI, houve a aceitação da educação para surdos através de metodologia 
que desenvolvesse o pensamento através do ensino da fala e da compreensão da língua falada. 
Pensava-se que a habilidade de falar com a voz estava intrinsecamente associada à 
inteligência. Entretanto, esse ensino era restrito aos filhos de nobres, por isso, pouquíssimos 
surdos tinham acesso. Além disso, segundo Soares (2005), desde o início da Idade Moderna 
3 
 
 
os surdos eram alvos da medicina e da religião. Sendo uma deficiência relacionada a uma 
anomalia orgânica, a surdez-mudez3 constituía um desafio para medicina. E segundo os 
preceitos religiosos, deviam-se ajudar os desvalidos, entre eles, aqueles que não podiam ouvir 
nem falar. (SOARES, 2005) 
Em vários países da Europa, ouvintes desenvolveram métodos para ensinar aos surdos 
a língua de seu país, entre eles, destacaram-se na Itália, Girolamo Cardano; na Espanha, Pedro 
Ponce de Leon e Juan Pablo Bonet; na Alemanha, Samuel Heinicke e Moritz Hill, na França, 
Charles Michael de L’Epée que funda, em Paris, a primeira escola para surdos em 1775, entre 
outros. Alguns desses professores utilizaram o método “oralista puro”, que se voltava 
unicamente para o ensino da língua falada. Outros acreditavam que a melhor metodologia de 
ensino para os surdos era o “método combinado”, que utilizava a língua de sinais como meio 
para o ensino da fala. 
Dentre essas práticas, muitas vezes o conhecimento que os surdos adquiriam eram por 
meio da escrita. Por isso, muitos médicos desenvolveram praticas de ensinar os surdos a ler e 
escrever para adquirir a fala. (SOARES, 2005, p.24). Entretanto, conforme Zumthor (1993, p. 
18-22) a primeira forma de comunicação humana foi a oralização, por isso a preocupação tão 
grande de médicos e educadores em desenvolver a fala na pessoa surda. O fato de ensinarem a 
escrita justifica-se por ela ser um instrumento para chegar a fala que era tão valorizada em 
uma sociedade que tinha a escrita como algo externo, parcial e atrasada. (ZUMTHOR, 1993, 
p. 18) 
Dos professores citados acima o que influenciou na educação dos Surdos no Brasil foi 
o francês Michael de L’Epée, pois vem do seu Instituto para o Brasil o professor Ernest Huet. 
Chega em 1855, no Rio de Janeiro, num momento social em que tais indivíduos não eram 
reconhecidos como cidadãos. Esse professor, em 1857, fundou a primeira escola para surdos 
no Brasil, o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), antigo Instituto dos Surdos-
Mudos. Foi a partir desse instituto que surgiu a Língua Brasileira de Sinais, a partir da 
combinação da Língua de Sinais Francesa com a língua de sinais já usada por surdos de várias 
regiões do Brasil. 
 Em 1880, aconteceu o congresso de Milão. Evento internacional que resultou no 
fortalecimento da filosofia oralista, sendo desta forma, um verdadeiro retrocesso na educação 
dos surdos do mundo todo. Essa tendência proibia os surdos de utilizar qualquer tipo de 
comunicação através dos sinais. O descontentamento com essa metodologia e estudos 
realizados sobre língua de sinais, que surgiram na década de 1960, deram origem a novas 
propostas pedagógico-educacionais em relação à educação da pessoa surda. 
4 
 
 
Passou a ser adotada, a partir da década de 1970, a filosofia educacional denominada 
comunicação total. Essa abordagem permite o uso de sinais, gestos, leitura orofacial, 
datilologia, desenho etc. Admitindo o contato com os sinais, antes proibido pelo oralismo, 
esse método possibilitou aos surdosse dispor a aprender a língua de sinais (LS). Entretanto, 
esta ainda não era reconhecida como língua natural dos surdos, era apenas um instrumento 
para se ensinar a Língua Portuguesa (LP). 
Paralelamente ao desenvolvimento das propostas de comunicação total foram surgindo 
pesquisas sobre línguas de sinais e conseqüentemente, estudos sobre uma metodologia voltada 
para educação bilíngue. Segundo o bilinguismo a língua de sinais é a língua materna dos 
surdos e a língua Portuguesa é a segunda língua. 
Desta forma, a educação bilíngue contrapõe-se ao oralismo, pois trabalha com uma 
pedagogia visual e entende que a oralização dos surdos não é de competência educacional. Ela 
contrapõe-se a comunicação total porque compreende que tanto a LP como a LS têm 
características próprias e é incompatível articulá-las simultaneamente, visto que os surdos 
precisam adquirir a língua de sinais com metodologia de ensino de língua materna e aprender 
a LP com metodologia de ensino de segunda língua (L2). (SALLES, 2004) 
A aplicação dessa metodologia ainda é recente e em muitos países, como no Brasil, as 
experiências ainda são poucas. Faltam profissionais habilitados e ainda há resistências de 
muitos em considerar a língua de sinais como língua natural dos surdos. 
 
Interferências da LIBRAS na escrita da Língua Portuguesa 
 
No primeiro artigo da lei de LIBRAS nº. 10.436, de 24 de abril de 2002 lemos: “É 
reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais – 
Libras e outros recursos de expressão a ela associados”. Portanto, a LIBRAS é considerada 
como língua, isso porque diante de análises feitos por linguistas foi constatado que apresenta 
características de língua: 
Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de 
comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-
motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico 
de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas 
surdas do Brasil. (lei 10.436, parágrafo único) 
 
Sendo uma língua com modalidade diferente da língua oral há repercussões diretas na 
aprendizagem escrita da segunda língua. Por isso, a análise de produções escritas de surdos 
5 
 
 
tem despertado interesse de linguistas e educadores. Algumas particularidades dos textos são 
apontadas por autores como: Quadros (2006), Salles (2004), Faria (2001), entre outros. 
 Deve-se ressaltar que na aprendizagem do português como segunda língua, na 
modalidade escrita, ocorre a articulação das propriedades da língua materna (LIBRAS) e da 
língua alvo, dando origem à interlíngua4. 
 Ao se referir aos estágios de interlíngua, Quadros e Schmiedt (2006, p. 34) esclarecem: 
“esses estágios de interlíngua apresentam características de um sistema linguístico com regras 
próprias e vai em direção à segunda língua.” Isto significa que em diversos estágios da 
escolarização do surdo, a sua produção escrita estará sujeita a diferenciações. Por isso, nas 
etapas iniciais a sua escrita estará muito mais marcada pelas características da língua de 
sinais, enquanto que nas etapas finais desse processo, mesmo com particularidades, ela estará 
mais próxima do português, sua segunda língua. Isso foi comprovado pelas pesquisas 
realizadas por Brocado (2003, p. 308) demonstrando os estágios de interlíngua em crianças 
surdas. 
 Segundo ele, no estágio de interlíngua I, observa-se o emprego predominante de 
estratégias de transferência da língua de sinais (L1) para a escrita da Língua Portuguesa (L2). 
Já no estágio de interlíngua II, segundo o autor, constata-se na escrita de alguns alunos uma 
intensa mistura das duas línguas, em que se observa o emprego de estruturas linguísticas da 
Língua de Sinais Brasileira e o uso indiscriminado de elementos da Língua Portuguesa, na 
tentativa de apropriar-se da língua alvo. No terceiro estágio de interlíngua, há o emprego 
predominante da gramática da Língua Portuguesa em todos os níveis, principalmente, no 
sintático. Definindo-se pelo aparecimento de um número maior de frases na ordem Sujeito-
Verbo-Objeto e de estruturas complexas. 
Diante dessas particularidades da interlíngua, o primeiro contato com um texto escrito 
por um surdo é algo desconcertante para o ouvinte. Isso acontece pelo fato de o ouvinte não 
conhecer a realidade do surdo e desconhecer que a produção escrita em LP trata-se de 
segunda língua. (SALLES, 2004, p. 118). Daí a importância de conhecermos as características 
da LIBRAS para compreender as implicações dessa língua na aprendizagem escrita da Língua 
Portuguesa. 
Primeiramente, deve-se ressaltar que, como qualquer outra língu,a a LIBRAS 
apresenta suas características gramaticais próprias, diferenciando-se, portanto, da estrutura da 
Língua Portuguesa. A respeito disso comenta Felipe (2005, p.21): 
A LIBRAS, como toda língua de sinais, é uma língua de modalidade 
gestual-visual que utiliza, como canal ou meio de comunicação, 
6 
 
 
movimentos gestuais e expressões faciais que são percebidas pela visão; 
portanto, diferencia da Língua Portuguesa, uma língua de modalidade oral-
auditiva, que utiliza, como canal ou meio de comunicação, sons articulados 
que são percebidos pelos ouvidos. Mas as diferenças não estão somente na 
utilização de canais diferentes, estão também nas estruturas gramaticais de 
cada língua. 
 
Diante das diferenças das duas línguas, como categorias de análise, serão levadas em 
consideração a repercussão de tais diferenças nos níveis fonológicos, morfológico e sintático 
no texto produzido pelo surdo. Tais categorias baseiam-se na pesquisa desenvolvida por Faria 
(2001). 
 
Aspectos fonológicos 
 
No que se refere aos aspectos fonológicos, a LP tem como unidade mínima o som 
(fonema), na LIBRAS a articulação das mãos são comparadas aos fonemas. Essas articulações 
são denominadas de parâmetros, que são: configurações de mãos - a forma da mão; ponto de 
articulação – o lugar onde se posiciona a mão; movimento – os sinais podem ter ou não; 
orientação – a direção do sinal; expressão facial/corporal – muitos sinais necessitam de 
expressões feitas pelo rosto/ou corpo. Assim, a partir da combinação destes parâmetros são 
formados os sinais que são as palavras. 
Em relação às expressões faciais e corporais, que se refere ao quinto parâmetro da 
LIBRAS, na língua oral também há ocorrências de tais recursos que não estão presentes na 
escrita. Sobre isso, Carvalho afirma: 
A comunicação oral exige, além do conhecimento das normas que regem o 
funcionamento da língua, o manejo de recursos não verbais e 
paralinguísticos, como gestos, as expressões faciais, as entonações, etc., o 
que não ocorre na escrita, em que a coesão é estabelecida através do uso de 
conectivos, recorrência a lexicalizações e estruturas de maior complexidade. 
(2008, p. 65) 
 
Esses recursos não verbais são imprescindíveis nas duas línguas, pois eles interferem 
na interpretação e entendimento dos enunciados. 
Além de tais recursos, os aspectos fonológicos próprios de uma língua de modalidade 
espaço-visual repercutem na produção de textos escritos por educandos surdos. Interferindo 
diretamente na ortografia, acentuação e pontuação. 
 
Aspectos morfológicos 
 
7 
 
 
Em relação à morfologia, que é a parte da gramática que estuda as palavras e os 
elementos que as constituem, há uma grande diferença entre as línguas em questão. No que se 
refere à palavra, nas línguas orais-auditivas ela é denominada de item lexical, nas línguas de 
sinais são os sinais. Além de estudar a flexão das palavras, a morfologia também as divide em 
classes gramaticais. Neste caso, também há diferenças entre essas duas línguas. Por exemplo, 
na LIBRAS há ausência de conectivos de ligação pelo fato de a ligação entre os elementos se 
estabelecer no espaço. 
Assim, nas frases escritas produzidas por surdos, pode-se verificar falta de 
concordância de gênero enúmero. Há uma tendência em escrever verbos no infinitivo, ou 
flexão incorreta ocasionando estruturas inadequadas. Há omissão frequente dos verbos de 
ligação, devido a inexistência destes na LIBRAS. O uso inadequado ou ausência de 
conectivos. Há também escrita do verbo no lugar do adjetivo ou substantivo e vice-versa. 
 
Aspectos sintáticos 
 
A sintaxe estuda a relação das palavras nas frases. Na LIBRAS a sintaxe é espacial. 
Por isso há uma diferença no emprego do objeto que pode está à direita ou à esquerda do 
verbo. Isso acarreta em estruturas invertidas da Língua Portuguesa, principalmente por verbos 
com concordância pelo fato de ter incorporações aleatórias de pontos no espaço. O ponto 
inicial é o sujeito e o final é o objeto. De acordo com Faria (2001, p. 1), não foi encontrado 
estruturação passiva em LIBRAS. Dentre as repercussões na escrita, há uma escrita sem 
preocupação com a posição do objeto, produzindo estruturas invertidas (Objeto-Sujeito-
Verbo) 
 
Gênero: relato de experiência vivida 
 
 
Antes da análise do texto, percebe-se que é importante esclarecer algumas 
características do gênero analisado. Primeiramente, ressalta-se que gênero textual também 
denominado de gênero discursivo é considerado aqui como “uma forma textual concretamente 
realizada e encontrada como texto empírico, materializado. O gênero tem existência concreta 
expressa em designações diversas, constituindo, em princípio, conjuntos abertos.” 
(MARCUSCHI, 2001, 42-43) 
O texto selecionado trata-se do gênero relato de experiência vivida. E em relação à 
condição de produção, o texto foi fruto de uma atividade solicitada pela professora de Língua 
8 
 
 
Portuguesa, no ano de 2006, em um curso de capacitação de surdos para o mercado de 
trabalho, oferecido numa parceria SENAC/APADA/Instituto G. Barbosa na cidade de 
Aracaju-Sergipe. 
Após uma visita a um dos supermercados da rede G. Barbosa, foi feito debate em sala 
de aula e solicitado o relato da experiência na forma escrita. O texto pertence a uma jovem 
com surdez moderada e oralizada, tendo nível médio completo. Sobre a autoria, é importante 
salientar que o escritor “é ele que dá um rumo ao que é dito, sendo responsável único pelo que 
faz, desde que não experimenta o envolvimento imediato com o interlocutor, típico de uma 
conversa, de um diálogo” (CARVALHO, 2008, p. 66). Assim, tratou-se de uma atividade 
planejada e houve um distanciamento dos interlocutores. 
Dentre as características desse gênero pode-se destacar que se encontram presentes no 
texto expressões gramaticais que revelam marcas da autoria, de diálogo e de tempo. Sendo 
estas marcas características próprias do gênero em questão. 
Dentre as marcas da autoria, pode-se destacar: 
• Expressões que revelam sentimentos pessoais; 
• O autor se revela no depoimento vivido pelo uso de verbos e pronomes na primeira 
pessoa. 
A vivência das pessoas não se dá de forma solitária. Por isso, em relatos pessoais, 
encontram-se características gramaticais que assinalam as marcas de diálogo com outros 
sujeitos que participaram dessa vivência, por isso: 
• Rememoram-se situações vividas com outros sujeitos; 
• Há presença de vozes desses sujeitos no depoimento, citado de forma direta ou 
indireta o que eles disseram. 
Percebe-se também uma relação dialógica entre o enunciador e o destinatário, pois 
segundo Kemiac (2008, p. 29), o dialogismo constitui a realidade fundamental da língua. 
Sobre isso Bakhtin (2000) afirma que “um enunciado concreto é um elo na cadeia da 
comunicação verbal de uma dada esfera.” Por isso que: 
• O enunciador se dirige ao leitor fazendo-lhe perguntas; 
• Inclui o leitor, outra característica do diálogo. 
Quando se produz um relato recorre-se à memória. Assim sendo, percebe-se marcas de 
tempo no texto. No caso em questão, a autora relata seu depoimento recordando sua visita ao 
supermercado G. Barbosa. Desta forma, pode-se perceber: 
• O Jogo do “agora” com o “ontem” do “aqui” com o “lá”; 
9 
 
 
• Os verbos usados expressam o ato de lembrar para mostrar a relação do presente com 
o passado, por isso pode-se verificar verbos no presente, pretérito imperfeito e 
pretérito perfeito. 
 
 
 
Relato de experiência vivida 
 
Texto 
 
Eu ver uma G. Barbosa ter muito de ótimo porque As pessoa esta trabalhar muito de 
certo mais fica tudo As Pessoa como certo ou errado, Eu já ver uma Mulher esta Educação, 
Respeito mais Ele viu amiga dela porque esta conversamos verdade Porque Eu não gosta 
muito de trabalho. não porque ter uma chefe não fica ver nada. Eu não gosta nada aqui G. 
Barbosa não damo nada esta muito feito. Eu ver uma Amiga minha nome dela Monica Só Ela 
esta trabalho muito de certo verdade Ela esta limpa cabelo também corpo roupa esta ótimo 
Também muito de Sorriso Alegra Só Monia. Ela era Boa 
Eu ter muito Cetasa Sim Verdade. 
Ela não Ter erro nada. Só certo verdade. Também Banheiro ter uma Porta está quebrar 
Verdade Eu ver já. Porta de Banheiro quebrar esta muito de feito. Sim não Pessoa vai falar 
muito de chefe porque ter homem ver Banheiro. nossa fala está Pior só Banheiro esta velho 
por favo Troca uma Porta novo de Banheiro. As pessoal não Poder (ocupado) conversamos 
Os homens esta vassoura vareto chão mais Ele ter Paciência não fica raiva porque pessoa já 
Ter paciência mais Ele ter muito de vergonha não poder. Eu ver uma carrinho muito de coisa 
ter Pessoas não quero compra porque ter tudo coisa esta velho Ter trocar outro novo Só mais 
Na Rua Ter muitos carrinhos deixou Rua porque os homens não quero trabalho preguiça de 
quer Os homens esta muito de ódio também nervoso esta ver ter um Amiga dele só fica 
esperar quer? 
O homem esta trabalho certo. Ele gosta muito carrinho onde fica guardar. Ele Ela 
trabalhar outro fazer Papel de presente. Mais ter trabalho certo porque Eles Elas falar Ela não 
quero Ajuda outro Amiga também 
Eu não gosto de trabalho de G. Barbosa mais Pessõa gosta fazer mal outro Eu nunca 
fazer amiga dela só fica nada. Nós ter fica certo não pode raiva outro Amiga. Eu ver ter muito 
de confusão tudo 
Eu ver ter água chão cuidado caí 
 
10 
 
 
 
Análise das Marcas de interferência da LIBRAS na produção escrita da Língua 
portuguesa 
 
1. Aspectos fonológicos 
• Ortografia: Confusão entre a posição de algumas letras no vocábulo 
não damo nada 
Porta de Banheiro quebrar esta muito de feito: compreende-se que a aluna queria dizer porta 
feia. 
 Só Monia: apagamento da letra c da palavra Mônica 
Eu ter muito Cetasa: palavra correta certeza 
por favo Troca...: esquecimento da letra r 
Os homens esta vassoura vareto chão: palavra varrendo 
Nota-se também, durante todo o texto, o uso inadequado de letras maiúsculas ou a sua 
falta após a pontuação: 
Banheiro. nossa fala está Pior 
• Acentuação: pode ter troca de acentuação, pois há memorização da acentuação por não 
reconhecer as sílabas tônicas; 
 mais Pessõa gosta fazer: sinal do til inadequado 
• Pontuação: Pode-se verificar que em todo o texto há ausência de pontuação, seja de ponto 
final, vírgula ou ainda outros. Isso acontece pelo fato de a pontuação ser aparentemente 
vinculada à língua oral (entoação, ritmo, timbre). 
Eu ver uma G. Barbosa ter muito de ótimo porque As pessoa esta trabalhar muito de certo 
mais fica tudo 
As pessoal não Poder (ocupado) conversamos Os homens esta vassoura vareto chão mais Ele 
ter Paciência não fica raiva porque pessoa já Ter paciência mais Ele ter muito de vergonha 
não poder 
 
2. Aspectos morfológicos 
• Gênero: supressão ou inadequação de uso. 
Eu ver uma G. Barbosa: como o substantivo termina com a letra “a”, a aluna associou ao 
artigo uma. 
uma carrinho 
11 
 
 
ter um Amiga dele 
Ajuda outro Amiga 
• Número: as concordâncias não são empregadas corretamente. 
As pessoa esta 
As Pessoa como certo ou errado 
As pessoal não Poder (ocupado) conversamos Os homens esta vassoura vareto chão 
não pode raivaoutro Amiga 
os homens não quero trabalho preguiça de quer Os homens esta 
A aluna não compreende que o uso de “eles” substitui essas repetições equivalendo as 
pessoas: 
Ele Ela trabalhar (...) porque Eles Elas falar: 
• Verbos: Há uma predominância de verbos na forma infinitiva, são poucos verbos 
flexionados, alguns incorretamente. 
Eu não gosta muito de trabalho 
Eu ver uma G. Barbosa ter muito 
Eu já ver 
Eu ter muito Cetasa (...) Ela não Ter 
• Verbos de ligação: há omissão freqüente dos verbos de ligação, devido a inexistência 
destes na LIBRAS. 
As Pessoa como certo ou errado (subtende-se: as pessoas estão certas ou erradas.) 
porque os homens não quero trabalho preguiça de quer: (subtende-se: os homens não querem 
trabalhar porque estão com preguiça.) 
• Elementos de Ligação: 
Ausência de conjunção “que” e preposição “no”: Eu ver ter água chão (Subtende-se: eu vejo 
que tem água no chão) 
Usos inadequados da preposição “de”: 
Eu ver uma G. Barbosa ter muito de ótimo 
As pessoa esta trabalhar muito de certo mais fica tudo 
Ela esta trabalho muito de certo 
Ele ter muito de vergonha não poder 
Eu ver ter muito de confusão tudo 
Troca da conjunção “mas” por “mais”: 
Respeito mais Ele viu amiga 
12 
 
 
 mais Ele ter Paciência 
Ausência da preposição “de” e “na”: 
Eu não gosta nada aqui 
 Ter muitos carrinhos deixou Rua (deixados na rua) 
Troca da proposição “com” por “de”: Os homens esta muito de ódio (Subtende-se: Os 
homens estão com muito ódio) 
• Substantivos, Adjetivos e verbos: quando tiver o mesmo radical, há escrita do verbo no 
lugar do adjetivo ou substantivo e vice-versa. 
Trocou “quebrar” por “quebrada”: Também Banheiro ter uma Porta está quebrar Verdade. 
Trocou “trabalho” por “trabalhar”: Eu não gosto de trabalho de G. Barbosa 
Trocou “amiga” por “amizade”: Eu nunca fazer amiga dela só fica... 
 
3. Aspectos sintáticos 
• Estrutura frasal: escrita sem preocupação com a posição do objeto, produzindo estruturas 
invertidas. 
Eu ver já. (Eu já vi) 
Troca uma Porta novo de Banheiro (Subtende-se: Trocar a porta do banheiro por uma nova) 
Os homens esta vassoura vareto chão (Subtende-se: Os homens estão varrendo o chão com a 
vassoura) 
Ela não quer ajuda outra amiga também (Subtende-se: Ela não quer a ajuda de outra amiga.). 
 
Considerações finais 
 
 Diante da análise feita, observa-se que a escrita dos surdos não segue as mesmas 
construções dos ouvintes devido à interferência da LIBRAS que é a língua materna da 
comunidade surda. Tais singularidades são comuns a um aprendiz de segunda língua. Por 
outro lado, percebe-se que alguns erros são comuns também a falantes da língua portuguesa, 
em que são refletidos a influência da variante oral na escrita. 
 Constata-se também a falta de domínio das estruturas sintáticas da língua portuguesa, 
a ausência de concordância básica, o desconhecimento de palavras do cotidiano. Há também a 
omissão de preposições e conectivos ou o uso inadequado e uma grande quantidade de verbos 
no infinitivo ou flexões inadequadas. Essas dificuldades acarretam a falta de entendimento 
por parte do leitor, mas verifica-se que há sentido na escrita e coerência no desenvolvimento 
13 
 
 
das informações do texto, pois a aluna relata passo a passo a experiência na visita feita ao 
supermercado. 
Portanto, essa construção que caracteriza uma interlíngua - percurso de aquisição de 
uma segunda língua, que tem no ponto de partida sua língua natural - não pode ser 
desqualificada pelo professor em seu processo de avaliação. A interlíngua produzida pelos 
surdos, não pode ser ignorada por eles, no processo de aprendizagem da língua portuguesa 
escrita. (SILVA, 2010) 
Dessa forma, este artigo aponta que a LIBRAS, sendo a primeira língua dos surdos, 
serve de referência para a escrita da língua portuguesa. Então, cabe ao professor interpretar o 
sentido presente nas produções escritas e intervir de forma que possibilite um ensino que 
aproxime o texto surdo da estrutura da língua portuguesa, respeitando a LIBRAS como 
primeira língua dessa comunidade. Assim, ele possibilita o ensino de português com 
metodologia de segunda língua. 
 
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1 Mestranda em letras pela UFS, Especialista em Educação Inclusiva e em Língua Brasileira de Sinais pela 
Faculdade Pio Décimo. Graduada em Letras Português Francês pela UFS. Professora Substituta do 
Departamento de Educação da UFS, campus de Itabaiana. Professora de Atendimento Educacional 
Especializado-AEE pela Secretaria Estadual de Educação. Membro do grupo de estudos “Inclusão escolar da 
pessoa com deficiência” do Departamento de Educação da Universidade Federal de Sergipe. Email: 
monicagsb@yahoo.com.br. 
2 Especialista em Educação e Patrimônio Cultural em Sergipe pela Faculdade Atlântico. Licenciado e bacharel 
em História pela UFS. Professor substituto do Departamento de História da UFS, campus de São Cristóvão. 
Professor da rede municipal de Aracaju. Email: vagnersbarbosa@hotmail.com 
3 Termo utilizado na época. 
4 Denominação utilizada para designar a língua de um falante não nativo.

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