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Parte 1 2 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho SUMÁRIO 1 FUNDAMENTOS DA ELETROQUÍMICA.............................................................. 06 1.1 Histórico da Eletroquímica.............................................................................. 06 1.2 Definições da Eletroquímica............................................................................. 10 1.3 Tipos de Condutores............................... ...................................................... 12 1.3.1 Condutores Eletrônicos.............................................................................. 12 1.3.2 Condutores Iônicos..................................................................................... 13 1.4 Movimentação de Cargas em uma Célula Eletroquímica............................ 13 1.5 Atividade Iônica............................................................................................... 14 1.6 Potencial de Junção Líquida........................................................................... 18 2 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO....................................................................... 21 2.1 Histórico da Corrosão....................................................................................... 21 2.2 Importância da Corrosão.................................................................................. 22 2.3 Definições da Corrosão.................................................................................... 24 3 CLASSIFICAÇÃO DA CORROSÃO...................................................................... 26 3.1 Classificação da Corrosão quanto ao Mecanismo.......................................... 27 3.1.1 Corrosão Úmida.............................................................................................. 27 3.1.2 Corrosão Seca ou Oxidação.......................................................................... 28 3.2 Classificação da Corrosão quanto a Forma.................................................... 29 3.2.1 Corrosão Uniforme........................................................................................ 29 3.2.2 Corrosão por Pite e Alveolar....................................................................... 32 3.2.3 Corrosão na forma de Trinca......................................................................... 34 3.3 Classificação da Corrosão quanto a Extensão............................................... 36 3 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 4 TAXA DE CORROSÃO....................................................................................... 39 4.1 Perda de Espessura......................................................................................... 39 4.1.1 Medição da Espessura................................................................................... 42 4.1.1.1 Ultrassom..................................................................................................... 42 4.1.1.2 Calibre Mecânico......................................................................................... 43 4.1.1.3 Filme Radiográfico...................................................................................... 44 4.2 Perda de Peso................................................................................................... 45 4.3 Exemplos de Aplicação.................................................................................... 47 4.4 Cálculo da Vida................................................................................................. 51 4.5 Acompanhamento da Corrosão....................................................................... 53 4.6 Severidade da Corrosão................................................................................... 55 5 MECANISMO ELETROQUÍMICO DA CORROSÃO.............................................. 56 5.1 Reações da Corrosão........................................................................................ 57 5.2 Principais Reações Catódicas.......................................................................... 63 5.2.1 Meio Ácido Sem Aeração............................................................................... 63 5.2.2 Meio Ácido Aerado......................................................................................... 64 5.2.3 Meio Aquoso Aerado...................................................................................... 64 5.2.4 Meio Aquoso Desaerado................................................................................ 65 5.2.5 Meio com Íon Oxidante................................................................................... 65 5.2.6 Meio com Cátions de Metal Nobre ou Metal Comum................................. 65 5.2.7 Meio com Ácido Oxidante............................................................................. 66 4 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 6 METALURGIA....................................................................................................... 68 6.1 Fabricação......................................................................................................... 68 6.2 Definições.......................................................................................................... 71 6.3 Heterogeneidades............................................................................................. 74 7 MICRO PILHAS..................................................................................................... 76 7.1 Áreas de Maior Corrosão.................................................................................. 79 8 FATORES QUE INTERFEREM NA CORROSÃO.................................................. 82 8.1 Influência do Metal............................................................................................ 82 8.1.1 Formação da Patina........................................................................................ 86 8.1.2 Formação da Passivação............................................................................... 88 8.1.3 Formação de Par Galvânico.......................................................................... 90 8.2 Influência do Meio............................................................................................. 91 8.2.1 Influência do pH.............................................................................................. 91 8.2.2 Influência da Aeração..................................................................................... 93 8.2.3 Influência da Concentração........................................................................... 95 8.2.4 Influência da Temperatura............................................................................. 96 8.2.5 Influência da Velocidade................................................................................ 97 8.2.6 Influência da Polarização.............................................................................. 99 8.3 Influência do Produto da Corrosão.................................................................. 100 5 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 9 CORROSÃO ATMOSFÉRICA............................................................................... 102 9.1 Umidade Relativa do Ar (URA).......................................................................... 103 9.2 Influência do Oxigênio...................................................................................... 106 9.3 Influência dos Poluentes.................................................................................. 107 9.4 Influência do Metal............................................................................................ 110 9.5 Outros Fatores...................................................................................................112 10 CORROSÃO PELO SOLO................................................................................... 113 10.1 Resistividade do Solo..................................................................................... 113 10.2 Potencial do Solo............................................................................................ 117 10.3 pH do Solo........................................................................................................ 118 10.4 Fatores Externos............................................................................................. 121 10.4.1 Solos Vizinhos com Aeração Diferentes..................................................... 121 10.4.2 Solos Vizinhos com Resistividade Diferentes........................................... 123 10.4.3 Correntes de Interferência........................................................................... 124 11 CORROSÃO INDUZIDA POR MICRORGANISMO (MIC)...................................... 127 6 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 1. FUNDAMENTOS DA ELETROQUÍMICA 1.1 Histórico da Eletroquímica O início do século XVIII foi marcado pelo o desenvolvimento de várias pesquisas tendo como objetivo a identificação de processos que pudessem gerar energia, na forma de eletricidade. Merece destaque a teoria e experimentos realizados, em 1780 pelo cientista norte americano Benjamim Franklin que criou o termo “carga elétrica” quando identificou a presença de dois tipos de partículas elétricas e lhes atribuiu os sinais positivo e negativo, provavelmente porque haviam indícios que essas cargas se movimentavam em sentidos opostos (VANIN, 1999). Em 1786, o químico inglês Henry Cavendish conseguiu mostrar que um corpo podia armazenar eletricidade. Esses estudos foram completados pelo físico francês, Charles Augustin de Coulomb que provou ser possível medir a carga elétrica. Além disso, Coulomb é autor da conhecida lei da eletricidade básica enunciada, como: “dois corpos com cargas elétricas de sinais opostos se atraem, na razão direta do produto de suas cargas e inversa do quadrado da distância que as separa”. No mesmo ano, de 1786, o médico italiano Luigi Galvani, aplicando choque elétrico na perna de uma rã morta, usando hastes de metais diferentes, observou movimentos musculares. A princípio esse efeito foi chamado de “eletricidade animal” e servia para provar a teoria, defendida por muitos cientistas da época, de que os animais continham eletricidade armazenada e que as hastes metálicas apenas conduziam a corrente (GERMANO, M.G.; SILVA, A.P.B., 2012). No início de 1800, o físico italiano Alessandro Volta, após várias experiências, sugeriu que as contrações na rã observadas por Galvani eram causadas por uma eletricidade artificial, provocada pelo uso de hastes com metais diferentes, quando a rã era tocada por hastes do mesmo metal não ocorriam as contrações observadas por Galvani, ou seja, a rã não tinha eletricidade armazenada apenas conduzia a corrente que estava nos metais. A partir dessa comprovação, Volta passou a defender a teoria de que a eletricidade era armazenada pelos metais e os tecidos úmidos da rã, conduziam a eletricidade. Com o intuito de demonstrar sua teoria, Volta construiu um sistema similar ao usado na rã, mas de maneira a amplificar a geração da eletricidade. Nas experiências desenvolvidas por Volta foi usado um empilhamento de 30 conjuntos de metais, cada um contendo: um disco de zinco sobre outro de prata, com panos embebidos 7 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho com água salgada encostados em ambos os lados dos discos. Os discos junto com os panos embebidos com água salgada foram mantidos empilhados dentro de uma “gaiola” de madeira, formada por um disco de madeira colocado em cada extremidade do empilhamento, ligados por tirantes de madeira (Figura 1.1). Depois foram conectados dois fios de cobre, um no disco de prata localizado no fundo do empilhamento e o outro ligado ao último disco de zinco no topo do empilhamento. Quando os fios de cobre eram encostados, saltava uma faísca elétrica. Volta chamou esse aparelho de “eletricidade artificial”, hoje é conhecido como “Pilha Voltaica”. Volta, chamou os metais de condutores secos e o pano umidecido de condutor úmido. No entendimento de Volta, a faísca era gerada porque os metais usavam a solução de água salgada como um condutor elétrico que possibilitava a saída da eletricidade armazenada pelos metais. Alessandro Volta montou muitas outras pilhas similares a essa primeira, usando materiais e soluções diferentes, mantendo a mesma sequencia de empilhamento e alterando essa sequencia e concluiu que a intensidade da eletricidade gerada é diretamente proporcional as combinações de metais e as soluções utilizadas no empilhamento. Figura 1.1 – Pilha de Volta No final de 1800, o químico inglês William Nicholson, com a ajuda do médico inglês Anthony Carlisle, usou uma pilha voltaica montada com 17 discos de prata, 17 de zinco e água 8 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho salgada, para induzir a movimentação de cargas em outra célula montada com 2 chapas de platina mergulhadas em água e ligadas aos polos da pilha voltaica (Figura 1.2). O objetivo desses cientistas era separar as moléculas da água. Após algum tempo foi possível observar a geração de gás hidrogênio na chapa ligada ao polo negativo da pilha voltaica e gás oxigênio na chapa ligada ao polo positivo da pilha. O gás hidrogênio foi gerado pela redução do íon hidrogênio presente no meio, através da equação 1.1 e o oxigênio foi consequência da oxidação do oxigênio contido na oxidrila, equação 1.2. Reação de redução do hidrogênio: 2H+ + 2e → H2 (equação 1.1) Reação de oxidação do oxigênio: 2OH- → H2O + ½ O2 + 2e (equação 1.2) Esse tipo de célula onde a movimentação de cargas é imposta por uma fonte externa de energia, como na pilha de Nicholson e Carlisle, é chamado de eletrolise. A eletrólise da água é uma das maneiras para obtenção de hidrogênio e oxigênio (FERRAZ. L. F., 1994). Figura 1.2 – Pilha usada por Nicholson e Carlisle para separação da água. Uma das maiores contribuições na relação entre eletricidade e reações químicas vieram do químico inglês Michael Faraday, considerado por muitos o descobridor da eletrólise. No ano de 1834 Faraday apresentou ao mundo as leis da eletrolise e introduziu uma nova terminologia na química, adota até hoje, onde as cargas elétricas, foram denominadas de 9 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho “íons”, sendo “ânodo” as cargas negativas e “cátodo” as positivas. Em homenagem as contribuições advindas das suas descobertas, foi denominada de Faraday a quantidade de eletricidade necessária para libertar um equivalente grama de qualquer substância. Em 1836, o químico inglês John Frederic Daniel, criou uma bateria elétrica muito mais eficiente que as pilhas voltaicas. A chamada pilha de Daniel é constituída de eletrodos de cobre e zinco, interligados e imersos em soluções de sulfato de cobre e sulfato de zinco, respectivamente (Figura 1.3). As principais diferenças da pilha de Daniel com relação a pilha voltaica, são: o emprego de apenas 1 par de metais, a utilização de soluções diferentes e o uso da ponte salina para fazer a ligação entre os eletrólitos. Figura 1.3 – Pilha de Daniel Outro notório avanço na eletroquímica foi obtido com a teoria da ionização de eletrólitos enunciada pelo físico, matemático e químico sueco Svante August Arrhenius em 1887, após vários estudos concluiu que os eletrólitos em solução se dissociavam em cargas elétricas diferentes e que a soma das cargas positivase negativas era igual, sendo a solução eletricamente neutra. Em 1923, o químico alemão, Erch Amand Arthur Joseph Huckel, junto com o químico holandês, Petrus Josephus Wilhelmus Debye, desenvolveram a teoria das soluções eletrolíticas, elucidando os motivos da diferença entre a condutividade dos eletrólitos e estabelecendo uma metodologia de cálculo da condutividade de um eletrólito através da sua força iônica. Essa metodologia é conhecida hoje como a equação de Debye-Huckel. 10 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 1.2 Definições da Eletroquímica Com base nos conceitos introduzidos por Volta e Faraday podemos considerar que existem dois tipos de células que relacionam eletricidade com reações químicas. Volta mostrou que era possível obter eletricidade com a união de metais diferentes, desde que eles estivessem em contato com uma solução iônica e Faraday mostrou que a movimentação de cargas obtida tem origem em reações químicas que ocorrem na interface eletrodo/solução. Reações essas denominadas de eletródica ou eletroquímica. Comparando as células usadas por Nicholson/Carlisle e Daniel verificamos a ocorrência de fenômenos oposto, na primeira temos corrente elétrica gerando reações eletroquímicas para garantir a continuidade da movimentação de cargas. Já na pilha de Daniel, temos reações eletroquímicas espontâneas gerando corrente elétrica. Atualmente, as células similares as usadas por Nicholson/Carlisle e Faraday, onde a corrente elétrica provoca reações eletroquímicas, são denominadas de células eletrolíticas (eletrólise) e as células similares as utilizadas por Alessandro Volta e Daniel, onde reações eletroquímicas espontâneas provocam corrente elétrica, são denominadas de pilhas. Portanto pilhas são pequenos geradores de corrente elétrica. Merece ser ressaltado que em ambas os tipos de células temos metais em contato com eletrólitos, reações eletroquímicas e movimentação de cargas (corrente elétrica). Com base nesse histórico, a química moderna, apresente as seguintes definições: a) Reação eletroquímica ou eletródica: é toda reação química que ocorre na interface do metal com um eletrólito e que envolve a movimentação de elétrons; b) Eletrodo: é o conjunto formado por um metal ou parte dele em contato com um eletrólito, onde existe a possibilidade de ocorrer reação eletroquímica; c) Célula eletroquímica: todo sistema contendo um ou mais eletrodos, do mesmo metal ou de metais dissimilares, imersos em um mesmo eletrólito ou em eletrólitos diferentes em contato elétrico permanente. No caso de dois ou mais eletrodos esses devem estar em contato elétrico permanente; d) Célula eletrolítica: toda célula eletroquímica em que a movimentação de cargas é imposta através de uma fonte externa de corrente continua. Sempre teremos corrente elétrica gerando reações eletroquímicas. Essa célula é usada no estudo da eletrolise (Figura 1.4); e) Pilha: toda célula eletroquímica em que a movimentação de cargas é espontânea. Sempre teremos reação eletroquímica gerando corrente elétrica. Essa célula é usada no estudo da corrosão (Figura 1.5). 11 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 1.4 – célula eletrolítica – estudo da eletrólise Figura 1.5 – pilha – estudo da corrosão Diferentes autores, cientista e estudiosos apresentam definições diferentes sobre o fenômeno chamado de eletroquímica, esse documento adotou como definição da eletroquímica uma adaptação da usada por John Bockris no livro Modern Electrochemistry, vol.1: “eletroquímica é a parte da ciência que estuda as reações eletródicas e a movimentação de cargas em um eletrólito”. 12 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 1.3 Tipos de Condutores Considerando apenas o tipo de carga que está em movimento no condutor, estes podem ser classificados em: Condutores de 1a espécie ou condutores eletrônicos; Condutores de 2a espécie ou condutores iônicos. 1.3.1 Condutores Eletrônicos São assim chamados todos os condutores em que as cargas que estão em movimento, no interior dos condutores, são elétrons. Nesses condutores a passagem da corrente elétrica, que se dá através da movimentação de elétrons, não provoca alterações químicas nem estruturais. (Figura 1.6) Exemplos de condutores eletrônicos: Todos os metais e ligas metálicas, grafite, silício, germânio etc. Figura 1.6 Representação esquemática de um condutor eletrônico. 13 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 1.3.2 Condutores Iônicos São assim chamados todos os condutores em que as cargas que estão em movimento, no interior do condutor, são íons (Figura 1.7). Nesses condutores a passagem da corrente elétrica provoca reações químicas nas interfaces eletrodo / solução. Deve ser ressaltado que no interior dos condutores iônicos uma movimentação de cargas está associada a uma movimentação de massa. (o íon não tem massa desprezível como os elétrons). Figura 1.7 Representação esquemática da movimentação de cargas no interior de um condutor iônico. A transferência de cargas nas interfaces eletrodo / solução ocorre devido à transferência de elétrons, através de reações eletroquímicas. 1.4 Movimentação de Cargas em uma Célula Eletroquímica Conhecendo-se as cargas que estão em movimento nos condutores que constituem uma célula eletroquímica, podemos representar esquematicamente esta movimentação, que de maneira simbólica costuma ser representada por i, símbolo da corrente elétrica (Figura 1.8). 14 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 1.8 Representação esquemática da movimentação de cargas em uma célula eletroquímica A Figura 1.8 mostra a movimentação de cargas em uma célula eletroquímica, do tipo pilha, onde os eletrodos (metais e fios) são condutores eletrônicos e a solução é um condutor iônico. As reações que ocorrem na interface metal / solução são reações eletroquímicas que alguns vezes são chamadas também de reações eletródicas. O sentido convencional da corrente elétrica, i, é adotado internacionalmente como o sentido de movimentação das cargas positivas (cátions) presentes no meio, sentido oposto ao de movimentação dos elétrons, que se movimentam nos eletrodos, e oposto a movimentação das cargas negativas (ânions) da solução. 1.5 Atividade iônica Em uma solução iônica, um íon não pode ser considerado como componente isolado, seu comportamento é influenciado pela presença dos íons vizinhos, devido as interações eletrostáticas que ocorrem espontaneamente entre eles. Essas forças eletrostáticas interferem na movimentação e disponibilidade dos íons, por isso a concentração iônica não reflete a real disponibilidade dos íons da solução. Assim, para soluções iônicas a medida da disponibilidade dos íons na solução deve ser medida pela atividade iônica, quantificação que leva em conta a interação eletrostática dos íons com seus vizinhos. A correção da concentração com a atividade iônica de uma solução é feita através da equação 1.3, onde a relação entre 15 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho concentração e atividade é chamado de coeficiente de atividade (f), que é uma medida da interação iônica. ai = f.ci (equação 1.3) Sendo: ai: atividade do íon i na solução ci: concentração do íon i na solução f: coeficiente de atividade dos íons na solução Quando um composto iônico é dissolvido em água ocorre uma separação de íons e alteração da condutividade da solução formada. A condutância de uma solução depende do númeroe mobilidade desses íons. Em uma solução bem diluída os íons estão “afastados” e a interação entre eles é pequena, pouco interferindo na mobilidade, mas à medida que a concentração da solução aumenta, ocorre uma maior interferência que afeta a mobilidade e altera a condutividade da solução. A influência da interação iônica em uma solução pode ser medida através da equação de Debye e Huckel descrita na equação 1.4. Através dessa equação mede-se a Força Iônica da solução (I) que é uma medida do campo elétrico gerado pelos íons da solução. Essa força iônica é função da concentração e carga dos íons. I = ½ . (Σ(C1.Z12 + C2.Z22 + ...+ Cn.Zn2) (equação 1.4) Sendo: I: força iônica da solução, em mol/l C: concentração de cada íon, em mol/litro Z: carga do íon Exemplo1.1: Calcule a força iônica das soluções abaixo Resolução I = 0,5.[(0,01.11) + (0,01.11)] = 0,01 mol/l I = 0,5.[(0,01.22) + (0,02.12)] = 0,03 mol/l Solução Concentração da solução (mol/l) Íon 1 Íon 2 C1 (mol/l) Z1 C2 (mol/l) Z2 Força iônica (mol/l) KCl 0,01 K Cl 0,01 1 0,01 1 0,01 CaCl2 0,01 Ca Cl 0,01 2 0,02 1 0,03 16 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho A Tabela 1.1 mostra os valores do coeficiente de atividade de vários íons em função da força iônica da solução, da carga do íon e do íon, determinados experimentalmente. O valor α representa o raio do íon, em nano milímetro. Tabela 1.1 Valores do coeficiente de atividade de vários íons em função da força iônica da solução e carga do íon. Conhecendo a força iônica da solução (I) é possível calcular o coeficiente de atividade da solução através da equação 1.5, também desenvolvida por Debye e Huckel. Essa equação aplica-se para soluções diluídas e para íons univalentes com concentração iônica até 0,1 mol/dm3, com um pequeno erro. Para maiores concentrações a equação deve ser modificada (Denaro A. R., 1974). log (f) = - A. zi2.√I (equação 1.5) Sendo: f: coeficiente de atividade do íon i. A: constante que depende a temperatura e da constante dielétrica do solvente. zi: carga do íon i I: força iônica da solução Para soluções aquosas a 250C o valor da constante A é igual a 0,51.dm3/2/mol1/2, quando a concentração iônica for medida em mol/dm3. 0,0005 0,001 0,0025 0,005 0,01 0,025 0,05 0,1 0,25 NH4 + ; Ag + 0,975 0,964 0,945 0,924 0,898 0,850 0,800 0,750 0,30 Cl -1 ; Br -1 ; I -1 ; CN -1 ; NO3 -1 ; NO2 -1 ; HCOO -1 0,975 0,964 0,945 0,925 0,899 0,850 0,810 0,760 0,35 OH -1 ; SCN -1 ; MnO4 -1 0,975 0,964 0,945 0,926 0,900 0,860 0,810 0,760 0,43 HCO3 -1 ; H2PO4 -1 ; Na + 0,975 0,964 0,947 0,928 0,902 0,860 0,820 0,760 0,60 Li + 0,975 0,965 0,948 0,929 0,907 0,870 0,840 0,800 0,90 H + 0,975 0,967 0,950 0,933 0,914 0,880 0,860 0,830 0,45 CO3 -2 ; CrO4 -2 ; Pb +2 ; Hg2 +2 ; SO4 -2 ; HPO4 -2 0,903 0,867 0,805 0,742 0,665 0,550 0,460 0,370 0,60 Ca +2 ; Cu +2 ; Fe +2 ; Ni +2 0,905 0,872 0,809 0,749 0,675 0,570 0,490 0,410 0,80 Mg +2 ; Be +2 0,906 0,872 0,813 0,755 0,690 0,600 0,520 0,450 0,40 PO4 -3 ; [Fe(CN)6] -3 0,796 0,725 0,612 0,505 0,395 0,250 0,160 0,100 0,90 Al +3 ; Fe +3 ; Cr +3 ; Ce +3 0,802 0,738 0,632 0,540 0,450 0,330 0,250 0,200 1 2 3 Força Iônica (mol/litro) Carga α (nm) íon 17 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Em soluções muito diluídas, abaixo de 10-6 Molar, a atividade e concentração são aproximadamente iguais, ou seja, o coeficiente de atividade tende a 1. Com o aumento da concentração a força iônica aumenta e o coeficiente de atividade diminui. Na prática usa-se a atividade iônica média representada pela letra ɣ que é na verdade a média aritmética dos componentes iônicos da solução. Exemplo 1.2: Calcular o pH de uma solução 0,01 molar de HCl. Resolução sem considerar a atividade iônica HCl → H+ + Cl- 0,01 0,01 0,01 pH = - log (H+) = - log (10-2) = 2 Resolução considerando a atividade iônica HCl → H+ + Cl- CH = 0,01 M CCl = 0,01 M Cálculo da força iônica I = ½.(CH.ZH2 + CCl.ZCl2) = 0,5.[(0,01.12 + 0,01.12) = 0,01 M Cálculo da atividade iônica do H+ Da tabela 1.1 com I = 0,01 M e H+ – então: ɣ = 0,914 Cálculo da atividade iônica do H+ aH = 0,01.0,914 = 0,00914 M Cálculo do pH pH = - log (H+) = - log 0,00914 = 2,04 O valor da atividade de líquidos puros ou com quantidade desprezível de íons e sólidos é considerada igual a unidade. Na realidade, o valor unitário só está rigidamente correto quando as substâncias estão na temperatura de ambiente de 250C e na pressão de 1 atmosfera, condição adotada no estudo da corrosão como condição padrão. O valor unitário para os sólidos e substâncias puras pode ser usado no estudo da corrosão sem interferência nos resultados. Assim, uma solução iônica com atividade iônica unitária está na condição padrão e um metal estará sempre na condição padrão. Fazendo um paralelo de uma solução iônica com uma mistura de gases pode-se considerar que a atividade de um gás é igual a pressão parcial quando se tratar de um gás ideal, medida em atmosferas. Para baixas pressões a maioria dos gases tem comportamento 18 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho próximo do ideal, portanto pode-se considerar a atividade com sendo igual a pressão parcial do gás. Portanto, quando se tiver um gás com pressão parcial unitária (1 atmosférica) ele estará na condição padrão. Quando se tem a chapa de um metal imersos em uma solução iônica de seus próprios íons, com atividade unitária teremos o que se denomina na corrosão de eletrodo padrão do metal. Por exemplo, uma chapa de ferro mergulhado em uma solução aquosa de íons de ferro, com atividade unitária, teremos o eletrodo padrão de ferro. Quando se tem uma solução com íons de um gás na atividade unitária e se borbulha nessa solução esse gás na pressão de 1 atmosfera, teremos o eletrodo padrão do gás. Por exemplo, uma solução aquosa de ácido sulfúrico, com atividade do íon hidrogênio unitária, quando se mantém um borbulhamento na solução de gás hidrogênio na pressão de 1 atmosfera, teremos o eletrodo padrão do hidrogênio. 1.6 Potencial de Junção Líquida O potencial de junção líquida se desenvolve através da interface entre duas soluções eletrolíticas que tenham composições diferentes. Uma junção líquida muito simples que consiste em uma solução de ácido clorídrico com 1 mol por litro em contato com uma solução 0,01 mol por litro do mesmo ácido. Uma barreira porosa inerte, como um disco de vidro sinterizado, previne que as duas soluções se misturem rapidamente. Tanto os íons hidrogênio como os íons cloreto tendem a se difundir nessa interface a partir da solução mais concentrada para a solução mais diluída. A força que direciona cada íon é proporcional as diferenças de atividade das duas soluções. No presente exemplo, os íons hidrogênios são substancialmente mais móveis que os íons cloretos. Assim, os íons hidrogênio difundem mais rapidamente que os íons cloreto e, resulta uma separação de cargas. O lado mais diluído da interface torna-se positivamente carregado por causa da difusão mais rápida dos íons hidrogênio. Portanto, o lado concentrado adquire uma carga negativa em decorrência do excesso de íons cloreto, que se movem mais vagarosamente. A carga desenvolvida tende a se contrapor às diferenças nas velocidades de difusão dos dois íons de forma que uma condição de estado estacionário seja atingida rapidamente. A diferença de potencial resultante dessa separação de carga é o potencial de junção líquida que pode ter uma intensidade de até 0,100 Volts. Esses valores podem afetar os resultados de medidas experimentais. 19 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO- PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho O potencial de junção líquida atua sempre no sentido de acelerar os íons que se difundem mais lentamente e retardar os íons com uma velocidade de difusão maior. A Figura 1.9 representa esquematicamente a formação do potencial de junção líquida quando se utiliza uma membrana porosa de vidro sinterizado para separar as duas meias células da pilha de Daniel. Figura 1.9 – Pilha de Daniel construída usando uma divisória porosa de vidro sinterizado. O potencial de junção líquida não pode ser totalmente eliminado, mas pode ser minimizado para valores desprezíveis com a utilização de uma ponte salina no lugar da membrana porosa para a separação dos líquidos de uma pilha eletroquímica. A ponte salina é formada por um tubo no formato da letra U cheio com uma solução saturada de cloreto de potássio (KCl) ou de nitrato de amônio (NH4NO3) e inserido na pilha com uma extremidade do U em cada eletrólito, como mostra a Figura 1.10. As extremidades do tubo geralmente são obstruídas com algodão ou outra membrana porosa, como o vidro sinterizado, para evitar difusão demasiada de íons. 20 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 1.10 – Pilha de Daniel construída usando uma ponte salina. Uma ponte salina utilizada deve preencher três requisitos: separar fisicamente as soluções; garantir a continuidade elétrica entre as soluções; e minimizar o potencial da junção líquida. Em uma ponte salina um potencial de junção líquida é substituído por dois potenciais de junção líquida, um em cada extremidade da ponte salina. A alta concentração e condutividade dos íons da ponte salina faz com que a maior movimentação de cargas ocorra com os íons da ponte salina. O potencial de junção líquida criado nas duas extremidades da ponte depende principalmente da diferença entre o número de transporte do ânion e do cátion das soluções separadas e da solução usada na ponte salina. Se os números de transporte não forem muito diferentes, o potencial de junção líquida nas duas extremidades da ponte tende a ser pequeno. Quando se utiliza uma ponte salina formada por cloreto de potássio ou nitrato de amônio como os números de transporte são muito próximos de 0,5, os potenciais criados nas duas extremidades serão aproximadamente iguais e baixos, interferindo muito pouco no potencial da pilha formada. Epilha = ECu – EZn Ejunção líquida ≈ 0 Ponte Salina 21 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 2 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO 2.1 Histórico da Corrosão Os danos acumulativos provocados pelo tempo de vida, associado a outros fatores, como intempéries e exposição a meios agressivos, não está restrito aos metais, mas a todos os materiais e até aos seres vivos, formando o chamado ciclo da vida. Portanto, pode-se considerar que a deterioração faz parte da vida e nossa convivência com ela existe desde os primórdios. Como evidência dessa preocupação, pode ser citado a separação de pedras específicas, mais duras e mais resistentes pelo homem das cavernas, na construção de abrigos; o uso de impermeabilização nas construções antigas pelos romanos; e as famosas espadas árabes com excelente resistência mecânica e a corrosão. Muitos historiadores afirmam que a corrosão foi o primeiro processo de deterioração identificado pelo homem, e se caracteriza por ser espontâneo e ter grande influência na durabilidade dos metais. Constatações da ação da corrosão podem ser obtidas diariamente na observação da deterioração das estruturas metálicas que sustentam pontes e viadutos, no casco de embarcações metálicas, na carcaça dos automóveis, nas instalações industriais, etc. A abundância de minério de ferro no mundo, confirmada no século XX de que 5% dos elementos químicos na crosta terrestre é ferro, levou os cientistas ao desenvolvimento de ligas tendo o ferro como principal participante, na elaboração das ligas ferrosas que, infelizmente, não tem boa resistência à corrosão em meios úmidos e oxidantes, como o ar atmosférico. Essa deficiência tornou interessante o desenvolvimento de outros metais com maior resistência à corrosão, bem como o desenvolvimento de revestimentos orgânicos e metálicos para proteção à corrosão. Sendo a corrosão dos metais um processo espontâneo, poderíamos concluir que seu uso fosse impróprio, mas verifica-se justamente o oposto. Os metais são o material mais usado na fabricação de equipamentos e tubulações para a indústria, transporte, aplicações domésticas e até em atividades relacionadas a medicina e odontologia, que os utiliza largamente para implantes e restauração de dentes. Essa utilização é possível graças ao desenvolvimento de metais mais resistentes a determinados meios corrosivos, que levam o metal a imunidade ou a passivação, tendo como resultado uma taxa de corrosão desprezível, o que possibilita uma utilização segura e viável, técnica e economicamente dos metais. O termo corrosão tem sido usado com um sinônimo da palavra deterioração ou perda, para todo tipo de material, e até para identificar perdas financeiras e na agricultura. Assim, no 22 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho início de 1960 foi sugerido, por profissionais da corrosão, que o termo corrosão fosse restrito a deteriorações observadas em metais e suas ligas, mas essa sugestão não tem sido muito respeitada. A palavra corrosão provém de uma adequação da palavra americana corrosion que por sua vez já é uma adequação do verbo latino corrodere. Para entender o significado da palavra corrodere é preciso separá-la nas silabas: cor, rod, ere. A silaba cor, significa deterioração; rod, significa roer; e ere, rapidamente. Portanto a palavra latina corrodere foi usada para expressar a ideia de um fenômeno espontâneo que ocorre rapidamente, deixando uma superfície rugosa. Hoje sabe-se que realmente a corrosão é um processo espontâneo, e quando isolado, deixa uma superfície rugosa, mas sua velocidade depende das características do metal e do meio. 2.2 Importância da Corrosão As perdas financeiras impostas pela corrosão podem ser divididas em perdas diretas e indiretas. As perdas diretas são aquelas associadas à reposição de equipamentos, máquinas, estruturas ou peças danificadas, bem como os valores despendidos na busca de metais mais resistentes a corrosão, uso de revestimentos orgânicos e metálicos, gastos com inibidores de corrosão, proteção catódica e os custos relacionados a monitoração da corrosão. Além das perdas diretas que são mais fáceis de serem relacionados à corrosão aparecem as perdas indiretas que estão associados as consequências dos danos causados pela corrosão em partes não danificadas diretamente pela corrosão, como: a interrupção na operação de plantas industriais, superdimensionamento de estruturas e equipamentos, e as perdas impostas as pessoas, à sociedade e ao meio ambiente, devido vazamentos de produtos tóxicos ou inflamáveis. Os levantamentos relacionados as perdas provocadas por corrosão, geralmente estão relacionadas as perdas diretas. Muitos estudos costumam dividir as perdas diretas da corrosão em 5 categorias, tendo como referência à aplicação do bem deteriorado. Essas 5 categorias são: a) Infraestrutura: quando a deterioração está associada a partes de pontes, viadutos, tubulações de transporte de produtos combustíveis e inflamáveis, tanques e recipientes de armazenamento, estrutura de aeroportos, rodovias, portos e ferrovias; 23 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho b) Utilidades: toda deterioração em tubulações de transporte de água e gás, tratamento de água, estrutura de transmissão de eletricidade e telecomunicações; c) Transportes:perdas nos meios de transporte como automóveis, caminhões, aviões, trens e embarcações; d) Produção: perdas ocorridas nas áreas de exploração, produção e refino do petróleo, mineração, indústrias químicas, petroquímica, farmacêuticas, papel e celulose, agricultura, alimentação, eletrônicos e eletrodomésticos; e) Governamental: gastos nos equipamentos e consumíveis na área militar e governamental. A Figura 2.1 mostra a porcentagem de perda, normalmente, atribuída a cada uma dessas categorias. Figura 2.1 – Divisão dos custos da corrosão por categoria Estudos realizados pela NACE mostram que as perdas diretas provocadas pela corrosão têm crescido anualmente. Em 1975, as perdas diretas associadas a corrosão, só nos estados unidos da américa, foram de 70 bilhões de dólares, em 1995 essa perda aumentou para 300 bilhões, mostrando um aumento de 11,5 bilhões por ano. Já no ano de 1998 os custos ficaram pouco abaixo, somando 276 bilhões de dólares, o que equivale a 3,1% do produto interno bruto americano. Entre 1999 e 2001, essas perdas atingiram o valor de 400 bilhões de dólares por ano, só nos estados unidos da américa. O documento “Now is the time” emitido pela WCO (World Corrosion Organization) indica perdas diretas anuais, no mundo, devido à corrosão o valor de US$ 2,2 trilhões, o que equivale a cerca de 3% do produto interno bruto mundial. Especialistas em corrosão consideram que 24 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho entre 20 e 25% desses custos poderiam ser economizados se as tecnologias de prevenção a corrosão conhecidas fossem aplicadas de maneira preventiva. No início dos anos 80, nos Estados Unidos, uma firma de combate a corrosão, com o intuito de divulgar seus produtos, após uma consulta a laboratórios especializados, publicou a frase: enquanto você está lendo este cartaz, 760 quilos de ferro de seus bens foram corroídos”. 2.3 Definições da Corrosão A primeira constatação da corrosão foi obtida por Alessandro Volta, quando ele usou reações eletroquímicas para gerar energia elétrica de maneira continua em 1800. Naquele momento o principal interesse era a geração de energia elétrica e a deterioração dos discos de zinco não tiveram destaque, mas aconteceram. O destaque para a corrosão ocorreu em experiências futuras, com a pilha de Daniel, onde a deterioração da chapa de zinco foi referenciada, como uma das consequências da movimentação de cargas na pilha. Estudando com mais atenção a pilha de Daniel pode-se tirar outras conclusões interessantes, como: a) A movimentação de cargas é originada por reações eletroquímicas que ocorrem simultaneamente no ânodo e cátodo da pilha; b) No ânodo ocorrem reações de oxidação do tipo da representada na equação 2.1 e no cátodo reações de redução do tipo da representada na equação 2.2; Reação anódica (oxidação do metal): Me → Me+ + e (equação 2.1) Reação catódica (redução do cátion): X+ + e → X0 (equação 2.2) c) A quantidade de reações anódicas e catódicas é igual em número de elétrons e ocorre continuamente enquanto tiver metal em contato com o eletrólito; d) A movimentação de cargas depende também de uma união elétrica entre ânodo e cátodo; e) As reações eletroquímicas ocorrem devido a uma força elétrica que se estabelece, espontaneamente, entre o metal e o eletrólito, chamada de diferença de potencial, cuja intensidade depende da natureza do metal e do eletrólito. As constatações descritas acima são a base do processo da corrosão, ou seja, para que ocorra o fenômeno da corrosão é preciso que se tenha um ou mais eletrodos, unidos eletricamente e ambos devem estar em contato com um eletrólito. Quando isso acontece, espontaneamente, vão ocorrer reações eletroquímicas que provocam uma movimentação de cargas no circuito externo da pilha formada. 25 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho A definição do fenômeno corrosão pode ser descrita de várias maneiras dependendo do interesse e conhecimento de quem elabore essa definição, mas para que ela esteja correta é preciso ficar claro que se trata de um processo de deterioração espontâneo de um metal em contato com um eletrólito. Conhecendo os processos de obtenção do aço e observando um metal com corrosão um metalurgista poderia definir a corrosão como sendo o processo inverso ao da metalurgia, como mostrado na Figura 2.2. Os processos metalúrgicos transformam o minério de ferro em uma chapa de aço e na corrosão, a chapa de aço exposta ao ar atmosférico, espontaneamente, volta a ser minério de ferro. Figura 2.2 – Conceito de corrosão do ponto de vista metalúrgico. Os profissionais da corrosão adotam como definição da corrosão uma definição mais completa do ponto de vista processual que pode ser expressa usando palavras diferentes, mas basicamente tem a seguinte redação: “corrosão é um fenômeno espontâneo da deterioração de um metal quando exposto a um meio corrosivo, através de reações químicas ou eletroquímicas”. Essa definição é muito interessante porque deixa claro dois pontos fundamentais para que a corrosão aconteça: a) Tem que existir o contato entre o metal e um meio corrosivo (eletrólito); b) O processo da corrosão ocorre através de reações químicas ou eletroquímicas nos locais onde o metal estiver em contato com o meio. Deixando claro que o processo corrosivo é um fenômeno de superfície. A grande maioria dos processos da corrosão ocorrem com o meio corrosivo no estado líquido e nesses casos, as reações serão de natureza eletroquímica, mas existem situações em que o meio está no estado gasoso, aí a natureza da corrosão passa ser química, porque inicia por um processo direto de oxidação do metal e crescimento do óxido pela movimentação de cargas através da camada do óxido formado. 26 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 3 CLASSIFICAÇÃO DA CORROSÃO Existe várias maneiras de se classificar à corrosão dependendo do interesse e de como o escritor pretende desenvolver o tema corrosão, nesse trabalho será adotada a classificação que está associada a metodologia usada pela maioria das normas técnicas que tratam da identificação e análise da corrosão. Essa escolha está ligada a minha experiência com normas e artigos técnicos desenvolvidos na área industrial, meu campo de atuação por cerca de 40 anos. Entende-se por classificação da corrosão uma ferramenta usada para ordenar o estudo da corrosão através da identificação da forma e principais fatores que provocaram a deterioração. Portanto, a classificação da corrosão de maneiras diferentes em nada interfere no estudo do processo corrosivo apenas mostra caminhos com nomes diferentes para se chegar ao mesmo resultado, ou seja, a classificação da corrosão é apenas uma ferramenta didática que costuma ser alterada por vários autores para se chegar ao mesmo resultado que é o entendimento do fenômeno corrosão. Neste trabalho a corrosão será classificada em função do mecanismo, da forma, da extensão e do tipo. . A classificação da corrosão em função da forma é a maneira como a deterioração é observada. Na maioria das peças ou equipamentos os danos provocados por corrosão são observados a olho nu ou com o uso de equipamentos com aumento de até 100x. Apenas na avaliação de casos onde ocorre influência metalúrgica ou de tensão é que se utiliza maiores aumentos para identificação da corrosão. Deve ficar claro também que a corrosão é uma deterioração com origem na superfície do metal em contato com um meio corrosivo. As formas da corrosão são: corrosão uniforme; corrosão por pite (pitting, em inglês) ou alvéolo; e corrosão na forma de trincas. O mecanismo da corrosão depende do processo da corrosão, fato que depende diretamente do estado físico emque o meio se apresenta. Portanto, a classificação da corrosão quanto ao seu mecanismo será: corrosão úmida quando o meio está no estado líquido e a corrosão seca quando o meio está no estado gasoso. O mecanismo da corrosão mais estudado e de maior interesse é aquele que acontece quando o meio está no estado líquido por ser, em geral, o principal mecanismo de deterioração dos metais em temperaturas inferiores a 2040C (API RP 571, 2011). Quando o meio está no estado gasoso, embora a corrosão com o meio no estado gasoso seja importante, em geral nessas condições o principal 27 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho mecanismo de deterioração não é a corrosão, mas outros mecanismos como a fluência, choque térmico ou colapso plástico. A extensão da corrosão tem grande influência quando se descreve as partes de uma peça, espécime ou equipamento está deteriorado. Essa classificação indica locais de maior corrosão provocados por falhas de projeto, construção ou montagem que induzem modificações locais no material ou no meio, como: soldas mal planejadas ou mal executadas, pontos de concentração de tensões, alterações introduzidas no material durante uma conformação ou soldagem, pontos de mudança de fluxo, regiões de estagnação do meio, etc. Portanto, a extensão da corrosão pode ser generalizada ou localizada. Os tipos de corrosão é uma classificação que está associada as principais características do metal e/ou do meio que provocam à corrosão ou modificam o local ou velocidade da corrosão. Os principais tipos de corrosão são: corrosão galvânica, corrosão atmosférica, corrosão pelo solo, corrosão microbiológica, corrosão seletiva, corrosão sob depósito, corrosão por aeração diferencial, corrosão sob tensão, corrosão ácida, corrosão caustica, corrosão aquosa, corrosão-fadiga, corrosão-erosão, ataque pelo hidrogênio. Esses tipos de corrosão estão desenvolvidos no capítulo XX. 3.1 Classificação da Corrosão quanto ao Mecanismo O mecanismo corrosivo é classificado em função do estado físico do meio que provoca a corrosão. Considerando que os estados físicos possíveis da natureza são três: sólido, líquido e gasoso e que no estado sólido a condutividade é muito baixa, tornando a corrosão praticamente desprezível em relação a outros meios de deterioração, a corrosão costuma ser classificada em: corrosão úmida e corrosão seca. 3.1.1 Corrosão Úmida Chama-se de corrosão úmida os processos de corrosão que ocorrem quando o meio corrosivo está no estado líquido. Nesses casos, o mecanismo da corrosão é de natureza eletroquímica. A corrosão úmida é o mecanismo de deterioração mais importante nos casos de deterioração em que a temperatura é inferior a 2040C (API RP 571, 2011), em equipamentos, instalações industriais e utensílios de uso popular. 28 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Estima-se que cerca de 80% dos casos de perdas por corrosão são de natureza eletroquímica, o que explica a grande importância do conhecimento da eletroquímica no estudo da corrosão. A deterioração por corrosão úmida caracteriza-se basicamente por: a) Realizar-se necessariamente na presença de meio líquido; b) Ocorrer em temperatura abaixo do ponto de orvalho1; c) Estar associada, a formação de uma pilha. Como a grande maioria dos meios líquidos, que são corrosivos, têm como solvente a água, a corrosão úmida é algumas vezes chamada de corrosão em meio aquoso. Os exemplos mais populares de corrosão úmida é a corrosão atmosférica que provoca perdas de patrimônio possíveis de serem constatados no nosso cotidiano, como a deterioração de automóveis, bicicletas, grades de proteção, eletrodomésticos, etc. Existem também perdas por corrosão úmida mais difíceis de serem percebidas como a corrosão interna de equipamentos e tubulações que armazenam ou transportam substâncias líquidas cuja ocorrência de vazamentos podem provocar danos importantes como: incêndio, explosões e contaminação do meio ambiente. 3.1.2 Corrosão Seca ou Oxidação A corrosão é chamada de seca quando o meio corrosivo está no estado gasoso. Esses processos são muitas vezes denominados de corrosão em alta temperatura ou simplesmente de oxidação ou ainda de oxidação em alta temperatura. A natureza da corrosão seca é considerada pela maioria dos autores como sendo química e não eletroquímica. Esses processos de corrosão não têm tanto interesse porque em temperaturas acima de 260C (API RP 579, 2009) a perda de propriedades dos metais por outros motivos é mais importante. Assim, muitos poucos dos casos de deterioração na indústria são atribuídos a corrosão seca. A exceção é a corrosão seca que ocorre nos tubos de fornos e caldeiras que tem grande interesse no analise de falhas. 1Ponto de orvalho = temperatura em que o ar úmido se torna saturado em vapor d’água, quando resfriado sob pressão constante. 29 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho A corrosão seca caracteriza-se basicamente por: a) o meio corrosivo está sempre na forma de um gás; b) ocorrer em temperaturas acima de 260C (API RP 579, 2009) ou acima do ponto de orvalho do meio, o que for menor; c) estar associada a formação de uma película que fica aderida a superfície do metal. Como na grande maioria dos casos de corrosão seca o oxigênio é o principal agente corrosivo ou pelo menos participa do processo, a corrosão seca é também chamada de oxidação ou oxidação em alta temperatura. O termo oxidação aqui usado não significa perda de elétrons, mas sim uma reação direta do metal com o oxigênio ou com outro elemento químico que atue de maneira similar ao oxigênio, como, por exemplo, o enxofre. Alguns autores costumam usar o termo sulfetação para designar a corrosão quando o enxofre é o principal contaminante do meio corrosivo, principalmente na corrosão seca. 3.2 Classificação da Corrosão quanto à Forma A classificação da corrosão quanto está associada como a deterioração provocada pela corrosão é observada. A principal ferramenta para observação da corrosão são nossos próprios olhos, em alguns casos, utiliza-se algum aumento para que a deterioração seja melhor caracterizada. Nos casos em que o metal tenha sofrido alguma modificação metalúrgica ou de tensão utiliza-se maiores aumentos para uma melhor identificação da corrosão. 3.2.1 Corrosão Uniforme A forma da corrosão chamada de uniforme ou generalizada é a mais fácil de ser caracterizada porque toda a superfície do metal exposta a um mesmo meio tem deterioração aproximadamente igual. Nessa forma da corrosão a deterioração tem perda de espessura aproximadamente igual em todas as partes do metal exposta ao meio. A Figura 3.1 mostra uma representação esquemática de uma chapa com corrosão uniforme após a remoção do produto de corrosão formado, durante a exposição ao meio corrosivo. A espessura tF é a espessura do metal medida após a exposição do metal ao meio, por um tempo determinado, e após a remoção de todo o produto da corrosão aderido à superfície do metal, observa-se que a espessura tF é aproximadamente igual em qualquer ponto do metal onde for medida. 30 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 3.1 – Esquema representativo da corrosão uniforme – t0: espessura antes da exposição e tF: espessura após a exposição ao meio. A Figura 3.2 mostra uma chapa de aço carbono após 15 dias de exposição numa solução de ácido sulfúrico a 0,25 molar, numa temperatura de 220C, onde pode ser observada uma superfície com alta rugosidade, mas aproximadamente igual em todos os pontos. Figura 3.2 - Superfície de um aço com corrosão uniforme. A Figura 3.3 mostra a parte de uma chapa do casco de um vaso de pressão ondea união por solda de metais diferentes levou a uma corrosão uniforme do metal menos nobre e proteção do metal mais nobre da união formada. 31 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 3.3 – Corrosão uniforme do metal menos nobre. Dependendo das características do metal e do meio e principalmente, da velocidade do fluxo a região com corrosão pode estar recoberta com produto de corrosão e/ou depósitos de sujeiras formando uma camada que impede uma avaliação adequada da superfície com corrosão, como mostra a Figura 3.4. Esses produtos de corrosão podem ter aderências diferentes a superfície, em muitos casos os produtos são de baixa aderência e devem ser removidos antes de uma avaliação e medida da corrosão. Para realizar uma medida real da deterioração provocada pela corrosão é necessário remover todo o produto de corrosão que puder ser removido através de limpeza mecânica ou eletrolítica, de maneira que seja garantida a medição da espessura apenas do metal resistente. Em alguns casos, como no aço inoxidável em meios oxidantes, a camada formada é tão tênue, resistente e fortemente aderida que fica a impressão que não existe camada, nesses casos, a medida da corrosão é realizada sobre o produto de corrosão, pois o produto de corrosão passa a fazer parte do metal. 32 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 3.4 – Antes da avaliação deve ser removida toda a deposição sobre a região corroída. 3.2.2 Corrosão por Pite e Alveolar Tanto a corrosão por pite como alveolar são caracterizadas quando a perda de espessura em algumas partes do metal exposto ao mesmo meio é maior do que em outras. A diferença entre a corrosão na forma de pite (pitting - em inglês) e alveolar está associada apenas as dimensões do local com maior perda de espessura. Na corrosão localizada alveolar os locais com maior corrosão têm um aspecto de uma bacia, onde a profundidade (p) é menor do que 3 vezes qualquer dimensão da superfície (L). A Figura 3.5 mostra um esquema representativo de uma superfície com corrosão alveolar na forma de alvéolos. 33 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 3.5 - Representação esquemática da corrosão localizada alveolar. A Figura 3.6 mostra a corrosão alveolar dispersa em um espécime de aço carbono testado em laboratório após uma exposição de 15 dias em uma solução aquosa de ácido sulfúrico 0,25 molar, na temperatura de 250C, em equilíbrio com a atmosfera e velocidade de fluxo na ordem de 0,8 metros por segundo, sem incidência sobre sua superfície. Figura 3.6 - Corrosão localizada alveolar dispersa no casco de um vaso de pressão. A corrosão localizada na forma de pite (pitting em inglês), tem dimensões superficiais bem menores e maior profundidade. O pite é caracterizado quando a relação entre o comprimento (L) for menor do que 3 vezes a profundidade (p), como mostrado na Figura 3.7. Figura 3.7 Representação esquemática da corrosão localizada por pite a) Vista frontal da chapa b) Seção transversal da chapa a) Vista frontal da chapa b) Seção transversal da chapa 34 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho A Figura 3.8 mostra a corrosão por pite dispersa em um borbulhador do tipo válvula usada no interior de torres de processo. Observa-se que fora dos locais com pite a corrosão é desprezível, o que caracteriza a corrosão como localizada na forma de pites. Figura 3.8 - Corrosão localizada por pite na tampa de um borbulhador do tipo válvula. 3.2.3 Corrosão na forma de Trinca O caso mais comum de corrosão na forma de trinca ocorre em metais submetidos a tensões de tração, nessas situações a corrosão facilita a nucleação de trincas, perpendiculares a direção das tensões de tração. Essa sinergia entre tensões de tração e corrosão que leva a formação de trincas, chama-se de corrosão sob tensão. Nesses casos, a perda de espessura provocada pela corrosão, é muito pequena. Trincas podem ser definidas pela separação local do material, incentivadas pela presença de tensões de tração que atuam na ponta da trinca. A nucleação de uma trinca está associada a concentração de tensão, no caso da corrosão, essa concentração pode ser criada pela formação de pites de corrosão. Por esse motivo, na maioria dos casos, a corrosão sob tensão está associada a quebra de passivação2. A Figura 3.9 representa esquematicamente a ruptura de um corpo de prova após a exposição a um meio específico, como resultado da nucleação e propagação de uma ou mais trincas por corrosão sob tensão. 2 Passivação: película protetora formada espontaneamente por produtos da corrosão. 35 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 3.9 – Representação esquemática da Corrosão sob tensão. Deve ser ressaltado que a corrosão sob tensão acontece para alguns materiais em meios específicos, como por exemplo: o aço carbono exposto a meios que contenham sulfeto de hidrogênio ou o aço inoxidável austenítico exposto a um meio com cloretos. A Figura 3.10 mostra um exemplo de trincas de corrosão sob tensão paralelas a um cordão de solda do casco de um vaso de pressão em aço carbono exposto a um meio contendo sulfeto de hidrogênio. Figura 3.10 – Trincas de corrosão sob tensão. 36 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 3.3 Classificação da Corrosão quanto a Extensão Dependendo das características do metal e do meio, da velocidade de fluxo e da temperatura a corrosão pode ocorrer igualmente em toda a extensão do metal exposta ao meio, de maneira dispersa ou ficar concentrada em alguns locais. Essa interferência em geral está associada a problemas referentes a falhas de projeto, procedimentos de montagem e soldagem deficientes, locais com velocidades de fluxo diferentes, regiões com temperaturas diferentes, regiões onde ocorre quebra de proteção, regiões com mudança de fluxo, ou outras que modifiquem localmente o metal ou o meio. A Figura 3.11 representa um tubo em aço carbono, com adição de 1% de cromo e 0,5% de molibdênio após exposição por 15 dias, em uma solução aquosa de ácido sulfúrico na concentração de 0,25 molar, na temperatura de 250C, em uma cuba aberta para a atmosfera e uma velocidade de fluxo aproximada de 0,8 metro por segundo. Nessa foto pode ser observada uma situação de corrosão uniforme generalizada, onde a perda de espessura foi aproximadamente igual em toda a superfície exposta ao meio, sem regiões com intensidade diferente da corrosão. Figura 3.11 – Superfície com corrosão uniforme generalizada. 37 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Na Figura 3.12 observa-se uma situação de corrosão alveolar dispersa, onde os alvéolos estão dispersos de maneira aleatória sobre a superfície metálica exposta. Esse caso tem-se uma chapa de aço carbono após exposição de 16 dias, em solução ácida, na temperatura de 250C, com a cuba aberta para a atmosfera e velocidade de fluxo aproximada de 0,8 metros por segundo. Figura 3.12 – Superfície com corrosão alveolar dispersa. A Figura 3.13 mostra uma situação onde foi utilizada uma solda homogênea para união de duas chapas de aço carbono. Nesse caso, a corrosão teve uma intensidade muito maior na solda e zona de ligação do que nas chapas, trata-se de um caso de corrosão uniforme localizada. 38 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 3.13 – Corrosão uniforme localizada na solda e zonade ligação. Solda em Aço Carbono Tubo de Aço Carbono Tubo de Aço Carbono Corrosão Uniforme Localizada na Solda e Zona de Ligação 39 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho 4 TAXA DE CORROSÃO A taxa de corrosão expressa o desgaste verificado na superfície metálica. A avaliação correta das taxas de corrosão é de grande importância na determinação da vida útil de um equipamento, tubulação, uma estrutura metálica ou qualquer outra peça. Os métodos usuais de determinação da taxa de corrosão são: a) Perda de espessura por unidade de tempo: Usada principalmente em instalações industriais para avaliar o desgaste provocado pela corrosão uniforme ou localizada em equipamentos, tubulações e outras peças utilizadas em instalações industriais. b) Perda de peso por unidade de área na unidade de tempo: Usada principalmente em experiências realizadas tanto em laboratório quanto no campo, quando a corrosão for uniforme. c) Aumento de peso por unidade de área na unidade de tempo: Usada apenas para avaliar a corrosão de metais em alta temperatura nas experiências de laboratório. Quando for utilizada a perda de espessura para calcular a taxa de corrosão deve ser considerado as frentes de ataque que o metal foi exposto. Por exemplo, se um cupon de corrosão for totalmente imerso em um meio haverá duas frentes de ataque na direção da espessura e isso deve ser considerado no cálculo da espessura. 4.1 Perda de Espessura A perda de espessura por unidade de tempo determina a taxa de penetração da corrosão na superfície metálica, após um tempo determinado de exposição do metal ao meio corrosivo. A taxa de corrosão deve ser calculada por frentes de ataque do meio à superfície metálica e por tipo de meio. A equação 4.1 é a expressão matemática usualmente aplicada para o cálculo da taxa de corrosão uniforme quando apenas um lado da espessura estiver exposto ao meio corrosivo, como mostra a Figura 4.1 40 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho TC = (t0 – tF) / t (equação 4.1) Sendo: t0: espessura do metal antes da exposição ao meio, em milímetros (mm) tF: espessura do metal após a exposição e após a remoção do produto de corrosão, em milímetros (mm) tempo: tempo de exposição do metal ao meio, em anos (a) TC: taxa de corrosão, em milímetros por ano (mm/a) Figura 4.1 – Exposição de uma superfície do metal ao meio. A equação 4.2 é utilizada para medir a taxa de corrosão de um cupom imerso em um meio corrosivo, como mostra a Figura 4.2. Nesse caso, as duas superfícies da espessura foram expostas ao meio corrosivo, como é o mesmo meio a taxa de corrosão, que representa a agressividade do meio, deve ser dividida por dois. TC = [(t0 – tF) / t] / 2 (equação 4.2) Sendo: t0: espessura do metal antes da exposição ao meio, em milímetros (mm) tF: espessura do metal após a exposição e após a remoção do produto de corrosão, em milímetros (mm) tempo: tempo de exposição do metal ao meio, em anos (a) TC: taxa de corrosão, em milímetros por ano (mm/a) 2: indica que as duas superfícies do metal estão expostas ao meio 41 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 4.2 – Imersão total do metal no meio. As equações 4.1 e 4.2 só devem ser aplicadas para medir corrosão uniforme. Nos casos em que a corrosão for localizada, na forma de alvéolos ou pites deve ser usada a taxa de pite ou taxa de penetração (TP), como mostra a equação 4.3. TP = p / t (equação 4.3) Sendo: TP: taxa de pite, em milímetros por ano (mm/a) p: profundidade do maior pite, medida após a remoção de todo o produto de corrosão aderido à superfície do metal, em milímetros (mm) t: tempo de exposição, em anos (a) As unidades de medida normalmente utilizadas para expressar a taxa de corrosão são: Milímetros de penetração por ano: mm/ano ou mm/a Polegadas de penetração por ano: ipy (inches per year) Milésimo de polegada de penetração por ano: mpy (mils per year) Sendo que 1 ipy = 25,4 mm/ano e 1 ipy = 1000 mpy. Quando um equipamento, cupom de corrosão ou espécime usado em experiência de laboratório apresentar corrosão uniforme e a presença de pites, costuma se medir a taxa de corrosão uniforme por perda de peso ou perda de espessura, conforme o caso, e acrescenta- se a taxa de corrosão a informação do fator de pite (pitting fator), calculado pela equação 4.4, como a razão entre a maior profundidade do pite e a perda de metal da corrosão uniforme, como representado na Figura 4.3. 42 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Fator de Pite (FP) = P d (equação 4.4) Sendo: FP: Fator de pite, valor adimensional. P: maior profundidade de pite medida, em mm. d: perda de espessura devido a corrosão uniforme no local do pite (Figura 4.3), em mm. Figura 4.3 – Cálculo do Fator de Pite (equação 4.4). 4.1.1 Medição de Espessura A medição da espessura com precisão é fator fundamental para o cálculo correto da taxa de corrosão. Por isso, foram desenvolvidos métodos para realizar essa medição com precisão, agilidade e menor custo. A definição do método mais indicado depende de vários fatores como: local onde será realizada a medida, disponibilidade de acesso as duas superfícies do metal e forma da corrosão. Os métodos atuais mais utilizados estão descritos a seguir. 4.1.1.1 Ultrassom No caso do ultrassom a medição de espessura é determinada pelo caminho percorrido por ondas ultrassônicas que atravessam o metal até encontrar sua superfície posterior quando são refletidas e retornam ao cabeçote que é transmissor e receptor das ondas ultrassônicas (Figura 4.4). 43 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 4.4 – Medição de espessura por ultrassom. A velocidade da onda sônica no metal é conhecida e o aparelho mede o tempo que a onda leva para percorrer toda a espessura do metal ida e volta, assim o valor da espessura é calculado pelo produto entre a velocidade e o tempo que a onda leva para fazer uma vez o percurso. Atualmente é o método mais utilizado por ser preciso, de baixo custo e rápido. Esse método de medida pode ser usado quando se tem acesso pelos dois lados do metal ou só por um lado, como no caso da medição da espessura de tubulações ou equipamentos sem acesso interno. 4.1.1.2 Calibre Mecânico A medida da espessura utilizando um calibre mecânico é mais antiga, trata-se de uma medição direta da espessura do metal, que só pode ser usada quando se tem acesso a ambos os lados do metal que se deseja medir a espessura. Os tipos mais usuais de calibre mecânicos usados na medição de espessura são o paquímetro e o calibre com relógio. O paquímetro é o preferido quando se mede peças pequenas, como: aba de flange, peças internas em equipamentos, cupons de corrosão, espécimes usados em testes de laboratório, etc. O calibre mecânico com relógio é mais indicado quando é necessária grande abertura do calibre para realizar a medição, como na medição de espessura do pescoço de bocais em equipamentos de grande porte e outros casos similares. A Figura 4.5 mostra esquematicamente um calibre mecânico com relógio analógico, usado na indústria. Trata-se de uma ferramenta com boa precisão quando usado por pessoas treinadas, pois exige muita precisão do inspetor na colocação do calibre, uma leve inclinaçãodurante sua operação pode influenciar na medida. Além do que exige calibração constante pela facilidade com que perde 44 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho seu alinhamento. Entretanto, tem como vantagem a possibilidade de realizar várias medidas em pouco tempo e não exige grande preparação da superfície a ser medida. Figura 4.5 - Esquema de um calibre mecânico com relógio, utilizado para medição de espessura quando existe acesso dos dois lados do local a ser medido. 4.1.1.3 Filme Radiográfico A utilização do filme radiográfico para a medição de espessura exige acesso de ambos os lados da superfície a ser medida, de um lado do metal é colocada a fonte de radiação e do outro o filme que será sensibilizado pela radiação que atravessa o metal. Quanto maior a espessura do metal, mais radiação será absorvida pelo metal, menos radiação via chegar no filme e o filme será menos queimado, deixando o filme radiográfico mais claro. Para espessuras menores, vai ocorre o oposto, chegará mais radiação ao filme e está ficará mais escuro, Figura 4.6. Figura 4.6 – Montagem para obtenção de uma radiografia. RELÓGIO 45 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho A espessura do metal pode ser determinada por comparação usando um padrão de densidade como referência ou pela medição direta na chapa radiográfica quando a espessura do metal é projetada no filme. A Figura 4.7 é o filme radiográfico de uma tubulação de pequeno diâmetro após uma exposição radiográfica digital para avaliação da espessura da tubulação. Figura 4.7 – Filme radiográfico para avaliação de espessura A técnica do filme radiográfico para medição da espessura tem menor precisão que os casos anteriores, mas tem a vantagem de mostrar a espessura em toda região compreendida pelo filme radiográfico, normalmente de 250 mm, o que costuma ser uma grande vantagem. Por esse motivo, a medição de espessura por radiografia costuma ser chamado de perfil radiográfico. A desvantagem dessa técnica é a necessidade de isolamento da área enquanto ocorrer a exposição da fonte radioativa, por problemas de saúde. E sua grande vantagem é que ele pode ser realizado com equipamento em operação, sem a necessidade de preparação da superfície. 4.2 Perda de Peso O cálculo da corrosão por perda de peso é utilizado para quantificar a corrosão em peças ou cupons de corrosão de pequenas dimensões ou que possam ser transportados com facilidade para uma balança de precisão. Os casos mais comuns, são situações de experiências em laboratório ou na monitoração da corrosão por perda de massa. As normas ASTM e NACE recomendam o uso desse método para cálculo da taxa de corrosão por este 46 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho ser mais preciso do que o cálculo pela perda de espessura, visto que na perda de peso a rugosidade da superfície não interfere na medida. A expressão matemática usada para o cálculo da taxa de corrosão por de peso está descrita na equação 4.5. Observa-se que nessa expressão aparece a área da superfície do metal exposta, para que o cálculo possa ser aplicado para peças de qualquer forma e qualquer dimensão. TC = (P0 – PF) / (A0.t) (equação 4.5) Sendo: TC: taxa de corrosão, em mg / dm2. dia (mdd) P0: peso inicial do metal, após limpeza e preparação, em mg PF: peso final do metal, após exposição e limpeza, em mg A0: área de toda a superfície do metal exposta ao meio, em dm2 t: tempo de exposição do metal ao meio, em dias A unidade de medida, normalmente utilizada na determinação dessa taxa de corrosão por perda de peso é miligrama por decímetro quadrado por dia, representada pela sigla mdd. Algumas, normas e literaturas utilizam também a unidade de medida de gramas por metro quadrado por hora (g/m2.h). O cálculo da taxa de corrosão por perda de peso só pode ser utilizado quando a corrosão for na forma uniforme. A taxa de corrosão por perda de peso costuma ser transformada para milímetros por ano, pois está é forma mais usual de expressar a corrosão. Para converte a taxa de corrosão em perda de peso para perda de espessura é preciso conhecer a densidade do metal exposto a corrosão. A equação 4.6 mostra como é feita essa conversão. ρ = m / v ou ρ = m / (e.A) ou e = m / (ρ.A) (equação 4.6) Sendo: ρ: densidade do metal m: massa de metal corroída A: área do metal exposta ao meio e: espessura do metal exposto 47 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Aplicando o valor da espessura (e) da equação 4.6, na equação 4.1 teremos a equação 4.7. TC = m / (ρ.A.t) (equação 4.7) Sendo: TC: taxa de corrosão m: massa de metal corroída (perda de peso) ρ: densidade do metal exposto a corrosão t: tempo de exposição do metal ao meio Para que a taxa de corrosão seja medida em milímetros por ano (mm/a), usando-se a densidade em g/cm3, a perda de massa em gramas, a área em cm2 e o tempo em dias é necessário aplicar na equação 4.7 um fator, como mostra a equação 4.8. TC = (8,76. 104). [m / (ρ.A.t)] (equação 4.8) Sendo: TC: taxa de corrosão, em mm/a m: massa de metal corroída, ou perda de peso, em gramas ρ: densidade do metal exposto a corrosão, em g/cm3 t: tempo de exposição do metal ao meio, em horas 4.3 Exemplos de Aplicação Serão apresentados alguns exemplos do cálculo da taxa de corrosão usando as equações 4.1, 4.2 e 4.3 Exemplo 4.1: Determine a taxa de corrosão, em mm/a, dos metais A e B da Figura 4.8, sabendo-se que os metais A e B foram expostos a meios corrosivos diferentes durante 10 anos. Qual metal sofreu maior corrosão? (Medidas em milímetros) 48 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 4.8 – Exposição dos Metais A e B a meios diferentes RESOLUÇÃO Taxa de corrosão do metal A – aplicando a equação 4.2 – exposição das 2 superfícies do metal ao meio. t0 = 40 mm tF = 20 mm t = 10 anos T.C. = [ ( 40 - 20 ) / 10 ] / 2 = 1 mm / ano Duas frentes de ataque 49 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Taxa de corrosão do metal B – aplicando a equação 4.1 – exposição de apenas 1 superfície do metal ao meio. t0 = 40 mm. tF = 20 mm. t = 10 anos. Meio mais agressivo Considerando que os dois metais estão expostos ao mesmo meio, o metal A teve uma resistência à corrosão, nesse meio, melhor do que o metal B. O exemplo 4.2 é uma aplicação das equações 4.5 e 4.8 Exemplo 4.2: Um ensaio de laboratório com 3 materiais diferentes, mergulhados num mesmo meio corrosivo, apresentou os resultados plotados na Figura 4.5. Baseando-se nessas curvas e nos dados da Tabela 4.1 responda o seguinte: a) quais as taxas de corrosão de cada um dos três metais em toda a experiência, sabendo que a corrosão foi uniforme? b) qual o material apresentou menor e maior corrosão depois de decorridos 10 e 20 dias de experiência? Tabela 4.1 – Densidade e área de exposição dos metais Material Área exposta (dm2) Densidade (g/cm3) 1 25,00 7,86 2 30,00 8,15 3 28,00 7,32 T.C. = (40 - 20 ) / 10 = 2 mm / ano 50 FUNDAMENTOS DA CORROSÃO - PARTE 1 Autor: Me. Nestor Ferreira de Carvalho Figura 4.5 – Perda de peso dos metais durante a exposição ao meio RESOLUÇÃO a) A Tabela 4.2 mostra o resultado do cálculo das taxas de corrosão em mdd, pela
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