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Revolução Permanente - Leon Trotski

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O QUE É A REVOLUÇÃO PERMANENTE? (TESES) *
Leon Trótski 
CONSTANTINOPLA, 30 DE NOVEMBRO DE 1930. 
1. A teoria da revolução permanente exige na atualidade a maior atenção da parte de todo o marxista, porque o 
desenvolvimento da luta ideológica e da luta de classes fez esta questão sair definitivamente dos domínios das 
recordações de velhas divergências entre marxistas russos, para a colocar como a questão do caráter, do nexo 
interno e dos métodos da revolução internacional em geral. 
2. Para os países de desenvolvimento burguês atrasado e, em particular, para os países coloniais e semicoloniais, 
a teoria da revolução permanente significa que a resolução íntegra e efetiva das suas tarefas democráticas e de 
libertação nacional somente pode ser concebida por meio a ditadura do proletariado, que se coloca à cabeça da 
nação oprimida e, primeiro de tudo, das suas massas camponesas. 
3. Não só a questão agrária como também a questão nacional atribuem ao campesinato, que constitui a enorme 
maioria da população dos países atrasados, um papel excepcional na revolução democrática. Sem a aliança entre 
o proletariado e os camponeses, as tarefas da revolução democrática não podem ser realizadas; nem sequer 
podem ser seriamente colocadas. Mas a aliança destas duas classes não poderá realizar-se a não ser através duma 
luta implacável contra a influência da burguesia liberal nacional. 
4. Quaisquer que sejam as primeiras e episódicas etapas da revolução nos diferentes países, a aliança 
revolucionária do proletariado e do campesinato só é concebível sob a direção política da vanguarda proletária 
organizada em partido comunista. O que significa, por sua vez, que a vitória da revolução democrática só é 
concebível por meio da ditadura do proletariado, que se apoia na sua aliança com o campesinato e que, em 
primeiro lugar, decide das tarefas da revolução democrática. 
5. Encarada em seu sentido histórico, a antiga palavra de ordem bolchevique "ditadura democrática do 
proletariado e do campesinato" exprimia exatamente as relações acima caracterizadas entre o proletariado, o 
campesinato e a burguesia liberal. Isto foi demonstrado pela experiência de Outubro. Mas a antiga fórmula de 
Lênin não antecipava quais seriam as relações políticas recíprocas do proletariado e do campesinato no interior 
do bloco revolucionário. Em outras palavras, a fórmula admitia conscientemente um certo número de incógnitas 
algébricas, que, no decurso da experiência histórica, deviam ceder o lugar a elementos aritméticos precisos. Esta 
experiência provou, em circunstâncias que excluem qualquer outra interpretação, que o papel do campesinato, 
qualquer que seja a sua importância revolucionária, não pode ser um papel independente e ainda menos um papel 
dirigente. O camponês segue o operário ou o burguês. Isso significa que a "ditadura democrática do proletariado 
e do campesinato" não é concebível a não ser como ditadura do proletariado arrastando atrás de si as 
massas camponesas. 
6. Uma ditadura democrática do proletariado e do campesinato, como regime distinto, pelo seu conteúdo de 
classes, da ditadura do proletariado, só seria realizável no caso em que fosse possível pôr de pé um partido 
revolucionário independente que exprimisse os interesses da democracia camponesa e pequeno burguesa em 
geral, um partido capaz de, com a ajuda do proletariado, conquistar o poder e lhe determinar o programa 
revolucionário. A história moderna, designadamente a da Rússia durante os últimos vinte e cinco anos, mostra-
nos que o intransponível obstáculo que se opões à formação dum partido camponês consiste na falta de 
independência econômica e política da pequena burguesia (campesinato) e na sua profunda diferenciação 
interna, que permite que as suas camadas superiores se aliem à grande burguesia quando dos acontecimentos 
decisivos, sobretudo quando por ocasião de guerra ou de revolução, ao passo que as camadas inferiores se aliam 
ao proletariado, obrigando as suas camadas médias a escolher entre as duas forças. Entre o regime de Kerenski e 
o poder bolchevique, entre o Kuomintang e a ditadura do proletariado, não existe nem pode existir nenhum 
regime intermediário, isto é, nenhuma ditadura democrática dos operários e dos camponeses. 
7. A tendência da Internacional Comunista para impor hoje aos países do Oriente a palavra de ordem da ditadura 
democrática do proletariado e do campesinato, há longo tempo ultrapassada pela histórica, não pode ter outro 
sentido que não seja reacionário. Na medida em que esta palavra de ordem é oposta à ditadura do proletariado, 
contribui politicamente para a dissolução e decomposição do proletariado nas massas pequeno-burguesas e cria 
assim condições favoráveis à hegemonia da burguesia nacional, logo ao fracasso da revolução democrática. A 
incorporação desta palavra de ordem no programa da Internacional Comunista significa trair efetivamente o 
marxismo e as tradições bolcheviques de Outubro. 
8. A ditadura do proletariado, que sobe o poder como força dirigente da revolução democrática, se encontra 
muito rápida e inevitavelmente colocada perante tarefas que a forçarão a fazer incursões profundas no direito de 
propriedade burguês. No decurso de seu desenvolvimento, a revolução democrática transforma-se diretamente 
em revolução socialista e torna-se assim uma revolução permanente. 
9. A conquista do poder pelo proletariado não completa revolução; limita-se a iniciá-la. A construção socialista 
só é concebível na base da luta de classes à escala nacional e internacional. Dado o domínio decisivo das 
relações capitalistas na arena mundial, esta luta conduzirá inevitavelmente a erupções violentas, isto é, a guerras 
civis internas e a guerras revolucionárias no exterior. É nisso que consiste o caráter permanente da própria 
revolução socialista, quer se trate de um país atrasado que tenha acabado de realizar a sua transformação 
democrática, quer dum velho país capitalista que já tenha passado por um longo período de democracia e de 
parlamentarismo. 
10. O triunfo da revolução socialista é inconcebível nos limites nacionais. Uma das causas essenciais da crise da 
sociedade burguesa reside em que as forças produtivas por ela criadas não podem se conciliar com os limites do 
Estado nacional. De onde surgem as guerras imperialistas por um lado e a utopia dos Estado Unidos burgueses 
da Europa por outro. A revolução socialista começa no terreno nacional, desenvolve-se na arena internacional e 
completa-se na arena mundial. Assim, a revolução socialista torna-se permanente num sentido novo e mais 
amplo do termo: só está acabada com o triunfo definitivo da nova sociedade sobre todo o nosso planeta. 
11. O esquema do desenvolvimento da revolução mundial antes traçado elimina a questão dos países "maduros" 
ou "não maduros" para o socialismo, segundo a classificação pedante e morta que estabeleceu o atual programa 
da Internacional Comunista. Na medida em que o capitalismo criou o mercado mundial, a divisão mundial do 
trabalho e forças produtivas mundiais, preparou o conjunto da economia mundial para a transformação socialista. 
Os diferentes países atingirão essa fase em ritmos diferentes. Em certas circunstâncias, países atrasados podem 
chegar à ditadura do proletariado mais rapidamente do que países avançados, mas atingirão o socialismo mais 
tarde do que estes. 
Um país colonial ou semicolonial atrasado, cujo proletariado não esteja suficientemente preparado para agrupar 
a sua volta o campesinato e para conquistar o poder, é por esse mesmo fato incapaz de levar a bom termo a 
revolução democrática. Em compensação, num país em que o proletariado chegue ao poder no seguimento de 
uma revolução democrática, o destino ulterior da ditadura e do socialismo dependerá menos, no fim das contas, 
das forças produtivas nacionais do que do desenvolvimento da revolução socialista internacional. 
12. A teoria do socialismo num sópaís, que surgiu como conseqüência da reação contra Outubro, é a única teoria 
que se opõe duma maneira profunda e conseqüente à teoria da revolução permanente. 
A tentativa feita pelos epígonos para limitar, sob os golpes da crítica, a aplicação da teoria do socialismo num só 
país unicamente à Rússia devido às suas particulares propriedades (a extensão territorial e as riquezas naturais) 
não melhora nada e pelo contrário agrava tudo. A renúncia a uma atitude internacional conduz inevitavelmente 
ao messianismo nacional, isto é, ao reconhecimento de vantagens e particularidades específicas que permitem a 
um país desempenhar um papel a que outros não poderiam se elevar. 
A divisão mundial do trabalho, a dependência da indústria soviética em relação à técnica estrangeira, a 
dependência das forças produtivas dos países avançados em relação às matérias-primas asiáticas, etc., tornam 
impossível a construção de uma sociedade socialista autônoma, isolada, em nenhum país do mundo. 
13. A teoria de Stálin-Bukhárin não só opõe de forma mecânica a revolução democrática à revolução socialista, a 
despeito da experiência das revoluções russas, como também separa a revolução nacional da revolução 
internacional. Coloca as revoluções dos países atrasados perante a tarefa de instaurar o regime irrealizável da 
ditadura democrática, que opõe à ditadura do proletariado. Introduz assim, em política, ilusões e ficções, paralisa 
a luta do proletariado pelo poder no Oriente e entrava a vitória das revoluções coloniais. 
Do ponto de vista da teoria dos epígonos, a conquista do poder pelo proletariado constitui, por si só, a realização 
da revolução (para os "nove décimos", segundo a fórmula de Stálin); inaugura a época das reformas nacionais. A 
teoria da integração do kulak no socialismo e a teoria da "neutralização" da burguesia mundial são, por 
conseqüência, inseparáveis da teoria do socialismo num só país. Estas teoria aparecem juntas, e juntas caem. 
A teoria do socialismo-nacional degrada a Internacional Comunista, da qual se utiliza como arma auxiliar na luta 
contra a intervenção militar. A política atual da Internacional Comunista, o seu regime e a escolha dos seus 
dirigentes corresponde perfeitamente à sua decadência e à sua transformação em tropa auxiliar, que não se 
destina a resolução de tarefas independentes. 
14. O programa da Internacional Comunista, obra de Bukhárin, é eclético duma ponta a outra. É uma tentativa 
desesperada para conciliar a teoria do socialismo num só país com o internacionalismo marxista, apesar de este 
ser inseparável do caráter permanente da revolução mundial. A luta da Oposição de Esquerda Comunista por 
uma política justa e um regime sadio na Internacional Comunista está indissoluvelmente ligada à luta por um 
programa marxista. Por sua vez, a questão do programa é inseparável das duas teorias opostas: a teoria da 
revolução permanente e a teoria do socialismo num só país. O problema da revolução permanente ultrapassou há 
muito tempo o quadro das divergências episódicas entre Lênin e Trótski, divergências que, além do mais, foram 
inteiramente esgotadas pela história. Trata-se da luta entre as idéias fundamentais de Marx e Lênin, por um lado, 
e o ecletismo dos centristas, por outro. 
 RETIRADO DE TROTSKY, LEON A REVOLUÇÃO PERMANENTE. LISBOA: ANTÍDOTO, 1977, PÁG. 201-208. COTEJADO COM O ESPANHOL, *
INGLÊS E FRANCÊS NAS EDIÇÕES: LA TEORIA DE LA REVOLUCIÓN PERMANENTE. BUENOS AIRES: CEIP LEÓN TROTSKY, 2000, PÁG. 
519-523; PERMANENT REVOLUTION.. NEW YORK: PROGRESS PUBLISHERS/MILITANT, 1931; LA RÉVOLUTION PERMANENTE. PARIS: LES 
ÉDITIONS DE MINUIT, 1963, PÁG. 228-236. 
	Leon Trótski
	Constantinopla, 30 de novembro de 1930.

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