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1 2 3 4 | Lei penal no tempo .......................................................................................... 05 | Lei penal no espaço......................................................................................... 13 | Extinção da punibilidade ................................................................................. 19 | Concurso de crimes ........................................................................................ 30 | Concurso de pessoas ...................................................................................... 36 | Erros ................................................................................................................ 43 | Crimes contra o patrimônio – Parte I.............................................................. 50 | Crimes contra o patrimônio – Parte II ............................................................ 58 ..................................................................................................................... 62 5 Imagine que, exatamente hoje, você cometeu um crime. Pode ser qualquer crime: um furto, um roubo, uma receptação ou, até mesmo, um homicídio, por que não? Agora, imagine que no dia seguinte entra em vigor uma lei que agrava a pena do crime que você cometeu. Nesse caso, qual pena será aplicada para penalizar a sua conduta? A nova pena ou aquela vigente no dia da sua conduta? Sem ainda responder à questão, imagine outra situação: imagine que a nova lei reduza a pena do crime que você cometeu. Nesse caso, qual pena se aplica? Pense, também, em uma nova lei que revoga o crime que você cometeu. Quando você cometeu o crime, a lei ainda estava em vigor, não estava? Você ainda será punido ou sua punibilidade será extinta? Perceba que essas questões tratam de um conflito de leis penais no tempo. Situações nas quais precisaremos saber se, no caso concreto, será aplicada a lei que estava em vigor quando a conduta foi praticada ou será aplicada a nova lei. Para essas perguntas, algumas de suas respostas são óbvias, outras nem tanto. Mas “quem” nos fornece essas respostas são os artigos e princípios inseridos dentro da matéria chamada lei penal no tempo. E, grosso modo, podemos dizer que essa matéria está regulamentada dentro do Código Penal entre os artigos 2º e 4º. Esse é o primeiro conflito aparente que iremos estudar. Ele ocorre quando entra em vigor nova lei que revoga um crime existente no ordenamento jurídico. Para essa nova lei revogadora, nós utilizamos o termo abolitio criminis. 6 Sabemos que o direito sofre constantes mudanças. Bens jurídicos valorizados em um determinado contexto social podem perder relevância com o passar dos anos. Por isso, o Estado tende a proteger menos esses bens jurídicos por meio de alterações legislativas. Uma dessas alterações é a revogação de delitos. Assim, se o Estado revoga um crime, quer dizer que não há mais interesse em punir essa conduta (ao menos na esfera penal). Por isso, não teria lógica fazer com que aqueles que estão sendo processados pela prática do crime continuem sendo processados. Tampouco teria lógica fazer com que aqueles que cumprem pena continuem a cumprir. Por isso, ninguém poderá ser punido por um fato que lei posterior deixa de considerar crime. Reconhece esse texto? Pois é, está previsto no art. 2º do Código Penal: Art. 2º Ninguém poderá ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Essa regra constitui exceção ao princípio da irretroatividade da lei penal, previsto no art. 5º, inciso XL, da CF/88.1 Como o próprio texto constitucional determina, a lei não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Importante: Com a abolitio criminis, conforme texto expresso no art. 2º do CP, cessam apenas os efeitos penais2 da sentença penal condenatória. Isto é, os efeitos extrapenais3 permanecem. 1 Art. 5º, inciso XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. 2 Cite-se, como exemplos, a própria pena e a reincidência. 3 São exemplos de efeitos extrapenais aqueles previstos nos artigos 91 e 92 do Código Penal, como a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime e perda, em favor da União, dos instrumentos do crime. 7 A nova lei que revoga um crime é, sem dúvidas, benéfica ao réu ou ao apenado. Contudo, a revogação não é o único benefício que uma nova lei em vigor pode prever. Uma nova lei pode, por exemplo, diminuir a pena cominada para determinado crime ou, até mesmo, revogar qualificadoras e causas de aumento de pena. Assim, se de qualquer forma a lei nova beneficiar o agente, ela deverá ser aplicada aos fatos anteriores à sua vigência. Esse é o texto do parágrafo único do artigo 2º do CP: Art. 2º, parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. Atente-se ao fato de que a nova lei benéfica (a revogadora também, inclusive) será aplicada aos fatos ainda que a sentença condenatória já tenha transitado em julgado. Nesse sentido, interessante mencionar a Súmula 611 do STF, já cobrada no Exame de Ordem: Súmula 611 do STF – Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao Juízo das execuções a aplicação da lei penal mais benigna. Aprendemos nos dois últimos tópicos que a nova lei benéfica será aplicada aos fatos anteriores à sua vigência, quando beneficiarem o agente. Contudo, pode ser que a nova lei seja maléfica ao agente, aumentando a pena cominada ao crime, criando novas qualificadoras, criando causas de aumento de pena etc. É a chamada novatio legis in pejus. 8 Nesses casos, como a lei prejudica o réu, ela não poderá retroagir. Essa é, na verdade, a regra. As duas primeiras situações (retroatividade) são exceções. A lei só produz efeitos em relação aos fatos ocorridos durante a sua vigência (da entrada em vigor até a sua revogação). A nova lei maléfica não poderá retroagir por expressa determinação constitucional. Aqui, estamos diante do princípio da irretroatividade da lei penal, previsto no art. 5º, inciso XL, da CF/88: Art. 5º, inciso XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. º Já vimos que, fora as exceções,4 aplicaremos ao caso concreto a lei que estava vigente à época da prática do crime. Contudo, quando exatamente se considera praticado o crime? No momento da conduta (ação ou omissão), ou no momento da consumação do crime? Essa é uma questão muito importante e já foi cobrada várias vezes no Exame de Ordem. Imagine que, no dia 01/08/2020, com intenção de matar, Doroteu, um jovem de dezessete anos, efetua disparos de arma fogo na direção de Mário Augusto, atingindo- o em região vital. Crendo que a vítima estava morta, o autor foge do local do crime. Mario Augusto é imediatamente atendido pela equipe de primeiros socorros e é internado em estado de coma. No dia 05/08/2020, Doroteu completa dezoito anos. E, no dia 10/08/2020, não resistindo aos ferimentos, Mario Augusto falece. 4 São exceções a abolitio criminis e a novatio legis in mellius. Essas, por serem benéficas ao agente, retroagirão e serão aplicadas aos fatos ocorridos antes da entrada em vigor. 9 Se considerarmos que o crime foi praticado no momento da ação, Doroteu será considerado inimputável e cumprirá medida socioeducativa. Se, por outro lado, considerarmos o crime praticado no momento do resultado, isto é, no momento da morte de Mario Augusto, Doroteu será imputável e terá que a cumprir pena. Nesse caso, segundo a nossa legislação, Doroteu será considerado imputável ou inimputável? Bem, nesse caso, Doroteu será consideradoinimputável. Isso ocorre pois o nosso Código Penal adotou a teoria da atividade, prevista no artigo 4º do Código Penal: Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. Crimes permanentes são aqueles que o momento de sua consumação se prolonga no tempo. Isto é, enquanto o crime estiver acontecendo, ele estará se consumando. Cite-se, como exemplo, o crime de sequestro e cárcere privado (art. 158 do CP). Durante a prática dos crimes permanentes, sobrevindo lei nova gravosa, esta deverá ser aplicada imediatamente pois o fato ainda está sendo executado. Imagine que, no dia 01/08/2020, Fábio sequestre Amália. O crime de sequestro e cárcere privado prevê uma pena de reclusão de um a três anos. 10 Imagine agora que, com Amália ainda sequestrada, no dia 05/08/2020 entra em vigor uma lei que aumenta a pena do crime de sequestro e cárcere privado para reclusão de dois a cinco anos. No dia 10/08/2020 a polícia finalmente encontra Amália e prende Fábio em flagrante. Assim, por se tratar de crime permanente, deve ser aplicada a nova pena, ainda que mais gravosa. Esse é, inclusive, texto da Súmula 711 do STF: Súmula 711 do STF – A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade delitiva ou da permanência. A figura do crime continuado nós estudaremos logo mais. Pelo que estudamos até aqui, podemos concluir que a lei penal produzirá efeitos sobre os fatos ocorridos durante a sua vigência. E, se determinado crime deixa de ser vigente, o agente (acusado ou condenado) é beneficiado. Todavia, existem alguns crimes que, pela sua natureza, continuarão gerando efeitos mesmo depois de perderem a vigência. São os crimes tipificados via lei excepcional ou via lei temporária. Essas leis vigem por tempo predeterminado pois visam regular situações transitórias e especiais que, em circunstâncias normais, não seriam necessárias. I) Lei excepcional: São leis que vigem durante situações de emergência. Assim, imagine que, diante da decretação de estado de calamidade pública, causada pelo nosso conhecido COVID-19, vendedores e fornecedores aumentam absurdamente o preço do Álcool em Gel, injustificadamente. Para conter a situação, o Governo Federal passa a tabelar os preços. E, após o devido trâmite legal, é aprovada a seguinte (fictícia, no caso) lei penal incriminadora: 11 Art. 1º – Aumentar, injustificadamente, preços de Álcool em Gel durante o período de calamidade pública decretado em virtude do Coronavírus. Pena – detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. II) Lei temporária: São leis com tempo de vigência predeterminado em decorrência de situações especiais. É o caso, por exemplo, dos crimes previstos na Lei n.º 12.663/2012. Trata-se de lei relativa à Copa do Mundo FIFA de futebol ocorrida no Brasil em 2014, que teve seu tempo de vigência condicionado à duração do evento. Essa lei tipifica algumas condutas, dentre elas: Art. 30. Reproduzir, imitar, falsificar ou modificar indevidamente quaisquer Símbolos Oficiais de titularidade da FIFA: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano ou multa. Todavia, como determina o artigo 36 da supracitada lei, esse e outros tipos penais nela previstos tiveram vigência até o dia 31 de dezembro de 2014.5 Deste modo, os sujeitos que praticaram essas condutas durante o período de vigência dessas leis (temporária e excepcional), ainda serão responsabilizados, mesmo que estejam sendo processados após a lei perder a vigência. É justamente isso que estabelece o artigo 3º do Código Penal: Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência. 5 Art. 36. Os tipos penais previstos neste Capítulo terão vigência até o dia 31 de dezembro de 2014. 12 01. (XXVI Exame de Ordem) Jorge foi condenado, definitivamente, pela prática de determinado crime, e se encontrava em cumprimento dessa pena. Ao mesmo tempo, João respondia a uma ação penal pela prática de crime idêntico ao cometido por Jorge. Durante o cumprimento da pena por Jorge e da submissão ao processo por João, foi publicada e entrou em vigência uma lei que deixou de considerar as condutas dos dois como criminosas. Ao tomarem conhecimento da vigência da lei nova, João e Jorge o procuram, como advogado, para a adoção das medidas cabíveis. Com base nas informações narradas, como advogado de João e de Jorge, você deverá esclarecer que: a) não poderá buscar a extinção da punibilidade de Jorge em razão de a sentença condenatória já ter transitado em julgado, mas poderá buscar a de João, que continuará sendo considerado primário e de bons antecedentes. b) poderá buscar a extinção da punibilidade dos dois, fazendo cessar todos os efeitos civis e penais da condenação de Jorge, inclusive não podendo ser considerada para fins de reincidência ou maus antecedentes. c) poderá buscar a extinção da punibilidade dos dois, fazendo cessar todos os efeitos penais da condenação de Jorge, mas não os extrapenais. d) não poderá buscar a extinção da punibilidade dos dois, tendo em vista que os fatos foram praticados anteriormente à edição da lei. 13 Existem lugares que, embora não estejam localizados dentro do Brasil, serão considerados território brasileiro por extensão. Assim, os crimes ali praticados serão julgados no Brasil, segundo a lei penal brasileira. Quais são esses territórios brasileiros por extensão? Bem, a matéria de lei penal espaço responderá a essa pergunta. Também existem alguns crimes que, embora cometidos em território estrangeiro, poderão ser julgados no Brasil, segundo a legislação Brasileira. E quais são esses crimes? Isso mesmo, a matéria de lei penal no espaço dará a resposta. Uma outra questão que será respondida por essa matéria é: onde se considera praticado um crime quando a ação/omissão e o resultado ocorrem em países diferentes? A territorialidade estabelece a regra lógica de que aos crimes praticados em território nacional será aplicada a lei brasileira. É o que determina o caput do art. 5º do CP: Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. Importante destacar que por território nacional entende-se: I) o solo; II) o respectivo espaço aéreo; e III) a costa oceânica até doze milhas náuticas. Contudo, a lei penal brasileira prevê os chamados territórios brasileiros por extensão. São lugares (bens, tecnicamente falando) que, embora não estejam localizados dentro do território brasileiro, serão assim considerados, por mera ficção jurídica. 14 Estão previstos nos §1º e §2º do art. 5º do CP: §1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. §2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. Assim, do texto legal, abstraímos os seguintes territórios por extensão: • Embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro, onde quer que se encontrem. • Aeronaves e embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedadeprivada que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. • Aeronaves e embarcações estrangeiras de propriedade privada, que estejam, respectivamente, em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. Deste modo, os crimes praticados nos ambientes supracitados poderão ser julgados no Brasil, segundo a legislação penal brasileira. Assim, por exemplo, um homicídio cometido por um francês contra um espanhol, a bordo de um cruzeiro americano (embarcação privada) ancorado no Brasil, será julgado no Brasil, segundo a lei penal Brasileira. A extraterritorialidade, por sua vez, não trata de território brasileiro por extensão. Ela trata, efetivamente, de crimes cometidos em territórios estrangeiros, mas que, por questões de política criminal, o legislador determinou que pudessem ser julgados no Brasil, pela lei penal brasileira. 15 Esses crimes estão previstos no artigo 7º do Código Penal e poderão ser de extraterritorialidade incondicionada (previstos no inciso I) ou de extraterritorialidade condicionada (previstos no inciso II). I) Extraterritorialidade incondicionada (Art. 7, inciso I, do CP): São crimes mais graves e, por isso, não existe nenhuma condição para que a justiça brasileira realize o julgamento. Basta que o crime ocorra. São os crimes: a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil II) Extraterritorialidade condicionada (Art. 7º, inciso II, do CP): São crimes menos graves e, por isso, para que a lei penal brasileira seja aplicada, é necessário que se configure algumas condições. São os crimes: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; b) praticados por brasileiro; c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados. Já as condições para que a lei penal brasileira seja aplicada estão previstas no §2º do art. 7º: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. 16 Se, por exemplo, é praticado no estrangeiro um crime contra a vida do Presidente da República do Brasil, que lá estava em missão diplomática, ao agente criminoso será aplicada a lei penal brasileira independentemente de qualquer condição (Art. 7º, I, alínea “a”). Agora, se um homicídio for praticado em embarcação brasileira privada ancorada em território estrangeiro (Art. 7º, II, alínea “c”), para que seja aplicada a lei penal brasileira será necessário que, além de o sujeito lá não ser julgado, estejam presentes todas as condições previstas no inciso II do art. 7º do Código Penal. Na maioria das vezes, quando a extraterritorialidade é abordada no Exame de Ordem, a banca narra o cometimento de um crime em território estrangeiro e questiona se você está diante de um crime de extraterritorialidade condicionada ou incondicionada. É o tipo de questão que avalia o conhecimento sobre o texto de lei. Por isso, é importante que você leia diversas vezes o artigo 7º do Código Penal para memorizar quais são os crimes ali previstos e como eles se enquadram. John cometeu, em território estrangeiro, um crime de extraterritorialidade incondicionada (imagine um crime contra o patrimônio da União, por exemplo). John foi processado, julgado e condenado segundo a lei estrangeira, cumprindo lá integralmente a pena imposta. Passados alguns anos, em viagem para o Brasil, John é preso e processado pela prática do referido crime, sendo que já havia cumprido integralmente a sua pena no estrangeiro. Nesse caso, pergunta-se: John poderá ser processado e julgado agora segundo a lei brasileira, mesmo já tendo cumprido a sua pena no Estado estrangeiro? A resposta é sim. E isso ocorre porque foi um crime de extraterritorialidade incondicionada. Isto é, a lei penal brasileira será aplicada independentemente de qualquer condição. 17 Contudo, por critérios de justiça, a pena cumprida no estrangeiro não será ignorada. Ela será descontada em eventual pena aplicada pela jurisdição brasileira. É o que que determina o artigo 8º do Código Penal: Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas. Manuela, residente no Brasil, é crítica ferrenha do capitalismo norte-americano e por ele nutre um ódio mortal. Por isso, Manuela decide enviar, por avião, uma bomba relógio programada para disparar quando a aeronave estiver em território americano. Contudo, por conta de uma série de imprevistos, o avião precisou parar na Colômbia, onde lá a bomba acabou explodindo e matando dezenas de pessoas. Perceba que a ação foi praticada no Brasil, com a intenção de produzir resultado nos Estados Unidos, mas o crime consumou-se na Colômbia. Nesse caso, segundo o Código Penal, onde considera-se praticado o crime? Considera-se praticado o crime nos três países: Brasil, Colômbia e Estados Unidos. Isso ocorre porque nossa a legislação, nesse ponto, adotou a teoria da ubiquidade. É o que dispõe o artigo 6º do Código Penal: Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Atenção, aqui estamos diante de regras de Direito Internacional, quando a execução de um crime é iniciada em um país e o crime é consumado em outro (são os chamados crimes à distância). Não estamos tratando de competência territorial interna. Aos crimes cometidos dentro do território nacional, nós aplicaremos as regras de competência interna. Para a competência em razão do território, que estudamos em 18 Processo Penal, nós aplicamos - em regra - a teoria do resultado, prevista pelo artigo 70 do Código de Processo Penal.6 Portanto, não confunda. 02. (XI EXAME DE ORDEM) No ano de 2005, Pierre, jovem francês residente na Bulgária, atentou contra a vida do então presidente do Brasil que, na ocasião, visitava o referido país. Devidamente processado, segundo as leis locais, Pierre foi absolvido. Considerando apenas os dados descritos, assinale a afirmativa correta. a) Não é aplicável a lei penal brasileira, pois como Pierre foi absolvido no estrangeiro, não ficou satisfeita uma das exigências previstas à hipótese de extraterritorialidade condicionada. b) É aplicável a lei penal brasileira, pois o caso narrado traz hipótese de extraterritorialidade incondicionada, exigindo-se, apenas, que o fato não tenha sido alcançado por nenhuma causa extintiva de punibilidade no estrangeiro. c) É aplicável a lei penal brasileira, pois o caso narrado traz hipótese de extraterritorialidade incondicionada, sendo irrelevante o fato de ter sido o agente absolvido no estrangeiro. d) Não é aplicável a lei penal brasileira, pois como o agente é estrangeiro e a conduta foi praticada em território também estrangeiro, as exigências relativas à extraterritorialidade condicionada não foram satisfeitas. 6 Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa,pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. 19 Tema frequente na primeira fase do Exame de Ordem, as causas de extinção da punibilidade estão previstas em um rol exemplificativo7 no artigo 107 do Código Penal: Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: I - pela morte do agente; II - pela anistia, graça ou indulto; III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; IV - pela prescrição, decadência ou perempção; V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada; VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite; IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei. Os incisos IV e V possuem grande incidência no Exame de Ordem, não à toa os destacamos. E, sem dúvidas, dentre todos os temas, a prescrição é que possui maior importância. Por isso, e pelo grau de dificuldade da matéria, dedicaremos esse capítulo quase que por inteiro ao estudo da prescrição e suas espécies. Contudo, antes de aprendermos sobre prescrição, é necessário destacar pontos relevantíssimos sobre outras causas extintivas da punibilidade que são cobradas com frequência pela FGV. 2.1. Perempção: Prevista no inciso IV do art. 107 do CP, a perempção é uma causa de extinção da punibilidade que decorre da inércia do querelante na ação penal privada. Na ação penal privada, o interesse em ver o réu sendo processado é exclusivo do querelante, isto é, daquele que oferece a queixa-crime. Se, por alguma razão 7 Nesse sentido, cabe aqui destacar uma novidade legislativa: o acordo de não persecução penal, inserido em nosso ordenamento jurídico pela Lei n.º 13.964/2019 (Pacote Anticrime). Determina o §13 do Art. 28- A do CPP que: “Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção da punibilidade.” Julgamos ser um item muito importante no seu estudo, haja vista a preferência da banca por novos temas. 20 injustificada, o querelante ficar inerte no curso da ação penal privada, presume-se a perda do interesse em punir o agente. As causas de perempção estão previstas no art. 60 do CPP. E é muito importante que você faça uma leitura atenta do dispositivo, pois é comum que a FGV cobre o teor do referido texto legal. Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar- se-á perempta a ação penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais;8 IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor. 2.2. Perdão: Pela mesma lógica do tópico anterior, nas ações penais privadas se a vítima perdoar o autor do crime, e este aceitar o perdão, a punibilidade deste será extinta. O perdão poderá ser expresso ou tácito e sobre ele é importante memorizar as disposições do artigo 106 do CP: • Se concedido a qualquer dos querelados a todos aproveita. • Se concedido por um dos ofendidos, não prejudica o direito dos outros. • Se o querelado o recusa, não produz efeito. 8 Destacamos esse trecho pois, além de muitas vezes passar despercebido, já foi cobrado mais de uma vez no Exame de Ordem. Portanto, atenção! 21 • Perdão tácito é o que resulta da prática de ato incompatível com a vontade de prosseguir na ação.9 • Não é admissível o perdão depois que passa em julgado a sentença condenatória. Destacados os pontos importantes, vamos ao estudo da prescrição. Em um primeiro ponto, estudaremos os aspectos gerais para, após, analisarmos situações exemplificativas. 3.1 ESPÉCIES DE PRESCRIÇÃO A partir do momento em que um sujeito comete um crime, o Estado possui um tempo determinado para condená-lo com trânsito em julgado. Se o Estado não o fizer nesse tempo, estaremos diante da PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA (PPP).10 Depois que o Estado condenou o sujeito e, após transitar em julgado a sentença, o Estado possuiu outro tempo determinado para fazer o sujeito cumprir a pena aplicada. Se, nesse tempo, o Estado não conseguir fazer com que essa pena seja executada, estaremos diante da PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA (PPE). Perceba, então, que a prescrição se ramifica em duas espécies: PPP e PPE. 9 Cite-se, como exemplo, o querelante tomando cerveja no bar com o querelado. 10 A prescrição da pretensão punitiva (PPP) possui três espécies: abstrata, retroativa e intercorrente. Elas nós estudares na sequência. 22 3.2 PRAZOS PRESCRICIONAIS Os tipos penais incriminadores não preveem o prazo prescricional. Eles apenas determinam a pena que será aplicada (Ex.: o crime de furto simples prevê uma pena de 1 a 4 anos de reclusão). Isso quer dizer que o prazo prescricional é o mesmo da pena prevista? Óbvio que não. Pra saber qual é o prazo prescricional de determinado crime, basta pegar a pena máxima cominada pelo tipo penal (no caso do furto simples, por exemplo, a pena de 4 anos) e enquadrá-la na “tabela” prevista no artigo 109 do Código Penal. Assim, conforme o referido texto legal, a prescrição ocorrerá: • Em 20 (vinte) anos, se o máximo da pena é superior a doze. • Em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze. • Em 12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito. • Em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro. • Em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois. • Em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a um ano. Assim, no furto simples, cuja pena máxima é de quatro anos, o prazo prescricional será de oito anos (Art. 107, IV, do CP). 23 3.3 BASE DE CÁLCULO Acabamos de estudar no tópico anterior que usaremos como base de cálculo a pena máxima cominada no tipo penal. Nesse sentido, pergunta-se: a pena máxima cominada no tipo penal sempre será a base de cálculo do prazo prescricional? A resposta é: não. Apenas utilizamos a pena máxima cominada no tipo legal para calcular a prescrição da pretensão punitiva (PPP), aquela que ocorre antes do trânsito em julgado da sentença. Para o cálculo da prescrição a pretensão executória (PPE), utilizaremos como base de cálculo a pena aplicada na sentença.11 Mas, independentemente da base de cálculo, sempre utilizaremos a tabela do artigo 109 do Código Penal. 3.4. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA (PPP) E SUAS ESPÉCIES A prescrição da pretensão punitiva possui três espécies: I) prescrição abstrata; II) prescrição retroativa; e III) prescrição intercorrente. 11 Art. 110 do CP - A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. 24 Atenção: Para que seja PPP (qualquer uma de suas espécies) é preciso que não tenha acontecido o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Se já houve, estaremos diante da PPE. I) Prescrição abstrata: É a PPP propriamente dita. Chamamos de abstrata pois sua base de cálculo, conforme já estudamos, é a pena máxima abstratamente cominada no tipo penal. Após praticado o crime, o Estado terá que julgar o sujeito no prazo prescricional determinado, caso contrário, ocorrerá a extinção da punibilidade. Assim, por exemplo, o crime de tráfico dedrogas (art. 33 da Lei n.º 11.343/2006), cuja pena máxima é quinze anos, prescreverá em vinte anos, segundo o inciso I do art. 109 do CP. II) Prescrição retroativa: Aqui também estamos diante de uma espécie de PPP. Todavia, já foi proferida a sentença. Mas atente-se: a sentença não transitou em julgado ainda. Por isso, utilizaremos a pena aplicada na sentença como base de cálculo. “Mas por ser espécie de PPP, não deveríamos usar como base de cálculo a pena máxima cominada no tipo penal?” A resposta é não. Aqui, estamos de diante de uma exceção. Assim, após verificar, por meio da pena aplicada, qual é o prazo prescricional, você irá verificar – retroativamente – se entre a data do recebimento da denúncia e a data da sentença transcorreu o referido prazo prescricional. “Por que a partir do recebimento da denúncia? Não deveria ser a partir da data dos fatos?” 25 A resposta também é não. Ao contrário do que ocorre na prescrição abstrata, aqui na retroativa – por expressa determinação legal (Art. 110, § 1º, do CP)12 – o termo inicial para a contagem deverá ser a data do recebimento da denúncia/queixa. E isso já foi cobrado no Exame de Ordem. Atenção: Para ser prescrição retroativa, é necessário que tenha acontecido o trânsito em julgado para a acusação.13 E jamais (jamais, mesmo) você pode confundir isso com trânsito em julgado da sentença penal condenatória. O trânsito em julgado para a acusação ocorre quando o juiz profere a sentença condenatória, manda intimar as partes e só a defesa recorre, sendo que o Ministério Público se mantém inerte e deixa o prazo se esgotar. Já o trânsito em julgado da sentença penal condenatória ocorre quando a decisão é proferida e as duas partes não recorrem, esgotando o prazo. Exemplo: No caso do crime de tráfico do exemplo anterior, se entre a data do recebimento da denúncia e a publicação da sentença passar mais de oito anos e o juiz condenar o réu a pena de quatro anos, estaremos diante da prescrição retroativa, vez que o prazo prescricional será de, justamente, oito anos (Art. 109, inciso IV, CP). III) Prescrição intercorrente (ou superveniente): Estamos diante de outra espécie de PPP que, por exceção à regra, terá como base de cálculo a pena aplicada na sentença. E, tal como ocorre na retroativa, é necessário que não tenha ocorrido o 12 Art. 110, §1º, do CP -A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. 13 Por que isso é necessário? Por que se o Ministério Público não recorreu, a pena não poderá ser aumentada pelo tribunal quando só a defesa recorrer (princípio da vedação a reformatio in pejus). Assim, na pior das hipóteses, a maior pena possível no acórdão será a já aplicada na sentença. 26 trânsito em julgado da sentença penal condenatória, caso contrário estaríamos diante de uma PPE. Contudo, enquanto que na retroativa nós olhamos para trás. Na intercorrente nós olhamos para frente. A prescrição intercorrente é aquela que ocorre entre a data sentença e o seu trânsito em julgado. Assim, por exemplo, quando o juiz condenar o réu a uma pena de um ano e entre a sentença condenatória e seu trânsito em julgado transcorrer mais de quatro anos, ocorrerá a chamada prescrição intercorrente (Art. 109, V, CP). 3.5. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA (PPE) Transitada em julgado a sentença penal condenatória, surge para o Estado um prazo para submeter o réu à execução da pena. Se esse prazo não for respeitado, estará configurada a prescrição da pretensão executória (PPE). Essa modalidade de prescrição está prevista no artigo 110 do Código Penal,14 ocorre após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e regula-se pela pena aplicada (verificando-se os mesmos prazos do artigo 109 do CP). Verifica-se a PPE, por exemplo, quando após sentença condenatória transitada em julgado, que condenou o réu a uma pena de um ano de reclusão, o Estado demora mais de quatro anos (Art. 109, V) para dar início ao cumprimento da pena. 14 Art. 110 - A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. 27 Atenção: Na PPE (e somente na PPE), os prazos previstos no artigo 109 do CP serão aumentados em um terço se o condenado for reincidente, conforme determinada a parte final do artigo 110 do CP. Isso já foi cobrado mais de uma vez no Exame de Ordem e costuma confundir os candidatos. 3.6. PONTOS NÃO MENOS IMPORTANTES E INDISPENSÁVEIS PARA O ESTUDO DA MATÉRIA • Artigo 115 do CP: Determina que, em todos os tipos de prescrição, os prazos serão reduzidos pela metade quando o agente era, na data do crime, menor de 21 anos, ou, na data da sentença, maior de 70 anos. • Artigo 111 do CP: Estabelece os termos iniciais de contagem na PPP. A regra é que a contagem inicie no momento da consumação do crime (inciso I), mas o artigo traz algumas situações excepcionais, e é muito importante que você as entenda. • Artigo 112 do CP: Estabelece os termos iniciais de contagem na PPE. • Artigo 116 do CP: Estabelece as causas impeditivas da prescrição. Isto é, situação que vão suspender a contagem do prazo prescricional. Quando verificadas, suspendem o prazo. Quando resolvidas, o prazo volta a contar de onde parou. • Artigo 117 do CP: Estabelece as causas interruptivas da prescrição. Isto é, são situações que farão com que a contagem seja reiniciada, do zero. A mais comum em provas é o recebimento da denúncia ou queixa (inciso I). 28 • São duas as espécies de prescrição: prescrição da pretensão punitiva (PPP) e prescrição da pretensão executória (PPE). • O marco que separa essas duas espécies é o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. • Para calcular o prazo prescricional, utilizamos o art. 109 do CP. • Se for PPP, em regra, a base de cálculo será a pena máxima cominada no tipo penal. Se for PPE a base de cálculo será a pena aplicada na sentença. • Todavia, como exceções, na PPP retroativa e na PPP intercorrente a base de cálculo será a pena aplicada na sentença. • A PPP abstrata ocorre entre a data do fato e o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. • A PPP retroativa ocorre entre a data do recebimento da denúncia/queixa e a sentença. Como base de cálculo usamos a pena aplicada na sentença. • A PPP intercorrente (ou superveniente) ocorre entre a sentença e o seu trânsito em jugado. Como base de cálculo também usamos a pena aplicada na sentença. • A PPE ocorre após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e como base de cálculo usamos a pena aplicada na sentença. • Na PPE, os prazos do art. 109 aumentam em 1/3 se o condenado é reincidente. 03. (XV Exame de Ordem) Francisco foi condenado por homicídio simples, previsto no Art. 121 do Código Penal, devendo cumprir pena de seis anos de reclusão. A sentença penal condenatória transitou em julgado no dia 10 de agosto de 1984. Dias depois, 29 Francisco foge para o interior do Estado, onde residia, ficando isolado num sítio. Após a fuga, as conseguiram capturá-lo. Francisco procura você como advogado(a) em 10 de janeiro de 2014. Com relação ao caso narrado, assinale a afirmativa correta. a) Ainda não ocorreu prescrição do crime, tendo em vista que ainda não foi ultrapassado o prazo de trinta anos requerido pelo Código Penal. b) Houve prescrição da pretensão executória. c) Não houve prescrição, pois o crime de homicídio simples é imprescritível. d) Houve prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato,pois Francisco nunca foi capturado. 04. (II Exame de Ordem) A respeito do regime legal da prescrição no Código Penal, tendo por base ocorrência do fato na data de hoje, assinale a alternativa correta. a) A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. b) A prescrição da pena de multa ocorrerá em 2 (dois) anos, independentemente do prazo estabelecido para a prescrição da pena de liberdade aplicada cumulativamente. c) Se o réu citado por edital permanece revel e não constitui advogado, fica suspenso o processo, mantendo-se em curso o prazo prescricional, que passa a ser computado pelo dobro da pena máxima cominada ao crime. d) São causas interruptivas do curso da prescrição previstas no Código Penal, dentre outras, o recebimento da denúncia ou da queixa, a pronúncia, a publicação da sentença condenatória ou absolutória recorrível. 30 Nos parece lógico pensar que, quando alguém pratica dois ou mais crimes, o juiz simplesmente somará as penas desses delitos. Contudo, embora seja intuitivo, nem sempre será assim. Existem situações nas quais, por exemplo, o juiz aplicará a pena de um só dos crimes e aumentará essa pena em determinada quantidade. Assim, no concurso de crimes estudamos como a pena será aplicada quando um sujeito cometer dois os mais crimes (o que não se confunde com o concurso de agentes, matéria que estudaremos na sequência, que ocorre quando dois ou mais sujeitos praticam o mesmo crime). O Código Penal prevê três mecanismos para se calcular a pena do sujeito que comete dois ou mais crimes. São eles: a) concurso material (art. 69 do CP); b) concurso formal (art. 70 do CP); e c) crime continuado (art. 71 do CP). a) Concurso material (Art. 69 do CP): Ocorre quando o agente, mediante mais de uma conduta, pratica dois ou mais crimes. Nesse caso, soma-se as penas dos crimes, conforme previsão do artigo 69 do Código Penal: Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela Imagine, por exemplo, um sujeito que vai até um posto de gasolina e, mediante violência e grave ameaça, subtrai dinheiro (roubo - art. 157 do CP). Para fugir, o sujeito subtrai uma motocicleta (furto - art. 155 do CP) e, durante a fuga, mata dolosamente um pedestre para atrasar a perseguição dos policiais (homicídio - art. 121 do CP). 31 Repare que houve a prática de dois ou mais crimes, mediante mais de uma ação. Resta configurado, portanto, o concurso material de crimes, cuja consequência é a soma das penas que serão aplicadas pelos três delitos. Deste modo, caso o juiz condene o réu a uma pena de 1 (um) ano pelo furto, 4 (quatro) anos pelo roubo e 6 (seis) anos pelo homicídio, a pena total aplicada será de 11 (onze) anos. b) Concurso formal (art. 70 do CP): Ocorre o concurso formal quando o agente, mediante uma só conduta (ação ou omissão) pratica dois ou mais crimes. Aqui, ao contrário do que ocorre no concurso material, as penas não serão somadas, serão exasperadas. Isto é, o juiz irá pegar a pena do crime mais grave e aumentar de 1/6 (um sexto) até a metade. Ou, se os crimes tiverem penas iguais, usará qualquer uma delas, aumentando também de 1/6 (um sexto) até a metade. Atenção: Não confunda conduta com atos. Uma conduta pode englobar vários atos, como, por exemplo, a conduta de matar alguém pode englobar vários disparos (atos) de arma de fogo. Você deve dar uma atenção especial ao concurso formal por duas razões: I) é a espécie de concurso de crimes mais cobrada na OAB; e II) possui dois tipos: concurso formal próprio (ou perfeito) e concurso formal impróprio (ou imperfeito). • Concurso formal próprio (perfeito): Trata-se do concurso formal propriamente dito, o que foi explicado logo acima. Uma só conduta e dois ou mais crimes. Não se somam as penas, exaspera-se (1/6 até a metade). Está previsto na primeira parte do artigo 70 do CP: Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade (...) 32 Exemplo: “A”, com dolo de matar, atira em seu desafeto “B”. Contudo, a bala - contra a sua vontade - atravessa o corpo de “B” e acaba matando “C” também. Trata-se de uma só conduta que gerou dois crimes. Aplicar-se-á, então, a pena de um só crime, aumentando-a de 1/6 até a metade. • Concurso formal impróprio (imperfeito): Também ocorre quando o agente, mediante uma só conduta, comete dois ou mais crimes. Aqui, contudo, o agente quer praticar os dois crimes. Exemplo: Um sujeito, desejando matar três pessoas de uma só vez, as coloca em uma única fila. Com uma arma de fogo potente e de alta precisão, atira no primeiro e a bala atravessa os outros dois indivíduos, matando todos os três. Nesse caso, embora seja uma só conduta, como o agente quis cometer todos os delitos, as penas serão somadas. Daí decorre o nome concurso formal impróprio (ou imperfeito). É formal porque é apenas uma conduta, e é impróprio (ou imperfeito) porque, embora seja formal, iremos somar as penas, assim como ocorre no concurso material. O concurso formal impróprio está previsto na segunda parte do artigo 70 do CP: Art. 70 – (...) as penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. Por isso, podemos concluir que no concurso formal impróprio existirá o dolo de praticar todos os crimes (a lei chama isso de desígnios autônomos). Ao passo que no concurso formal próprio, necessariamente, estaremos diante de concurso entre crimes culposos ou concurso entre crimes dolosos e culposos. Isto é, sempre um dos crimes terá que ser culposo. Caso contrário, se o agente quis praticar todos, será concurso formal impróprio e as penas serão somadas. c) Crime continuado (art. 71 do CP): Esta é uma das ficções jurídicas criadas pelo legislador. São situações em que os crimes praticados pelo agente são 33 semelhantes e ocorridos num intervalo curto de tempo. Por isso, para a lei, serão considerados como um só. Aqui, para fazer o cálculo, o juiz usará a somente a pena do crime mais grave e a aumentará de 1/6 (um sexto) até 2/3 (dois terços). Se os crimes forem idênticos, poderá ser usada a pena de qualquer um dos crimes, também aumentada de 1/6 a 2/3 (dois terços). O crime continuado está previsto no artigo 71 do CP: Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. • Requisitos do crime continuado:15 Do artigo 71 são abstraídos os seguintes requisitos: I) Pluralidade de condutas: É preciso que haja mais de uma conduta, caso contrário estaremos diante do concurso formal. II) Crimes da mesma espécie: Entende o STJ que crimes da mesma espécie não necessariamente serão crimes previstos no mesmo tipo penal, mas, sim, crimes que tutelem o mesmo bem jurídico.16 IV) Condições de tempo: Segundo o STJ, é preciso que entre os crimes haja um lapso temporal inferior a trinta dias,17 caso contrário não haverá conexãotemporal entre as condutas e, por consequência, restará afastado o crime continuado. V) Condições de lugar: Trata-se de condição que encontra maior divergência. Há quem entenda que os crimes devem ser praticados na mesma cidade, há também quem entenda que precise ser na mesma 15 A doutrina, de um modo geral, entende que a ausência de qualquer dos requisitos, por si só, não desqualifica o crime continuado. Essas condições não devem ser analisadas individualmente, mas no seu conjunto. 16 REsp 1767902/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2018, DJe 04/02/2019. 17 AgRg no REsp 1747139/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2018, DJe 04/02/2019. 34 região metropolitana ou cidades contíguas. Só no caso concreto, com base no princípio da razoabilidade, será possível auferir esse requisito. VI) Maneira de execução: Trata-se do modus operandi. É o modo, a forma ou estilo de se praticar a conduta. • Concurso material benéfico: Ao calcular a pena pelo mecanismo do concurso formal (exasperação), o resultado da pena não poderá exceder àquilo que seria o resultado de eventual concurso material (soma), devendo o juiz estabelecer esse limite. Se a pena fruto da exasperação for maior do que se fossem somadas as penas, a finalidade do concurso formal seria desvirtuada. É o que determina o parágrafo único do artigo 70 do CP18. • Crimes dolosos com violência ou grave ameaça e o crime continuado: Estabelece o parágrafo único do artigo 71 do CP que: Art. 71, p. único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código. 05. (XV Exame de Ordem) Roberto estava dirigindo seu automóvel quando perdeu o controle da direção e subiu a calçada, atropelando dois pedestres que estavam parados num ponto de ônibus. Nesse contexto, levando-se em consideração o concurso de crimes, assinale a opção correta, que contempla a espécie em análise: a) concurso material. b) concurso formal próprio ou perfeito. c) concurso formal impróprio ou imperfeito. 18 Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código. 35 d) crime continuado. 06. (XXV Exame de Ordem) Juarez, com a intenção de causar a morte de um casal de vizinhos, aproveita a situação em que o marido e a esposa estão juntos, conversando na rua, e joga um artefato explosivo nas vítimas, sendo a explosão deste material bélico a causa eficiente da morte do casal. Apesar de todos os fatos e a autoria restarem provados em inquérito encaminhado ao Ministério Público com relatório final de indiciamento de Juarez, o Promotor de Justiça se mantém inerte em razão de excesso de serviço, não apresentando denúncia no prazo legal. Depois de vários meses com omissão do Promotor de Justiça, o filho do casal falecido procura o advogado da família para adoção das medidas cabíveis. No momento da apresentação de queixa em ação penal privada subsidiária da pública, o advogado do filho do casal, sob o ponto de vista técnico, de acordo com o Código Penal, deverá imputar a Juarez a prática de dois crimes de homicídio em: a) concurso material, requerendo a soma das penas impostas para cada um dos delitos. b) concurso formal, requerendo a exasperação da pena mais grave em razão do concurso de crimes. c) continuidade delitiva, requerendo a exasperação da pena mais grave em razão do concurso de crimes. d) concurso formal, requerendo a soma das penas impostas para cada um dos delitos. 36 Freddie é um sujeito que, por ser envolvido com mundo do crime, tem muitos inimigos. E, em um determinado dia, por uma infeliz coincidência do destino, Freddie encontra dois de seus piores inimigos de uma só vez: Roger e Brian. Roger e Brian não se conhecem e, sem nenhum acordo prévio, começam a efetuar disparos de arma de fogo na direção de Freddie, com dolo de matá-lo. Dentre os vários disparos, Freddie é atingido por dois. Um dos disparos atingiu região vital e foi responsável pela morte de Freddie. Outro disparo atingiu apenas o braço esquerdo de Freddie e, comprovadamente, não seria suficiente para matá-lo. No curso do processo, restou comprovado que o autor do disparo letal foi Roger, e que o responsável pelo tiro que atingiu o braço de Freddie foi Brian. Pergunta-se: Qual a tipificação da conduta de Roger e Brian? Os dois responderão por homicídio consumado? Ou apenas responde por homicídio consumado o autor do disparo letal e o outro responde por homicídio tentado? Interessante, não? Justamente essa e outras questões que as regras do concurso de pessoas visam responder. E a resposta para essa pergunta será dada no decorrer desta aula. Assim, pelo concurso de pessoas, nós saberemos: I) quais pessoas envolvidas na prática delituosa serão responsabilizadas penalmente; e II) dentre os responsabilizados, qual será a responsabilidade de cada um. Para que duas ou mais pessoas sejam responsabilizadas pela prática do mesmo crime, é necessário que estejam presentes quatro requisitos: 37 a) Pluralidade de agentes: Trata-se do requisito básico, primordial, que já é inerente ao instituto. Alguns autores, inclusive, nem o consideram como requisito em virtude dessa inerência. b) Relevância causal das condutas: A participação do sujeito deve integrar o nexo causal, deve ser relevante. Por isso, nem todo comportamento constituirá participação, pois é necessário que haja eficácia causal. Deste modo, não há que se falar em concurso de pessoas quando, por exemplo, “A” empresta sua arma de fogo para “B” cometer um homicídio e “B” comete o homicídio com uma faca. c) Vínculo subjetivo entre os agentes: É preciso que os agentes tenham consciência de que participam de um crime em comum. Caso contrário, poderemos estar diante da chamada autoria colateral. Para que você entenda a autoria colateral, lembre-se do exemplo dado no início desta aula. Naquele exemplo, não havia vínculo subjetivo entre Roger e Brian, isto é, eles não queriam concorrer para a prática de um crime em comum. Deste modo, não há que se falar em concurso de agentes e, portanto, o autor do disparo letal responderá por homicídio consumado e o autor do disparo não letal responderá pelo homicídio tentado. Trata-se da autoria colateral. Diferente seria se Roger e Brian quisessem, em conluio, matar Freddie. Nesse caso, ainda que um só dos dois autores atingisse a vítima, os dois seriam responsabilizados penalmente. • Atenção: Para se configurar o vínculo subjetivo não é necessário que os agentes se conheçam previamente. d) Identidade de infração penal: É preciso, ainda, que os agentes queiram produzir o mesmo crime. Caso contrário, poderemos estar diante da chamada cooperação dolosamente distinta, prevista no §2º do artigo 29 do Código Penal. 38 Art. 29, § 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave. Exemplificando a cooperação dolosamente distinta: João e Cléber combinam de realizar um crime de furto na casa de Ana Maria. Assim, esperam um dia no qual Ana Maria estaria viajando, para furtar a residência durante a madrugada. No dia combinado, João leva Cléber, em sua motocicleta, até a casa de Ana Maria. Enquanto João fica em sua moto, vigiando e aguardando Cléber, este entra na residência para realizar o furto.Contudo, ao entrar na casa e subtrair certa quantia em dinheiro, Cléber é surpreendido com a presença de Ana Maria. Assim, para garantir o resultado do furto, Cléber agride Ana Maria e consegue fugir do local junto com João. Observa-se que o que fora acordado anteriormente entre os agentes era o crime de furto (art. 155 do CP). Cléber, todavia, acabou cometendo o crime de roubo (art. 157 do CP) pois agiu com violência. Nesse caso, como João quis praticar crime menos grave (furto e não roubo), está configurada a cooperação dolosamente distinta e será aplicada a regra prevista no artigo 29, §2º do CP. Quando configurado o concurso de pessoas (isto é, duas ou mais pessoas cometendo o mesmo crime), pode ser que aquele que estiver envolvido seja classificado como: a) autor; b) coautor; ou c) partícipe. a) Autor: É quem realiza o núcleo do tipo penal, isto é, quem realiza o verbo do tipo. Assim, imagine que, no exemplo anterior, o plano tenha saído como esperado. João espera na motocicleta, enquanto Cléber entra na residência e subtrai o dinheiro. 39 Nesse caso, foi Cléber que realizou o núcleo/verbo do tipo previsto no artigo 155 do CP19, ou seja, subtraiu quantia em dinheiro. Por isso, Cléber será considerado autor. b) Partícipe: Partícipe é aquele que, não realizando o núcleo do tipo, concorre para o resultado crime, seja: I) induzindo20; II) instigando21; ou c) auxiliando materialmente22. Por isso dizemos que, no exemplo anterior, João foi partícipe. João, ao levar Cleber na residência que seria furtada, e fica esperando, auxiliou materialmente. c) Coautor: É o nome dado ao autor quando existem dois ou mais autores. A teoria responsável por fazer essa classificação, segundo a corrente majoritária, é a teoria objetivo-formal. Ao estudar a teoria da norma penal, aprendemos que em um tipo penal incriminador podem existir elementares e circunstâncias. a) Elementares: Grosso modo, elementares são termos que, quando retirados do tipo penal incriminador, causam sua atipicidade ou desclassificação para outro tipo penal. Cite-se, como exemplo, o termo “mediante violência ou grave ameaça” previsto no crime de roubo (art. 157 do CP) que, quando ausente, a conduta será desclassificada para o crime de furto (art. 155 do CP). 19 Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. 20Induzir é criar na cabeça do sujeito a intenção criminosa que, até então, era inexistente. Ocorre quando, por exemplo, “A” induz (dá a ideia) “B” a matar seu desafeto, fazendo-o acreditar que essa é a solução para o seu problema. 21 Instigar é reforçar a vontade criminosa que já existe no sujeito. No exemplo anterior, ocorreria a instigação se “B” já tivesse a ideia de matar seu desafeto e “A” apenas o estimulasse. 22 Auxílio material trata-se da viabilização material da execução do crime. É o caso do João, do exemplo do furto. João levou Cléber até a casa que seria furtada e lá ficou esperando. É uma clássica situação de auxílio material. 40 Ainda exemplificando, no crime de homicídio (art. 121 do CP), se retirarmos o verbo “matar”, a conduta será atípica. b) Circunstâncias: Circunstâncias, por sua vez, são dados secundários que, quando presentes, vão aumentar ou diminuir a pena. Todavia, quando ausentes, não vão causar a atipicidade da conduta. Podemos encontrá-las como qualificadoras, causas de aumento de pena, causas diminuição de pena etc. Elas se classificam em objetivas e subjetivas. I) Circunstâncias objetivas: Tratam sobre fato, meios e modo de realização do crime. Como exemplo, podemos citar a qualificadora por emprego de fogo, no crime de homicídio (art. 121, §2º, III, do CP). II) Circunstâncias subjetivas (ou de caráter pessoal): Tratam sobre o agente criminoso e suas motivações, são de caráter pessoal. Cite-se, como exemplo, o chamado “homicídio privilegiado” previsto §1º do art. 121 do CP, configurado quando o agente comete o crime impelido por relevante valor moral. Bem, tudo isso foi explicado para que você possa entender o sentido do artigo 30 do Código Penal, que determina: Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. Quando o texto legal diz que “não se comunicam”, ele quer dizer que, quando um crime é praticado por duas ou mais pessoas (concurso de agentes), algumas circunstâncias que serão aplicadas para um agente, não serão aplicadas para outro. E quais circunstâncias não se comunicam? As de caráter subjetivo, aquelas que tratam sobre o agente, sua vontade e suas motivações. Provavelmente você ainda esteja, confuso(a). Por isso, vamos exemplificar: Kiko, ao saber que Leandro estuprou a sua filha, decide se vingar e contrata Bruno, famoso matador de aluguel. Bruno realiza a missão que lhe foi dada e mata Leandro, o estuprador. 41 Assim, Kiko e Bruno cometeram, em concurso de pessoas, o crime de homicídio. Quanto ao Kiko, o que o motivou praticar o crime foi relevante valor moral. Contudo, por se tratar de uma circunstância subjetiva (de caráter pessoal), a causa de diminuição prevista no §1º do artigo 121 (homicídio privilegiado)23 só será cabível para Kiko. Ou seja, ela não se comunica. Do texto do artigo 30 interpreta-se que: • As circunstâncias subjetivas (denominadas no artigo como “de caráter pessoal”) jamais se comunicam, sendo irrelevante se o coautor ou partícipe delas tinha conhecimento. • As circunstâncias objetivas comunicam-se, desde que o coautor ou partícipe delas tenha conhecimento.24 • As elementares, sejam objetivas ou subjetivas, se comunicam, desde que o coautor ou partícipe delas tenha conhecimento. 25 E porque as circunstâncias e elementares objetivas precisam entrar na esfera de conhecimento do coautor ou partícipe? Porque se assim não fosse, a lei estaria permitindo a responsabilidade penal objetiva, aquela que ocorre ser a averiguação de dolo ou culpa. 07. (XVI Exame de Ordem) Maria Joaquina, empregada doméstica de uma residência, profundamente apaixonada pelo vizinho Fernando, sem que este soubesse, escuta sua conversa com uma terceira pessoa acordando o furto da casa em que ela trabalha durante os dias de semana à tarde. Para facilitar o sucesso da operação de seu amado, ela deixa a porta aberta ao sair do trabalho. Durante a empreitada criminosa, sem saber 23 Art. 121 - §1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. 24 Exemplificando: A causa de aumento de pena relativa ao emprego de arma de fogo (art. 157, §2º-A, I, do CP) se aplica a todos os agentes que praticaram o roubo, mesmo que só um deles tenha usado a arma. É preciso, contudo, que todos tenham conhecimento da utilização. 25 Exemplificando: Kiko é funcionário público e, aproveitando-se das facilidades que o cargo lhe propicia, junta-se com Leandro – que sabe que Kiko é funcionário público – e subtrai bens da Administração Pública. Deste modo, ambos responderão pelo crime de peculato (art. 312 do Código Penal) haja vista que a condição de funcionário público (de caráter pessoal) é elementar do referido tipo penal. Todavia, se Leandro desconhecesse que Kiko era funcionário público, a elementar não se comunicaria e Leandro responderia por furto. 42 que a porta da frente se encontrava destrancada, Fernando e seu comparsa arrombam a porta dos fundos, ingressam na residência diversos objetos. Diante desse quadro fático, assinale a opção que apresenta a correta responsabilidade penal de Maria Joaquina. a) Deverá responder pelo mesmo crime de Fernando, na qualidade de partícipe, eis que contribuiu de alguma forma para o sucessoda empreitada criminosa ao não denunciar o plano. b) Deverá responder pelo crime de furto qualificado pelo concurso de agentes, afastada a qualificadora do rompimento de obstáculo, por esta não se encontrar na linha de seu conhecimento. c) Não deverá responder por qualquer infração penal, sendo a sua participação irrelevante para o sucesso da empreitada criminosa. d) Deverá responder pelo crime de omissão de socorro. 43 Erro é a falsa percepção da realidade. E, no direito, a depender da espécie, o erro poderá excluir a tipicidade ou a culpabilidade. O erro que exclui a tipicidade é chamado de erro de tipo. Por sua vez, o erro que exclui a culpabilidade é chamado de erro de proibição. Nesta aula, abordaremos detalhadamente os dois tipos, iniciando pelo erro de tipo. Contudo, para efeitos didáticos, é interessante que, logo de início, você já saiba diferenciá-los. a) Erro de tipo: Age na tipicidade e ocorre quando, por falsa percepção da realidade, o sujeito realiza uma conduta errando em relação a um dos elementos constitutivos do tipo penal. Exemplo: Bruno, assim que o professor finaliza a aula e dispensa os alunos, recolhe o notebook que estava ao seu lado e o leva para casa crendo ser o seu equipamento. Chegando em casa, descobre que na verdade o notebook era de Kiko, seu colega de sala. Em um primeiro momento, se pode até pensar que Bruno cometeu um crime de furto, pois subtraiu coisa alheia móvel, como prescreve o art. 155 do Código Penal. Todavia, analisando tecnicamente a conduta de Bruno, se observa que ele na verdade não cometeu crime, pois agiu em erro de tipo, isto é, por falsa percepção da realidade errou em relação a um dos elementos constitutivos do tipo penal, in casu, “coisa alheia”. Bruno subtraiu o notebook pensando ser o seu, e não o de seu colega Kiko, configurado, portanto, o erro de tipo. A consequência será o afastamento da responsabilidade criminal de Bruno. b) Erro de proibição: Por sua vez, o erro de proibição age na culpabilidade do agente. Aqui, o sujeito não erra em relação aos elementos do tipo, mas realiza uma conduta proibida, crendo ser esta ser permitida. Como veremos, a depender 44 do tipo de erro de proibição (inevitável ou evitável), o sujeito poderá ser isento de pena ou tê-la diminuída. Para exemplificar: Kiko é cidadão Holandês que, ao passar suas férias no Brasil, decide trazer consigo algumas gramas de maconha, crendo fielmente ser lícita essa conduta aqui no país, tal como é na Holanda. Chegando no Brasil, Kiko é preso em flagrante por tráfico de drogas. Evidentemente que um caso como esse exige uma análise probatória rígida para se chegar a maiores conclusões. Todavia, preliminarmente, e para efeitos didáticos, podemos dizer que Kiko agiu em erro de proibição. A consequência, a depender da espécie de erro de proibição, poderá ser a isenção de pena ou a sua redução. O erro de tipo é dividido em duas espécies: a) Erro de tipo essencial: O sujeito erra em relação aos elementos constitutivos do tipo penal (elementares), repercutindo na tipificação da conduta do acusado. b) Erro de tipo acidental: O sujeito erra em relação a outras circunstâncias do tipo penal (não elementares), muitas vezes irrelevantes, de modo que esse erro não irá repercutir na tipificação da conduta. Começaremos o nosso estudo pelo erro de tipo essencial. Como já mencionado, o erro de tipo constitui basicamente uma falsa percepção da realidade quanto a um dos elementos constitutivos do tipo penal. Veja, o dolo é formado por dois elementos: a) vontade (elemento volitivo) e b) consciência (elemento cognitivo). No erro de tipo, o agente age com vontade, mas lhe falta consciência quanto a um dos elementos do tipo. Lembre-se do exemplo 45 do furto do notebook: Kiko incontestavelmente teve vontade de subtraí-lo; não teve, todavia, consciência quanto ao fato de ser alheio. Por isso, a consequência do reconhecimento do erro de tipo é justamente o afastamento do dolo. E, como sabemos, sem dolo não há conduta; sem conduta não há fato típico; e sem fato típico não há crime. O sujeito, portanto, é absolvido. Contudo, existem situações nas quais, pela natureza do erro, o dolo será afastado, mas será permitida a punição por crime culposo (se previsto em lei). É o que determina o art. 20 do Código Penal, onde o erro de tipo está previsto: Art. 20. O erro sobre elemento constitutivo de tipo penal exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei. Daí a necessidade da distinção entre erro de tipo inevitável e erro de tipo evitável. I) Erro de tipo inevitável: Também chamado de escusável ou invencível, é o erro previsto na primeira parte do artigo 20 do CP. Trata-se do erro que o agente não poderia ter evitado mesmo agindo com toda a prudência necessária. Verificada sua existência, se exclui o dolo e a culpa e o fato torna-se atípico. II) Erro de tipo evitável: Também conhecido como inescusável ou vencível, é o erro previsto na segunda parte do artigo 20 do CP. Trata-se do erro que poderia ser evitado se o agente tivesse sido prudente. Verificada a sua existência, exclui-se o dolo, porém subsiste a culpa, de modo que o agente responderá pela modalidade culposa (se houver a previsão legal). O que dirá se o erro é evitável ou inevitável serão as condições do caso concreto e, nesse sentido, imagine o seguinte exemplo: Leandro, caçador esportivo, decide caçar em determinada reserva destinada exclusivamente à caça de animais, devidamente legalizada e isolada dos centros urbanos. Em um determinado momento, Leandro verifica um arbusto se mexendo e, crendo estar ali um animal, atira em sua direção. Contudo, posteriormente se descobre que, na verdade, era uma pessoa que ali estava fazendo necessidades fisiológicas. Assim, devido as circunstâncias do caso, podemos dizer que se trata de erro inevitável, cujo efeito será a absolvição de Leandro. 46 Situação diferente seria se Leandro estivesse caçando em um bosque localizado dentro da região urbana, em um espaço não destinado à caça. Aqui, certamente seria um erro evitável, cujo efeito seria apenas o afastamento dolo. Isto é, Leandro responderia por homicídio culposo. Aqui, o sujeito erra em relação às outras circunstâncias do tipo penal (não elementares), muitas vezes irrelevantes, de modo que esse erro não irá repercutir na tipificação da conduta. Isto é, quando verificado esse tipo de erro, a responsabilidade penal do agente não será afastada. O erro de tipo acidental é classificado em algumas espécies, sendo elas: I) Erro sobre o objeto: Ocorre quando a conduta do agente é direcionada para um objeto material, mas acaba atingindo outro. É o caso, por exemplo, do sujeito que querendo furtar um iPhone acaba por furtar uma falsificação de iPhone. Essa falsa percepção da realidade não irá alterar a tipificação e tampouco absolver o acusado. II) Erro sobre a pessoa (error in persona): Ocorre quando a conduta do agente é direcionada para a pessoa “A”, mas por falsa percepção da realidade atinge “B”. É o caso, por exemplo, do sujeito que deseja matar seu pai e, após montar uma emboscada, acaba matando um homem muito parecido. Neste caso, o erro não irá alterar a tipificação e tampouco absolver o acusado. Inclusive, nesse caso, deverá o agente ainda responder por homicídio com a incidência da agravante de crime praticado contra ascendente (art. 61, inciso II, alínea “e”, do CP). É a regra que se retira do art. 20, §3º do CP, que prevê o error in persona: Art. 20, § 3º - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quemo agente queria praticar o crime. 47 III) Erro na execução (aberratio ictus): Está previsto no artigo 73 do Código Penal e ocorre quando o agente, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa. Neste caso, o erro também será irrelevante para a tipificação do crime, e, tal como ocorre no error in persona, o sujeito irá responder considerando-se as condições da pessoa contra quem a ação foi dirigida. É o caso, por exemplo, do sujeito que deseja matar seu pai e, após montar a emboscada, por má pontaria, erra o tiro e acaba acertando um sujeito que estava passando por trás. O erro será irrelevante para a tipificação e o agente irá responder por homicídio com a incidência da agravante de crime praticado contra ascendente (art. 61, inciso II, alínea “e”, do CP). Se o disparo, contudo, atingir também a pessoa que o sujeito pretendia ofender, será aplicada a regra do concurso formal próprio, previsto no artigo 70 do Código Penal, onde será considerada uma só pena (a mais grave, quando distintas) e será aumentada de um sexto até a metade. É a regra prevista no art. 73 do CP: Art. 73. Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3.º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código. IV) Erro sobre o nexo causal (aberratio causae): É o erro que recai sobre o nexo causal. Isto é, o resultado que o agente visava ocorreu em razão de um acontecimento diverso daquele que ele inicialmente idealizou. É o caso, por exemplo, do sujeito que desejando a morte de seu inimigo, o empurra do alto de uma cachoeira para que este morra afogado. Contudo, ao cair, a vítima bate a cabeça em uma pedra e morre de traumatismo cranioencefálico. 48 Neste caso, o erro não irá alterar a tipificação e tampouco absolver o acusado. Como já explicado no início da aula, o erro de proibição age na culpabilidade do agente. Aqui, o sujeito não erra em relação aos elementos do tipo, mas sim realiza uma conduta proibida crendo ser esta ser permitida. Lembre-se, portanto, do exemplo do holandês Kiko, dado no início da aula, que de férias no Brasil trouxe algumas gramas de maconha, pensando ser tal conduta lícita. Nesse sentido é que falamos em erro de proibição inevitável e erro de proibição evitável. I) Erro de proibição inevitável: Trata-se do erro que o agente não poderia ter evitado mesmo agindo com toda a prudência necessária. O efeito desse erro é a isenção de pena do réu, isto é, ele será absolvido. II) Erro de proibição evitável: Trata-se do erro que poderia ser evitado se o agente tivesse sido prudente. Aqui, contudo, o efeito não será a isenção de pena, mas sim a sua diminuição de um sexto a um terço. Deste modo, assim como ocorre lá na distinção do erro de tipo evitável/inevitável, esse juízo deve ser feito caso a caso, levando em consideração as circunstâncias do caso concreto. Por fim, destaca-se que o erro de proibição está previsto no art. 21 do Código Penal: Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência. 49 08. (XX EXAME DE ORDEM UNIFICADO) Wellington pretendia matar Ronaldo, camisa 10 e melhor jogador de futebol do time Bola Cheia, seu adversário no campeonato do bairro. No dia de um jogo do Bola Cheia, Wellington vê, de costas, um jogador com a camisa 10 do time rival. Acreditando ser Ronaldo, efetua diversos disparos de arma de fogo, mas, na verdade, aquele que vestia a camisa 10 era Rodrigo, adolescente que substituiria Ronaldo naquele jogo. Em virtude dos disparos, Rodrigo faleceu. Considerando a situação narrada, assinale a opção que indica o crime cometido por Wellington. a) Homicídio consumado, considerando-se as características de Ronaldo, pois houve erro na execução. b) Homicídio consumado, considerando-se as características de Rodrigo. c) Homicídio consumado, considerando-se as características de Ronaldo, pois houve erro sobre a pessoa. d) Tentativa de homicídio contra Ronaldo e homicídio culposo contra Rodrigo. 50 Quando estudamos crimes contra o patrimônio, estudamos as disposições contidas entre os artigos 155 e 183 do Código Penal. Todavia, como o nosso foco aqui é acertar as questões do Exame de Ordem, vamos estudar aquilo que estatisticamente tem relevância. Isto é, matérias com alto grau de incidência na prova. Obviamente, isso não dispensa o estudo de matérias que ainda não foram cobradas. Mas é preciso que você direcione o seu foco nestes conteúdos para, depois, complementar o seu material com os demais assuntos. 2.1. Previsão legal Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. 2.2. Consumação e a teoria da amotio Kiko acabou de furtar o celular de Leandro em uma padaria, enquanto este tomava café. Assim que subtraiu o celular, que estava em cima da mesa, Kiko corre com o bem em mãos. De imediato, um senhor que, também estava na padaria, avisa Leandro sobre o ocorrido, e este passa a correr atrás de Kiko para recuperar o bem. Após alguns quarteirões de perseguição, e para a o infeliz azar do agente criminoso, Kiko esbarra em dois policiais que, de imediato, percebem o ato delituoso e prendem Kiko em flagrante. 51 Pergunta-se: O crime de furto foi consumado ou tentado? Era necessário que Kiko tivesse a posse mansa e pacífica do bem para que o delito fosse consumado? Bem, para poupar o seu tempo, vamos direto ao que interessa. Dentre as diversas teorias existentes, no Brasil, pela atual jurisprudência, adota-se a teoria da omotio. Por essa teoria, o crime de furto é consumado com a mera inversão da posse do bem. Isto é, o furto ainda será consumado mesmo que a coisa subtraída seja retomada em logo em seguida, com ou sem perseguição. Para a amotio, é desnecessária a posse mansa e pacífica do bem. Assim, pelo exemplo dado no início, Kiko responderá pelo crime de furto consumado. 2.3. Qualificadoras As qualificadoras do crime de furto estão previstas entre os §4º e §7º do art. 155. Seguindo a lógica do nosso curso intensivo, é preciso que você leia e estude todas elas com atenção. Contudo, aqui trataremos das qualificadoras mais cobradas e dos aspectos com maior incidência no Exame de Ordem, de modo prático e direto. 2.3.1 Furto qualificado por destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa (Art. 155, §4º, I) • Destruir é desfazer ou fazer desaparecer (ex.: quebrar janela de vidro). Romper é deteriorar, arrombar, serrar etc (ex.: abrir uma porta um “pé de cabra”). Obstáculo é a barreira que protege o bem (ex.: cadeado, grade, porta, janela, etc). • Não configura crime de dano (art. 163 do CP) pois, aqui, o dano é absorvido (meio de execução). Contudo, para isso, é necessário que a destruição ou rompimento ocorra antes ou durante o crime. Se ocorrer após, já consumado o furto, o sujeito responderá por furto e dano em concurso material. 52 • Por deixar vestígios, é imprescindível a realização de exame de corpo de delito para a sua comprovação (art. 158 do CPP). Contudo, não sendo possível o exame por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir a sua falta (art. 167 do
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