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1 Aula 01 1D Português Teoria literária Texto literário O que nos permite considerar um texto escrito como literário é o fato de o autor fazer através dele uma criativa manifestação artística de sua sensibilidade, utilizando a palavra escrita. O texto assim elaborado transpõe fron- teiras geográficas e temporais: muitas obras de autores estrangeiros, escritas há muito tempo, abordam temas que, por serem universais e eternos, são ainda atuais. A comunicação e a expressão de um texto literário advêm dos mais variados artifícios e técnicas: • escrever em verso ou prosa; • empregar linguagem figurada; • não só traduzir, mas também recriar ou relativizar a realidade; • provocar no leitor sentimentos como estranhamen- to, surpresa, ambiguidade, divertimento e outros; • despertar no público a consciência crítica. Os autores tem um estilo próprio que é inspirado pela época em que viveram e pelas experiências que vivenciaram. A isto chamamos de estilo individual. Quando variados autores vivenciaram suas expe- riências pessoais sob a influência dos acontecimentos de uma mesma época, dizemos que as características que seus textos apresentam em comum constituem um estilo de época ou uma escola literária. Barroco, Arcadismo, Romantismo, Realismo-Natura- lismo, Parnasianismo, Simbolismo, Pré-Modernismo e Modernismo foram os principais movimentos literários surgidos no Brasil a partir do Descobrimento. Gêneros ou modos literários Uma obra literária, dependendo dos elementos semânticos, formais e estilísticos que apresentem, pode ser incluída num dos três gêneros básicos. Gênero épico-narrativo: inclui os textos que narram histórias, têm personagens, ação, enredo. É o modo literário que normalmente apresenta uma história inventada como se fosse real, ou uma história real reinventada, em que as personagens agem, reagem e interagem em determinado espaço (lugar) e tempo. Gênero épico, a palavra narrada. Tipos de narrativas A EPOPEIA é a história contada em versos. Narra a História, as aventuras e conquistas de um povo ou de um herói (Os Lusíadas, O Uraguai, Caramuru, Ilíada...). O ROMANCE é chamada de a longa narrativa. É o texto mais complexo e mais rico, pois pode apresentar: • grande variedade de espaços e lugares; • personagens com características diversificadas; • intersecção com outros gêneros literários; • diversas histórias que se interligam de uma forma ou de outra. O CONTO é uma narrativa curta, que geralmente vem com poucos personagens, apresenta pouca diver- sificação de temas, espaços e tempos e tem um núcleo central de ação. A CRÔNICA é um relato simples, curto, de cunho pessoal, em que o autor comenta, interpreta e emite opiniões a respeito de fatos ou assuntos que estão na ordem do dia. Originalmente eram textos publicados em jornal. Passou a ser objeto de publicação porque faz a junção da reportagem com a literatura. Gênero lírico: modo de expressão em que, na maio- ria dos autores, predominam os aspectos subjetivos, as emoções, os íntimos e profundos sentimentos humanos. Lirismo é poesia, poesia é emoção, elevação mental e espiritual, mergulho na sublimidade da beleza. Gênero lírico, a palavra cantada ou recitada. Gênero dramático: compõe-se de textos escritos para serem representados em público. Neste modo próprio para o teatro, destacam-se os diálogos (discurso direto), os mo- nólogos e gestos, as encenações e as rubricas (orientações do autor). A tragédia, a comédia e o drama são os tipos básicos de peças teatrais, que podem apresentar variações e entrelaçamentos. Gênero dramático, a palavra encenada. 2 Extensivo Terceirão Elementos estilísticos e formais 1. Do gênero lírico SONETO DE FIDELIDADE Vinícius de Morais De tudo ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento. Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. 1. Cada linha do poema chama-se verso, cada conjunto de versos é uma estrofe. 2. A primeira e a segunda estrofes são quartetos (formadas por quatro versos cada); as duas últimas estrofes, de três versos cada, são tercetos. 3. A coincidência ou semelhança de sons no final dos versos são as rimas (atento/pensamento – tanto/ encanto). Os versos sem rima são chamados versos brancos. 4. Um poema como este acima, formado por dois quartetos e dois tercetos, é conhecido como soneto. 5. Métrica é o número de sílabas poéticas de cada verso. Para chegar a esse número conta-se até a úl- tima sílaba tônica e unem-se os sons das vogais que terminam uma palavra e iniciam a seguinte (De-tu- -doao-meu-a-mor-se-rei-a-TEN-to / An-tes-e-com- -tal-ze-loe-sem-pree-TAN-to). O poema portanto é composto por versos com dez sílabas métricas ou decassílabos. Versos de um poema, em que não é usada a métrica, são chamados de versos livres. 6. É importante não confundir: autor ou poeta é quem escreve o poema; eu poético é o personagem que fala dentro do poema e que não coincide sempre com o poeta. 2. Do gênero épico Apelo Amanhã faz um mês que a Senhora está lon- ge de casa. Primeiros dias, para dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa de esquina. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho. Com os dias, Senhora, o leite primeira vez co- alhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, e até o canário ficou mudo. Para não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os ami- gos. Uma hora da noite eles se iam eu ficava só, sem o perdão da sua presença a todas as aflições do dia, como a última luz na varanda. E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tempero da salada – o meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? As suas violetas , na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa, calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolhas? Ne- nhum de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor. [TREVISAN. Dalton. De “II - Os Mistérios de Curitiba”, in Os Desastres do Amor. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968] 1. Enredo, intriga, trama, ação são os termos que designam o desenrolar dos acontecimentos em uma história. O enredo de um romance pode desenrolar- -se em torno de um ou mais conflitos ou situações de tensão. O texto mostra a evolução do sentimento de solidão e carência que vai-se agravando com o passar dos dias de ausência da dona de casa. 2. Personagens são os indivíduos (pessoas, animais, objetos, entidades) que participam da evolução dos acontecimentos narrados. Há personagens que são protagonistas (heróis ou anti-heróis), antagonistas (os que se opõem aos protagonistas) e os que fazem figuração, os secundários. No texto, o protagonista anônimo é o marido abandonado pela esposa. É um personagem plano. O personagem plano caracteriza-se pela previsibi- lidade, simplicidade e pouca profundidade psicológica (como os personagens típicos e caricaturais). O personagem redondo ou esférico é imprevisível, misterioso, complexo, diferente das pessoas comuns. 3. Tempo é o “quando” acontecem, aconteceram ou acontecerão os fatos narrados. O tempo pode ou não coincidir com a época em que o livro é escrito. Pode ter curta ou longa duração. Pode ser cronológico quando transcorre em ordem linear de início, meio e fim, com Aula 01 3Português 1D marcação explícita ou implícita de datas ou de fatos históricos. Dizemosque o tempo é psicológico quan- do acompanha o fluxo da consciência e da memória, sem preocupação com a sequência temporal ou lógica. Flash back ou retrospectiva consiste no recuo no tempo que o narrador faz para trazer ao presente lembranças ou acontecimentos passados. 4. Espaço é o “onde” real, irreal, imaginário ou virtual em que ocorrem as ações. Ao falar em ambiente decaden- te, luxuoso, paranoico, religioso, urbano ou outro, o narrador está unindo os conceitos de tempo e espaço. 5. Foco narrativo ou ponto de vista é a posição ou perspectiva do narrador em relação ao que é narrado. Foco narrativo ou ponto de vista interno é a pers- pectiva do narrador que também é personagem. Por isso sua narração é feita em primeira pessoa, como no texto acima de Dalton Trevisan. O narrador-personagem narra como se estivesse vivendo os fatos naquele instante, por isso não conhece ou finge não conhecer os detalhes da história, nem o íntimo das personagens. Foco narrativo ou ponto de vista externo é o que apresenta um narrador observador que utiliza a terceira pessoa verbal para contar sua história. Este narrador pode apenas relatar o que está vendo ou pode apresentar-se como um narrador onisciente, que já conhece todos os detalhes do enredo e, inclusive, os pensamentos, ideias e sentimentos das personagens. 3. Do gênero dramático Ato III QUADRO II [...] TIÃO (irrita-se cada vez mais. Uma irritação desesperada) – Mariinha, não adiantava nada!... Eu tive... eu tive... MARIA – Medo, medo, medo... TIÃO (num grande desabafo) – Medo, está bem, Maria, medo!... Eu tive medo sempre!... A história do cinema é mentira! Eu disse porque eu quero sê alguma coisa, eu preciso sê alguma coisa!... Não queria ficá aqui sempre, tá me en- tendendo? Tá me entendendo? A greve me metia medo. Um medo diferente! Não medo da greve! Medo de sê operário! Medo de não saí nunca mais daqui! Fazê greve é sê mais operário ainda!... MARIA – Não, não... Eu não saio daqui! TIÃO – (num desabafo total) - Minha Miss Le- opoldina, eu quero bem!... Eu queria que a gente fosse que nem nos filmes!... Que tu risse sempre! Que sempre a gente pudesse andar no parque! Eu tenho medo que tu tenha de sê que nem todas que tão aí!... Se matando de trabalhá em cima de um tanque!... Eu quero minha Miss Leopoldina... Eu te quero bem! Eu quero bem a todo mundo!... Eu não sou um safado!... Mas para de chorá! Se você quisé eu grito pra todo mundo... que eu sou um safado! (Gritando para a rua) Eu sou um safado!... Eu traí... Porque tenho medo... Porque eu quero bem! Porque eu quero que ela sorria no parque pra mim! Porque eu quero viver! E viver não é isso que se faz aqui! MARIA – Tião!... TIÃO – Mariinha, minha dengosa (Atira-se so- bre ela. Abraçam-se.) E agora, Maria, o que vou fazer? MARIA – Não posso deixá o morro... Deixan- do o morro, o parque também ia ser diferente! Tá tudo errado!... Reconhece! TIÃO – Não posso ficá, Maria...Não posso ficá!... MARIA (para de chorar. Enxuga as lágrimas) – Então, vai embora... Eu fico. Eu fico com Ota- vinho... Crescendo aqui ele não vai tê medo... E quando tu acreditá na gente... por favor... volta! (Sai.) TIÃO – Maria, espera!... (Correndo, segue Ma- ria. Pausa.) OTÁVIO (entrando) – Já acabou? ROMANA –Vai falá com ele, Otávio... Vai! OTÁVIO – Enxergando melhó a vida, ele volta. (Retorna ao quarto). [...] (Gianfrancesco Guarnieri – Eles não usam black-tie) 1. No teatro clássico a Tragédia, de conteúdo sério, tinha como hoje, o objetivo de inspirar terror e compaixão para purificar os sentimentos dos es- pectadores. As encenações apresentavam a virtude superando as mais terríveis tragédias e infortúnios, e o crime sendo atingido pelos castigos implacáveis do destino inexorável. Diferentemente da tragédia atual, a clássica seguia a regra das três unidades: de tempo (a história toda se desenrolava num período de 24 horas); de ação (só um assunto centralizava as atenções); de lugar (não havia mudança do local das ações). 2. A Comédia teve origem nas festas dionisíacas, quan- do se misturavam instantes de tristeza com outros de alegria desenfreada. Sua finalidade é fazer rir uti- lizando contradições e contrastes. Modernamente, a comédia incorpora inúmeras outras roupagens. 3. Foi o Romantismo que difundiu o Drama, espécie literária em que se fundem os elementos da tragédia e da comédia, como acontece na vida que é uma oscilação intermitente de prazeres e dores. O texto acima é um bom exemplo de teatro dramático. 4 Extensivo Terceirão 4. No teatro, a narração normalmente é feita indiretamente pelos personagens que, através dos diálogos ou monó- logos, dos gestos, das emoções levam o público a conhecer e entender o enredo. 5. As rubricas são as informações e instruções passadas pelo autor a respeito do cenário, figurino, iluminação, sonoplastia e dos personagens com seus tipos, ações e reações. Elas aparecem normalmente escritas em itálico e entre parênteses), como na última linha do texto (Retorna ao quarto). As rubricas podem ou não ser seguidas à risca pelo diretor e pelos atores. Testes Assimilação 01.01. (UFU – MG) – Assinale a afirmativa INCORRETA. a) Enquanto a linguagem do historiador, do cientista se define como denotativa, a linguagem do autor literário se define como conotativa. b) A obra literária não permite aos leitores gerar várias ideias e interpretações, pois trabalha a linguagem de forma exclusivamente objetiva. c) A literatura não existe fora de um contexto social, já que cada autor tem uma vivência social. d) A linguagem poética é constituída por uma estrutura complexa, pois acrescenta ao discurso linguístico um significado novo, surpreendente. e) Para o entendimento de um texto literário, é necessário o conhecimento do código linguístico e de uma pluralidade de códigos: retóricos, míticos, culturais, que se encontram na base da estrutura artístico-ideológica do texto. 01.02. (FAAP – SP) – Texto AS POMBAS (Raimundo Correia) Vai-se a primeira pomba despertada... Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas De pombas vão-se dos pombais, apenas Raia sanguínea e fresca a madrugada E à tarde, quando a rígida nortada Sopra, aos pombais, de novo, elas, serenas Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada... Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam Como voam as pombas dos pombais; No azul da adolescência as asas soltam, Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam E eles aos corações não voltam mais... Pobre é a rima que se processa entre palavras da mesma classe gramatical, tal qual a) despertada / madrugada b) dezenas / apenas c) nortada / revoada d) serenas / penas e) pombais / mais 01.03. Com relação aos gêneros literários, é INCORRETO afirmar que, no gênero a) lírico, o artista retrata criticamente a realidade. b) épico, o autor se apega à objetividade e à impessoalidade. c) lírico, a tendência do escritor é revelar as emoções que o mundo causou nele. d) dramático, há ausência de narrador, apresentando-se um conflito através do discurso direto. e) narrativo, podem-se fundir todos os gêneros literários. 01.04. Texto Os gatos Fialho de Almeida Deus fez o homem à sua imagem e semelhança, e fez o crítico à semelhança do gato. Ao crítico deu ele, como ao gato, a graça ondulosa e o assopro, o ronrom e a garra, a língua espinhosa. Fê-lo ner- voso e ágil, refletido e preguiçoso; artista até ao requinte, sarcástico até a tortura, e para os amigos bom rapaz, desconfiado para os indiferentes, e terrível com agressores e adversários... . Desde que o nosso tempo englobou os homens em três categorias de brutos, o burro, o cão e o gato – isto é, o animal de trabalho, o animal de ataque, e o animal de humor e fantasia – por que não escolheremos nós o travestir do último? É o que se quadra mais ao nosso tipo, e aquele que melhor nos livrará da escravidão do asno, e das dentadas famintasdo cachorro. Razão por que nos acharás aqui, leitor, miando um pouco, arranhando sempre e não temendo nunca. Predomina neste texto a a) narração d) forma epistolar b) descrição e) poesia c) dissertação Aula 01 5Português 1D 01.07. Numere os fragmentos de texto de acordo com os seguintes gêneros literários: 1. Lírico; 2. Satírico; 3. Épico. ( ) “Quem por ti de amor desmaia, Nesta praia geme e chora: Vem, Pastora, por piedade A saudade consolar. Não recreiam sempre os montes Co’as delícias de Amalteia; Vem, ó Glaura, a ruiva areia, Rio e fontes animar.” (Silva Alvarenga) ( ) “A cada canto um grande conselheiro, Que nos quer governar cabana e vinha, Não sabem governar sua cozinha, E podem governar o mundo inteiro. Em cada porta um bem frequentado olheiro, Que a vida do vizinho e da vizinha Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha, Para o levar à praça, e ao terreiro.” (Gregório de Matos) ( ) “Nesta triste masmorra, de um semivivo corpo sepultura, inda, Marília, adoro a tua formosura. Amor na minha ideia te retrata; busca, extremoso, que eu assim resista à dor imensa que me cerca e mata.» (Tomás Antônio Gonzaga) ( ) “Este lugar delicioso e triste, Cansada de viver, tinha escolhido Para morrer, a mísera Lindoia. Lá reclinada, como que dormia, Na branda relva e nas mimosas flores; Tinha a face na mão e a mão no tronco De um fúnebre cipreste, que espalhava Melancólica sombra. Mais de perto Descobrem que se enrola em seu corpo Verde serpente...” (Basílio da Gama) A sequência correta encontrada é: a) 1, 2, 3, 3 b) 1, 2, 1, 3 c) 2, 1, 3, 1. d) 3, 2, 3, 1. e) 2, 3, 3, 2 Aperfeiçoamento 01.05. (UERJ) – Observe atentamente os dois trechos trans- critos a seguir. 1. “... o objetivo da poesia (e da arte literária em geral) não é o real concreto, o verdadeiro, aquilo que de fato aconteceu, mas sim o verossímil, o que pode acontecer, considerado na sua universa- lidade.” (SILVA,Vítor M. de A. “Teoria de Litera- tura”. Coimbra: Almedina, 1982.) 2. Verossímil. 1. Semelhante à verdade; que parece verdadeiro. 2. Que não repugna à verdade, provável. (FERREIRA. A. B. de Holanda, “Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa”. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.) A partir da leitura de ambos os fragmentos, pode-se deduzir que a obra literária tem por objetivo a) construir uma aparência de realidade para expressar dado sentido. b) anular a realidade concreta para superar contradições aparentes. c) opor-se ao real para afirmar a imaginação criadora. d) buscar uma parcela representativa do real para contestar sua validade. e) despertar no leitor uma consciência social crítica. 01.06. (UERJ) – Texto “Comenta-se, um pouco rápido demais, que a predileção que os leitores sentimos por um ou outro personagem vem da facilidade com que nos identificamos com eles. Esta formulação exige al- gumas pontuações: não é que nos identifiquemos com o personagem, mas sim que este nos identi- fica, nos aclara e define frente a nós mesmos; algo em nós se identifica com essa individualidade imaginária, algo contraditório com outras ‘iden- tificações semelhantes’, algo que de outro modo apenas em sonhos haveria logrado estatuto de natureza. A paixão pela literatura é também uma maneira de reconhecer que cada um somos mui- tos, e que dessa raiz, oposta ao senso comum em que vivemos, brota o prazer literário.” (Traduzido de SAVATER, Fernando. “Criaturas del aire”. Barcelona: Ediciones Destino,1989.) Este texto trata de um conceito importante na teoria da literatura: o conceito de catarse. De acordo com o autor, pode-se definir catarse como o processo que afeta o leitor no sentido de a) valorizar o imaginário. b) superar o senso comum. c) construir a personalidade. d) mudar a maneira de pensar. e) liberar emoções reprimidas. 6 Extensivo Terceirão 01.08. (CFTMG) – O fragmento abaixo pertence ao gênero dramático. “MICROFONE – Buzina de automóvel. Rumor de derrapagem violenta. Som de vidraças partidas. Silêncio. Assistência. Silêncio. VOZ DE ALAÍDE (microfone) – Clessi... Clessi... (Luz em resistência no plano da alucinação. 3 mesas, 3 mulheres escandalosamente pintadas, com vestidos berrantes e compridos. Decotes. Duas delas dançam ao som de uma vitrola invisível, dando uma vaga sugestão lésbica. Alaíde, uma jovem senhora, vestida com sobriedade e bom gosto, aparece no centro da cena. Vestido cinzento e uma bolsa vermelha.) ALAÍDE (nervosa) – Quero falar com Madame Clessi! Ela está? (Fala à 1ª. mulher que, numa das três mesas, faz “paciência”. A mulher não responde.) ALAÍDE (com angústia) – Madame Clessi está – pode-me dizer? ALAÍDE (com ar ingênuo) – Não responde! (com doçura) Não quer responder? (Silêncio da outra.)” RODRIGUES, Nelson. Teatro completo I. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981. p. 109. Nesse gênero literário, o narrador é a) onisciente. b) personagem. c) observador. d) inexistente. e) interferente 01.09. Associe os gêneros literários às suas respectivas características. 1 – Gênero lírico 2 – Gênero épico 3 – Gênero dramático ( ) Exteriorização dos valores e sentimentos coletivos ( ) Representação de fatos com presença física de atores ( ) Manifestação de sentimentos pessoais predominando, assim, a função emotiva A sequência correta, de cima para baixo, é a) 3 – 2 – 1 b) 1 – 2 – 3 c) 2 – 1 – 3 d) 1 – 3 – 2 e) 2 – 3 – 1 01.10. (UEM – PR) – Assinale o que for correto sobre teoria e estrutura da narrativa. 01) Os acontecimentos narrados no texto narrativo devem sempre obedecer à ordem sequencial e cronológica. O narrador não tem a liberdade de inverter as ações em outra ordem que não a causal, porque isso poderia comprometer a com- preensão do leitor. 02) No texto literário, o narrador não é o autor, mas sim um papel por este inventado. O autor tem existência física e histórica, enquanto o narrador é uma personagem de ficção. Ainda que se trate de um texto narrado em primeira pessoa, autor e narrador não são idênticos. 04) O romance se define como um tipo de texto cujo conteúdo é sempre uma história de amor profundo. O par amoroso luta com todas as suas forças para se manter unido. O amor frágil e passageiro é conteúdo da novela e do conto, textos voltados para a superficialidade das relações afetivas. 08) O foco narrativo é o ângulo de visão adotado pelo narrador para apresentar fatos e/ou experiências psicológicas e se apresenta principalmente em primeira ou em terceira pessoa. Quando o foco narrativo está em primeira pessoa, há uma visão subjetiva e parcial. É o caso, por exemplo, de Dom Casmurro, de Machado de Assis. Quando está em terceira pessoa, há uma visão externa, assumida por um observador “de fora”. É o caso, por exemplo, de Clara dos Anjos, de Lima Barreto. 16) O conteúdo do texto lírico é incompatível com a narratividade, uma vez que está centrado no universo psíquico do “eu” e, nesse sentido, põe em evidência a consciência fragmentada e caótica, impossível de ser expressa na narrativa. A desarticulação textual e a falta de logicidade do discurso lírico fazem com que ele apresente menos possibilidades de sentido do que o texto narrativo. Aula 01 7Português 1D Aprofundamento 01.11. A sátira é um exemplo do gênero a) dramático. c) lírico. e) didático. b) narrativo. d) épico. 01.12. (UEM – PR) – A palavra serve para comunicar e interagir. E tam- bém para criar literatura, isto é, criar arte, provo- car emoções, produzir efeitos estéticos. (Português: linguagens: volume 1: ensino médio / William Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães. – 5.ed. – São Paulo: Atal, 2005. p. 27.) A partir da definição anterior, pode-se afirmar que a lingua- gem literária a) pressupõe objetividade e clareza diante da sua função utilitária. b) não permite que haja dupla interpretação a respeito do assunto tratado. c) é organizada de modo que a plurissignificação esteja presente no texto. d) tempor objetivo esclarecer acerca de um assunto rela- cionado à realidade. e) tem como principal objetivo proporcionar entretenimento. 01.13. (ESPCEX – SP) – Leia o trecho a seguir e responda. “O senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é por os campos-gerais a fora a dentro, eles dizem, fim de rumo, terras al- tas, demais do Urucuia. Toleima. Para os de Corin- to e do Curvelo, então, o aqui não é dito sertão? Ah, que tem maior! Lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de mora- dor; e onde criminoso vive seu cristo-jesus, arreda- do do arrocho de autoridade. O Urucuia vem dos montões oestes. Mas, hoje, que na beira dele, tudo dá – fazendões de fazendas, almargem de vargens de bom render, as vazantes; culturas que vão de mata em mata, madeiras de grossura, até ainda vir- gens dessas lá há. Os gerais correm em volta. Es- ses gerais são sem tamanho. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães... O sertão está em toda parte.” Quanto ao trecho, é correto afirmar que a) não há ponto de vista do narrador, que apenas relata as impressões alheias. b) apresenta alguns neologismos, como “toleima”, “almar- gem”, “opiniães” e “oestes”. c) não há abordagem universal, a passagem constitui apenas uma descrição do sertão. d) o trecho transpõe os limites do regional, alcançando a dimensão universal. e) transparece todo misticismo sertanejo, baseado apenas nos dois extremos: o bem e o mal. 01.14. (UEL – PR) – Leia a crônica abaixo e responda à(s) questão(ões) a seguir. O desaparecido Tarde fria, e então eu me sinto um daqueles velhos poetas de antigamente que sentiam frio na alma quando a tarde estava fria, e então eu sinto uma saudade muito grande, uma saudade de noivo, e penso em ti devagar, bem devagar, com um bem- -querer tão certo e limpo, tão fundo e bom que parece que estou te embalando dentro de mim. Ah, que vontade de escrever bobagens bem mei- gas, bobagens para todo mundo me achar ridícu- lo e talvez alguém pensar que na verdade estou aproveitando uma crônica muito antiga num dia sem assunto, uma crônica de rapaz; e, entretanto, eu hoje não me sinto rapaz, apenas um menino, com o amor teimoso de um menino, o amor bur- ro e comprido de um menino lírico. Olho-me ao espelho e percebo que estou envelhecendo rápida e definitivamente; com esses cabelos brancos pa- rece que não vou morrer, apenas minha imagem vai-se apagando, vou ficando menos nítido, estou parecendo um desses clichês sempre feitos com fotografias antigas que os jornais publicam de um desaparecido que a família procura em vão. Sim, eu sou um desaparecido cuja esmaecida, inútil foto se publica num canto de uma página interior de jornal, eu sou o irreconhecível, irre- cuperável desaparecido que não aparecerá mais nunca, mas só tu sabes que em alguma distante esquina de uma não lembrada cidade estará de pé um homem perplexo, pensando em ti, pensando teimosamente, docemente em ti, meu amor. (BRAGA, R. 200 crônicas escolhidas. Rio de Janeiro: Record, 2013. p. 465.) Leia, a seguir, o trecho presente no início do segundo pará- grafo da crônica. Ah, que vontade de escrever bobagens bem meigas, bobagens para todo mundo me achar ridículo [...] A respeito desse trecho, considere as afirmativas a seguir. I. O trecho representa a ruptura entre a crônica e o mundo através do aprofundamento na vida interior. II. O trecho contesta a viabilidade de uma crônica com marcas líricas consideradas como tolices. III. O trecho ressalta a crônica como veículo da expressão do sentimento de desajuste entre o indivíduo e o mundo ao seu redor. IV. A iniciativa metalinguística aponta a liberdade e a varieda- de de vertentes da crônica que pode se valer de recursos narrativos e líricos. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas I e II são corretas. b) Somente as afirmativas I e IV são corretas. c) Somente as afirmativas III e IV são corretas. d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas. 8 Extensivo Terceirão 01.15. (UNESP – SP) – Leia o trecho do conto “Pai contra mãe”, de Machado de Assis (1839-1908), para responder à(s) questão(ões). A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras instituições sociais. Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um deles era o ferro ao pescoço, ou- tro o ferro ao pé; havia também a máscara de fo- lha de flandres. A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos, por lhes tapar a boca. Tinha só três buracos, dois para ver, um para res- pirar, e era fechada atrás da cabeça por um cade- ado. Com o vício de beber, perdiam a tentação de furtar, porque geralmente era dos vinténs do se- nhor que eles tiravam com que matar a sede, e aí ficavam dois pecados extintos, e a sobriedade e a honestidade certas. Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança sem o grotesco, e alguma vez o cruel. Os funilei- ros as tinham penduradas, à venda, na porta das lojas. Mas não cuidemos de máscaras. O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fu- jões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa também, à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave. Pesava, naturalmente, mas era menos castigo que sinal. Escravo que fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente, e com pouco era pe- gado. Há meio século, os escravos fugiam com frequência. Eram muitos, e nem todos gostavam da escravi- dão. Sucedia ocasionalmente apanharem panca- da, e nem todos gostavam de apanhar pancada. Grande parte era apenas repreendida; havia al- guém de casa que servia de padrinho, e o mesmo dono não era mau; além disso, o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói. A fuga repetia-se, entretanto. Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de con- trabando, apenas comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade. Dos que seguiam para casa, não raro, apenas ladinos, pe- diam ao senhor que lhes marcasse aluguel, e iam ganhá-lo fora, quitandando. Quem perdia um escravo por fuga dava algum di- nheiro a quem lho levasse. Punha anúncios nas folhas públicas, com os sinais do fugido, o nome, a roupa, o defeito físico, se o tinha, o bairro por onde andava e a quantia de gratificação. Quando não vinha a quantia, vinha promessa: “gratificar- -se-á generosamente” – ou “receberá uma boa gra- tificação”. Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de preto, descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa. Protestava-se com todo o rigor da lei contra quem o acoitasse. Ora, pegar escravos fugidios era um ofício do tempo. Não seria nobre, mas por ser instrumento da força com que se mantêm a lei e a proprieda- de, trazia esta outra nobreza implícita das ações reivindicadoras. Ninguém se metia em tal ofício por desfastio ou estudo; a pobreza, a necessidade de uma achega, a inaptidão para outros trabalhos, o acaso, e alguma vez o gosto de servir também, ainda que por outra via, davam o impulso ao ho- mem que se sentia bastante rijo para pôr ordem à desordem. (Contos: uma antologia, 1998.) Embora não participe da ação, o narrador intromete-se de forma explícita na narrativa em: a) “Há meio século, os escravos fugiam com frequência.” (3º. parágrafo) b) “O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões.” (2º. parágrafo) c) “A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escra- vos, por lhes tapar a boca.” (1º. parágrafo) d) “Mas não cuidemos de máscaras.” (1º. parágrafo) e) “Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão.” (3º. parágrafo) 01.16. (CFTM) – Sobre os gêneros literários, afirma-se: I. O gênero dramático abrange textos que tematizam o sofrimento e a aflição da condição humana. II. Textos pertencentesao gênero lírico privilegiam a expres- são subjetiva de estados interiores. III. O gênero épico compreende textos sobre acontecimen- tos grandiosos protagonizados por heróis. IV. Em literatura, o romance e a novela são formas narrativas pertencentes ao gênero dramático. Estão corretas apenas as afirmativas a) I, II e III. b) I e IV. c) II, III e IV. d) III e IV. e) II e III. 01.17. (UEM – PR) – Assinale o que for correto sobre o gênero lírico. 01) O gênero lírico, em comparação com o gênero épico ou narrativo, mostra-se marcado por um filtro subjetivo que favorece a expressão individual, bem como a in- tensificação de sentimentos e emoções. 02) Embora marcado por grande liberdade temática, o gênero lírico é bastante rigoroso no tocante às formas fixas, de modo que se manifesta apenas em sonetos, odes, elegias, contos e novelas. 04) Em contraste com a presença de um narrador no gê- nero épico, na lírica nota-se a presença de um eu lírico, que tanto permite a expressão de um mundo interior quanto serve de filtro para a realidade externa. Aula 01 9Português 1D 08) Uma das principais subdivisões do gênero lírico encon- tra-se no par “comédia” e “tragédia” que, presente desde as primeiras manifestações do gênero, deu origem, já no fim do século XVIII, à “tragicomédia”, com a utiliza- ção de versos livres e brancos. 16) Recursos formais como a rima, a métrica e o ritmo, em- bora possam ser verificados em outros gêneros literá- rios, encontram-se especialmente ligados ao gênero lí- rico, favorecendo sua sonoridade e sua expressividade. 01.18. A crônica é um gênero, digamos, aberto. Dentro dessa rubrica cabem vários conceitos. As quatro opções abaixo apresentam características de crônica, menos uma. Assinale essa opção. a) Pequeno texto polêmico escrito para uma coluna de periódico, assinada, com notícias e comentários sobre cultura e política. b) Conjunto de notícias e críticas a respeito de fatos da atu- alidade, de cunho memorialista ou confessional. c) Texto literário breve que espelha fatos ou elementos do cotidiano, sobre os quais o enunciador reflete e opina. d) Breve narrativa literária de trama quase sempre pouco definida e sobre motivos extraídos do cotidiano imediato. e) Narrativa breve, com poucos personagens e que se inicia com o conflito já próximo de seu desfecho. Desafio 01.19. (UECE) – Texto Pedro Américo, pintor brasileiro nascido na Paraíba, foi um grande cultivador da arte acadêmica. Viveu sob a proteção de D. Pedro II, que lhe financiou cursos na Europa. O Imperador Brasileiro foi um verdadeiro Mecenas (indivíduo rico que protege artistas, homens de letras ou de ciências, proporcionando-lhes recursos financeiros para que possam dedicar-se, sem preocu- pações outras, às artes e às ciências). Foi por encomenda de D. Pedro II que ele pintou, em 1888, o quadro que homenageia D. Pedro I, pelo ato de proclamar a independência política do Brasil. A pintura recebeu o nome de Independência ou Morte, sendo mais conhecida, no entanto, como O Grito do Ipiranga. É um quadro que todo estudante brasileiro reconhece. O GRITO Um tranquilo riacho suburbano, Uma choupana embaixo de um coqueiro, Uma junta de bois e um carreteiro: Eis o pano de fundo e, contra o pano, Figurantes – cavalos e cavaleiros, Ressaltando o motivo soberano, A quem foi reservado o meio plano Onde avulta solene e sobranceiro. Complete-se a figura mentalmente Com o grito famoso, postergando Qualquer simbologia irreverente. Nem se indague do artista, casto obreiro, Fiel ao mecenato e ao seu comando, Quem o povo, se os bois, se o carreteiro. PAES, José Paulo. Poesia Completa. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. P. 105. Os poemas podem variar no número de sílabas métricas. Os versos que têm de 1 a 12 sílabas recebem nomes diferentes. A partir de 13 sílabas, deixam de receber nomes específicos. Em relação ao poema O Grito é correto afirmar que a) foi feito com versos de 5 sílabas métricas chamados pentassílabos ou redondilhas menores. b) apresenta versos de 7 sílabas métricas, a medida ou o metro das quadras e da poesia popular de maneira geral como ocorre em cantigas de roda e desafios. c) tem versos de 8 sílabas métricas, denominados octossíla- bos, usados nas baladas (composições poéticas populares antigas, acompanhadas ou não de música). d) foi estruturado em versos de 10 sílabas métricas, decassí- labos, que são versos longos, de difícil feitura, adequados aos poemas heroicos e épicos. 01.20. (UNICAMP – SP) – © LE R – Sa lã o Ca rio ca d o Li vr o – w w .le rs al ao ca rio ca .c om .b r “Acho que só devemos ler a espécie de livros que nos ferem e trespassam. Um livro tem que ser como um machado para quebrar o mar de gelo do bom senso e do senso comum.” (Adaptado de “Franz Kafka, carta a Oscar Pollak, 1904.” Disponível em https:// laboratoriode sensibilidades.wordpress.com. Acessado em 28/05/2018.) 10 Extensivo Terceirão Assinale o excerto que confirma os dois textos anteriores. a) A leitura é, fundamentalmente, processo político. Aqueles que formam leitores – professores, bibliotecários – desem- penham um papel político. (Marisa Lajolo, A formação do leitor no Brasil. São Paulo: Ática, 1996, p. 28.) b) Pelo que sabemos, quando há um esforço real de igua- litarização, há aumento sensível do hábito de leitura, e portanto difusão crescente das obras. (Antonio Candido, Vários escritos. São Paulo: Duas cidades, 2004, p.187.) c) Ler é abrir janelas, construir pontes que ligam o que somos com o que tantos outros imaginaram, pensaram, escreve- ram; ler é fazer-nos expandidos. (Gilberto Gil, Discurso no lançamento do Ano Ibero-Americano da Leitura, 2004.) d) A leitura é uma forma servil de sonhar. Se tenho de sonhar, por que não sonhar os meus próprios sonhos? (Fernando Pessoa, Páginas íntimas e de Auto-Interpretação. São Paulo: Ática, 1966, p. 23.) Gabarito 01.01. b 01.02. c 01.03. a 01.04. b 01.05. a 01.06. e 01.07. b 01.08. d) Trata-se de um tipo de texto próprio para ser representado, o que pressupõe recurso à linguagem gestual, à sonoplastia e à luminotécnica. Normalmente, não apresenta narrador, como se afirma em [d]. 01.09. e) O gênero lírico privilegia a manifestação de sentimentos pessoais, o dramático representa fatos com presença de atores e o épico busca a ex- teriorização de valores e sentimentos coletivos. “Últimos cantos” de Gonçalves Dias, “Morte e vida Severina ” de João Cabral de Melo Neto e “O Uraguai” de Basílio da Gama ilustram, respectivamente, essas caracterizações. 01.10. 10 (02 + 08) – São incorretas as proposições [01], [04] e [16], pois: [01] – no texto narrativo, as ações podem ser estruturadas cronologicamente ou acompanharem o fluxo psicológico do narrador, o que nem sempre obedece a um ordenamento causal; [04] – além de nem sempre apresentarem temática amorosa, uma das características que diferencia o conto do romance é, grosso modo, a estrutura da narrativa: ação curta com poucos personagens ou várias ações que se entrecruzam entre vários personagens, respectivamente, enquanto novela é uma forma intermediária entre conto e romance; [16] o texto lírico não rejeita a narratividade, pois apesar de centrado no eu lírico pode relatar fatos de forma compreensível e lógica de que é exemplo o poema “I-Juca Pirama”, de Gonçalves Dias. 01.11. c 01.12. c) O texto literário não possui função utilitária. Trata-se de um texto mais artístico, de função estética, muitas vezes, subjetivo, dando margem a diferentes interpretações por parte dos leitores. 01.13. d) Guimarães Rosa, um dos principais representantes do regionalismo brasileiro do Terceiro Tempo do Modernismo, desenvolve temáticas de di- mensão universal, como o do excerto do enunciado em que o narrador descreve o sertão numa linguagem quase mística ou filosófica. Trata-se do início da narrativa apresentada como um imensomonólogo em que Riobaldo conta os casos que viveu, ao mesmo tempo que vai tecendo reflexões sobre os mistérios da condição humana. Assim, é correta a opção [d]. 01.14. c) As proposições I e II são falsas, pois I, no início do segundo parágrafo, o narrador confessa que gostaria de transmitir ao mundo as sensações que o dominam (“Ah, que vontade de escrever bobagens bem meigas, bobagens para todo mundo me achar ridículo”), o que contraria a ideia de ruptura total entre a crônica e o mundo; II nada sugere que as marcas líricas inviabilizem uma crônica, mesmo sendo entendidas como tolices pelo leitor. Como as demais são verdadeiras, é correta a opção [c]. 01.15. d) O sujeito desinencial da oração transcrita em [d] na primeira pessoa do plural- “cuidemos (nós)”- permite deduzir que o narrador se intromete de forma explícita na narrativa. 01.16. a 01.17. 21 (01 + 04 + 16). [02] O gênero lírico pode manifestar-se na poesia, de maneira geral, não há o rigor apontado na afirmativa. Além disso, contos e novelas pertencem ao gênero narrativo. [08] Uma das principais subdivisões do gênero dramático encontra-se no par “comédia” e “tragédia”. 01.18. e 01.19. d) O poema O Grito de José Paulo Paes é constituído de versos decassílabos, adequados aos poemas heroicos e épicos como se afirma em [d]. Exemplo de escansão: Um-tran-qui-lo-ri-a-cho-su-bur-ba (no)/ U-ma-chou-pa-naem-bai-xo- deum-co-quei (ro) 01.20. c) A mensagem da imagem que constitui o primeiro texto explora, humoristicamente, a plurissignificação da expressão “abrir a cabeça”: no sentido literal de golpear com instrumento cortante ou, no sentido conotativo, de proporcionar abertura a novas ideias, não se prendendo a velhos conceitos. Desta forma, a leitura de livros de qualidade, como a obra de Machado de Assis, seria a melhor opção para a transformação positiva do indivíduo, o que também é reafirmado no segmento da carta de Kafka a Oscar Pollak: “Um livro tem que ser como um machado para quebrar o mar de gelo do bom senso e do senso comum”. A frase de Gilberto Gil, transcrita em [C], confirma o mesmo conceito sobre a característica essencial a uma obra com grande valor literário: permitir “abrir janelas” e “construir pontes” entre o que já foi escrito e o que apresenta de novidade ao leitor. 11Português 1D Português 1B1DAula 02 Literatura colonial Quinhentismo Mais do que literatura brasileira, os textos escritos nes- se período (1501-1600) devem ser chamados de literatura sobre o Brasil. São valiosos documentos históricos que serviram de fonte de pesquisa e inspiração para os futuros intelectuais. Esses textos são essencialmente informações sobre a nova terra descoberta, como a carta de Pero Vaz de Caminha, diários e registros de viagens, o teatro de An- chieta e os escritos do Padre Manuel da Nóbrega. Observe um trecho da Carta do achamento, de Caminha. “...esta gente é boa e de boa simplicidade e gravar-se- -á, neles, ligeiramente, qualquer cunho que lhes queiram dar. E logo lhes deu Nosso Senhor bons corpos e bons rostos como a bons homens. Eles não lavram nem criam; nem há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha; nem nenhuma outra alimária que costumada seja ao viver dos homens; nem comem senão desse inhame (mandioca) que aqui há muito; e dessas sementes e frutos que a terra e as árvores de si lançam. E, com tudo isso, andam tais, tão rijos e tão nédios, que o não somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos. Enquanto ali andaram, este dia, sempre dançaram ao som de um tamborim nosso e bailaram com os nossos, de maneira que são muito mais nossos amigos que nós seus.” Barroco Nos séculos XV e XVI (1601 – 1768), a mentalidade mais liberal da filosofia pagã, proposta pelo Renas- cimento, que cultuava o corpo e o prazer, entrou em choque com os rígidos princípios cristãos da ascese, da penitência e da fuga dos prazeres da carne. Para combater o “paganismo” que estava invadindo seus domínios, a Igreja contrarreformista prega uma reli- gião que incute o medo do castigo divino, a insegurança quanto à salvação eterna, o terror das torturas infernais, a imagem de um Deus cruel e vingativo. O homem da época se sente inseguro, temeroso, em dúvida. É então que, no século XVII surge, nas artes plásticas e na literatura, o movimento Barroco, intérprete dos anseios desse homem seiscentista, solicitado simulta- neamente por ideais pagãos e cristãos, em conflito. As características do BARROCO decorrem de sua condição de intérprete dos anseios do homem seiscen- tista solicitado por ideais em conflito. • Fusionismo: tentativa de conciliar e incorporar contrários, daí o emprego marcante das figuras de oposição como antíteses e paradoxos (luz-treva; espírito-matéria). • Religiosidade: sentimento do exílio desta vida, do desengano do mundo, terror do inferno, ânsias do céu, frustração, sentimento trágico da existência. • Rebuscamento: linguagem pomposa e exagerada, gosto pela grandiosidade, excesso de detalhes, uso abusivo de figuras de linguagem. • Sensorialismo: busca do efeito sugestivo de fortes impressões sensoriais para impressionar a vista, o ouvido, o tato, o olfato e o palato. GREGÓRIO DE MATOS GUERRA Poeta baiano nasceu em 1636. De família rica, viveu dos 14 ao 45 anos em Portugal, onde estudou e se formou em Direito. Voltou ao Brasil e passou a viver desregradamente, debochando de todo mundo. Viveu um ano exilado em Angola, morrendo um ano após seu retorno da África, em Recife, aos sessenta anos. Deixou uma obra irregular, dividida em três temáti- cas. I. Poesia sacra e filosófica, composta dentro dos limites impostos pela contrarreforma. Como autor barroco, não poderia faltar em sua obra a poesia religiosa. Essa temática abrange um amplo conjunto, desde os poemas circunstanciais em come- moração a festas de santos até os poemas de contrição e de reflexão moral. Observe. 12 Extensivo Terceirão Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado, Da vossa alta piedade me despido, Porque quanto mais tenho delinquido, Vós tenho a perdoar mais empenhado. Se basta a vos irar tanto um pecado, A abrandar-vos sobeja um só gemido, Que a mesma culpa, que vos há ofendido, Vos tem para o perdão lisonjeado. Se uma ovelha perdida, e já cobrada, Glória tal e prazer tão repentino vos deu, como afirmais na Sacra História: Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada Cobrai-a; e não queirais, Pastor divino, Perder na vossa ovelha a vossa glória Esse soneto de contrição é um dos mais conhecidos poemas de Gregório e segue o modelo conceptista de Quevedo. II. Poesia lírico-amorosa abrange um amplo leque temático. Às vezes é a mais pura idealização do amor: Quem a primeira vez chegou a ver-vos, Nise, e logo se pôs a contemplar-vos, Bem merece morrer por conversar-vos E não poder viver sem merecer-vos. Outras vezes é uma requintada exploração da psi- cologia amorosa, como, por exemplo, na expressão da timidez do amante, temeroso do desprezo da amada: Largo em sentir, em respirar sucinto, Peno e calo, tão fino e tão atento, Que fazendo disfarce do tormento, Mostro que o não padeço e sei que o sinto. Chega também, frequentemente, a um realismo irônico, quase cínico, como nos seguintes versos em que busca definir o amor: Isto, que o Amor se chama, este, que vidas enterra, este, que alvedrios prostra, este, que em palácios entra: [.......................................] este, que o ouro despreza, faz liberal o avarento, é assunto dos poetas: [.......................................] Arre lá com tal amor! isto é amor? é quimera, que faz de um homem prudente converter-se logo em besta. Segundo historiadores, o poeta teve uma paixão não correspondida pela filha de um senhor de engenho, D. Ângela de Sousa Paredes Rabelo e organizou um ciclo dos poemas que seriam expressão desse caso amoroso. Entre eles estão alguns dos mais belos da obra de Gre- gório de Matos. O soneto a seguir é o sétimo poema do ciclo “Ângela”:Anjo no nome, Angélica na cara. Isso é ser flor, e Anjo juntamente, Ser Angélica flor, e Anjo florente, em quem, senão em vós se uniformara? Quem veria uma flor, que a não cortara De verde pé, de rama florescente? E quem um Anjo vira tão luzente, Que por seu Deus o não idolatrara? Se como Anjo sois dos meus altares, Fôreis o meu custódio, e minha guarda, Livrara eu de diabólicos azares. Mas vejo, que tão bela, e tão galharda, Posto que os Anjos nunca dão pesares, Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda. Observe que o nome da amada sugere as duas ima- gens em torno das quais se organiza toda a expressão poética. III. Poesia satírica: O “Boca do Inferno”, como foi cha- mado, não perdoava ninguém: ricos e pobres, negros, brancos e mulatos, padres, freiras, autoridades civis e religiosas, amigos e inimigos, todos, enfim, eram objeto de sua “lira maldizente”. O governador Câmara Coutinho, por exemplo, foi assim retratado: Nariz de embono com tal sacada, que entra na escada duas horas primeiro que seu dono.” Contudo, o melhor de sua sátira não é esse tipo de zombaria, engraçada e maldosa, mas a crítica de cunho geral aos vícios da sociedade. Sua vasta galeria de tipos humanos contribui para construir sua maior e principal personagem – a cidade da Bahia: Aula 02 13Português 1D Senhora Dona Bahia, nobre e opulenta cidade, madrasta dos naturais, e dos estrangeiros madre. Terra que não aparece neste mapa universal com outra; ou são ruins todas, ou ela somente é má. Mas nem sempre o poeta é rancoroso com sua cidade. No famoso soneto “Triste Bahia”, já musicado por Caetano Veloso, Gregório identifica-se com ela, ao com- parar a situação de decadência em que ambos vivem. O poema abandona o tom de zombaria das sátiras para tornar-se um quase lamento: Triste Bahia! ó quão dessemelhante Estás e estou do nosso antigo estado! Pobre te vejo a ti, tu a mim empenhado, Rica te vi eu já, tu a mim abundante. Depreende-se desse texto que as sátiras de Gregório de Matos desagradavam a muita gente. Por isso ele defende seu direito de escrevê-las. Aos vícios Eu sou aquele, que os passados anos cantei na minha lira maldizente torpezas do Brasil, vícios e enganos. [.......................................................] De que pode servir calar quem cala? Nunca se há de falar o que se sente! Sempre se há de sentir, o que se fala? Qual homem pode haver tão paciente, Que vendo o triste estado da Bahia, Não chore, não suspire e não lamente? [..........................................................] Se souberas falar, também falaras, Também satirizaras, se souberas, E se foras Poeta, poetizaras. A ignorância dos homens destas eras Sisudos faz ser uns, outros prudentes, Que a mudez canoniza bestas feras. Há bons, por não poder ser insolente, Outros há comedidos de medrosos, Não mordem outros não, por não ter dentes. Quantos há que os telhados têm vidrosos, E deixam de atirar sua pedrada De sua mesma telha receosos. Uma só natureza nos foi dada: Não criou Deus os naturais diversos, Um só Adão formou, e esse de nada. Todos somos ruins, todos perversos, Só nos distingue o vício e a virtude, De que uns são comensais outros adversos. Quem maior a tiver, do que eu ter pude, Esse só me censure, esse me note, calem-se os mais, chitom, e haja saúde. IV. Poesia burlesca é a poesia mais circunstancial de Gregório de Matos. De modo sempre galhofeiro, o poeta registra em versos pequenos acontecimentos da vida cotidiana da cidade e dos engenhos. Alguém já disse que a poesia burlesca é a crônica do viver baiano seiscentista. A maior parte desses poemas burlescos foi escrita na última fase da vida do poeta, período de decadência pessoal e profissional. O doutor deixara de advogar e perambulava pelos engenhos do Recôncavo levando sua viola de cabaça, frequentando festas de amigos e namorando as mulatas, muitas delas prostitutas. Compostos em tom brincalhão, esses textos podem frequentemente tornar-se obscenos. Daí, o ‘populismo’ chulo que irrompe às vezes e, longe de significar uma atitude aristocrática, nada mais é que válvula de escape para velhas obsessões sexuais ou arma para ferir os poderosos invejados. Acompanhe: Décimas Quita, como vos achais com esta troca tão rica? eu vos troco por Anica, vós por Nico me deixais: vós de mim não vos queixais, eu, Quita, de vós me queixo, e pondo a cousa em seu eixo, a mim com razão me tem, pois me deixais por ninguém, e eu por Arnica vos deixo. Vós por um Dom Patarata trocais um Doutor em Leis, e eu troco, como sabeis, uma por outra Mulata: vós fostes comigo ingrata com a grosseira ingratidão, eu não fui ingrato não, e quem troca odre por odre, um deles há de ser podre, 14 Extensivo Terceirão e eu sou na troca odre são. Eu com Anica querida me remexo como posso, vós c’o Patarata vosso estareis bem remexida: nesta desigual partida leve o diabo o enganado, porque eu acho no trocado, que me vim a melhorar mas na Moça por soldar, que vós no Moço soldado Se bem vos não vai na troca pela antiga benquerença, que farei logo a destroca: porém se Amor vos provoca a dar-me outros novos zelos, hemos de lançar os pelos ao ar por seguridade, e eu sei, que a vossa amizade há de custar-me os cabelos. Soneto bem conhecido A cada canto um grande conselheiro Que nos quer governar cabana e vinha, Não sabem governar sua cozinha, E podem governar o mundo inteiro. Em cada porta um frequentado olheiro, Que a vida do vizinho, e da vizinha, Pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha Para a levar à Praça, e ao Terreiro. Muitos mulatos desavergonhados, Trazidos pelos pés os homens nobres, Posta nas palmas toda a picardia. Estupendas usuras nos mercados, Todos, os que não furtam, muito pobres, e eis aqui a cidade da Bahia Apesar de ter feito linda poesia sacra e lírica, foi como poeta satírico que o “Boca do Inferno” se destacou. Em seus sonetos (2 quartetos e 2 tercetos), oitavas (estrofes de 8 versos), décimas (estrofes de 10 versos) e poemas de diversas formas, Gregório de Matos não perdoa ninguém, rico ou pobre, homem ou mulher, inimigo ou não. Assim, o poeta “abrasileirou” a linguagem inserindo em suas poe- sias palavras nativas e palavrões chulos, usando sempre o estilo barroco de mostrar uma visão de mundo conflituosa. PADRE ANTÔNIO VIEIRA Pe. Antônio Vieira (1608–1697) pode considerar-se com toda a razão um autor tanto português como bra- sileiro não devido apenas ao fato de nascer em Lisboa e de ter morrido na Bahia. Vieira tem o que dizer tanto aos brasileiros como aos portugueses. Mas não só isso. A obra vieiriana pode ser destinada aos habitantes de todo o mundo. Não se dirige apenas ao homem barroco, mas também ao homem dos nossos dias, pregando nos temas que continuam a ser atuais. Para caracterizar Pe. Antônio Vieira como o escritor e pregador excelente e também como homem extraordinário, citamos as palavras de Hernâni Cidade : “…a vivacidade permanente de uma in- teligência ao mesmo tempo lúcida e engenhosa, de uma imaginação dotada de todos os recursos para comover, encantar, fazer sorrir, de uma sensibilidade permeável a toda a radiação da beleza das coisas e das palavras e capaz de captar e transmitir pelo modo mais sugestivo e aliciante, e teremos uma imagem de qual seria a sedução deste mago da palavra!…” Antônio Vieira é considerado o maior pregador da Língua Portuguesa, o “príncipe dos pregadores”. Foi um ferrenho defensor do catolicismo e da expansão territorial portuguesa. Embora muitos de seus sermões apresentem verdadeira pérolas de sabedoria, e seu vocabulário seja rico e abundante, nota-se com evidente clareza a fami- gerada idolatria católica pelos seus “santos” e o eterno preconceito contra os protestantes. Isso, aliás, explicado pelo próprio contexto histórico no qual ele estava inse- rido, uma vez que ele não estava tão distante assim da Reforma Protestante de Martinho Lutero. Além de insigne orador, Vieira foiconselheiro real e diplomata de D. João IV, missionário, alcunhado pelos índios “Payassu” (O Padre Grande) e, sobretudo, autor dos famosos sermões. Vieira é autor de aproximadamente 200 sermões e é considerado o maior orador sacro de Portugal. Na época dele o sermão possibilitava que a palavra do pregador fa- lasse para todas as camadas sociais. E os sermões de Vieira abrangem não só a temática teológica, mas também as questões da moralidade, da filosofia e da política. Como missionário e grande defensor dos índios aparece Vieira, sobretudo no famoso Sermão de Santo Antônio aos peixes. Também no Sermão da Sexagési- ma do ano de 1655 encontramos o tema da defesa dos direitos humanos dos índios. Arcadismo As tendências estéticas do ARCADISMO figuram-se como a busca do natural e do simples, a adoção de es- quemas rítmicos mais graciosos, de um estilo mais me- lífluo, musicalmente fácil e ajustado a temas bucólicos (ligados à vida no campo). Aula 02 15Português 1D Torno a ver-vos, ó montes; o destino aqui me torna a pôr nestes oiteiros; onde um tempo os gabões deixei grosseiros pelo traje da Corte rico e fino. ... Se o bem desta choupana pode tanto, que chega a ter mais apreço e mais valia, que da Cidade o lisonjeiro encanto; Aqui descanse a louca fantasia; e o que te agora se tornava em pranto, se converta em afetos de alegria. 03. Texto Quem vê girar a serpe da irmã no casto seio, Pasma, e de ira e temor ao mesmo tempo cheio Resolve, espera, teme, vacila, gela e cora, Consulta seu amor e o seu dever ignora. Voa a farpada seta da mão, que não se engana; Mas ai, que já não vives, ó mísera indiana! Nestes versos de Silva Alvarenga, poeta árcade e ilustrado, faz-se alusão ao episódio da obra O Uraguai, de Basílio da Gama, em que a heroína Lindoia morre. 04. A poesia árcade de Tomás Antônio Gonzaga, embora ainda presa ao padrão estético europeu do século XVIII, já manifesta aspectos nativos, expressando de- talhes significativos do contexto histórico-geográfico brasileiro, como está exemplificado em: Tu não verás, Marília, cem cativos tirarem o cascalho e a rica terra, ou dos cercos dos rios caudalosos, ou da minada serra. 05. A imagem mítica de uma natureza harmônica, capaz de inspirar o desejo do equilíbrio racional e da vida simples, constitui uma espécie de paradigma da po- esia neoclássica, como se pode perceber nos versos: Pois que viva eu em paz, em calma pura, Abrandando a paixão nestes ribeiros, Aspirando dos álamos a brandura, Ouvindo ao vento os cantos mais inteiros. Em nome do equilíbrio e do bom gosto, o Arcadismo adota um estilo de pensamento voltado para o racional, o claro, o regular, o verossímil. (Alfredo Bosi) O Arcadismo brasileiro: a) tem suas fontes nos antigos grandes autores gregos e latinos, dos quais imita os motivos e as formas; b) legou-nos poemas de feição épica como Caramuru (de Frei José da Santa Rita Durão) e O Uraguai (de Basílio da Gama) no qual se reconhece qualidade mais destacada em relação ao primeiro; c) inspirou a produção dos versos de Marília de Dirceu, obra que celebrizou Tomás Antônio Gonzaga, e que destaca a originalidade de estilo e de tratamento local dos temas pelo autor; d) apresentou uma corrente de conotação ideológica, envolvida com as questões sociais de seu tempo, com a crítica aos abusos de poder da Coroa Portuguesa, como em Cartas chilenas, de Tomás Antônio Gonzaga. Análise de textos 01. Tomás Antônio Gonzaga, poeta árcade, conheceu Maria Doroteia Joaquina de Seixas, por volta de 1782. A partir dessa época, essa jovem amada aparece em suas Liras com o pseudônimo de Marília. O texto a seguir foi tirado da Lira I, parte 1. Os teus olhos espalham luz divina, a quem a luz do sol em vão se atreve; papoila ou rosa delicada e fina e cobre as faces que são da cor da neve. Os teus lindos cabelos são uns fios d’ouro; teu lindo corpo bálsamos vapora. Ah! não, não fez o Céu, gentil Pastora, para glória de Amor igual Tesouro. Graças, Marília bela, Graças à minha estrela! Percebe-se, no fragmento, um tom de sensualidade, marcado pelo uso de expressões que se referem a sensações visuais, táteis e olfativas. A figura da mulher é apresentada em partes: olhos, face, cabelos e corpo, em um processo de composição que associa expressões denotativas a expressões conotativas. 02. O poema a seguir, de Cláudio Manuel da Costa, manifesta o conflito do poeta, homem nativista pro- vinciano, ligado à terra natal, cuja formação superior deu-se na metrópole. 16 Extensivo Terceirão 06. Que havemos de esperar, Marília bela? que vão passando os florescentes dias? as glórias que vêm tarde, já vêm frias, e pode enfim mudar-se a nossa estrela. – A mesma formosura é dote que só goza a mocidade: rugam-se as faces, o cabelo alveja mal chega a longa idade. A constatação da passagem do tempo leva o poeta a defender a mentalidade do carpe diem – aproveitar a vida enquanto há tempo. 07. Bucolismo – Pastores que levais ao monte o gado, / vede lá como andais por essa serra. / que para dar contá- gio a toda a terra, / basta ver-se o meu rosto ma- goado. 08. Críticas do governo – Passam, prezado amigo, de quinhentos / os presos que se ajuntam na cadeia. / uns dormem encolhidos sobre a terra, / mal cobertos dos tra- pos, que molharam / de dia, no trabalho. Testes Assimilação 02.01. Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas. O movimento literário denominado Barroco tem no padre Antônio Vieira uma de suas grandes expressões. Em sua vasta obra, incluem-se em que aborda temas , e . a) sermões satíricos historiográficos religiosos b) sermões sociais políticos religiosos c) poemas religiosos satíricos místicos d) cartas amorosas historiográficos sociais e) epístolas políticos amorosos místicos 02.02. (UPF – RS) – O poeta baiano Gregório de Matos, também chamado de Boca do Inferno, produziu uma obra que explora temas contrastantes. Assinale a alternativa que não apresenta uma vertente temática de sua obra. a) o satanismo; c) o lirismo amoroso; e) a sátira aos costumes. b) a religiosidade; d) o erotismo; 02.03. (UCSal – BA) – Os versos abaixo pertencem ao poeta Gregório de Matos. Que falta nessa cidade? – Verdade Que mais por sua desonra? – Honra Falta mais que se lhe ponha? – Vergonha O demo a viver se exponha Por mais que a fama se exalta, Numa cidade onde falta Verdade, honra, vergonha. Assinale a alternativa em que se apontam, corretamente, características da arte do poeta, presentes nesses versos. a) Alegoria religiosa: dramatização dos vícios, fortes antíteses e pensamento paradoxal. b) Lírica irônica: excesso de metáforas, de inversões sintáticas e de antíteses. c) Sátira de costumes: excesso de metáforas, simetrias sintáticas e sentimento de melancolia. d) Poesia encomiástica: exaltação de virtudes próprias, condenação dos vícios alheios e dedicatória a um poderoso. e) Sátira moralizante: jogo verbal, simetrias sintáticas e sonoridade expressiva. 02.04. (UFV – MG) – Todos os frag- mentos abaixo representam, pela linguagem ou pela temática, o movi- mento árcade brasileiro, exceto: a) A mesma formosura / é dote que só goza a mocidade: / rugam-se as faces, o cabelo alveja / mal chega a longa idade. b) Pastores que levais ao monte o gado, / vede lá como andais por essa serra. / que para dar contágio a toda a terra, / basta ver-se o meu rosto magoado. c) Passam, prezado amigo, de qui- nhentos / os presos que se ajuntam na cadeia. / uns dormem encolhi- dos sobre a terra, / mal cobertos dos trapos, que molharam / de dia, no trabalho. d) Que havemos de esperar, Marília bela? / que vão passando os flo- rescentes dias? /as glórias que vêm tarde, já vêm frias, / e pode enfim mudar-se a nossa estrela. e) Oh! Que saudades que eu tenho / da aurora da minha vida, / da minha infância querida / que os anos não trazem mais. Aula 02 17Português 1D Aperfeiçoamento 02.05. (PUCCAMP – SP)– A imagem mítica de uma natureza harmônica, capaz de inspirar o desejo do equilíbrio racional e da vida simples, constitui uma espécie de paradigma da poesia neoclássica, tal como se pode perceber nestes versos: a) O Demo a viver se exponha Por mais que a fama a exalta, Numa cidade onde falta Verdade, honra, vergonha. b) O vocábulo puro, em que me amparo, Esquiva-se a meu jugo; e raro canto. Que a palavra da boca é sempre inútil Se o sopro não lhe vem do coração. c) Pois que viva eu em paz, em calma pura, Abrandando a paixão nestes ribeiros, Aspirando dos álamos a brandura, Ouvindo ao vento os cantos mais inteiros. d) A morte é limpa. Cruel mas limpa. Com seus aventais de linho – Fâmula – esfrega as vidraças. Tem punhos ágeis e esponjas. e) O poema é uma pedra no abismo. O eco do poema desloca os perfis. Para bem das águas e das almas Assassinemos o poeta. 02.06. Texto (...) Se o rio levantando me causava, Levando a sementeira, prejuízo, Eu alegre ficava, apenas via Na tua breve boca um ar de riso. Tudo agora perdi; nem tenho o gosto De ver-te ao menos compassivo o rosto. Propunha-me dormir no teu regaço As quentes horas da comprida sesta, Escrever teus louvores nos olmeiros, Toucar-te de papoilas na floresta. Julgou o justo céu que não convinha Que a tanto grau subisse a glória minha. Tomás Antônio gonzaga, Marília de Dirceu. Nesse fragmento, o eu lírico revela sofrimento físico e moral; há a predominância de um tom trágico, de desalento, de revolta e de amargura. Nele, o poeta manifesta características como a) o sentimentalismo e a subjetividade. b) a impessoalidade e o sentimentalismo. c) a indiferença e a dúvida. d) o sentimentalismo e a objetividade. e) a esperança e a objetividade. 02.07. Texto Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pre- gadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da ter- ra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, haven- do tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? (...) Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, ser- vem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? (...)” Pe. Antônio Vieira. Sermão de Santo Antônio O jesuíta, Pe. Antônio Vieira, pregou o Sermão de Santo An- tônio em 1654, em São Luís do Maranhão. Acerca do estilo e do contexto histórico em que a obra de Padre Vieira se desenvolve, analise as afirmativas a seguir. 1. A prosa de Vieira é marcada pelo “jogo de ideias”, processo argumentativo caracterizado pelo raciocínio lógico (con- ceptismo), um dos traços da linguagem literária do Barroco. 2. Ao atribuir a Cristo a analogia entre o sal e os pregadores, Vieira intensifica seu poder de persuasão com um forte argumento de autoridade. 3. O teor do texto evidencia que o pregador tem intenções essencialmente espirituais, desprovidas de qualquer caráter ideológico ou político. 4. É fato que Vieira usou o púlpito para denunciar a crueldade do colonialismo português e sua violência contra índios e negros. Estão corretas a) 1 e 3, apenas. d) 2 e 3, apenas. b) 1 e 4, apenas. e) 1, 2, 3 e 4. c) 1, 2 e 4, apenas. 02.08. (UNIOESTE – PR) – Autor de versos líricos, sacros e satíricos, Gregório de Matos Guerra refletiu um tema comum da poesia universal: o tema do carpe diem (aproveita a vida). Assinale a alternativa onde este tema aparece. a) Oh não aguardes, que a madura idade te converte esta flor, essa beleza, em terra, em cinza, em pó, em sombra, em nada. b) Não se sabendo parte deste todo, um braço que lhe acharam sendo parte, nos diz as partes todas deste todo. c) Esta razão me obriga a confiar, Que, por mais que peguei, neste conflito Espero em vosso amor de me salvar. d) Arrependido estou de coração, de coração vos busco, dai-me abraços, abraços, que me rendem vossa luz. e) Pois alto! Vá descendo onde jazia, Verá quanto melhor se lhe acomoda Ser homem embaixo do que burro em cima. 18 Extensivo Terceirão 02.09. A literatura do início colonial brasileiro caracteriza- -se por ser: a) uma literatura que se restringe a mera cópia da produção literária europeia; b) uma manifestação do espírito brasileiro voltado para a valorização das grandes descobertas; c) um conjunto de obras caracterizadas por acentuado lirismo; d) uma fase cujas obras se destinaram principalmente a tornar conhecida a nova terra; e) uma série de composições épicas apresentadas em prosa e em verso. 02.10. Texto AOS AFETOS E LÁGRIMAS DERRAMADAS NA AUSÊNCIA DA DAMA A QUEM QUERIA BEM Ardor em firme coração nascido; Pranto por belos olhos derramado; Incêndio em mares de água disfarçado; Rio de neve em fogo convertido: Tu, que em um peito abrasas escondido; Tu, que em um rosto corres desatado; Quando fogo, em cristais aprisionado; Quando cristal em chamas derretido. Se és fogo como passas brandamente, Se és neve, como queimas com porfia? Mas ai, que andou Amor em ti prudente! Pois para temperar a tirania, Como quis que aqui fosse a neve ardente, Permitiu parecesse a chama fria. Considere as afirmativas sobre o soneto de Gregório de Matos Guerra: I. Exemplifica a estética barroca e, dentro dela, o cultismo (malabarismo com as palavras). II. O caráter paradoxal do amor, ou seja, a oposição sensuali- dade/refreamento, é desenvolvido através de impressões sensoriais. III. A estrutura paralelística sustenta o jogo de imagens característico da retórica barroca. É certo concluir que: a) apenas a I está correta; b) apenas a II está correta; c) apenas a III está correta. d) apenas a I e a III estão corretas; e) a I, a II e a III estão corretas. 02.11. (MACK – SP) – A poesia árcade de Tomás Antônio Gonzaga, embora ainda presa ao padrão estético europeu do século XVIII, já manifesta aspectos nativos, expressando detalhes significativos do contexto histórico-geográfico brasileiro. Esse registro poético da vida colonial está exemplificado em: a) Apenas, Doroteu, o nosso chefe / as rédeas manejou do seu governo, / fingir nos intentou que tinha uma alma / amante da virtude. b) Enquanto pasta alegre o manso gado, / minha bela Marília, nos sentemos / à sombra deste cedro levantado. c) Tu não verás, Marília, cem cativos / tirarem o cascalho e a rica terra, / ou dos cercos dos rios caudalosos, / ou da minada serra. d) Num sítio ameno, / cheio de rosas, / de brancos lírios, / murtas viçosas, / dos seus ovelhinhas tiro o leite, / e mais as finas lãs, de que me visto. 02.12. (UFRGS) – Sobre a poesia de Gregório de Matos Guerra é correto afirmar que: a) privilegia os cenários bucólicos percorridos por pastores e ninfas examinados de uma perspectiva satírica e irônica. b) expõe em sintaxe complexa e com metáforas antité- ticas os dilemas do amor e do espírito no quadro da Contrarreforma. c) expõe em sintaxe simples o caráter sereno e amoroso de um pastor que corteja sua amada com promessas de vida amena e burocrática. d) privilegia o cenário urbano para denunciar as arbitrarieda- des da Inquisição e o racismo dos portugueses instalados na colônia. e) privilegia os cenários palacianos em que ocorrem intrigas e conspirações envolvendo nobres burocratas, monges e prostitutas. 02.13. (USF – SP) – Texto Aduladores Santo Agostinho, doutor em toda esta matéria primaz, com doutrina tirada da escola de Davi, ensina que há dois gêneros de inimigos, uns que perseguem, outros que adulam; mas que mais se há de temer a língua do adulador, que as mãos do perseguidor.(...) A mão do perseguidor arma- -se com a espada, com a lança, com a seta, com o veneno, e com todos os outros instrumentos de ferir e matar, que a fúria e violência do fogo acrescentou à dureza do ferro; e contudo diz o maior doutor da Igreja, que mais se há de temer a língua desarmada do adulador que todas as armas do perseguidore do inimigo. (...) As palavras brandas do adulador são redes que ele arma para tomar nelas o mesmo adulado. (...) Uns autores comparam estes aduladores ao camaleão, que não tendo cor certa nem própria, Aula 02 19Português 1D se reveste e pinta de todas as cores, quaisquer que sejam, as do objeto vizinho. Outros os comparam à sombra que não tem outra ação, figura ou mo- vimento que a do corpo interposto à luz, do qual nunca se aparta, e sempre e para qualquer parte o segue. Outros os comparam ao espelho, retrato natural e recíproco de quem nele se vê porque se lhe pondes os olhos, olha para vós; se rides, ri; se chorais, chora; lágrimas porém sem dor e riso sem alegria, que não fora o espelho adulador, assim não fora. Mas como o camaleão, a sombra e o espelho, tudo são assistentes mudos, a compa- ração de santo Agostinho é a mais própria e seme- lhante de todas; porque os comparou ao eco. (...) Biante, um dos sete sábios da Grécia, perguntado qual era o animal mais venenoso, respondeu que, dos bravos o tirano, dos mansos o adulador. Em chamar veneno a adulação, acertou-lhe o nome; mas em distinguir o tirano do adulador, não disse bem: porque, “como acabamos de demonstrar”, todo adulador é tirano. VIEIRA, Antônio, Sermão da primeira sexta-feira, 1644. De acordo com o texto, a) O adulado gosta de estimular a atitude do adulador. b) O inimigo mais temido, para Santo Agostinho, é aquele que ataca com armas. c) A comparação do bajulador com o espelho equivale a considerar aquele cultor da própria imagem. d) A imagem do adulador-sombra conota fidelidade e proteção. e) A comparação mais adequada é de Santo Agostinho, pois ressalva a subserviência explícita do adulador. 02.14. No texto, aparece a) A linguagem cultista. b) O uso intensivo de hipérboles. c) O pensamento marcado pela religiosidade. d) A retórica aprimorada e respaldada no jogo de conceitos. e) O uso de símbolos conotando a fugacidade das coisas. 02.15. Leia atentamente o texto. Ora suposto que somos pó, e não pode deixar de ser, pois Deus o disse, perguntar-me-eis, e com muita razão, em que nos distinguimos logo, os vivos dos mortos? Os mortos são pó, nós também somos pó; em que nos distinguimos uns dos ou- tros? Distinguimo-nos os vivos dos mortos, assim como se distingue o pó do pó. Os vivos são pó levantado, os mortos são pó caído; os vivos são pó que anda, os mortos são pó que jaz: Hic jacet. Estão essas praças no verão cobertas de pó: dá um pé de vento, levanta-se o pó no ar e que faz? O que fazem os vivos, e muito vivos. Não aquieta o pó, nem pode estar quedo; anda, corre, voa; entra por esta rua, sai por aquela; já vai adiante, já torna atrás, tudo enche, tudo cobre, tudo envolve, tudo perturba, tudo toma, tudo cega, tudo penetra; em tudo e por tudo se mete, sem aquietar nem sossegar um momento, enquanto o vento dura. Acalmou o vento: cai o pó, e onde o vento parou, ali fica; ou dentro de casa, ou na rua, ou em cima de um telhado, ou no mar, ou no rio, ou no monte, ou na campanha. Não é assim? Assim é. E que pó, e que vento é este? O pó somos nós: Quia pulvis es; o vento é a nossa vida: Quia ventus est vita mea. Deu o vento, levantou-se o pó; parou o vento, caiu. Deu o vento, eis o pó levantado; estes são os vivos. Parou o vento, eis o pó caído; estes são os mortos. Os vivos pó, os mortos pó; os vivos pó levantado; os mortos pó caído; os vivos pó com ven- to, e por isso vãos; os mortos pó sem vento, e por isso sem vaidade. Esta é a distinção, e não há outra.” (Sermão da Quarta-Feira de Cinzas) Avalie as afirmativas. 1. O excesso de repetições e de exemplos, no intuito de deta- lhar a argumentação para melhor firmar a ideia, caracteriza o conceptismo barroco. 2. Uma das qualidades poéticas do texto está no ritmo e na simetria que o autor obtém com o uso das repetições, o que confere musicalidade à prosa e colabora para atrair o receptor. 3. Pó é metáfora para «matéria» e «pessoas»; «vento» é me- tonímia para «vida». 4. Ao lembrar que os vivos e os mortos são pó, Vieira faz um discurso teocêntrico: quer dizer que a vida pertence a Deus, condenando assim o materialismo e a vaidade antropocên- trica. 5. No segundo parágrafo, o autor confere ao pó a autonomia de seu movimento, metaforizando desse modo a capaci- dade da razão humana. Estão corretas. a) 1, 3 e 4. b) 1, 2 e 3. c) 2, 3, 4 e 5. d) 2 e 3. e) 1, 3 e 5. 02.16. (UFPR) – Leia atentamente o poema: SONETO Carregado de mim ando no mundo, E o grande peso embarga-me as passadas, Que como ando por vias desusadas, Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo. 20 Extensivo Terceirão O remédio será seguir o imundo Caminho, onde dos mais vejo as pisadas, Que as bestas andam juntas mais ousadas, Do que anda o engenho mais profundo. Não é fácil viver entre os insanos, Erra, quem presumir que sabe tudo, Se o atalho não soube dos seus danos. O prudente varão há de ser mudo, Que é melhor neste mundo, mar de enganos, Ser louco c’os demais, que só, sisudo. (WISNIK, J. M. “Prefácio”. Poemas escolhidos de Gregório de Matos. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p.23). A poesia satírica de Gregório de Matos emprega modelos e procedimentos variados. José Miguel Wisnik indica que ela pode ser entendida como “uma luta cômica entre duas sociedades, uma normal e outra absurda”. Com base nisso, é correto dizer que este soneto a) apresenta a imagem de um “mundo às avessas”, em que a maioria aceita a sociedade absurda como se fosse a ideal. b) desenha a sociedade ideal e utópica, que deverá ser alcançada no futuro. c) explora a dualidade conflituosa entre corpo e espírito e associa a vertente satírica à sacro-religiosa. d) apresenta um sujeito poético “sisudo e só”, o que retira do soneto o tom cômico que caracteriza a sátira. e) apresenta a crítica aberta e racional como solução para o estado insano do mundo. 02.17. (FIC – PR) – O poema abaixo foi escrito por Gregório de Matos Guerra, no século XVII. AO GOVERNADOR ANTÃO DE SOUSA DE MENESES CHAMADO VULGARMENTE O “BRAÇO DE PRATA” Sor Antão de Sousa de Meneses, Quem sobe a alto lugar, que não merece, Homem sobe, asno vai, burro parece, Que o subir é desgraça muitas vezes. A fortunilha, autora de entremezes, Transpõe em burro o herói que indigno cresce; Desanda a roda, e logo o homem desce, Que é discreta a fortuna em seus reveses. Homem sei eu que foi Vossenhoria Quando o pisava da fortuna a roda; Burro foi ao subir tão alto clima. Pois, vá descendo do alto onde jazia, Verá quanto melhor se lhe acomoda Ser homem em baixo que burro em cima. Assinale a alternativa incorreta a respeito do poema acima. a) A forma do poema – soneto em decassílabos, vinculado a uma tradição clássica de temas sublimes – contrasta com o conteúdo de cunho satírico, vazado numa linguagem mais coloquial. É um contraste compreensível no âmbito do Barroco. b) Na primeira estrofe, o poeta utiliza metáforas para des- qualificar aquele que assume alta posição de mando (no caso, no governo) sem atributos e credenciais para tal. c) A segunda estrofe desenvolve a mesma tese da primeira: um homem só é digno se assume um lugar adequado a sua natureza; a pretensão à posição superior por meio de cobiça e bravata configurará a inépcia, a imoralidade, a corrupção. d) A “roda da fortuna” é metonímia para o destino da vida. E quando apela para que o governador desça de onde jazia, o poeta sugere que o político deve estar entre o povo para atender a suas necessidades e demandas. e) A mensagem do poema se encaixa perfeitamente no quadro político atual, sugerindo que, em termos morais e políticos, o Brasil não mudou muito. 02.18. (UFPR) – Considerando a poesia de Gregório de Ma- tos e o momento literário em que sua obra se insere, avalie as seguintes afirmativas: 1. Apresentando a luta do homem no embate entre a carne e o espírito, a terra e o céu, o presente e a eternidade, os poemas religiosos do autor correspondem à sensibilidade da
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