Buscar

Apresentação1 GESTALT

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

Da teoria à terapia: o jeito de ser da gestalt
From the theory to the therapy: the way of being of gestalt
Segundo William Shakespeare (1564-1616), ‘Você faz suas escolhas
e suas escolhas fazem você’. Essa frase de gênio, de alguém que não era
psicólogo, mas que entendia, ou pelos menos tentava compreender, a
complexidade da existência e, sobretudo, do ser humano, parece refletir
a experiência-vivência de ser um gestalt-terapeuta. O indivíduo escolhe a
Gestalt-terapia e a Gestalt-terapia escolhe o indivíduo.
	
	A Gestalt-terapia trabalha os sentimentos do outro, a fim de que esse outro cumpra sua missão, perceba-se vivo e dinâmico e, sobretudo, cheio de infinitas possibilidades. O gestalt-terapeuta assume, portanto, função de catalisador da auto-percepção de si mesmo e do mundo, popularmente conhecida como awareness, a redescoberta de que ainda se está vivo e pronto para fechar velhas portas, atravessar novas janelas e fazer outros contatos plenos, necessitando, o gestalt-terapeuta, senti realmente a interconexão de todas as coisas e ser um ser-no-mundo, tendo também consciência de sua própria consciência e do seu importantíssimo papel nessa redescoberta do outro. No dizer do personagem Melquíades, no livro Cem anos de solidão, “as coisas (todas) têm vida própria. Tudo é uma questão de despertar a sua alma” (MÁRQUEZ, 2009).
DA PSICOLOGIA DA GESTALT À GESTALT-TERAPIA
Gestalt é uma palavra alemã que não possui tradução exata para
o português ou para qualquer outra língua, mas que, segundo Braghirolli
et al (1997), significa, aproximadamente, o todo, a estrutura, a forma, a
organização. Engelmann (2002) credita isso ao fato de desde o século XIX
o substantivo alemão “Gestalt” possuir dois significados: um como forma e
outro como entidade concreta. Este último foi utilizado pelos gestaltistas
de Berlim; por isso não se encontra a palavra em outras línguas, de modo
que quando escreviam em outro idioma decidiam mantê-la no original.
Mais do que Gestalt, Ginger e Ginger (1995) colocam que o corretomesmo
seria dizer Gestaltung, pois indica ação prevista, acabada ou ainda em
curso, implicando assim um processo de “formação”.
A Teoria da Gestalt ou psicologia da Gestalt, afirma, entre outras
coisasque não se pode ter conhecimento do todo por meio das partes, e
sim das partes por meio do todo; os conjuntos possuem leis próprias e que
são regidas por seus elementos (e não o contrário, como antes se pensava);
e só por intermédio da percepção da totalidade é que o cérebro pode
de fato perceber, decodificar e assimilar uma imagem ou um conceito.
Schultz e Schultz (2001) citam duas grandes influências para essa noção
gestaltista da percepção: o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804),
com a sua ênfase na unidade de um ato perceptivo, e o movimento fenomenológico,
quando refere à descrição imparcial da experiência imediata
tal como ela ocorre.
Ginger e Ginger (1995) conceituam Gestalt como a psicologia
segundo a qual o campo receptivo se organiza de maneira espontânea,
sob a forma de conjuntos estruturados e significantes. Não se pode reduzir
a percepção de uma totalidade à soma dos estímulos percebidos, uma vez
que o todo é diferente de suas partes. Máxima essa atribuída aos gestaltistas
que Engelmann (2002), por outro lado, considera errada, afirmando
que a psicologia da Gestalt é anterior à existência das partes, pois a Gestalt
de início vai ser dividida em partes.
 De acordo com Rodrigues (2006), a psicologia da Gestalt foi um campo estritamente experimental, que se ocupou em trazer questionamentos que foram contrários à visão mecanicista (causa-efeito) e à atomística (que tem o átomo como a menor parte ou elemento constitutivo das coisas). Psicologia da Gestalt e Gestalt-terapia são, portanto, campos de atuação diferentes e preocupações distintas. Enquanto a psicologia da Gestalt foi um campo de pesquisa que trouxe novas perspectivas para entender a maneira com a qual o homem se relaciona com o mundo, a Gestalt-terapia se preocupa com o campo clínico, com as técnicas de trabalho e estudos que visam dar ao homem as condições necessárias para seu próprio crescimento
 Fritz Perls (1893-1970) é tido como o criador da Gestalt-terapia, que alémde ser uma psicoterapia é também compreendida como uma autêntica filosofia existencial, uma “arte de viver”. Essa forma particular de conceber as relações do indivíduo com o mundo enfatiza a tomada de consciência da experiência atual (“o aqui e o agora”, que inclui o ressurgimento eventual de uma vivência antiga) e reabilita a percepção emocional e corporal, pondo em destaque os processos de bloqueio, quando desmascara evitações, medos e inibições, assim como as ilusões, deixando claro que cada um é responsável por suas escolhas e suas evitações (GINGER; GINGER, 1995).
	A princípio, de acordo com Ginger e Ginger (1995), Perls, no ano do “batismo oficial” da nova terapia, 1951, nomeara seu método terapêutico de “terapia da concentração”, em oposição ao método psicanalítico da livre associação. Entretanto, essa concentração do cliente no presente, na experiência vivida no “aqui e agora”, à época já não passava de um mero aspecto técnico, levando Perls a sugerir “Gestalt-terapia”, um nome mais global para o novo método. Apesar dos protestos dos pesquisadores gestaltistas, que acreditavam que o método de Perls não se encaixava na Teoria da Gestalt, o termo prevaleceu e se impôs em todo o mundo.
	Para Perls, Hefferline e Goodman (1997), a Gestalt-terapia se alimenta da noção da psicologia da gestalt clássica. Advém, portanto, de um conjunto de dados sem fim e rudimentar que é apresentado pelo ambiente e organizado e moldado pelo sujeito da percepção em “todos” que possuem forma e estrutura. “Todos” que são subjetivamente estruturados, e não os dados brutos incognoscíveis componentes da experiência de uma pessoa. De acordo com Braghirolli et al (1997), os gestaltistas ilustram essa noção de “todo” mostrando que uma melodia, por exemplo, não pode ser decomposta em suas notas musicais componentes sem que perca a estrutura que a identifica e, inversamente, se constituirá na mesma melodia tocada com outras notas (por exemplo, com uma mudança de escala).
Dessa perspectiva do “todo”, atribui-se à Gestalt um conceito
holístico, no qual tudo está interconectado entre si, como fazendo parte, em essência, da mesma coisa, do mesmo todo que move o Universo.
Quem pontua essa questão muito bem é Ginger e Ginger
(1995, p. 84):
A visão holística da Gestalt se insere, é evidente, nessa percepção do mundo que poderíamos qualificar de taoísta – em que nunca interessa ao terapeuta um sinal isolado, um gesto ou uma palavra, até um comportamento complexo mais elaborado, mas antes a interconexão permanente do indivíduo global com seu meio geral, social e cósmico, o todo num fluxo incessante que
só podemos apreender por uma vigilância constante, no aqui e agora, com seu cortejo ininterrupto de Gestalts que se formam, se realizam e se dissolvem num processo em perpétua turbulência.
Dentro desse fluxo contínuo, a experiência do self (eu) varia de tamanho
e finalidade dependendo do que esteja acontecendo. Pode, por
exemplo, diminuir, ficar ínfimo, quando se perde na contemplação de uma
obra de arte ou se estar embriagado de amor, ou expandir, tomar toda a
figura do awareness (consciência da consciência), quando se sente dor, no
caso o self se torna a dor (PERLS et al, 1997).
Pode-se compreender a partir desse contexto um outro conceito
importante em Gestalt: figura/fundo.
 	De maneira simples, como abordam Schultz e Schultz (2001), a figura seria o objeto observado para o qual temos uma tendência em organizar a percepção, enquanto o fundo seria o segundo plano sobre o qual a figura se destaca. Para Perls et al (1997), o processo de formação de figura/fundo é dinâmico no qual as urgências e recursos do campo progressivamente emprestam suas forças ao interesse, brilho e potência dominante. Já Ponciano (1997), diz que a função do self é se colocar
como figura e/ou fundo nas relações exteriores.
A Gestalt-terapia como conhecemos atualmente possui diversas
influências, desde a psicologia da Gestalt à filosofia existencial, passando
pela psicanálise de Freud (reformulando as teorias dos mecanismos
de defesa e trabalho com os sonhos), a teoria de campo de Kurt Lewin,
as religiões orientais (como o Zen Budismo), a fenomenologia, e outras.
De acordo com Ginger e Ginger (1995), da fenomenologia a Gestalt-
terapia reteve alguns aspectos. Entre os quais, podemos citar a importância
maior em descrever do que explicar (o como precede o porquê) e a
vivência imediata tal como é percebida ou sentida corporalmente. Outro
aspecto refere-se ao aqui e agora, o que conduz à importância de uma
tomada de consciência do corpo e do tempo vivido, como experiência
única de cada ser humano. Do existencialismo, ela absorveu o primado
da vivência concreta em relação aos princípios abstratos, a singularidade
de cada existência humana e a noção de responsabilidade de cada pessoa
que participa ativamente da construção de seu projeto existencial e
confere um sentido original ao que ocorre e ao mundo que a rodeia, construindo
assim sua liberdade.
O campo é a totalidade dos fatos co-existentes em dado momento
e concebido em termos de mútua interdependência. Sua significação
depende da percepção de correlação entre sujeito e objeto. O comportamento
é determinado por forças subjacentes no campo, que deve ser
compreendido partindo de descrições psicológicas e não somente de
forças físicas ou fisiológicas. Pode-se perceber a tendência de a teoria de
campo formar um conjunto de informações e postulados que aponta, em
sua totalidade, para um novo modelo, um novo paradigma de se entender
a pessoa humana de maneira inteira e integradora (PONCIANO, 1999).
Abordando a “fronteira de contato”, margem flutuante onde ego e
outro se encontram e algo acontece, Perls et al (1997) fala que é, precisamente,
nesse local de encontros entre self e outro e de afastamento para
ambos que a psicologia pode explicar melhor a responsabilidade que as
pessoas têm em moldar sua própria experiência. Ademais, é na fronteira
de contato que ocorre o crescimento, pois é onde a necessidade emergente
de uma pessoa e o que está disponível no ambiente para satisfazê-
-la se juntam ou se digladiam, dependendo se o encontro for amigável ou
não-amigável. Esse “ciclo de satisfação de necessidades” também pode ser
chamado de “ciclo de auto-regulação organísmica”, “ciclo de experiência”
ou, como é popularmente conhecido, “ciclo do contato”
Em sua obra O Ciclo do Contato, Ponciano (1997) define contato
como sendo sinônimo de encontro pleno, de mudança, de vida. Contato
possui um significado especial para o gestalt-terapeuta, uma vez que a
Gestalt está centrada no conceito de contato e na natureza das relações
de contato da pessoa consigo e com o mundo exterior. O contato é, portanto,
a matéria-prima da relação psicoterapêutica e define a qualidade do
processo. Tudo na natureza é contato e sem contato tudo perde o sentido.
O universo do contato é o da totalidade, por isso é que a psicoterapia,
como função do contato, ocorre somente quando se faz a totalidade.
Nesse sentido, totalidade, consciência e contato formam o tripé da mudança.
Trata-se de uma força mobilizadora, síntese harmoniosa das diferenças,
fruto da relação de diferença eu-mundo e eu-no-mundo. O contato
pleno acontece quando as funções sensitivas, motoras e cognitivas
se unem, num dinâmico movimento dentro-fora-dentro, para, por meio
de uma consciência emocionada, proporcionar no sujeito bem-estar, uma
escolha, uma opção real por si mesmo (PONCIANO, 1997).
Como terapia, a Gestalt permite ao terapeuta lançar mão de alguns
conceitos e técnicas no processo de ajuda ao cliente. Estando a Gestalt centradano conceito de contato, fala-se muito em “fechar gestalt”, quando
o processo foi adiante e não ficou nada em aberto. Quando fica, quando as
gestalts não se fecham, é porque ocorreu um bloqueio em uma das fases
do ciclo, como postula Ponciano (1997).
Dentre os bloqueios de contato, pode-se destacar: fixação, o processo
pelo qual o sujeito se apega excessivamente a pessoas, idéias ou coisas,
e temendo surpresas diante do novo e da realidade, sente-se incapaz
de explorar situações que flutuam rapidamente, permanecendo fixado
em coisas e emoções – medo de correr riscos; introjeção, que é o processo
através do qual o sujeito obedece e aceita opiniões arbitrárias, normas e
valores que pertencem aos outros, engolindo coisas dos outros sem querer,
e sem conseguir defender seus direitos por medo da sua própria agressividade
e da dos outros – gosta de ser mimado; e projeção, processo pelo
qual o sujeito possui dificuldade de identificar o que é seu, atribuindo ao
outro, ao mau tempo, coisas de que não gosta em si próprio, bem como
a responsabilidade pelos seus fracassos. Desconfia de todo mundo como
prováveis inimigos – gosta que os outros façam as coisas no seu lugar. 
APLICANDO A GESTALT-TERAPIA
Ponciano (1997) postula que a idéia do ciclo como processoterapêutico
passa pela compreensão de que o processo da saúde ou da cura
possui uma lógica, uma seqüência na qual uma coisa depende da outra
e onde tudo afeta tudo. Entretanto, nenhuma pessoa está em um único
ponto no Ciclo do Contato, e sim em vários, seja na direção da cura, sejana
direção dos bloqueios, mesmo porque cada ponto do ciclo contém todos
os outros. Por outro lado, a pessoa geralmente está mais em um pontodo
que em outro, por isso se pode dizer que alguém é mais tipicamente um
introjetor, um confluente e assim por diante.
Em relação às técnicas utilizadas pela Gestalt, Ginger e Ginger
(1995) colocam que elas só têm sentido em seu contexto global, isto é,
integradas em um método coerente e praticadas de acordo com uma filosofia geral. Assim, o essencial da Gestalt não está em suas técnicas, e sim no espírito geral do qual ela procede e que as justifica.
 Ginger e Ginger (1995) citam também algumas das técnicas quea Gestalt usa, como, por exemplo, o exercício de awareness, que se trata de estar atento ao fluxo constante das sensações físicas (exteroceptivas e proprioceptivas), dos sentimentos, de tomar consciência da sucessão ininterrupta de “figuras” que aparecem no primeiro plano, sobre o “fundo” formado pelo conjunto da situação que se vive e do sujeito que se é, no plano corporal, emocional, imaginário, racional ou comportamental. Tem- -se, também, o hot seat (cadeira quente), uma das técnicas mais utilizadas pelos gestalt-terapeutas. Coloca-se o cliente diante de uma cadeira vazia, na qual, conforme sua vontade, ele pode projetar um personagem imaginário com o qual deseja se relacionar. Esta é uma oportunidade do cliente expressar o que está preso em sua garganta. Depois, ele se coloca no lugar desse personagem imaginário e elabora uma resposta para si mesmo. Geralmente, obtém uma nova dimensão para a sua angústia
Uma outra técnica, o monodrama se trata de uma variação do
psicodrama, em que o próprio protagonista desempenha, de maneira
alternada, os diferentes papéis da situação por ele evocada (ele mesmo,
a esposa, os filhos, o chefe). Troca sempre de lugar quando for mudar de
papel para que a situação fique clara. Essa técnica facilita a encenação do
próprio sentimento, à medida que este emerge da situação, sem interferência
eventual na problemática pessoal de um parceiro anterior, que
pode não estar na mesma sintonia, como ocorre no psicodrama. Por fim, a
amplificação, que torna mais explícito o que está implícito, projetando na
cena exterior aquilo o que acontece na cena interior. Permite, assim, que
todos adquiram mais consciência do modo como se comportam aqui e
agora, na “fronteira do contato” com o meio.
Além das citadas, existem diversas outras técnicas e maneiras de
se trabalhar em Gestalt-terapia. Isso dependerá do estilo pessoal de cada
terapeuta, de seu modo de ser, uma vez que ser gestalt-terapeuta está
intimamente associado à própria vivência do
terapeuta como humanista,
ao modo de perceber o mundo e a si mesmo.
No entender de Erthal (2004), o principal instrumento de trabalho
Do psicólogo é ele próprio. Ela defende uma compreensão fenomenológica
do cliente, apoiada na descrição que ele traz para dentro do
consultório, na vivência dele de sua própria situação. Cabe ao terapeuta a
função de receptor sem valores morais (ou seja, neutralidade absoluta),
considerando o contexto, a díade e o sentido certo da comunicação desse
cliente. A interação profissional-cliente nunca pode ser considerada unilateral,
uma vez que existe um impacto que cada parte da díade estabelece
na relação.
É pela fala e pela linguagem que as pessoas comunicam seus sentimentos,
pensamentos e intenções. Mas, apesar dessa função social, há
ainda a função egocêntrica, na qual não existe preocupação em saber
com que se está falando. Trata-se de um falar para si mesmo, o que expressa
uma forma alienada e onipotente. Toda linguagem é uma forma
de comportamento interpessoal. A personalidade do falante está incluída
no comunicado pela própria forma sutil ou discreta como se expressa.
Não se pode não comunicar (no sentido de que não é possível conceber
a não-expressão), pois o silêncio, a forte introspecção, já é em si uma comunicação.
O trabalho do terapeuta é, praticamente, seguir as falas de
seu cliente, mescladas pela criteriosa escolha de cada intervenção feita
(ERTHAL, 2004).
	Erthal (2004) articula dez tipos de intervenções para que o terapeuta baseie cada vivência, cada momento entre ele e o cliente, e assim conduza a sessão sempre se apoiando na verdade do seu cliente, naquilo o que ele está, de uma forma ou de outra, trazendo para o âmbito do consultório e para a realidade da terapia. Dentre as intervenções, pode-se destacar: a refletora de vivências emocionais (interpretação vivencial), naqual o terapeuta transcende o conteúdo verbal daquilo que é expresso pelo cliente a fim de obter uma compreensão do sentimento contido nas formulações e assim expressar esse sentimento de maneira correta; a inquisitiva, talvez uma das mais usadas, na qual a intenção do terapeuta é obter dados maiores sobre um determinado assunto, estimulando o cliente a continuar falando, com especificação do foco de atenção. As perguntas podem facilitar o campo perceptual do cliente, transmitir o interesse do terapeuta em pesquisar com mais profundidade o assunto, no entanto é preciso cuidado para não usar em demasia e banalizar a intervenção. O psicólogo iniciante geralmente fica ansioso e conduz a entrevista com um bombardeamento de perguntas que “facilitam” a sua atuação, bloqueando o fluxo espontâneo da comunicação do cliente, que por sua vez termina se acostumando a ser indagado e apenas espera pela próximapergunta; e o confronto, cujo objetivo é mostrar as contradições que o cliente apresenta, a fim de possibilitar maneiras novas de se perceber. As respostas de conteúdo não-verbal facilitam esse confronto ao apontar para as discrepâncias, como, por exemplo, o cliente relatar algum acontecimento triste só que com uma expressão de felicidade. Isso demonstra uma incongruência que pode ser a indicação de alguma coisa com o poder de acarretar efeitos de significativa mudança no jeito em que a pessoa vê a si mesma e sente a si mesma na frente do outro.
É fácil, por fim, obter a percepção de que a Gestal-terapia se apóia
na relação terapeuta-cliente, dentro de uma visão holística e, sobretudo, 
humanista, para alcançar o resultado a que se propõe – um resgate da
harmonia e do bom funcionamento do organismo, em todos os aspectos
(físicos, psicológicos) que o circundam.
Segundo Cardella (1994), para que a relação tenha realmente natureza
terapêutica, deve ocorrer o fenômeno do amor, concebido pela
autora como um estado e um modo de ser caracterizados pela integração
e diferenciação de um indivíduo, que lhe permite ver, aceitar e encontrar
o outro como único, singular e semelhante na condição de humano. O
amor é a polaridade oposta do egocentrismo e do sofrimento emocional,
o amor é de natureza incondicional, o que implica a capacidade de
amar o diferente e não apenas o semelhante, e, quando recíproco na relação,
proporciona aos indivíduos um sentimento mútuo (do latim muto,
que significa mudar) de plenitude. Além de tornar possível o verdadeiro
Encontro, proporciona também um sentimento de transcendência de si
mesmo e de harmonia com a humanidade e a existência. Envolve fatores
como maturidade emocional, responsabilidade e posse da própria vida,
auto-sustentação e independência em relação aos outros. Nas palavras românticas
do grande poeta Dante Alighieri (1265-1321): ‘O amor me move:
só por ele eu falo’.
Refletindo sobre o “amor terapêutico”, Cardella (1994) acredita que
Na relação terapeuta-cliente o amor pode acontecer e se manifesta sob
características distintas das demais formas de amar. As atitudes amorosas
do terapeuta facilitam o desenvolvimento do potencial de amor do
cliente, devendo ser a base para o trabalho psicoterapêutico, juntamente
com conhecimentos teóricos, filosóficos e técnicos, sem os quais a relação
terapêutica seria, obviamente, descaracterizada. O trabalho terapêutico é, em si, uma prática de amor, pela qual o terapeuta cria condições para que o cliente possa ouvir, ver, compreender, aceitar e amar a si mesmo.
Parafraseando seu próprio conceito de amor, Cardella (1994, p.
59) define: “O amor terapêutico manifesta-se através de um estado e um
modo de ser caracterizados pela integração e diferenciação da personalidade
que nos permite ver, aceitar e encontrar o outro (cliente) como um
ser único, diferenciado, e semelhante na sua condição de humano”.
Ser um gestalt-terapeuta é estar em contato pleno com todas as
coisas, com todos os pontos infinitos que integram o Universo, seja o físico
ou o psicológico. E isso constantemente, pois não existe hora marcada
para se ajudar uma pessoa; o gestalt-terapeuta não permanece gestalt-terapeuta
somente dentro do consultório, mas, sobretudo, fora dele, quando
vai para casa, quando enfrenta a fila do pão, quando está entre amigos,
quando também precisa de ajuda.
Trata-se da responsabilidade que temos perante nós mesmos e o
outro, esse outro que é a essência do gestalt-terapeuta, cuja meta é ajudá-
-lo, abraçá-lo, mostrar que ele não está sozinho. O filósofo Platão (428/27
a.C. – 347 a.C.) postulou algo inusitado, que nem por isso deixa de ser
verdadeiro: ‘O corpo humano é a carruagem, eu, o homem que a conduz,
os pensamentos as rédeas, os sentimentos são os cavalos’. O gestalt-terapeuta
seria aquele que alimentaria os cavalos na noite anterior para que a
viagem flua harmoniosa e chegue ao seu destino, a fim de que a carruagem
cumpra sua missão existencial e tenha, ela própria, sentido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
	Para ser gestalt-terapeuta, portanto, é preciso amar incondicionalmente
	e ver o outro (cliente) como a si próprio, transcender o técnico e o
	profissional e ser, sobretudo, um artista, já que Perls diz que a Gestalt-terapia
	é uma arte, uma arte do bem, da paz e da harmonia que precisam ser
	buscadas dentro de cada um. Não basta apenas ter afinidade e conhecer
	A teoria, é necessário confundir-se com ela, uma vez que Gestalt-terapia é,
	acima de tudo, um jeito de ser.
BRAGHIROLLI, E. M. et al. Psicologia geral. 14. ed. Petrópolis (RJ): Vozes,
1997.
ENGELMANN, A. A psicologia da gestalt e a ciência empírica contemporânea.
Teoria. e Pesquisa. 2002, vol.18, no.1, p.1-16.
GINGER, S., GINGER, A. Gestalt: uma terapia do contato. 2. ed. São Paulo
(SP): Summus, 1995.
MÁRQUEZ, G. G.Cem anos de solidão. Editora: Record , 2009.
SCHULTZ, D. P., SCHULTZ, S. E. História da psicologia moderna. 14. ed. São
Paulo (SP): Cutrix, 2001.
RODRIGUES, H. E. O que é “gestalt-terapia”? Disponível em <www.geocities.
com/HotSprings/Resort/2631/>. Acesso em: 10 jan. 2006.
PERLS, F. S., HEFFERLINE, R., GOODMAN, P. Gestalt-terapia. Tradução Fernando
Rosa Ribeiro. 2. ed. São Paulo (SP): Summus, 1997.
RIBEIRO, J. P. O ciclo do contato.
2. ed. São Paulo (SP): Summus, 1997.
________. Gestalt-terapia de curta duração. 2. ed. São Paulo (SP): Summus,
1999.
YONTEF, G. M. Processo, diálogo e awareness. São Paulo (SP): Summus,
1998.
ERTHAL, T. C. S. Treinamento em psicoterapia vivencial. São Paulo (SP): Livro
Pleno, 2004.
CARDELLA, B. H. P. O amor na relação terapêutica: uma visão gestáltica. 3.
ed. São Paulo (SP): Summus, 1994.
REFERÊNCIAS

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Continue navegando

Outros materiais