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BIBLI-mecanismos de patogenicidade bacteriana

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C A P Í T U L O 
Patogênese da infecção 
bacteriana 
A patogênese da infecção bacteriana abrange o início do pro­
cesso infeccioso e os mecanismos que levam ao aparecimento 
dos sinais e sintomas da doença. Os fatores bioquímicos estru­
turais e genéticos que desempenham um papel importante na 
patogênese bacteriana são discutidos neste capítulo e podem 
ser revistos nos capítulos específicos para cada microrganismo. 
As bactérias patogênicas caracterizam-se por sua capacidade de 
disseminação, aderência e persistência, bem como invasão de 
células e tecidos do hospedeiro, toxigenicidade e capacidade de 
escapar ou sobreviver ao sistema imunológico do hospedeiro. 
A resistência a antimicrobianos e a desinfetantes também pode 
contribuir para virulência ou para capacidade do microrganis­
mo em causar doença. Muitas infecções causadas por bactérias 
geralmente tidas como patógenos são inaparentes ou assintomá­
ticas. Ocorrerá doença se as bactérias ou reações imunológicas à 
sua presença prejudicarem o hospedeiro. 
Os termos frequentemente empregados para descrever 
os aspectos da patogênese estão definidos no Glossário (ver 
adiante). No Glossário do Capítulo 8, encontram-se as defini­
ções dos termos utilizados em imunologia bem como os em­
pregados para descrever aspectos da resposta do hospedeiro 
à infecção. 
G LOSSÁ R I O 
Aderência {adesão, fixação): processo pelo qual as bactérias 
se fixam à superfície das células do hospedeiro. Após as bac­
térias terem penetrado no organismo, a aderência constitui 
uma etapa inicial importante no processo de infecção. Os 
termos aderência, adesão e fixação frequentemente são uti­
lizados como sinônimos. 
Infecção: multiplicação de um agente infeccioso no corpo. A 
multiplicação das bactérias que fazem parte da microbiota 
normal do trato gastrintestinal, da pele e assim por diante, 
geralmente não é considerada uma infecção. Já a multipli­
cação de bactérias patogênicas (p. ex., espécies de Salmo­
nel/a) - mesmo quando o indivíduo se mostra assintomáti­
co - é tida como uma infecção. 
Invasão: processo pelo qual bactérias, parasites animais, fun­
gos e vírus penetram nas células ou nos tecidos do hospe­
deiro e disseminam-se pelo corpo. 
Microbiota: microrganismos que colonizam diferentes sítios 
de indivíduos saudáveis. 
Não patógeno: microrganismo que não provoca doença; pode 
fazer parte da microbiota normal. 
Patogenicidade: capacidade que um agente infeccioso tem de 
provocar doença. (Ver também Virulência.) 
Patógeno: microrganismo capaz de causar doença. 
Patógeno oportunista: agente capaz de provocar doença 
apenas quando a resistência do hospedeiro está compro­
metida (i. e., quando o paciente se encontra "imunocompro­
metido"). 
Portador: indivíduo ou animal com infecção assintomática, 
que pode ser transmitida a outro indivíduo ou animal sus­
cetível. 
Superantígenos: toxinas que ativam o sistema imunológico 
se ligando diretamente à cadeia � do complexo de histo-
150 SEÇÃO Ili Bacteriologia 
compatibilidade principal (MHC) e ao receptor de linfócito T 
(T ce// receptor, TCR), assim resultando em intensa ativação 
policlonal de células T e na produção maciça de citocinas. 
Toxigenicidade: capacidade que um microrganismo tem de 
produzir uma toxina que contribui para o desenvolvimento 
de doença. 
IDENTIFICAÇÃO DAS BACTÉRIAS 
QUE CAUSAM DOENÇA 
Os seres humanos e os animais possuem uma microbiota 
normal abundante que habitualmente não provoca doença 
(Cap. 10), mas que atinge o equilíbrio com o hospedeiro, ga­
rantindo a sobrevivência, o crescimento e a propagação não 
apenas das bactérias, mas também do hospedeiro. Algumas 
bactérias que constituem importantes causas de doença cres­
cem comumente com a microbiota normal (p. ex., Streptococcus 
pneumoniae, Staphylococcus aureus). Algumas vezes, verifica-se 
a presença de bactérias nitidamente patogênicas (p. ex., Salmo­
nella typhi), porém a infecção permanece latente ou subclínica, 
de modo que o hospedeiro é um "portador" das bactérias. 
Pode ser difícil mostrar que determinada espécie bacteria­
na constitui a causa de uma doença específica. Em 1884, Robert 
Koch propôs uma série de postulados que foram amplamente 
aplicados para correlacionar muitas espécies bacterianas espe­
cíficas com determinadas doenças. Os postulados de Koch es­
tão resumidos no Quadro 9 .1. 
Virulência: capacidade quantitativa de um agente provocar 
doença. Os agentes virulentos causam doença quando in­
troduzidos no hospedeiro em pequeno número. A virulên­
cia envolve aderência, persistência, invasão e toxigenicida­
de (ver anteriormente). 
Os postulados de Koch continuam sendo uma base essen­
cial da microbiologia; no entanto, desde o fim do século XIX, 
constatou-se que muitos microrganismos que não preenchem 
os critérios dos postulados de Koch também provocam do­
ença. Assim, por exemplo, o Treponema pallidum (sífilis) e o 
Mycobacterium leprae (hanseníase) não podem ser cultivados 
in vitro; entretanto, existem modelos de infecção em animais 
com esses agentes. Outro exemplo é a Neisseria gonorrhoeae 
(gonorreia), para a qual não há modelo de infecção em ani­
mais, embora possa ser facilmente cultivada in vitro, tendo si­
do produzidas infecções experimentais em seres humanos que 
substituem o modelo animal. 
Em outros casos, os postulados de Koch foram satisfei­
tos, pelo menos em parte, ao se demonstrar a patogenicidade 
bacteriana em um modelo de infecção in vitro, em vez de um 
modelo em animal. Por exemplo, algumas formas de diarreia 
induzida por Escherichia coli (Cap. 15) foram defmidas pela in­
teração dessa bactéria com células do hospedeiro em cultura. 
As respostas imunológicas do hospedeiro também devem 
ser consideradas quando se investiga a presença de determinado 
QUADR0 9.1 Regras para o estabelecimento das causas das doenças infecciosas 
Postulados de Koch 
1 . O microrganismo deve ser 
encontrado em todos os casos da 
doença em questão e sua distribuição 
no corpo deve estar em concordância 
com as lesões observadas 
2. O microrganismo deve crescer em 
cultura pura in vitro (ou fora do 
corpo do hospedeiro) por diversas 
gerações 
3 . Quando tal cultura pura for 
inoculada em um animal suscetível, 
deverá resultar no surgimento da 
doença típica 
4. O microrganismo deve ser 
novamente isolado de lesões que 
produziram doença no modelo 
experimental 
Postulados de Koch moleculares 
1 . O fenótipo ou propriedade 
sob investigação deve estar 
significativamente associado a cepas 
patogênicas de uma espécie e não a 
cepas não patogênicas 
2. A inativação específica de um gene 
ou genes associados à virulência 
deve levar a uma diminuição 
mensurável da patogenicidade ou da 
virulência 
3. Reversão ou substituição de 
um gene mutado com um gene 
selvagem deve levar a restauração 
da patogenicidade ou virulência 
Regras moleculares para o estabelecimento 
da relação micróbio-doença 
1 . A sequência de ácidos nucleicos de um patógeno 
putativo deve estar presente na maior parte dos casos 
de uma doença infecciosa e preferencialmente em locais 
anatômicos onde o patógeno é evidente 
2. A sequência de ácidos nucleicos de um patógeno putativo 
deve estar ausente na maior parte dos controles saudáveis. 
Se a sequência for detectada em controles saudáveis, 
ela deve estar presente com baixa prevalência quando 
comparada com o número de pacientes que têm a doença, 
e em um baixo número de cópias 
3. O número de cópias de uma sequência de ácidos nucleicos 
associados a um patógeno deve diminuir ou tornar-se não 
detectável com a resolução da doença (p. ex., com um 
tratamento eficaz) e deve aumentar em casos de recidiva 
ou recorrência da doença 
4. A presença de uma sequência de ácidos nucleicos 
associada a um patógeno em indivíduos sadios deve 
ajudar a prever o desenvolvimento subsequente da 
doença 
5. A natureza do patógeno inferido a partir da análise da 
sequência de ácidos nucleicos deve ser condizente com 
as características biológicas conhecidasdos organismos 
relacionados com a natureza da doença. A importância 
de uma sequência microbiana detectada está aumentada 
quando o genótipo microbiano prevê a morfologia e 
a patologia microbianas, as características clínicas da 
doença e a resposta do hospedeiro 
microrganismo como possível causa de uma doença. Por con­
seguinte, a ocorrência de elevação nos títulos de anticorpos 
específicos durante a recuperação da doença constitui um im­
portante auxiliar dos postulados de Koch. 
A moderna genética microbiana abriu novas fronteiras pa­
ra o estudo das bactérias patogênicas e sua diferenciação das 
não patogênicas. A clonagem molecular possibilitou aos pes­
quisadores isolar e modificar genes de virulência específicos, 
estudando-os em modelos de infecção. A capacidade de estu­
dar genes associados à virulência levou à proposição dos pos­
tulados moleculares de Koch, resumidos no Quadro 9 .1. 
O crescimento de alguns patógenos em cultura é difícil ou 
mesmo impossível, e por esse motivo não é possível estabelecer 
a causa das doenças a eles associadas com base nos postulados 
de Koch ou nos postulados moleculares de Koch. Utiliza-se a 
reação em cadeia da polimerase para amplificar as sequências 
de ácidos nucleicos específicas do microrganismo isoladas de 
tecidos ou líquidos do hospedeiro, empregadas para a identi­
ficação dos microrganismos infectantes. As diretrizes molecu­
lares para o estabelecimento da causa da doença microbiana 
estão relacionadas no Quadro 9.1. Essa abordagem foi utilizada 
para o estabelecimento das causas de várias doenças, como a 
doença de Whipple (Tropheryma whipplei), angiomatose baci­
lar (Bartonella henselae), erliquiose monocítica humana (Ehr­
lichia chaffeensis), síndrome pulmonar por hanta-vírus (vírus 
Sin Nombre) e sarcoma de Kaposi (herpes-vírus humano 8). 
A análise da infecção e da doença mediante a aplicação de 
certos princípios, como os postulados de Koch, leva à classifi­
cação das bactérias como patógenos, patógenos oportunistas e 
não patógenos. Algumas espécies bacterianas são sempre con­
sideradas patogênicas, e sua presença é anormal. Como exem­
plos podemos citar o Mycobacterium tuberculosis (tuberculose) 
e Yersinia pestis (peste), bactérias que satisfazem facilmente os 
critérios dos postulados de Koch. Outras espécies fazem parte 
comumente da microbiota normal de seres humanos (e ani­
mais), mas também podem, com frequência, causar doença. 
Assim, por exemplo, a E. coli pertence à microbiota gastrintes­
tinal dos seres humanos sadios, mas também representa uma 
causa comum das infecções do trato urinário, diarreia do via­
jante e outras doenças. As cepas da E. coli que provocam doença 
são diferençadas daquelas que não o fazem pela determinação 
( 1) da existência ou não de virulência em animais e modelos 
de infecção in vitro, bem como (2) da constituição genética 
significativamente associada à produção da doença. Outras 
bactérias (p. ex., espécies de Pseudomonas, Stenotrophomonas 
maltophilia e muitas leveduras e bolores) só provocam doença 
em indivíduos imunodeprimidos ou debilitados, e constituem 
patógenos oportunistas. 
TRANSMISSÃO DA INFECÇÃO 
As bactérias (e outros microrganismos) podem se adaptar a 
uma variedade de ambientes que incluem fontes externas co­
mo: solo, água e matéria orgânica ou em ambientes internos 
encontrados nos insetos vetores, animais e em seres humanos, 
onde normalmente habitam e subsistem. Assim, dotadas des­
sa capacidade, as bactérias asseguram sua sobrevida e aumen­
tam a possibilidade de transmissão. Ao produzirem infecção 
assintomática ou doença leve, em vez de levarem à morte do 
CAPÍTULO 9 Patogênese da infecção bacteriana 151 
hospedeiro, os microrganismos que normalmente habitam em 
seres humanos aumentam a possibilidade de transmissão de 
uma pessoa para outra. 
Algumas bactérias que costumam provocar doença em se­
res humanos habitam principalmente em animais e infectam 
incidentalmente os seres humanos. Por exemplo, as espécies de 
Salmonella e Campylobacter infectam os animais, sendo trans­
mitidas aos seres humanos através de produtos alimentares. 
Outras bactérias produzem infecções de modo inadvertido em 
seres humanos, constituindo um erro no ciclo de vida normal 
do microrganismo; nesses casos, os microrganismos não se 
adaptam aos seres humanos, e a doença que provocam pode 
ser grave. Por exemplo, a Y. pestis (peste) tem um ciclo de vida 
bem estabelecido em roedores e pulgas de roedores, e a trans­
missão pelas pulgas a seres humanos é inadvertida; o Bacillus 
anthracis (antraz) é encontrado no meio ambiente, infecta oca­
sionalmente animais e é transmitido aos seres humanos por 
certos produtos de animais infectados, como pelos. As espé­
cies de Clostridium são onipresentes no meio ambiente, e são 
transmitidas aos seres humanos por ingestão (p. ex., gastrente­
rite por e. perfringens e e. botulinum [botulismo] ), ou quando 
ocorre contaminação de feridas pelo solo (p. ex., C. perfringens 
[gangrena gasosa] e C. tetani [tétano]). Tanto Bacillus anthra­
cis quanto as espécies de Clostridium formam esporos que pro­
tegem o ácido nucleico de diferentes fatores ambientais hostis 
como radiação ultravioleta, dessecação, detergentes químicos 
e alterações de pH. Esses esporos asseguram a sobrevivência 
do material genético em ambientes externos incluindo os ali­
mentos ingeridos pelo ser humano, que após sua ingestão ou 
inoculação germinam retornando ao estado vegetativo meta­
bolicamente ativo do patógeno. 
As manifestações clínicas das doenças (p. ex., diarreia, 
tosse, corrimento vaginal) causadas por microrganismos fre­
quentemente promovem a transmissão dos agentes. A seguir 
são apresentados alguns exemplos de síndromes clínicas e o 
modo pelo qual aumentam a transmissão das bactérias pato­
gênicas: o Vibrio cholerae pode causar diarreia volumosa, que 
pode contaminar a água do mar e a água doce; por conseguinte, 
tanto a água potável quanto os frutos do mar, como ostras e 
caranguejos, podem ser contaminados; a ingestão de água ou 
frutos do mar contaminados pode provocar infecção e doença. 
De modo semelhante, a contaminação dos alimentos com água 
de esgoto que contenha E. coli, que causa diarreia, resulta em 
transmissão da bactéria. O M. tuberculosis (tuberculose) infec­
ta naturalmente apenas os seres humanos, provocando doença 
respiratória com tosse e produção de perdigotos, o que resulta 
em transmissão da bactéria de uma pessoa para outra. 
Muitas bactérias são transmitidas de uma pessoa para outra 
por meio das mãos. Uma pessoa portadora de S. aureus na parte 
anterior das narinas pode esfregar o nariz, contaminar as mãos 
com os estafilococos e disseminá-los para outras partes do corpo 
ou para outra pessoa, resultando em infecção. Muitos patógenos 
oportunistas que provocam infecções hospitalares são transmi­
tidos de um paciente para outro por meio das mãos de membros 
da equipe hospitalar. Por conseguinte, a lavagem das mãos cons­
titui um importante componente no controle das infecções. 
As mais frequentes portas de entrada das bactérias pato­
gênicas são os locais do corpo nos quais as mucosas entram em 
contato com a pele: vias respiratórias (superiores e inferiores), 
trato gastrintestinal (principalmente a boca), trato genital e 
152 SEÇÃO Il i Bacteriologia 
vias urinárias. As áreas anormais das mucosas e da pele (p. ex., 
cortes, queimaduras e outras lesões) também são portas de en­
trada frequentes. A pele e as membranas mucosas constituem 
o mecanismo de defesa primária contra a infecção. Para causar 
doença, os patógenos precisam vencer essas barreiras. 
O PROCESSO INFECCIOSO 
No corpo, as bactérias que causam doenças têm de se aderir às 
células do hospedeiro, geralmente às células epiteliais. Estabele­
cido um local primário de infecção, as bactérias multiplicam-se 
e disseminam-se diretamente, através dos tecidos ou do sistema 
linfático, para a corrente sanguínea. Essa infecção (bacteriemia) 
pode ser transitória ou persistente,e permite que as bactérias se 
propaguem amplamente pelo corpo até alcançarem os tecidos 
particularmente apropriados para a sua multiplicação. 
A pneumonia pneumocócica fornece um exemplo do pro­
cesso infeccioso. O S. pneumoniae pode ser cultivado a partir 
de material da nasofaringe de 5 a 40% dos indivíduos sadios. 
Em certas ocasiões, os pneumococos da nasofaringe são aspi­
rados para os pulmões, o que é mais comum nos indivíduos 
debilitados ou em determinadas situações, como, por exem­
plo, o coma, quando os reflexos normais da tosse e do vômito 
encontram-se diminuídos. Verifica-se o desenvolvimento de 
infecção nas vias respiratórias terminais dos pulmões de in­
divíduos que não produzem anticorpos protetores contra o 
antígeno capsular pneumocócico. A multiplicação dos pneu­
mococos e a consequente inflamação resultam em pneumonia. 
Os pneumococos penetram nos vasos linfáticos dos pulmões e 
dirigem-se para a corrente sanguínea. Entre 10 e 20% dos in­
divíduos com pneumonia pneumocócica apresentam bacterie­
mia por ocasião do diagnóstico de pneumonia. Quando ocorre 
bacteriemia, os pneumococos podem disseminar-se para locais 
secundários de infecção (p. ex., líquido cerebrospinal, valvas 
cardíacas, espaços articulares). As principais complicações da 
pneumonia pneumocócica consistem em meningite, artrite 
séptica e raramente endocardites. 
O processo infeccioso no cólera envolve a ingestão de V. 
cholerae, atração quimiotática das bactérias para o epitélio in­
testinal, motilidade das bactérias por meio de um único flagelo 
polar e penetração na camada mucosa da superfície intestinal. A 
aderência do V. cholerae à superfície das células epiteliais é me­
diada por pili e, possivelmente, por outras adesinas. A produção 
da toxina colérica resulta em fluxo de cloreto e água no lúmen 
intestinal, provocando diarreia e desequilíbrio eletrolítico. 
A GENÔMICA E A PATOGENICIDADE 
BACTERIANA 
As bactérias são haploides ( Cap. 7) e limitam as interações 
genéticas passíveis de alterar seus cromossomos e de afetar 
potencialmente sua adaptação e sua sobrevivência em nichos 
ambientais específicos. 
A natureza clonal das bactérias patogênicas 
Importante consequência da conservação dos genes cromos­
sômicos nas bactérias é o fato de os microrganismos serem 
clonais. Para a maioria dos patógenos, existem apenas um ou 
alguns tipos clonais que se disseminam no mundo durante 
certo período. Por exemplo, a meningite meningocócica epi­
dêmica do sorogrupo A ocorre na Ásia, no Oriente Médio e 
na África, e, em certas ocasiões, propaga-se para a Europa Se­
tentrional e para as Américas. Em várias ocasiões, ao longo de 
várias décadas, observou-se o aparecimento de tipos clonais 
isolados da Neisseria meningitidis do sorogrupo A em uma 
região geográfica e, posteriormente, em outras regiões, resul­
tando em doença epidêmica. Existem muitos tipos do Haemo­
philus influenzae, mas apenas o clone do H. influenzae tipo b 
costuma estar associado à ocorrência de doença*. Existem dois 
tipos clonais da Bordetella pertussis, ambos associados a doen­
ça. De modo semelhante, a S. Typhi (causadora da febre tifoi­
de) possui dois tipos clonais. Entretanto, há mecanismos que 
a bactéria utiliza, ou que foram usados há muito tempo, para 
transmitir genes de virulência de uma para outra. 
Elementos genéticos móveis 
Os mecanismos primários de troca de informação genética 
entre bactérias incluem a transformação natural e a trans­
missão de elementos genéticos móveis tais como plasmídeos, 
transpósons e bacteriófagos (frequentemente referidos como 
"fagos"). A transformação ocorre quando o DNA de um or­
ganismo é liberado para o ambiente e incorporado por um 
organismo diferente capaz de reconhecer e de se ligar a esse 
DNA. Em outros casos, os genes que codificam muitos fa­
tores de virulência bacteriana são carreados por plasmídeos 
ou fagos. Plasmídeos são estruturas extracromossomiais que 
apresentam capacidade de autorreplicação e transpósons são 
segmentos de DNA que podem se mover de um ponto para 
outro na fita de DNA. Esses dois fenômenos podem resul­
tar em recombinação entre o DNA extracromossômico e o 
cromossômico (recombinação ilegítima ou não homóloga; 
Cap. 7). Se essa recombinação se verifica, os genes que co­
dificam os fatores de virulência podem tornar-se cromos­
sômicos. Finalmente, vírus bacterianos ou fagos são outros 
mecanismos pelos quais o DNA pode ser transferido de um 
organismo para outro. A transferência desses elementos ge­
néticos entre membros de uma mesma espécie ou, menos 
comumente, interespécies pode resultar em transferência de 
fatores de virulência, incluindo genes de resistência a antimi­
crobianos. Alguns exemplos de fatores de virulência codifica­
dos em fagos ou plasmídeos estão no Quadro 9.2. 
Ilhas de patogenicidade 
Grandes grupos de genes associados à patogenicidade e locali­
zados no cromossomo bacteriano são chamados de ilhas de pa­
togenicidade (PAI - pathogenicity islands ). Existem grandes 
grupos de genes organizados, com tamanho entre 10 e 200 kb. 
As principais propriedades das PAI são as seguintes: possuem 
um ou mais genes de virulência; estão presentes no genoma dos 
* N. de T. Embora o H. influenzae do tipo b seja o principal patógeno do 
gênero, a implementação das vacinas conjugadas no esquema da vacinação 
em diferentes países está levando a pressão seletiva e consequentemente, 
um maior isolamento de outros biotipos não 1 e de outros sorotipos como 
o a, além de amostras de H. influenzae não tipáveis (HiNT) associadas a 
infecções como otite média e pneumonias. 
CAPÍTULO 9 Patogênese da infecção bacteriana 153 
QUADRO 9.2 Exemplos de fatores de virulência 
codificados por genes em elementos genéticos móveis 
representam estruturas em mosaico com componentes adqui­
ridos em momentos diferentes. Em conjunto, as propriedades 
das PAI sugerem que se originaram de transferência gênica a 
partir de diferentes espécies. Alguns exemplos de PAI dos fato­
res de virulência encontram-se no Quadro 9.3. 
Gênero/Espécie 
Codificados por plasmídeo 
Escherichia coli 
Escherichia coli 
Escherichia coli 
• • e espec1es 
de Shigella 
Bacillus anthracis 
Codificados por fago 
Clostridium 
botulinum 
Corynebacterium 
diphtheriae 
Vibrio cholerae 
Fator de virulência e doença 
Enterotoxinas termoestáveis e 
termolábeis que causam diarreia 
Hemolisina (citotoxina) de doença 
invasiva e infecções do trato 
. , . unnano 
Fatores de aderência e produtos 
gênicos envolvidos em invasão de 
mucosas 
Cápsula, essencial para virulência 
(em um plasmídeo). Fator edema, 
fator letal e antígeno protetor 
são todos essenciais para 
virulência 
Fator de edema, fator letal, antígeno 
protetor, todos essenciais para 
virulência (em outro plasmídeo) 
Toxina botulínica que causa paralisia 
Toxina diftérica que inibe a síntese 
de proteínas humanas 
Toxina do cólera, que pode causar 
diarreia aquosa grave 
REGULAÇÃODOSFATORESDEVIRULÊNCIA 
BACTERIANOS 
As bactérias patogênicas (e outros patógenos) adaptaram-se 
tanto ao estado saprofítico quanto ao estado de vida livre, pos­
sivelmente a ambientes extracorporais, bem como ao hospe­
deiro humano. Em seu processo de adaptação, os patógenos 
preservaram suas necessidades e seus produtos metabólicos. 
Desenvolveram complexos sistemas de transdução de sinais 
para regular os genes importantes relacionados com a viru­
lência. Os sinais ambientais frequentemente controlam a ex­
pressão dos genes de virulência. Os sinais comuns consistem 
em temperatura, disponibilidade de ferro, osmolalidade, fase 
de crescimento, pH e íons específicos (p. ex., Ca2+) ou fatores 
nutrientes. Nos parágrafos que se seguem são apresentados al­
guns exemplos. 
O gene da toxina diftérica do Corynebacterium diphtheriae 
é transportado por bacteriófagos temperados. A toxina só é 
produzida por cepas lisogenizadas pelos fagos. A produção de 
toxina aumenta acentuadamente quando C. diphtheriae cresce 
em um meio com baixo conteúdo de ferro.membros patogênicos de uma espécie; são de grande tamanho; 
geralmente possuem um conteúdo de guanina mais citosina 
(G + C) diferente do restante do genoma bacteriano; estão nor­
malmente associadas a genes do RNAt; são geralmente encon­
tradas com partes do genoma associado a elementos genéticos 
móveis; com frequência apresentam instabilidade genética e 
A expressão dos genes de virulência de B. pertussis aumenta 
quando as bactérias crescem a 37ºC, mas é suprimida a tempe­
raturas mais baixas ou na presença de altas concentrações de 
sulfato de magnésio ou ácido nicotínico. 
Os fatores de virulência de V. cholerae são regulados em 
múltiplos níveis e inúmeros fatores ambientais. A expressão da 
toxina colérica é maior em pH de 6,0 do que em pH de 8,5, e 
também é maior a 30ºC do que a 37ºC. 
QUADRO 9.3 Alguns exemplos do elevado número de ilhas de patogenicidade (PAI) em patógenos humanos 
Gênero/Espécie 
Escherichia coli 
Escherichia coli 
Escherichia coli (EHEC) 
Salmonella typhimurium 
Yersinia pestis 
Vibrio cholerae EI Tor O 7 
Staphylococcus aureus 
Staphylococcus aureus 
Enterococcus faecalis 
PAI, ilha de patogenicidade. 
SPI, ilha de patogenicidade de Salmonella. 
HPI, ilha de alta patogenicidade. 
VPI, ilha de patogenicidade de Vibrio. 
SCC, cassete cromossômico estafilocócico mec. 
Nome da PAI 
PAI 153611536 
PAI IJ96 
01 57 
SPl-1 
HPl/pgm 
VPl-1 
SCC mec 
SaPll 
NPm 
SaPI, ilha de patogenicidade de Staphylococcus aureus. 
NP, não protease. 
Características de virulência 
Alfa hemolisina, fímbrias, aderências, em infecções do trato urinário 
Alfa hemolisina, pilus P, em infecções do trato urinário 
Toxina de macrófagos em E. coli êntero-hemorrágica (EHEC) 
Invasão e destruição das células hospedeiras, diarreia 
Genes que aumentam a captação de ferro 
Neuraminidase, utilização de aminoaçúcares 
Resistência a meticilina e outros antibióticos 
Toxina 1 da síndrome do choque tóxico, enterotoxina 
Citolisina, formação de biofilme 
154 SEÇÃO Ili Bacteriolog ia 
A osmolalidade e a composição dos aminoácidos também 
são importantes. Até 20 outros genes do V. cholerae são regula­
dos de maneira semelhante. 
Y. pestis produz uma série de plasmídeos de virulência que 
codificam determinadas proteínas, uma das quais é uma fra­
ção antifagocítica da proteína capsular que resulta em função 
antifagocítica. Esta proteína tem sua expressão máxima entre 
35 e 37ºC, a temperatura do hospedeiro, e minimamente entre 
20 e 28ºC, que corresponde à temperatura da pulga, na qual a 
atividade antifagocítica não se faz necessária. A regulação dos 
outros fatores de virulência em espécies de Yersinia também é 
influenciada por fatores ambientais. 
A motilidade das bactérias permite sua disseminação e multi­
plicação em seus nichos ambientais ou nos indivíduos. A Yersinia 
enterocolitica e a Listeria monocytogenes são comuns no ambien­
te em que a motilidade se torna importante para essas bactérias. 
Presumivelmente, a motilidade não é importante na patogênese 
das doenças causadas por essas espécies. A Y. enterocolitica é mó­
vel quando cresce a 25ºC, mas não quando cresce a 37ºC. De mo­
do semelhante, a Listeria é móvel quando cresce a 25ºC e imóvel 
ou com motilidade mínima quando cresce a 37ºC. 
FATORES DE VIRULÊNCIA BACTERIANOS 
Muitos fatores determinam a virulência bacteriana ou a capaci­
dade de provocar infecção e doença. 
Fatores de aderência 
Após as bactérias penetrarem no hospedeiro, precisam aderir 
as células de um tecido. Se não conseguirem fazê-lo, serão 
eliminadas pelo muco e por outros líquidos que banham a 
superfície tecidual. A aderência, que constitui apenas uma 
etapa no processo infeccioso, é seguida pelo desenvolvimento 
de microcolônias e por etapas subsequentes na patogênese da 
infecção. 
As interações entre as bactérias e as superfícies celulares dos 
tecidos no processo de aderência são complexas. Diversos fatores 
desempenham importantes papéis: a hidrofobicidade superficial 
e a carga efetiva da superfície; as moléculas de ligação nas bacté­
rias (ligantes) e interações dos receptores das células do hospe­
deiro. As bactérias e células do hospedeiro geralmente possuem 
cargas negativas na superfície e, portanto, forças eletrostáticas 
repulsivas, superadas por interações hidrofóbicas e outras mais 
específicas entre as bactérias e as células do hospedeiro. Em ge­
ral, quanto mais hidrofóbica for a superfície da célula bacteria­
na, maior será sua aderência à célula do hospedeiro. Diferentes 
cepas de bactérias de uma mesma espécie podem variar bastante 
quanto a suas propriedades superficiais hidrofóbicas e sua capa­
cidade de aderir às células do hospedeiro. 
As bactérias também possuem moléculas de superfície espe­
cíficas que interagem com as células do hospedeiro. Muitas são 
dotadas de pili ou fímbrias, apêndices semelhantes a "pelos" que 
se estendem a partir da superfície da célula bacteriana e ajudam a 
mediar a aderência das bactérias à superfície das células do hos­
pedeiro. Por exemplo, algumas cepas da E. coli possuem pili tipo 
l, que aderem a receptores de células epiteliais; a aderência pode 
ser bloqueada in vitro pela adição de n-manose ao meio. As E. 
coli que causam infecções do trato urinário não costumam exibir 
aderência mediada pela n-manose*, mas possuem pili P, que se fi­
xam a uma porção do antígeno de grupo sanguíneo P; a estrutura 
de reconhecimento mínima é o dissacarídeo a-n-galactopiranosil­
( 1 a 4)-�-d-galactopiranosídeo (adesão de ligação GAL-GAL). 
As amostras de E. coli, que provocam doenças diarreicas (ver 
Cap. 15), exibem aderência mediada por diferentes tipos de pili 
(fírnbrias) em células epiteliais do intestino. Os tipos pili e os seus 
mecanismos moleculares específicos de aderência são diferentes, 
dependendo da cepa de E. coli que induz a diarreia. 
Outros mecanismos específicos de ligantes-receptores estão 
envolvidos na aderência das bactérias às células do hospedeiro, 
ilustrando os diversos mecanismos empregados pelas bactérias. 
Os estreptococos do grupo A (Streptococcus pyogenes) (Cap. 14) 
também possuem apêndices filiformes, denominados fímbrias, 
que se estendem a partir da superfície celular. Nas fírnbrias, são 
encontrados o ácido lipoteicoico, a proteína F e a proteína M. 
O ácido lipoteicoico e a proteína F induzem a aderência dos es­
treptococos às células epiteliais bucais, mediada pela fibronecti­
na, que atua como molécula receptora da célula do hospedeiro. 
A proteína M atua como molécula antifagocítica e como um dos 
principais fatores de virulência.Os anticorpos dirigidos contra 
os ligantes bacterianos específicos que promovem a aderência 
(p. ex., pili e ácido lipoteicoico) podem bloquear a aderência às 
células do hospedeiro e, assim, protegê-lo de infecção. 
Após a aderência, mudanças conformacionais ocorrem na 
célula hospedeira provocando alterações do citoesqueleto de 
actina, resultando na endocitose do microrganismo pela célula. 
Algumas vezes, essas adesinas após promoverem a aderência 
ativam genes de virulência associados à invasão ou outras mu­
danças patogênicas descritas adiante. 
Invasão das células e dos tecidos 
do hospedeiro 
Para muitas bactérias que causam doença, a invasão do epitélio 
do hospedeiro é essencial para o processo infeccioso. Algumas 
bactérias (p. ex., espécies de Salmonella) invadem os tecidos 
através das junções existentes entre as células epiteliais. Outras 
bactérias (p. ex., espécies de Yersinia, N. gonorrhoeae, Chla­
mydia trachomatis) invadem tipos específicos de células epite­
liais do hospedeiro, podendo, subsequentemente, penetrar nos 
tecidos. No interior da célula do hospedeiro, as bactérias podem 
permanecer encerradas em um vacúolo constituído pela mem­
brana celular do hospedeiro, ou a membrana do vacúolo pode 
dissolver-se, permitindo a dispersão das bactérias no citoplasma. 
Algumas bactérias (p. ex., espécies de Shigella) multiplicam-se 
no interior da célula do hospedeiro, enquanto outras, não. 
O termo invasãocostuma ser utilizado para descrever a en­
trada das bactérias nas células do hospedeiro, implicando um 
* N. de T. Na realidade, as fímbrias do tipo 1 (manose sensível) desempe­
nham diferentes funções importantes no processo de patogenicidade das 
amostras de E. coli uropatogênica (UPEC). As fímbrias do tipo 1 se ligam 
às glicoproteínas uroteliais ricas em manose (uroplaquinas Ia e ilia), atra­
vés da subunidade frmH, que funciona como adesina e está localizada na 
ponta da fímbria. Esta interação resulta na invasão e na apoptose das célu­
las uroteliais. As fímbrias do tipo l, juntamente com as fímbrias P também 
atuam em sinergia facilitando a colonização renal que pode resultar em 
obstrução do néfron. Além disso, a proteína Tamm-Horsfall (THP), pro­
duzida por células renais é liberada na urina humana e pode atuar como 
um receptor solúvel para fimH, obstruindo a interação célula-hospedeiro 
e limitando a capacidade de UPEC em colonizar o trato urinário. 
papel ativo para os microrganismos e um papel passivo para as 
células do hospedeiro. Em muitas infecções, as bactérias produ­
zem fatores de virulência que influenciam as células do hospedei­
ro, induzindo-as a ingerir as bactérias. As células do hospedeiro 
desempenham um papel muito ativo nesse processo. 
Em geral, a produção de toxinas e outras propriedades de vi­
rulência são independentes da capacidade das bactérias de inva­
dir células e tecidos. Por exemplo, Corynebacterium diphtheriae 
é capaz de invadir o epitélio da nasofaringe e provocar faringite 
sintomática mesmo quando as cepas de C. diphtheriae não são 
toxigênicas. 
Estudos in vitro com células em cultura de tecido ajudaram 
a caracterizar os mecanismos de invasão de alguns patógenos; 
todavia, os modelos in vitro não fornecem necessariamente 
um quadro completo do processo de invasão. A compreensão 
global do processo, como ocorre na infecção adquirida natu­
ralmente, exigiu o estudo de mutantes obtidos por engenharia 
genética bem como sua capacidade de infectar animais e seres 
humanos suscetíveis. Por conseguinte, a compreensão da in­
vasão das células eucarióticas por bactérias exige que seja sa­
tisfeita grande parte dos postulados de Koch e dos postulados 
moleculares de Koch. Os parágrafos seguintes fornecem exem­
plos de invasão bacteriana de células do hospedeiro como parte 
do processo infeccioso. 
As espécies de Shigela aderem às células do hospedeiro in 
vitro. Em geral, são utilizadas células HeLa, que consistem em 
células indiferenciadas não polarizadas obtidas de um carcino­
ma cervical. A aderência provoca a polimerização da actina na 
porção adjacente da célula HeLa, o que induz a formação de 
pseudópodos pelas células HeLa com a consequente ingestão das 
bactérias. A aderência e a invasão são mediadas, pelo menos em 
parte, por produtos de genes localizados em um grande plasmí­
deo comum a muitas Shigelas. Inúmeras proteínas, inclusive os 
antígenos do plasmídeo de invasão (IpA-D, invasion plasmid 
antigens), contribuem para o processo. No interior das células 
HeLa, as Shigelas são liberadas ou escapam da vesícula fagocíti­
ca, multiplicando-se no citoplasma. A polimerização da actina 
impulsiona os microrganismos para o interior de uma célula 
HeLa e de uma célula para outra. ln vivo, as Shigelas aderem a 
integrinas na superfície das células M nas placas de Peyer, e não 
às células de absorção polarizadas da mucosa. Normalmente, as 
células M selecionam antígenos e os apresentam aos macrófa­
gos na submucosa. As Shigelas são fagocitadas pelas células M, 
passam através delas e escapam à ação dos macrófagos. As Shi­
gelas situadas no interior das células M e dos macrófagos podem 
matar essas células por ativação do processo de morte celular 
(apoptose). As Shigelas disseminam-se pelas células adjacentes 
da mucosa de modo semelhante ao modelo de invasão celular in 
vitro, por polimerização da actina, que impulsiona a bactéria. 
Com base em estudos que utilizaram células in vitro, parece 
que o processo de aderência-invasão da Yersinia enterocoliti­
ca assemelha-se ao da Shigella. A Yersinia adere à membrana 
celular do hospedeiro e induz a projeção de extensões proto­
plasmáticas. Em seguida, as bactérias são ingeridas pela célula 
do hospedeiro, com a formação de vacúolos; posteriormente, a 
membrana do vacúolo se dissolve. A invasão aumenta quando 
as bactérias são cultivadas a 22ºC mais do que a 37ºC. Após 
a penetração da Yersinia na célula, a membrana vacuolar dis­
solve-se, e as bactérias são liberadas no citoplasma. ln vivo, 
acredita-se que as espécies de Yersinia possam aderir às células 
CAPÍTULO 9 Patogênese da infecção bacteriana 155 
M das placas de Peyer e invadi-las em vez de fazê-lo nas células 
mucosas polarizadas de absorção, a exemplo da Shigella. 
A L. monocytogenes presente no ambiente é ingerida nos 
alimentos. Presumivelmente, as bactérias aderem à mucosa 
intestinal, invadem -na, alcançam a corrente sanguínea e disse­
minam-se. A patogênese desse processo foi estudada in vitro. 
L. monocytogenes adere aos macrófagos e a células intestinais 
indiferenciadas cultivadas, invadindo-os rapidamente. As es­
pécies de Listeria induzem a sua própria ingestão pelas célu­
las do hospedeiro. Uma proteína, a internalina, desempenha 
um papel primordial em tal processo. O processo de ingestão, 
movimento no interior da célula e deslocamento entre células, 
exige a polimerização da actina para impulsionar as bactérias, 
como no caso da Shigella. 
Legionella pneumophila infecta os macrófagos pulmonares, 
provocando pneumonia. A aderência de Legionella ao macró­
fago induz a formação de um pseudópodo longo e delgado 
que, em seguida, se enrola ao redor da bactéria, formando uma 
vesícula (fagocitose por enrolamento). A vesícula permane­
ce intacta; a fusão do fagolisossomo é inibida; e as bactérias 
multiplicam-se no interior da vesícula. 
N. gonorrhoeae utiliza pili como adesinas primárias e pro­
teínas associadas à opacidade (Opa) como adesinas secundá­
rias às células do hospedeiro. Certas proteínas Opa medeiam a 
aderência das bactérias às células polimorfonucleares. Alguns 
gonococos sobrevivem após fagocitose por essas células. Jun­
tos, os pili e as proteínas Opa aumentam a invasão das células 
cultivadas in vitro. Em culturas de tuba uterina (de Falópio), 
os gonococos aderem às microvilosidades das células não ci­
liadas e parecem induzir a sua ingestão por essas células. Os 
gonococos multiplicam-se no interior da célula e migram para 
o espaço subepitelial por um processo desconhecido. 
Toxinas 
Em geral, as toxinas produzidas por bactérias são classificadas 
em dois grupos: exotoxinas, e endotoxinas. As exotoxinas são 
proteínas frequentemente excretadas pela célula bacteriana. 
Contudo, algumas exotoxinas se acumulam no interior do ci­
tosol e são injetadas diretamente no interior da célula hospe­
deira ou são liberadas durante lise celular. As endotoxinas são 
moléculas lipídicas que são componetes da membrana da cé­
lula bacteriana. O Quadro 9.4 traz as principais características 
dos dois grupos. 
A. Exotoxinas 
Muitas bactérias gram-positivas e gram-negativas produzem 
exotoxinas de considerável importância clínica. Algumas des­
sas toxinas desempenharam importantes papéis na história 
mundial. Por exemplo, o tétano causado pela toxina do C. te­
tani matou até 50.000 soldados das forças do Eixo na Segunda 
Guerra Mundial; entretanto, as forças dos Aliados imunizaram 
os soldados contra tétano, de modo que apenas um número 
muito pequeno morreu por essa doença. Foram desenvolvidas 
vacinas para algumas das doenças mediadas por exotoxinas; 
tais vacinas continuam sendo importantes na prevenção de 
doenças. As vacinas - denominadas toxoides - são prepara­
das a partir das exotoxinas, modificadas de modo a perder sua 
toxicidade. Muitas exotoxinas consistem nas subunidades A e 
B. Em geral, a subunidade B medeia a aderência do complexo 
156 SEÇÃO Ili Bacteriologia 
QUADRO 9.4 Características das exotoxinas eendotoxinas (lipopolissacarídeos) 
Exotoxinas 
Excretadas pela célula viva; altas concentrações em meio líquido 
Produzidas por bactérias gram-positivas e gram-negativas 
Polipeptídeos, com massa molecular de 1 0,000 a 900,000 
Relativamente instáveis; com frequência, a toxicidade é rapidamente 
destruída por aquecimento a temperaturas acima de 60º( 
Altamente antigênicas; estimulam a formação de altos títulos de 
antitoxina. A antitoxina neutraliza a toxina 
Convertidas em toxoides não tóxicos e antigênicos por formalina, 
ácidos, aquecimento entre outros métodos. Os toxoides são usados 
para imunização (p. ex., toxoide tetânico) 
Altamente tóxicas; fatal para animais em microgramas ou menos 
Geralmente ligadas a receptores específicos em células 
Em geral, não provocam febre no hospedeiro 
Frequentemente controladas por genes extracromossômicos 
(p. ex., plasmídeos) 
da toxina a uma célula do hospedeiro e ajuda na penetração 
da exotoxina no interior da célula. A subunidade A é que for­
nece a atividade tóxica. A seguir, são apresentados exemplos 
de alguns mecanismos patogênicos associados a exotoxinas. As 
toxinas de bactérias específicas são discutidas nos capítulos de­
dicados a essas bactérias. 
C. diphtheriae é um bastonete gram-positivo capaz de crescer 
nas mucosas das vias respiratórias superiores ou em pequenas 
feridas cutâneas (Cap. 12). As cepas de C. diphtheriae que trans­
portam um corinebacteriófago lisogênico temperado (fago-� 
ou fago-w) com o gene estrutural da toxina são toxigênicas e 
produzem toxina diftérica, causando difteria. Muitos fatores 
regulam a produção da toxina; quando a disponibilidade de fer­
ro inorgânico constitui o fator limitante da velocidade de cres­
cimento, ocorre a máxima produção de toxina. A molécula de 
toxina é secretada em forma de molécula polipeptídica isolada 
(massa molecular [MM], 62,000). Essa toxina nativa é degrada­
da enzimaticamente em dois fragmentos, A e B, ligados entre si 
por uma ponte dissulfeto. O fragmento B (MM, 40,700) liga-se a 
receptores específicos da célula do hospedeiro e facilita a entrada 
do fragmento A (MM, 21,150) no citoplasma. O fragmento A 
inibe o fator de alongamento da cadeia peptídica EF-2 ao catali­
sar uma reação que retira um radical adenosina difosfato ribosil 
da molécula de NAD e o transfere para o EF-2. Com o complexo 
inativo de difosfato de adenosina ribose-EF-2 ocorre a parada da 
síntese proteica que interrompe as funções fisiológicas normais 
da célula. A toxina diftérica é muito potente. 
o e. tetani é um bastonete gram-positivo anaeróbio que 
provoca o tétano (Cap. 11). O C. tetani do ambiente contamina 
feridas, e os esporos germinam no ambiente anaeróbio do teci­
do desvitalizado. Com frequência, a infecção é insignificante e 
não se mostra clinicamente aparente. As formas vegetativas do 
C. tetani produzem a toxina tetanospasmina (MM, 150.000), 
Endotoxinas 
Parte integrante da parede celular de bactérias gram-negativas. Liberadas 
com a morte bacteriana e em parte durante o crescimento. Pode não 
ser necessário que sejam liberadas para terem atividade biológica 
Encontradas somente em bactérias gram-negativas 
Lipopolissacarídeos complexos. A porção lipídeo A provavelmente é 
responsável pela toxicidade 
Relativamente estáveis; resistem ao aquecimento a temperaturas acima 
de 60ºC por horas sem perda da toxicidade 
Fracamente imunogênicas; anticorpos são antitóxicos e protetores. 
A relação entre títulos de anticorpos e proteção contra doenças é 
menos nítida do que com exotoxinas 
Não convertidas em toxoides 
Moderadamente tóxicas; fatais para animais em dezenas a centenas de 
microgramas 
Não possuem receptores específicos em células 
Em geral causam febre no hospedeiro por l iberação de interleucina 1 e 
outros mediadores 
Síntese dirigida por genes cromossômicos 
clivada por uma protease bacteriana em dois peptídeos (MM, 
50.000 e MM, 100.000) ligados por uma ponte dissulfeto. Ini­
cialmente, a toxina liga-se a receptores existentes nas membra­
nas pré-sinápticas dos neurônios motores. Em seguida, migra 
pelo sistema de transporte axônico retrógrado pelos corpos ce­
lulares desses neurônios até a medula espinal e o tronco encefá­
lico. A toxina difunde-se nas terminações de células inibitórias, 
inclusive interneurônios glicinérgicos e neurônios secretores 
do ácido y-aminobutírico (GABA) do tronco encefálico. A to­
xina degrada a sinaptobrevina, uma proteína necessária para li­
gar as vesículas neurotransmissoras à membrana pré-sináptica. 
A liberação da glicina inibitória e do GABA é bloqueada, po­
rém os neurônios motores não são inibidos. Em consequência 
ocorre paralisia espástica. Quantidades extremamente peque­
nas da toxina podem ser letais para os seres humanos. O tétano 
é uma doença totalmente passível de prevenção em indivíduos 
com sistema imunológico normal, mediante a imunização com 
toxoide tetânico. 
C. botulinum provoca botulismo. Trata-se de um microrga­
nismo gram-positivo e formador de esporos encontrado no solo 
ou na água, e que pode crescer em alimentos (p. ex., enlatados e 
pacotes embalados a vácuo) se o ambiente for apropriadamente 
anaeróbio. Produz uma toxina extremamente potente (a mais 
potente que se conhece), mas termolábil, sendo, portanto, des­
truída por aquecimento. Existem 7 tipos sorológicos distintos de 
toxina. Os tipos A, B, E e F estão mais comumente associados à 
doença humana. A toxina assemelha-se muito à toxina tetâni­
ca, com a clivagem de uma proteína com MM de 150.000 dál­
tons (Da) em duas proteínas com MM de 100.000 Da e MM de 
50.000 Da ligadas por uma ponte dissulfeto. A toxina botulínica 
é absorvida pelo intestino e liga-se a receptores das membranas 
pré-sinápticas dos neurônios motores no sistema nervoso peri­
férico e nos nervos cranianos. A proteólise pela cadeia leve da 
toxina botulínica das proteínas-alvo nos neurônios inibe a li­
beração da acetilcolina nas sinapses, resultando em ausência de 
contração muscular e paralisia flácida. 
Esporos de C. perfringens são introduzidos em feridas por 
contaminação com solo ou fezes. Na presença de tecido necró­
tico (ambiente anaeróbio), os esporos germinam, e as células 
vegetativas podem produzir várias toxinas diferentes. Muitas 
dessas toxinas são necrosantes e hemolíticas, e - juntamente 
com a distensão do tecido pelo gás formado a partir dos car­
boidratos e da interferência no suprimento sanguíneo - fa­
vorecem a propagação da gangrena gasosa. A toxina alfa do 
C. perfringens é uma lecitinase que lesiona as membranas celu­
lares por clivagem da lecitina em fosforilcolina e diglicerídeo. 
A toxina teta também exerce efeito necrosante. Os clostrídeos 
produzem ainda colagenases e DNAses. 
Algumas cepas de S. aureus, que crescem em mucosas 
(p. ex., na vagina em associação com a menstruação) ou feridas, 
elaboram a toxina 1 da síndrome do choque tóxico (TSST 1), 
que provoca a síndrome do choque tóxico ( Cap. I 3). A doença 
caracteriza-se por choque, febre alta e exantema vermelho di­
fuso que posteriormente se descama; além disso, ocorre o com­
prometimento de vários outros sistemas orgânicos. A TSST I é 
um superantígeno que estimula os linfócitos T a produzirem 
grandes quantidades de interleucina 2 (IL2) de fator de necrose 
tumoral (TNF) (Cap. 8). As principais manifestações clínicas 
da doença parecem secundárias aos efeitos das citocinas. Mui­
tos dos efeitos sistêmicos da TSST I assemelham-se aos da to­
xicidade causada pelo lipopolissacarídeo (LPS; ver adiante). 
Algumas cepas de estreptococos �-hemolíticos do grupo A 
produzem a exotoxina pirogênica A, que se assemelha ou é 
igual à toxina eritrogênica estreptocócica, a qual resulta em fe­
bre escarlatina. A infecção rapidamente progressiva dos tecidos 
moles por estreptococos que produzem a exotoxina pirogênica 
A apresenta muitas manifestações clínicas semelhantes àquelas 
observadas na síndrome do choque tóxico por estaftlococos. A 
exotoxina pirogênica A também é um superantígeno,que atua 
de modo semelhante à TSST I. 
B. Exotoxinas associadas às doenças diarreicas 
e intoxicação alimentar 
As exotoxinas associadas às doenças diarreicas são frequen­
temente denominadas enterotoxinas. (Ver também o Qua­
dro 48.3) A seguir, são discutidas as características de algumas 
enterotoxinas importantes. 
O V. cholerae já provocou doença diarreica epidêmica ( có­
lera) em muitas partes do mundo (Cap. I7). Trata-se de outra 
doença causada por toxina de importância histórica e atual. 
Após entrar no hospedeiro através da água ou de alimentos con­
taminados, o V. cholerae penetra na mucosa intestinal e fixa-se 
às microvilosidades da borda em escova das células epiteliais do 
intestino. Geralmente do sorotipo OI (e OI39), o V. cholerae 
pode produzir uma enterotoxina com MM de 84.000 Da, a qual 
consiste em duas subunidades: A, que pode dividir-se em dois 
peptídeos, A
1 
e A2, ligados por uma ponte dissulfeto; e B. A su­
bunidade B possui cinco peptídeos idênticos e liga rapidamente 
a toxina às moléculas dos gangliosídeos da membrana celular. A 
subunidade A penetra na membrana celular e provoca grande 
aumento na atividade da adenilatociclase e na concentração de 
AMPc. O efeito final consiste em rápida secreção de eletrólitos 
CAPÍTULO 9 Patogênese da infecção bacteriana 157 
no lúmen do intestino delgado, com o comprometimento da 
absorção de sódio e cloreto, bem como perda de bicarbonato. 
Pode ocorrer diarreia maciça e potencialmente fatal (p. ex., 20 a 
30 L/dia), verificando-se ainda o desenvolvimento de acidose. 
Os efeitos deletérios do cólera decorrem da perda de líquido e do 
desequilíbrio ácido-básico; por conseguinte, o tratamento con­
siste em reposição hidreletrolítica. 
Algumas cepas do S. aureus produzem enterotoxinas quan­
do crescem em carnes, laticínios ou outros alimentos. Nos ca­
sos típicos, o alimento foi recentemente preparado, mas não 
adequadamente refrigerado. Existem pelo menos sete tipos 
distintos de enterotoxina estaftlocócica. Após a ingestão da 
toxina pré-formada, esta é absorvida no intestino, onde esti­
mula os receptores do nervo vago. O estímulo é transmitido ao 
centro do vômito no sistema nervoso central. Vômitos, quase 
sempre em jato, ocorrem em poucas horas. Diarreia é menos 
frequente. A intoxicação alimentar por estafilococos constitui 
a forma de intoxicação alimentar mais comum. As enterotoxi­
nas do S. aureus são superantígenos. 
As enterotoxinas também são produzidas por algumas 
cepas de Y. enterocolitica (Cap. I9), Vibrio parahaemolyticus 
(Cap. I7), espécies de Aeromonas (Cap. I7) e outras bactérias; 
todavia, o papel dessas toxinas na patogênese ainda não foi de­
finido. A enterotoxina produzida pelo C. perfringens é discuti­
da no Capítulo II . 
C. Lipopolissacarídeos das bactérias gram-negativas 
Os LPS (endotoxinas) das bactérias gram-negativas são compo­
nentes da parede que frequentemente são liberados quando a 
bactéria sofre lise. Essas moléculas são termoestáveis, têm MM 
entre 3.000 e 5.000 (lipo-oligossacarídeos, LOS) e alguns mi­
lhões (lipopolissacarídeos, LPS), podendo ser extraídas (p. ex., 
com fenol-água). Apresentam três regiões principais (Fig. 2.I9). 
Os efeitos fisiopatológicos dos LPS são semelhantes, inde­
pendentemente de sua origem bacteriana, à exceção dos observa­
dos em espécies de Bacteroides, que possuem estrutura diferente 
e são menos tóxicas ( Cap. 2 I). O LPS na corrente sanguínea liga­
se inicialmente a proteínas circulantes que, em seguida, intera­
gem com os receptores presentes nos macrófagos, neutrófilos e 
outras células do sistema reticuloendotelial. As citocinas pró-in­
flamatórias, tais como ILI, IL6, IL8, TNF-a., entre outras, são li­
beradas, além das cascatas do complemento e da coagulação são 
ativadas. Dos pontos de vista clínico ou experimental, podem-se 
observar febre, leucopenia e hipoglicemia; hipotensão e choque, 
resultando em comprometimento da perfusão de órgãos essen­
ciais (p. ex., cérebro, coração, rim); coagulação intravascular; e 
morte por disfunção orgânica maciça. 
A injeção de LPS causa febre depois de 60 a 90 minutos, 
tempo necessário para a liberação de ILI pelo hospedeiro. A 
injeção de ILI provoca febre em 30 minutos. A injeção repetida 
de ILI produz a mesma reação febril todas as vezes; todavia, 
a injeção repetida de LPS provoca uma resposta febril unifor­
memente decrescente em decorrência da tolerância, devido em 
parte ao bloqueio reticuloendotelial e em parte a anticorpos da 
lgM dirigidos contra o LPS. 
A injeção de LPS provoca leucopenia precoce assim como 
bacteriemia por microrganismos gram-negativos. Posterior­
mente, ocorre leucocitose secundária. A leucopenia precoce 
coincide com o início da febre em consequência da liberação 
158 SEÇÃO Ili Bacteriologia 
de 111. O LPS aumenta a glicólise em muitos tipos de célula, 
podendo levar a hipoglicemia. 
Ocorre hipotensão na fase inicial da bacteriemia por mi­
crorganismos gram-negativos ou após a injeção de LPS. Pode­
se verificar o aparecimento de constrição arteriolar e venular 
disseminada, seguida de dilatação vascular periférica, aumento 
da permeabilidade vascular, diminuição do retorno venoso, re­
dução do débito cardíaco, estagnação da microcirculação, vaso­
constrição periférica, choque e redução da perfusão dos órgãos 
e suas consequências. A coagulação intravascular disseminada 
(CID) também contribui para essas alterações vasculares. 
Os LPS situam-se entre os inúmeros agentes diferentes que 
têm a capacidade de ativar a via alternativa da cascata do com­
plemento, desencadeando uma variedade de reações mediadas 
pelo complemento (p. ex., anaftlatoxinas, respostas quimiotá­
ticas e lesão da membrana) e queda nos níveis séricos de com­
ponentes do complemento (C3, C5-C9). 
A coagulação intravascular disseminada (CID) representa 
uma complicação frequente da bacteriemia por microrganismos 
gram-negativos, embora também possa ocorrer em outras infec­
ções. O LPS ativa o fator XII (fator de Hageman) - a primeira 
etapa no sistema da coagulação intrínseca - e desencadeia a cas­
cata da coagulação que culmina na conversão do fibrinogênio 
em fibrina. Ao mesmo tempo, o plasminogênio pode ser ativa­
do pelo LPS em plasmina (uma enzima proteolítica), capaz de 
atacar a fibrina, com a consequente formação dos produtos de 
degradação da fibrina. A redução da contagem plaquetária e dos 
níveis de fibrinogênio, bem como a detecção dos produtos de 
degradação da fibrina constituem evidências de CID. Algumas 
vezes, a heparina pode prevenir lesões associadas à CID. 
O LPS provoca a aderência das plaquetas ao endotélio vas­
cular e a oclusão dos pequenos vasos sanguíneos, ocasionando 
necrose isquêmica ou hemorrágica em diferentes órgãos. 
Os níveis de endotoxina podem ser determinados pelo teste 
do límulo: um lisado de amebócitos do artrópode marinho límu­
lo (limulus) se solidifica ou coagula na presença de 0,0001 µg/mL 
de endotoxina. Esse teste é raramente usado em laboratórios clí­
nicos uma vez que é difícil de ser realizado de maneira eficiente. 
D. Peptidoglicano de bactérias gram-positivas 
O peptidoglicano das bactérias gram-positivas é constituído por 
macromoléculas de ligação cruzada que circundam as células 
bacterianas (Cap. 2 e Fig. 2.15). Podem ocorrer também altera­
ções vasculares que resultam em choque nas infecções causadas 
por bactérias gram-positivas que não contêm LPS. As bactérias 
gram-positivas possuem consideravelmente mais peptidoglicano 
associado à parede celular do que as bactérias gram-negativas. O 
peptidoglicano liberado durante a infecção pode ter muitas das 
mesmas atividades biológicas dos LPS, embora seja invariavel­
mente muito menos potente do que estes. 
Enzimas 
Muitas espécies de bactérias produzem enzimas não intrinseca­
mente tóxicas, mas que desempenham importante papel no pro­
cesso infeccioso. Algumas dessas enzimas são discutidas a seguir. 
A. Enzimas que degradam tecidos 
Muitas bactérias produzem enzimas que degradam tecidos.As mais bem caracterizadas são as enzimas de C. perfringens 
(Cap. 11), e, em menor grau, das bactérias anaeróbias (Cap. 21), 
de S. auerus (Cap. 13) e dos estreptococos do Grupo A (Cap. 14). 
O papel das enzimas que degradam tecidos na patogênese das 
infecções parece óbvio, embora de difícil comprovação, parti­
cularmente no caso de determinadas enzimas. Por exemplo, os 
anticorpos dirigidos contra as enzimas dos estreptococos que 
degradam tecidos não modificam as características da doença 
estreptocócica. 
Além da lecitinase, o e. perfringens produz a enzima pro­
teolítica colagenase, que degrada o colágeno, a principal pro­
teína do tecido conectivo fibroso, promovendo a disseminação 
da infecção nos tecidos. 
S. aureus produz a coagulase, que atua em combinação 
com fatores sanguíneos para coagular o plasma. A coagulase 
contribui para a formação das paredes de fibrina ao redor das 
lesões estaftlocócicas, ajudando esses microrganismos a per­
sistirem nos tecidos. Também provoca a deposição de fibrina 
sobre a superfície de alguns estafilococos, podendo ajudar a 
protegê-los contra fagocitose ou destruição no interior das cé­
lulas fagocíticas. 
As hialuronidases são enzimas que hidrolisam o ácido hia­
lurônico, um componente fundamental da substância do tecido 
conectivo. Essas enzimas são produzidas por muitas bactérias 
(p. ex., estaftlococos, estreptococos e anaeróbios), e ajudam sua 
disseminação através dos tecidos. 
Muitos estreptococos hemolíticos produzem estreptoqui­
nase (fibrinolisina), substância que ativa uma enzima proteo­
lítica do plasma. Em seguida, essa enzima é capaz de dissolver 
o plasma coagulado e, provavelmente, ajudar na rápida propa­
gação dos estreptococos através dos tecidos. A estreptoquinase 
tem sido utilizada no tratamento do infarto agudo do miocár­
dio para dissolver os coágulos de fibrina. 
Muitas bactérias produzem substâncias que são citolisinas 
- isto é, têm a propriedade de dissolver eritrócitos (hemo­
lisinas) ou destruir as células dos tecidos ou leucócitos (leu­
cocidinas). Por exemplo, a estreptolisina O, produzida por 
estreptococos do grupo A, é letal para camundongos e hemolí­
tica para os eritrócitos de muitos animais. A estreptolisina O é 
oxigenolábil, e pode, portanto, ser oxidada e inativada, embora 
seja reativada por agentes redutores. Além disso, é antigênica. 
Os mesmos estreptococos também produzem estreptolisina S 
oxigenoestável e induzível pelo soro, não antigênica. Os clos­
trídeos produzem diversas hemolisinas, como a lecitinase já 
descrita. As hemolisinas são produzidas pela maioria das cepas 
de S. aureus; os estafi.lococos também produzem leucocidinas. 
A maioria dos bastonetes gram-negativos isolados de locais de 
doença produz hemolisinas. Por exemplo, as cepas de E. coli 
que provocam infecções do trato urinário produzem tipica­
mente hemolisinas, enquanto as que fazem parte da microbiota 
gastrintestinal normal podem ou não produzir hemolisinas. 
B. lgA1 proteases 
A imunoglobulina A é o anticorpo secretor existente na superfi­
cie das mucosas. Ocorre em duas formas primárias, IgAl e IgA2, 
que diferem próximo ao centro ou região da dobradiça das ca­
deias pesadas das moléculas (Cap. 8). A IgAl possui uma série 
de aminoácidos na região da dobradiça que não estão presentes 
na IgA2. Algumas bactérias que causam doença produzem enzi­
mas, as lgAl proteases, que clivam a IgAl nas ligações prolina­
treonina ou prolina-serina específicas na região da dobradiça, 
inativando sua atividade de anticorpo. A IgAl protease é um 
importante fator de virulência dos patógenos N. gonorrhoeae, N. 
meningitidis, H. influenzae e S. pneumoniae. As enzimas também 
são produzidas por algumas cepas de Prevotella melaninogenica, 
certos estreptococos associados a doença dentária e algumas ce­
pas de outras espécies que ocasionalmente provocam doença. As 
espécies não patogênicas dos mesmos gêneros não possuem genes 
que codificam a enzima e, portanto, não a produzem. A produção 
da IgAl protease possibilita aos patógenos inativarem o anticor­
po primário encontrado na superfície das mucosas, eliminando, 
assim, a proteção do hospedeiro conferida pelo anticorpo. 
Fatores antifagocíticos 
Muitos patógenos bacterianos são rapidamente destruídos após 
sua ingestão por células polimorfonucleares ou macrófagos. 
Alguns patógenos escapam da fagocitose ou dos mecanismos 
microbicidas dos leucócitos ao adsorverem componentes nor­
mais do hospedeiro à sua superfície. Por exemplo, S. aureus 
possui a proteína A de superfície, que se liga à porção Fc da 
IgG. Outros patógenos possuem fatores de superfície que im­
pedem a fagocitose (p. ex., S. pneumoniae e N. meningitidis) e 
muitas outras bactérias apresentam cápsulas de polissacarídeo. 
S. pyogenes (estreptococos do grupo A) têm a proteína M. N. 
gonorrhoeae (gonococos) são dotadas de pili. A maioria dessas 
estruturas de superfície antifagocíticas exibe muita heteroge­
neidade antigênica. Por exemplo, existem mais de 90 tipos de 
polissacarídeo capsular pneumocócico e mais de 150 tipos de 
proteína M dos estreptococos do grupo A. Os anticorpos contra 
um tipo de fator antifagocítico (p. ex., polissacarídeo capsular, 
proteína M) protegem o hospedeiro contra as doenças causadas 
por bactérias desse tipo, mas não das causadas por outros tipos 
antigênicos do mesmo fator. 
Algumas bactérias (p. ex., Capnocytophaga e Bordetella) 
produzem fatores solúveis ou toxinas que inibem a quimiota­
xia dos leucócitos e, portanto, evitam a fagocitose por um me­
canismo diferente. 
Patogenicidade intracelular 
Algumas bactérias (p. ex., M. tuberculosis, Listeria monocyto­
genes, espécies de Bruce/la e de Legionella) vivem e crescem 
em ambiente hostil no interior das células polimorfonucleares, 
macrófagos ou monócitos. As bactérias vencem esse desafio 
por vários mecanismos: podem evitar sua entrada nos fago­
lisossomos, sobrevivendo no citosol dos fagócitos; impedir a 
fusão do fagossomo-lisossomo e sobreviver no interior do fa­
gossomo; ou ser resistentes às enzimas lisossômicas e sobrevi­
ver no interior do fagolisossomo. 
Muitas bactérias são capazes de sobreviver no interior de 
células não fagocíticas (ver seção anterior, Invasão das células e 
dos tecidos do hospedeiro). 
Heterogeneidade antigênica 
As estruturas de superfície das bactérias (e de muitos outros mi­
crorganismos) exibem considerável heterogeneidade antigênica. 
Com frequência, esses antígenos são utilizados como parte de 
um sistema de classificação sorológica das bactérias. A classifica­
ção de 2.000 ou mais espécies diferentes de Salmonella baseia-se 
principalmente nos tipos de antígenos O (cadeia lateral do LPS) 
CAPÍTULO 9 Patogênese da infecção bacteriana 159 
e H (flagelar). De modo semelhante, existem mais de 150 tipos 
de E. coli O e mais de 100 tipos de E. coli K (cápsula). O tipo an­
tigênico das bactérias pode constituir um marcador de virulên­
cia, relacionado com a natureza clonal dos patógenos, embora 
possa não ser realmente o fator (ou fatores) de virulência. O tipo 
antigênico de V. cholerae O 1 e o tipo antigênico O 139 caracteris­
ticamente produzem a toxina do cólera, enquanto um número 
muito pequeno dos vários outros tipos O produz a toxina. Ape­
nas alguns dos tipos de proteína M de estreptococos do grupo A 
estão associados à elevada incidência de glomerulonefrite pós­
estreptocócica. Os tipos de N. meningitidis com polissacarídeo 
capsular A e C estão associados à meningite epidêmica. Nos 
exemplos citados anteriormente, bem como em outros sistemas 
de tipagem que utilizam antígenos de superfície na classificação 
sorológica, os tipos antigênicos para determinado microrganis­
mo isolado da espécie permanecem constantes durante a infec­
ção e o repique das bactérias. 
Algumas bactérias e outros microrganismos têm a capacida­
de de efetuar alterações frequentes na forma antigênica de suas 
estruturas de superfície in vitro e, presumivelmente, in vivo. Um 
exemplo bem conhecido é o de Borrelia recurrentis,que provoca 
febre recorrente. Um segundo exemplo amplamente estudado é 
N. gonorrhoeae (Cap. 20). O gonococo possui três antígenos de 
superfície expostos que mudam suas formas a uma taxa muito 
elevada, de cerca de uma em cada 1.000: lipo-oligossacarídeo, 
6 a 8 tipos; pili, inúmeros tipos; e proteína Opa, 1 O a 12 tipos 
para cada cepa. O número de formas antigênicas é tão grande 
que cada cepa de N. gonorrhoeae parece antigenicamente distin­
ta das outras cepas. A mudança de formas para cada um dos três 
antígenos parece estar sob o controle de diferentes mecanismos 
genéticos. Acredita-se que a frequente mudança de formas anti­
gênicas possibilite aos gonococos escaparem do sistema imuno­
lógico do hospedeiro. Os gonococos não atacados pelo sistema 
imunológico sobrevivem e causam doença. 
Sistemas de secreção bacteriana 
Os sistemas de secreção bacteriana são importantes na pato­
gênese da infecção e são essenciais para a interação da bac­
téria com as células eucarióticas do hospedeiro. As bactérias 
gram-negativas possuem paredes celulares com membranas 
citoplasmáticas e membranas externas, e uma fma camada de 
peptidoglicano está presente. As bactérias gram-positivas pos­
suem uma membrana citoplasmática e uma espessa camada de 
peptidoglicano (Cap. 2). Algumas bactérias gram-negativas e 
algumas gram-positivas também possuem cápsulas. A com­
plexidade e a rigidez das estruturas da parede celular exigem 
mecanismos de translocação de proteínas através das membra­
nas. Esses sistemas de secreção estão envolvidos em funções 
celulares, tais como o transporte de proteínas que formam os 
pili ou flagelos e na secreção de enzimas ou toxinas para o meio 
extracelular. As diferenças de estrutura da parede celular entre 
bactérias gram-negativas e gram-positivas resultam em dife­
renças nos sistemas de secreção. Os mecanismos básicos dos 
diferentes sistemas de secreção são discutidos no Capítulo 2. 
(Observação: os sistemas de secreção bacteriana foram nome­
ados segundo a ordem de sua descoberta e não por seus meca­
nismos de ação.) 
Bactérias gram-negativas e gram-positivas possuem uma via 
geral de secreção (Sec) como principal mecanismo de secreção 
160 SEÇÃO Ili Bacteriologia 
proteica. Essa via está envolvida na inserção da maior parte das 
proteínas de membrana bacterianas e fornece a principal via pa­
ra proteínas que atravessam a membrana citoplasmática bacte­
riana. As bactérias gram-negativas apresentam seis mecanismos 
adicionais denominados sistemas de secreção (SS) 1-6, ou tipo 
1-VI, para secreção de proteínas. Esses sistemas podem ainda 
ser caracterizados como Sec dependentes (tipos 2 e 5) e Sec in­
dependentes (tipos l, 3, 4, 6). O SS do tipo 2 usa o sistema Sec 
para transportar proteínas para o periplasma e, então, formar 
um canal na membrana externa composto por um complexo de 
proteínas formadoras de poros. Esse sistema é usado para secre­
ção de toxinas bacterianas do tipo AB como a toxina colérica. 
De forma similar, o SS do tipo 5 usa o sistema Sec para exportar 
moléculas denominadas autotransportadores para o periplas­
ma. Uma vez no periplasma, essas moléculas se autotranspor­
tam através da membrana externa. Um exemplo desse sistema 
inclui a IgA protease secretada pelo Haemophilus influenzae. 
As vias independentes da sec incluem os sistemas de secreção 
tipo 1 ou sistema de secreção ABC (A TP binding cassette) e o 
sistema de secreção tipo 3. As vias de tipos 1 e 3 não interagem 
com proteínas que tenham sido transportadas através da mem­
brana citoplasmática pelo sistema Sec. Em vez disso, estes siste­
mas translocam proteínas através da membrana citoplasmática 
e da membrana externa. O tipo 3, que é ativado sob contato 
com uma célula eucariótica hospedeira, promove o transporte 
de proteínas diretamente do interior da bactéria para o interior 
da célula hospedeira empregando uma estrutura semelhante a 
uma agulha de seringa denominada injectosoma. Uma vez no 
citoplasma da célula hospedeira, as proteínas transportadas po­
dem manipular as funções da célula hospedeira. A via do siste­
ma de secreção tipo 4 consiste em um complexo de proteínas 
que forma um canal capaz de transportar diretamente proteínas 
e moléculas de DNA .. O mais recente SS a ser descoberto é a do 
tipo 6. Esse sistema desempenha um papel importante na se­
creção de proteínas de virulência em Vibrio cholereae e Pseudo­
monas aeruginosa entre outros patógenos gram-negativos. Um 
sétimo SS foi descoberto em Mycobacterium tuberculosis e ain­
da não está totalmente compreendido. Parece que esse sistema 
transporta proteínas de membrana necessárias para a virulência 
do microrganismo. Outros exemplos dos sistemas de secreção e 
seus papéis na patogênese estão mostrados no Quadro 9.5. Es­
ses exemplos são apenas uma pequena amostra concebida para 
ilustrar os papéis do grande número de atividades de secreção 
molecular usadas pelas bactérias para fornecer nutrientes e faci­
litar a sua patogênese. 
Necessidade de ferro 
O ferro é um nutriente essencial para o crescimento e o meta­
bolismo de praticamente todos os microrganismos e é um co­
fator essencial de vários processos metabólicos e enzimáticos. A 
disponibilidade de ferro em seres humanos para a assimilação 
microbiana é limitada, pois o ferro é sequestrado pelas proteínas 
transferrina, de alta afinidade pelo ferro no soro, e pela lacto­
ferrina, em superfícies mucosas. A habilidade de um patógeno 
microbiano para obter o ferro de maneira eficaz a partir do am­
biente é fundamental para a sua habilidade de causar doenças. A 
necessidade de ferro, como a bactéria o adquire e o metabolismo 
bacteriano do ferro são discutidos no Capítulo 5. 
A disponibilidade de ferro afeta a virulência de muitos pa­
tógenos. Por exemplo, o ferro é um fator de virulência essencial 
em P. aeruginosa. O uso de modelos em animais em infecção 
por Listeria monocytogenes mostrou que o aumento de ferro 
resultou em aumento da suscetibilidade à infecção, enquanto 
uma depleção de ferro resultou em uma sobrevida prolongada; 
terapias de suplementação de ferro resultam em aumento de in­
fecções letais. 
A diminuição da disponibilidade de ferro também pode ser 
importante na patogênese. Por exemplo, o gene para a toxina 
diftérica reside em um bacteriófago lisogênico e somente as 
cepas de e. diphtheriae que portam o bacteriófago lisogênico 
são toxigênicas. Na presença de pouco ferro disponível ocorre 
uma produção aumentada de toxina diftérica e de doença po­
tencialmente mais grave. A virulência de N. meningitidis em 
camundongos aumenta 1.000 vezes ou mais quando as bacté­
rias crescem em condições de restrição de ferro. 
A deficiência de ferro no homem também desempenha um 
papel no processo infeccioso. A deficiência de ferro acomete mi­
lhões de pessoas no mundo inteiro. A deficiência de ferro pode 
afetar múltiplos órgãos e sistemas, inclusive o sistema imuno­
lógico, e pode resultar em comprometimento da imunidade 
mediada por células e diminuição da função de células poli­
morfonucleares. A utilização de terapia por ferro durante uma 
infecção ativa provavelmente deverá ser adiada, pois muitos mi­
crorganismos patogênicos podem utilizar pequenas porções do 
ferro suplementar, resultando em aumento da virulência. 
O papel dos biofilmes bacterianos 
Um bioftlme é um agregado de bactérias interativas ligadas a 
uma superfície sólida ou umas às outras, revestidas por matriz 
exopolissacarídica. Distingue-se da forma planctônica ou bac­
teriana de crescimento livre, onde as interações entre os mi­
crorganismos não ocorrem da mesma maneira. Os biofilmes 
formam uma espécie de camada de limo em superfícies sólidas 
e ocorrem em toda a natureza. Uma única ou várias espécies de 
bactérias podem estar envolvidas, podendo coagregar-se para 
formar um biofilme. Os fungos (inclusive as leveduras) estão 
envolvidos ocasionalmente. Uma vez formado o biofilme, as 
moléculas de quorum sensing produzidas pela bactéria no bio­
ftlme acumulam-se, resultando em modificaçãoda atividade 
metabólica bacteriana. A biologia básica dos biofilmes exopo­
lissacarídicos (glicocálice) é discutida no Capítulo 2, as molé­
culas de quorum sensing são discutidas no Capítulo 1. 
As bactérias na matriz exopolissacarídica podem estar pro­
tegidas dos mecanismos imunológicos do hospedeiro. A ma­
triz também funciona como uma barreira à difusão de alguns 
antimicrobianos, enquanto outros podem ligar-se a ela. Algu­
mas bactérias no interior do bioftlme mostram acentuada re­
sistência aos antimicrobianos em contraste com a mesma cepa 
bacteriana que cresce em meio de cultura (forma planctônica), 
o que ajuda a explicar por que é tão difícil tratar as infecções 
associadas a biofilmes. 
Os biofilmes são importantes em infecções humanas per­
sistentes e difíceis de tratar. Alguns exemplos incluem infec­
ções por Staphylococcus epidermidis e S. aureus em cateteres 
venosos centrais, infecções oculares como as que ocorrem com 
lentes de contato e lentes intraoculares, na placa dental e em 
infecções em próteses. Talvez o melhor exemplo de biofilme 
em infecções humanas sejam as causadas por Pseudomonas ae­
ruginosa em pacientes com fibrose cística. 
CAPÍTULO 9 Patogênese da infecção bacteriana 161 
QUADRO 9.5 Exemplos de moléculas translocadas por sistemas de secreção bacteriana e sua relevância na 
patogênese 
Sistema de secreção 
Tipo 1 (sec independente) 
Tipo 2 (sec dependente) 
Tipo 3 (sec independente 
e dependente de 
contato) 
Tipo 4 (sec dependente e 
independente) 
Substratos proteicos 
Substratos de DNA 
Tipo 5 (sec dependente) 
Tipo 6 (sec independente) 
Tipo 7 (sec dependente) 
Gênero/Espécie 
Escherichia co/i 
Proteus vulgaris 
Morganella morganii 
Bordetella pertussis 
Pseudomonas aeruginosa 
Serratia marcescens 
Pseudomonas aeruginosa 
Legionella pneumophila 
Vibrio cholerae 
Serratia marcescens 
Espécies de Yersinia 
Pseudomonas aeruginosa 
Espécies de Shigella 
Salmonella enterica subespécies entérica 
sorotipos Choleraesuis, Dublin, 
Paratyphi, Typhi, Typhimurium 
entre outros. 
Escherichia co/i 
Vibrio parahaemolyicus 
Bordetella pertussis 
Helicobacter pylori 
Neisseria gonorrhoeae 
Helicobacter pylori 
Neisseria gonorrhoeae 
Haemophilus influenzae 
Escherichia co/i 
Shigella flexneri 
Serratia marcescens 
Espécies de Bordetella 
Bordetella pertussis 
Yersinia pestis 
Pseudomonas aeruginosa 
Vibrio cholerae 
Mycobacterium tuberculosis 
CFP, proteína de filtrado de cultura de lOkDa. 
ESAT-6, alvo antigênico precocemente secretado de 6kDa. 
RESUMO DO CAPÍTULO 
• Animais e humanos são colonizados por uma microbiota 
normal abundante, que em regra geral não é patogênica e é 
benéfica ao hospedeiro. 
• Bactérias virulentas causam doenças utilizando uma série 
de fatores de virulência que facilitam a aderência, persistên­
cia, invasão e toxigenicidade. 
• Genes que codificam fatores de virulência podem ser car­
reados por elementos genéticos móveis tais como plasmí­
deos, bacteriófagos ou são localizados em grandes ilhas de 
patogenicidade no cromossomo bacteriano. 
• Pili e fímbrias são estruturas em forma de bastão ou fio de 
cabelo, respectivamente, que facilitam a aderência nas célu­
las do hospedeiro. 
Substrato e papel na patogênese 
a.-Hemolisina faz poros na membrana das células 
Hemolisina 
Hemolisina 
Adenilatociclase que catalisa a síntese do AMPc 
Protease alcalina 
Zn protease produz danos à célula hospedeira 
Elastase, exotoxina A, fosfolipase C, outros 
Fosfatase ácida, lipase, fosfolipase, protease, RNAse 
Toxina do cólera 
Hemolisina 
Sistema Ysc-Yop; toxinas que bloqueiam fagocitose e induzem 
apoptose 
Citotoxina 
Controla a sinalização, invasão e morte das células do hospedeiro 
Efetores para ilhas de patogenicidade 1 e li (SPl1 e SPl2) de 
Salmonella, que promovem a fixação e invasão das células 
hospedeiras 
�ntero-hemorrágica (EHEC) e enteropatogênica (EPEC); ruptura 
das barreiras epiteliais e junções estreitas 
Citotoxicidade direta 
Toxina pertússica 
Citotoxina 
Sistema de exportação de DNA 
Sistema de captação e liberação de DNA 
lgA 1 protease altera a região da dobradiça e destrói a atividade do 
anticorpo (dependente de sec) 
lgA 1 protease, adesinas 
Se ri na protease, adesinas, pili tipo 1 , pili P 
Serina protease 
Proteases 
Adesinas 
Hemaglutinina filamentosa 
Antígeno capsular 
Toxina formadora de poros Hcp1 
Fatores de virulência 
CPF-1 O, ESAT-6 e antígeno alvo de células T 
• A invasão das células do hospedeiro é um mecanismo com­
plexo que envolve a elaboração de proteínas que facilitam 
a entrada. 
• Toxinas bacterianas podem ser extracelulares (exotoxinas) 
ou serem componentes da parede da célula bacteriana (en­
dotoxina, LPS) e estão entre as toxinas mais potentes na 
natureza (p. ex., toxina botulínica). 
• Outros importantes mecanismos de sobrevivência e de 
virulência bacteriana incluem: enzimas que degradam te­
cidos, fatores antifagocíticos, IgA proteases, heterogenici­
dade antigênica e a habilidade de quelar ferro. 
• Devem existir, pelo menos, sete sistemas de secreção bacte­
rianos conhecidos, por complexos proteicos ou canais res­
ponsáveis pelo transporte de proteínas e toxinas através da 
célula bacteriana. 
162 SEÇÃO Ili Bacteriologia 
QUESTÕES DE REVISÃO 
1. Uma mulher de 22 anos, que trabalha em uma creche, apresen­
ta-se com história de febre e tosse há 2 meses. Durante este pe­
ríodo, perdeu 5 kg. A radiografia de pulmão mostrou infiltrado 
bilateral nos lobos inferiores com cavidades. Um esfregaço co­
rado do seu escarro mostrou bacilos álcool-acidorresistentes. 
O modo mais provável pelo qual a paciente adquiriu a infecção 
foi 
(A) Atividade sexual 
(B) Ingestão de microrganismos na comida 
(C) Ter segurado um corrimão contaminado ao entrar em um 
transporte público 
(D) Ter manuseado um pote que continha terra 
(E) Ter aspirado gotículas em aerossol contendo microrganismos 
2. Durante uma pandemia por doença bem caracterizada, um 
grupo de 175 passageiros voou de Lima, capital do Peru, para Los 
Angeles, EUA. O lanche servido no avião, que incluía salada de 
caranguejo, foi ingerido por cerca de 66% dos passageiros. Após 
pousar em Los Angeles, muitos passageiros seguiram voo com 
destino a outras partes da Califórnia e outros Estados do Oeste 
dos EUA. Dois dos passageiros que permaneceram em Los An­
geles desenvolveram diarreia aquosa grave. Não se sabe qual é o 
estado dos demais passageiros. A provável causa da diarreia dos 
dois passageiros foi a(o): 
(A) Escherichia coli 0157:H7 (lipopolissacarídeo O antígeno 
157; antígeno flagelar 7) 
(B) Vibrio cholerae tipo 0139 (lipopolissacarídeo O antígeno 139) 
(C) Shigella dysenteriae tipo 1 
(D) Campylobacter jejuni 
(E) Entamoeba histolytica 
3. Uma mulher de 65 anos recebeu um cateter venoso central para 
terapia intravenosa. Ela apresentou febre e posteriormente teve 
várias culturas de sangue positivas para S. epidermidis. Todos os 
isolados de S. epidermidis apresentaram a mesma morfologia co­
lônica e o mesmo padrão de sensibilidade aos antimicrobianos, 
sugerindo ser a mesma cepa. Acredita-se que essa cepa formou 
um biofilme no cateter. Qual das seguintes afirmativas sobre esta 
infecção está correta? 
(A) O biofilme contendo S. epidermidis provavelmente foi reti­
rado por lavagem do cateter 
(B) A produção de um polissacarídeo extracelular inibe o cres­
cimento de S. epidermidis, limitando a infecção 
(C) A cepa de S. epidermidis presente no biofilme provavelmente 
é mais suscetível a terapia antimicrobiana, pois a bactéria 
apresenta uma diminuição de sua atividade metabólica 
(D) A habilidade do sistema de quorum sensing da cepa de S. 
epidermidis resulta em uma diminuição da suscetibilidade a 
terapia antimicrobiana 
(E) As complexas interações moleculares presentes no biofilme 
tornam difícil uma terapia antimicrobiana eficaz, sendo 
provável que o cateter tenha que ser removido para curar a 
infecção 
4. O primeiro microrganismo a satisfazer os postulados de Koch 
(no fim do

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