Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 1 organizadoras Jeane Ap. R. de Godoy Rosin Norma Regina Truppel Constantino Sandra Medina Benini cidade, resiliência e meio ambiente 1ª Edição ANAP Tupã/SP 2018 2 EDITORA ANAP Associação Amigos da Natureza da Alta Paulista Pessoa de Direito Privado Sem Fins Lucrativos, fundada em 14 de setembro de 2003. Rua Bolívia, nº 88, Jardim América, Cidade de Tupã, São Paulo. CEP 17.605-310. Contato: (14) 99808-5947 www.editoraanap.org.br www.amigosdanatureza.org.br editora@amigosdanatureza.org.br Editoração e Diagramação da Obra: Sandra Medina Benini; Jeane Ap. R. de Godoy Rosin Revisão Ortográfica: Smirna Cavalheiro Ficha Catalográfica Índice para catálogo sistemático Brasil: Planejamento Urbano e Paisagismo R821c Cidade, Resiliência e Meio Ambiente / Jeane Ap. R. de Godoy Rosin; Norma Regina Truppel Constantino; Sandra Medina Benini (orgs). 1 ed. – Tupã: ANAP, 2018. 180 p; il.; 14.8 x 21cm ISBN 978-85-68242-69-8 1. Espaço Urbano 2. Ambiente 3. Sustentabilidade I. Título. CDD: 710 CDU: 710/49 Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 3 CONSELHO EDITORIAL Profª Drª Alina Gonçalves Santiago - UFSC Profª Drª Ana Klaudia de Almeida Viana Perdigão - UFPA Prof. Dr. André de Souza Silva - UNISINOS Profª Drª Andrea Holz Pfutzenreuter - UFSC Profª Drª Célia Regina Moretti Meirelles - UPM Profª Drª Daniela de Souza Onça - FAED/UESC Profª Drª Denise Antonucci - UPM Prof. Dr. Edson Leite Ribeiro - Unieuro - Brasília / Ministério das Cidades Profª Drª Eliana Corrêa Aguirre de Mattos - UNICAMP Prof. Dr. Francisco Marques Cardozo Júnior - UESPI Prof. Dr. Glauco de Paula Cocozza - UFU Prof. Dr. João Roberto Gomes de Faria - FAAC/UNESP Profª Drª Karin Schwabe Meneguetti - UEM Profª Drª Márcia Eliane Silva Carvalho - UFS Profª Drª Maria Augusta Justi Pisani - UPM Profª Drª Maria José Neto - UFMS Profª Drª Martha Priscila Bezerra Pereira - UFCG Prof. Dr. Maurício Lamano Ferreira - UNINOVE Profª Drª Natacha Cíntia Regina Aleixo - UEA Profª Drª Renata Cardoso Magagnin - FAAC/UNESP Prof. Dr. Ricardo de Sampaio Dagnino - UNICAMP Profª Drª Risete Maria Queiroz Leao Braga - UFPA Profª Drª Ruth Maria da Costa Ataide - UFRN Prof. Dr. Salvador Carpi Junior - UNICAMP Profª Drª Simone Valaski - UFPR Prof. Dr. Vitor Corrêa de Mattos Barretto - FCAE/UNESP 4 ORGANIZADORAS DA OBRA Jeane Ap. R. de Godoy Rosin Professora e Pesquisadora do UNIVAG - Centro Universitário de Várzea Grande-MT. Possui Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Tupã (1986), Especialização em Planejamento e Gestão Municipal pela FCT/UNESP (2004), Mestrado em Direito do Estado pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília (2011) e Doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie/SP (2016) e Pós-doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela FAAC/UNESP - Campus de Bauru-SP (2018). Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase no Planejamento Urbano e Regional, atuando principalmente nos seguintes temas: gestão pública, sustentabilidade urbana, projetos de intervenção urbanística/requalificação de espaços públicos e políticas públicas atreladas ao direito à cidade. Norma Regina Truppel Constantino Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Paraná (1979), mestrado em Planejamento Urbano e Regional Assentamentos Humanos pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1994) e doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (2005). Atualmente é professor assistente doutor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho no Curso de Arquitetura e Urbanismo e no Mestrado Acadêmico em Arquitetura e Urbanismo. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Projetos de Espaços Livres Urbanos, atuando principalmente nos seguintes temas: paisagem urbana, paisagismo, espaços livres urbanos e história da cidade e do território. Sandra Medina Benini Professora e Pesquisadora do UNIVAG - Centro Universitário de Várzea Grande-MT. Possui Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Marília (1995), Bacharelado em Direito pela Faculdade de Direito da Alta Paulista (2005), Licenciatura em Geografia pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais (2014), Especialização em Administração Ambiental pela Faculdade de Ciências Contábeis e Administração de Tupã (2005), Especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho (2008), Mestrado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2009), Doutorado em Geografia na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2015), Doutorado em Arquitetura e Urbanismo pelo PPGAU/FAU Mackenzie (2016) e Pós-doutorado em Arquitetura e Urbanismo (PNPD/Capes) pela FAAC/UNESP - Campus de Bauru-SP (2017). Tem experiência na área de Planejamento Urbano e Regional, Planejamento Ambiental e Direito Urbanístico, atuando principalmente nos seguintes temas: políticas públicas, política urbana, gerenciamento de cidades e gestão ambiental. Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 5 SUMÁRIO PREFÁCIO .......................................................................................... Antonio Busnardo Filho Antonio Soukef Júnior 07 Capítulo 1 ......................................................................................... QUALIDADE DE VIDA URBANA: DISCUTINDO VULNERABILIDADE E RESILIÊNCIA URBANAS Angela Santana de Oliveira Douglas Gallo 09 Capítulo 2 ......................................................................................... A METRÓPOLE EM PEDAÇOS: A FRAGMENTAÇÃO E OS PADRÕES DE CONURBAÇÃO DA REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA José Vandério Cirqueira 23 Capítulo 3 ......................................................................................... SEIS ELEMENTOS DA FORMA URBANA E UM PROCEDIMENTO DE ANÁLISE Adilson Macedo 43 Capítulo 4 ......................................................................................... MOBILIDADE URBANA E MUDANÇAS CLIMÁTICAS: ORIENTAÇÕES PARA MEDIDAS ADAPTATIVAS Clarisse Linke Daniel Oberling João Pedro M. Rocha 69 6 Capítulo 5 ........................................................................................ LEITURA E POTENCIALIDADES DA VEGETAÇÃO URBANA EM CALÇADAS DE CUIABÁ/MT Angela Santana de Oliveira Douglas Luciano Lopes Gallo Marcos de Oliveira Valin Jr. 87 Capítulo 6 ........................................................................................ AÇÕES DE SAÚDE AMBIENTAL NOS PLANOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DO OESTE CATARINENSE Maria Assunta Busato Simone Cristine dos Santos Nothaft Lucimare Ferraz Carla Rosane Paz Arruda Teo 101 Capítulo 7 ......................................................................................... PROPOSTA DE SISTEMA SANITÁRIO PÚBLICO VOLTADA À PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE EM ASSENTAMENTOS DE INTERESSE SOCIAL NO ESTADO DO TOCANTINS, BRASIL Roberto Righi Eleana Patta Flain 119 Capítulo 8 ........................................................................................ OCUPAÇÃO URBANA EM MANANCIAIS: ESTUDO DE CASO DO RESERVATÓRIO BILLINGS Daniel Ladeira Almeida 143 Capítulo 9 ....................................................................................... AGRICULTURA URBANA E POLÍTICAS PÚBLICAS: EXIGÊNCIAS DA CIDADE CONTEMPORÂNEA Eloisa Carvalho de Araujo Fabíola Dornelles Torres Machado 163 Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 7 PREFÁCIO Antonio Busnardo Filho1 Antonio Soukef Júnior2 A presente obra, Cidade, Resiliência e Meio Ambiente,propõe a análise de temas de importância fundamental para a compreensão do espaço urbano contemporâneo e de como tratá-lo para se ter qualidade de vida e melhor sociabilidade, independente da violência e da segregação socioespacial, coisas comuns no cotidiano das cidades. Os autores são profissionais competentes nas suas áreas de pesquisa e atuação, e apresentam, de forma instigante, esses temas que compõem o dia a dia das cidades, atingindo os cidadãos sem que eles se deem conta. Esses temas são assuntos de conversas, conforme os fatos urbanos são experienciados por todos que vivem e convivem em cidades. Assim, questões da saúde, de vulnerabilidade, da capacidade de recuperação dos aspectos originais após um desastre qualquer das áreas urbanas são motivos para uma conversa e para o apontamento de soluções. O tamanho das cidades, sem se compreender os processos de conturbação nem a formação das Regiões Metropolitanas, o trânsito e a mobilidade urbana, a vegetação, a saúde ambiental, políticas sanitárias em áreas menos privilegiadas ou de interesse social, ocupação de áreas de mananciais, são motivos de discussão de como se gerir uma cidade, permitindo que todos os cidadãos sejam gestores urbanos. Os autores, por experiência própria e vivência intelectual dos fatos, deram a esses assuntos, aparentemente tão generalistas, a profundidade que de fato esses assuntos têm. Analisaram-nos cuidadosamente, e o conjunto da obra demonstra um fio condutor na sua composição, regido por uma visão interdisciplinar, que ecoa nos diferentes artigos. Essa interdisciplinaridade permite que os assuntos se complementem, possibilitando a compreensão da cidade contemporânea, mesmo quando a abordagem é mais específica, ou 1 Doutor em Educação (FE-USP), formado em Arquitetura e Urbanismo, professor do UNIVAG - Centro Universitário de Várzea Grande-MT. 2 Doutor em Estruturas Ambientais (FAU-USP), formado em Arquitetura e Urbanismo, professor do UNIVAG - Centro Universitário de Várzea Grande-MT. 8 seja, comente um lugar ou região mais singulares. É possível da análise desses lugares singulares se obter conhecimento para resolução de problemas de outras situações semelhantes enquanto procedimento metodológico, posto que as cidades contemporâneas têm as mesmas dificuldades de gestão. As propostas apresentadas levam em consideração os impactos causados sobre a coletividade, sugerindo políticas públicas que, às vezes, devem partir das fragilidades para se buscar um elemento integrador para as resoluções de problemas, pensando intervenções a partir de áreas de vizinhanças, possibilitando a observação e o reconhecimento do lugar. A elaboração deste livro é de importância ímpar para o estudo do urbanismo e da cidade contemporânea, considerando-se que é o olhar sobre o território próximo que permite a compreensão dos territórios mais distantes e das igualdades das cidades contemporâneas naquilo que é a marca da modernidade, a funcionalidade, suplantada nas questões cotidianas e mais corriqueiras, que tiram a importância dos assuntos mais abstratos, trazendo a gestão urbana para os assuntos mais próximos do cidadão. O interessante da obra é a análise de situações que parecem se eternizar na falta de soluções, mas os estudos mostram que com uma visão outra, com uma mudança paradigmática, é possível se ter uma nova forma de gestão, e considerar os problemas do ambiente urbano como princípios indutores de propostas viáveis para a organização das cidades contemporâneas. Capítulo 1 Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 9 QUALIDADE DE VIDA URBANA: DISCUTINDO VULNERABILIDADE E RESILIÊNCIA URBANAS Angela Santana de Oliveira3 Douglas Gallo4 Discutir a qualidade de vida nas cidades nos leva a enfrentar o desafio de defini-la, e de imergir na cidade juntamente com suas questões materiais, subjetivas, sociais e ambientais. Essa temática vem adquirindo grande importância nas discussões sobre o planejamento e a gestão urbanas, sendo que suas abordagens podem ser pautadas em aspectos objetivos (indicadores socioambientais), subjetivos (percepção populacional) e análise das políticas públicas. O planejamento urbano modernista (progressista ou funcionalista) tem sido hegemônico por grande parte do século XX, defendendo um modelo urbano perfeito e obsessão pela higiene. Porém, o paradigma ecológico tem se oposto a ele, embora neste a questão social tenha sido substituída pelo discurso do desenvolvimento sustentável e da sustentabilidade urbana. O desenvolvimento urbano sustentável muitas vezes é visto como marketing na competição entre as cidades num mercado global, sendo utilizado de forma bastante imprecisa na prática. Já no modelo da sustentabilidade urbana as políticas públicas devem adaptar a oferta de serviços à quantidade e qualidade das demandas sociais, equilibrando as necessidades cotidianas da população e os investimentos em redes de infraestrutura. Entra nesta matriz também considerar a cidade como espaço da qualidade de vida. 3 Doutora em Física Ambiental, professora do Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), campus Octayde Jorge da Silva, e-mail: angela.oliveira@cba.ifmt.edu.br 4 Doutorando em Urbanismo, mestre em Saúde Coletiva, professor do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), e-mail:douglas.luciano@ifsp.edu.br 10 O presente texto buscou discutir a qualidade de vida e a promoção da saúde no espaço público com enfoque nos conceitos de vulnerabilidade e resiliência urbanas. O termo Promoção da Saúde surge pela primeira vez no Canadá, em 1974, no chamado Informe Lalonde, quando o então ministro da Saúde, Marc Lalonde, demonstra, a partir de dados sanitários, que os investimentos efetuados exclusivamente em assistência não seriam capazes de assegurar a saúde de uma população. Lalonde mostrou que a política pública de saúde necessitava de mudanças, não apenas na forma de agir, mas especialmente na maneira de olhar e pensar a saúde e os problemas de saúde. Como consequência, em 1986 foi realizada a I Conferência Internacional da Saúde, no Canadá, cujo principal resultado foi o documento “Carta de Ottawa”, segundo o qual promoção da saúde consiste em capacitar a população para melhorar suas condições de saúde e aumentar seu controle sobre as mesmas. Hoje, trinta anos após esta primeira conferência, o conceito relaciona-se também com novas discussões sobre empoderamento e participação social. Para que uma cidade, município ou comunidade possam ser considerados saudáveis entende-se ser necessária uma vontade política do Estado, suas instituições e da sociedade civil em prol da efetivação de políticas públicas intersetoriais com foco na qualidade de vida urbana. Considerando o binômio vulnerabilidade-resiliência como conceitos integradores e multidimensionais, buscou-se reconhecer seu sentido e importância na discussão da promoção da saúde, como promoção de uma qualidade de vida urbana, intersetorial e transdisciplinar. O objetivo do presente ensaio é discutir os conceitos de vulnerabilidade e resiliência urbana e promoção de saúde, apresentando-se como referencial para a melhoria da qualidade de vida urbana e criação de cidades mais saudáveis. 1 PENSANDO A SAÚDE EM SUA POSITIVIDADE – PROMOÇÃO DA SAÚDE O conceito de promoção de saúde reforça a importância da ação ambiental e política bem como do estilo de vida como eixos norteadores. Entende-se por promoção da saúde um Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 11 [...] processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo. Para atingir um estado de completo bem- estar físico, mental e socialos indivíduos e grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida, e não como objetivo de viver. Nesse sentido, a saúde é um conceito positivo, que enfatiza os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas. Assim, a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva do setor saúde, e vai para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar global. (CARTA DE OTAWA, 1986, s/p). O foco da saúde muda, deixando de ser um objetivo a ser alcançado, tornando-se um recurso para o desenvolvimento da vida. O movimento sanitarista exerceu grande influência nas políticas públicas dos países desenvolvidos até o final do século XIX, mediante leis e grandes obras de engenharia. No início do século XX iniciou-se a era bacteriológica, quando a ênfase passou a ações de saúde com foco na prevenção pessoal. Até a década de 1970 as políticas públicas para a saúde, tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento, estiveram dominadas por essa orientação, concentrando as ações na construção de grandes hospitais e superespecialistas (WESTPHAL, 2000). No início da década de 1970, na maioria dos países, o setor de saúde começou a entrar em crise, devido aos altos custos da medicina curativa que utilizava alta tecnologia. Essa crise foi paulatinamente levando ao surgimento de estratégias baseadas em novos conceitos, iniciando um período chamado de “nova saúde pública”. Esta nova saúde pública surgiu do questionamento do poder da medicina na resolução sozinha dos problemas de saúde e do reconhecimento de que tudo que existe é produto da ação humana, em contraposição à hegemonia da terapêutica. Como consequência surgiu uma nova era de interesse social e político na saúde pública. A saúde de um indivíduo ou de uma comunidade depende também das coisas que o homem criou e faz, das interações dos grupos sociais, das políticas adotadas pelo governo e também dos mecanismos de atenção à doença. A partir da Declaração de Alma-Ata sobre Atenção Primária à Saúde em 1977, inúmeras iniciativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) culminaram com o projeto Cidades Saudáveis, em 1986. Os elementos principais dessas iniciativas foram o interesse pela pobreza, necessidade de 12 reorientação dos serviços de saúde, a importância da participação comunitária e o desenvolvimento de coalizões entre o setor público, setor privado e o voluntariado. Na década de 1980, em Toronto, no Canadá, aconteceu o congresso “Para Além da Assistência à Saúde”, que atraiu muitos interessados, visto que o Canadá já possuía inúmeras iniciativas que se caracterizavam como inseridas no Movimento Cidades Saudáveis. Os representantes do escritório europeu da OMS assumiram como novo paradigma este projeto estruturante, elaborando uma proposta de projeto de Promoção da Saúde, selecionando diversas cidades para adotarem os princípios definidos na proposta “Saúde para Todos” da OMS (WESTPHAL, 2000). A promoção da saúde surge então como uma reação à acentuada medicalização da vida social e como resposta que articula diversos recursos tecnológicos e posições ideológicas. Passa a ser um enfoque político e técnico em torno da questão da saúde como qualidade de vida. Seu conceito moderno surge e se desenvolve incluindo diversos procedimentos para a promoção da saúde: bom padrão nutricional; atendimento das necessidades para o desenvolvimento ótimo da personalidade; educação sexual; moradia adequada; recreação e condições agradáveis no lar e no trabalho. De acordo com Buss (2000), pode-se agrupar as diferentes conceituações da promoção da saúde em duas vertentes. A primeira consiste em atividades dirigidas à transformação dos comportamentos dos indivíduos, focando nos seus estilos de vida, ambientes e territórios onde se encontram, considerando a sua cultura particular, por consequência as ações se dariam no nível pessoal. A segunda vertente sustenta-se no entendimento de que a saúde é produto de um amplo espectro de fatores relacionados à qualidade de vida, incluindo aí a alimentação e nutrição, habitação e saneamento, condições de trabalho e oportunidades educacionais, ambiente físico e apoio social, além dos cuidados com a saúde de modo geral, exigindo ações mais globais e abrangentes. A criação de ambientes favoráveis à saúde implica o reconhecimento da complexidade das nossas sociedades e das relações de interdependência entre diversos setores. A proteção do meio ambiente e a conservação dos recursos naturais, o acompanhamento sistemático do impacto que as Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 13 mudanças no meio ambiente produzem, bem como a conquista de ambientes que facilitem e favoreçam a saúde, eu sua dimensão positiva (BUSS, 2003). 2 QUALIDADE DE VIDA NA CIDADE – UMA ABORDAGEM INTEGRAL A ideia de qualidade de vida introduz uma valorização de horizontes desejáveis para os grupos sociais, onde diferentes níveis de exigência e de aspirações conformam aspectos mais subjetivos e afeitos à percepção dos indivíduos. O conceito de qualidade de vida guarda relação com a satisfação das necessidades humanas, com a capacidade de uma comunidade desfrutar de uma vida média longa, de forma saudável. A tese de Vitte (2009) é que a garantia das necessidades básicas está longe de ser suficiente para a qualidade de vida plena ou para uma vida de qualidade, sendo de suma importância os fatores relativos à sociabilidade como suporte a uma percepção mais positiva da qualidade de vida. É importante salientar que essas práticas de sociabilidade vêm sofrendo duros golpes nas cidades brasileiras, especialmente nas grandes metrópoles, devido ao crescimento da violência e à segregação socioespacial. Embora a expressão qualidade de vida tenha sido originalmente utilizada com um caráter individual, especialmente na área da saúde, é necessário lembrar que o planejamento governamental tem um caráter coletivo, e que as políticas públicas são sempre orientadas a grupos populacionais. Assim sendo, ao considerar a qualidade de vida numa perspectiva do planejamento e da gestão, essas necessidades devem ser satisfeitas por políticas públicas. As necessidades humanas são regidas por dois conjuntos de valores, os relacionados ao bem-estar social e os relacionados à diferença. Os valores de bem-estar social têm vínculo com o bem-estar individual em função da saúde, segurança e riqueza, já os valores afeitos à diferença se referem a respeito, integridade, afeto e derivados das relações humanas. De acordo com a hierarquia de Maslow, as necessidades se dividem em cinco níveis: o primeiro nível está relacionado às necessidades básicas de sobrevivência; o segundo corresponde às necessidades de segurança no ambiente; o terceiro relaciona-se à necessidade de pertencimento e amor, do afeto nas relações pessoais; o quarto nível é o da estima, relativo à necessidade de 14 reconhecimento e posição social; e o quinto é o da autonomização (VITTE, 2009). A percepção de bem-estar e qualidade de vida nem sempre tem relação direta com a felicidade objetiva, mensurada por índices de nutrição, saúde, renda per capita, educação, etc. Ela está subordinada à percepção interna e ao julgamento que a pessoa faz da própria vida. Observa-se que nas sociedades democráticas ocorre uma relativa oferta de bem-estar social, porém, as necessidades humanas relacionadas ao verbo amar são mais complexas e muitas vezes esquecidas no debate da qualidade de vida. Esses aspectos podem ser relacionados às identidades sociais: vínculos e contatos com a comunidade local, vínculos com a família, amizades, participação em organizações e associações e relações com os colegas de trabalho. Uma característica importante é que as pessoas tendem a julgar a qualidadede seu ambiente mais pelo que percebem ser um bom vizinho do que pela condição física do bairro (VITTE, 2009). A qualidade de vida urbana é associada a aspectos das necessidades básicas e do ambiente físico, da imagem vinculada à paisagem urbana. A cidade é o lugar da manifestação do individual e da experiência coletiva, uma vez que existe uma multiplicidade de trocas que ajudam a produção da sociabilidade. É na cidade, como lugar, que ocorre a produção da vida, pelos modos de apropriação do espaço, e cada sociedade produz seu espaço de acordo com sua função social, os ritmos de vida, os modos de apropriação, projetos e desejos. A vida citadina se revela como espaço passível de ser sentido, pensado, apropriado e vivido pelo indivíduo, mediado pelo corpo que cria/percebe os referenciais necessários para dar sentido à experiência. A cidade pode ser entendida como um espaço concebido, vivido e percebido, agregando símbolos e valores elaborados por meio de impressões e experiências pessoais, mas também coletivas. Os indivíduos interagem com o mundo por meio das atividades cotidianas, na busca de satisfazer suas necessidades e desejos. O bairro, a praça, a rua e o pequeno comércio aproximam os moradores. Tais lugares podem ser mais que pontos de troca de mercadorias, podem possibilitar o encontro, reforçando a sociabilidade. Ao vivenciar a cidade o indivíduo percebe o meio e adquire uma imagem própria sobre o espaço, imagem esta que pode diferir de outros indivíduos. As paisagens Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 15 urbanas constituem elementos representativos da qualidade de vida. Acessibilidade, fluidez, limpeza, iluminação, qualidade das edificações, tamanho das residências, presença de áreas verdes e disponibilidade de serviços básicos são indicativos do grau de satisfação de necessidades básicas. A consciência individual é um produto social, bem como as subjetividades, e o coletivo atribui ao espaço ocupado o seu sentido, onde coexiste uma dimensão subjetiva na qual ocorre interferências de fatores socioculturais, que afetam as percepções individuais mediadas por aquelas. As cidades contemporâneas vêm assumindo características muito perversas, tornando-se muitas vezes inumanas. No entanto, pode-se empreender mudanças necessárias ao mobilizar-se coletivamente as energias e desprendendo-se de uma imagem de cidade como um inferno. O bem-estar e uma alta qualidade de vida dever ser um direito do cidadão, e é por meio da política que os cidadãos lutam por estes direitos e não o contrário (VITTE, 2009). O Estado, por meio de suas práticas, induz e provoca marcantes transformações nos usos e funções dos lugares na cidade. Ao direcionar investimentos em infraestruturas pode gerar desigualdades, já que no contexto da sociedade capitalista pode intervir aprofundando um processo de valorização diferencial da terra urbana. Qualquer intervenção na cidade capitalista não é necessariamente excludente, uma vez que todos os governos, o tempo todo, intervêm na cidade. Tais intervenções podem ser mais ou menos inclusivas de acordo com as forças sociais e políticas que estão operando no momento na realidade local. É preciso dar nova vida à cidade, fazer dela um espaço apropriável para a vida e para todos. Países como o Brasil e outros da América Latina, onde existe uma péssima distribuição de renda, analfabetismo e baixo grau de escolaridade, bem como condições ambientais e de habitação precárias, as condições de vida e saúde da população sofrem uma influência muito forte. O debate sobre a qualidade (condições) de vida e saúde tem um forte histórico na saúde coletiva (BUSS, 2000), no entanto, o desafio não é apenas mostrar que a qualidade/condições de vida afeta a saúde, influenciando fortemente a qualidade de vida, mas, sobretudo, investigar quais as intervenções, especialmente quais as políticas públicas intersetoriais, podem influenciar favoravelmente a qualidade de vida urbana. 16 3 VULNERABILIDADE E RESILIÊNCIA URBANAS – CONCEITOS INTEGRADORES O conceito de vulnerabilidade possui muitos sentidos e é utilizado em diferentes áreas do conhecimento. O termo vulnerabilidade designa, em sua origem, grupos ou indivíduos fragilizados, jurídica ou politicamente, na promoção, proteção ou garantia de seus direitos de cidadania (AYRES et al., 2003). Segundo Porto (2007), podemos dividir três grandes campos fenomênicos de complexidade onde o conceito pode ser aplicado: o mundo fisicalista, o mundo da vida e o mundo humano. Para que o conceito vulnerabilidade possa ser utilizado de forma transdisciplinar, faz-se interessante entender como é tratado em cada um desses “mundos”. No mundo fisicalista, analisado pela física, química e pelas engenharias, a vulnerabilidade é definida como a perda de resiliência, ou seja, a incapacidade de um sistema conservar certas propriedades durante ou após um distúrbio qualquer. A física define resiliência como uma alteração elástica, como a propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sofrido uma deformação elástica. Já a plasticidade é uma característica importante para a modelagem de materiais, por manterem a deformação aplicada. Importante salientar que o grau de resiliência ou vulnerabilidade, neste caso, são propriedades intrínsecas a cada material, e dependem também do grau de impacto externo sofrido. O paradigma fisicalista incorpora à discussão um jogo dialético entre rigidez e flexibilidade, entre conservação e ruptura, entre o que se perde e o que se ganha com as transformações. O conceito de vulnerabilidade no enfoque da vida (biológico) aborda o tema em relação a ecossistemas complexos. Segundo este paradigma, certos ecossistemas, espécies ou comunidades podem ser mais vulneráveis a determinadas perturbações ou riscos, como às mudanças climáticas, desmatamentos ou contaminações. A resiliência de ecossistemas é expressa pela sua capacidade de enfrentar perturbações sem a perda de sua integridade, o que se manifesta por meio de ciclos e relações globais do ecossistema como um todo. A vulnerabilidade representaria a perda de resiliência, representada pela declinação do vigor e da biodiversidade, ou pela Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 17 intensidade do impacto ambiental relacionado. O que isoladamente poderia ser considerado vulnerável pode representar o funcionamento normal de um conjunto maior. Na perspectiva do mundo do homem, o paradigma biomédico considera vulnerável a existência de indivíduos ou grupos suscetíveis com predisposição especial para contraírem enfermidades diante de situações de risco. O conceito evoluiu na perspectiva da Saúde Coletiva, ampliando o espectro de análise ao considerar não apenas a visão biológica e individual, mas também o contexto perante recursos e modos de vida que viabilizam ou restringem ciclos virtuosos de vida das pessoas e comunidades. Para tanto, tornou-se necessário entender um conjunto de processos políticos, econômicos, culturais e psicológicos, além dos propriamente biomédicos, que possibilitam o fortalecimento ou enfraquecimento diante da possibilidade de eventos mórbidos. Aqui o termo vulnerabilidade surge como estratégia conceitual e metodológica integradora. O conceito de vulnerabilidade se desenvolveu justamente em um período que considerava a chance de exposição das pessoas ao adoecimento como resultado de um conjunto de aspectos não apenas individuais, mas também coletivos, contextuais, que acarretam maior suscetibilidade a agravos, de modo inseparável com maior ou menor disponibilidade de recursos de todas as ordens para se proteger de ambos (AYRES et al., 2003). Embora risco e vulnerabilidade guardem, como vimos, uma estreita relação histórica, a confusão terminológica não traz benefícios a nenhum dos dois conceitos. Uma primeira diferençaque deve ser marcada é o caráter eminentemente analítico do risco, em contraste com as aspirações sintéticas da vulnerabilidade. Menos que isolar analiticamente, a grande pretensão é a busca da síntese, em termos abstratos, a elaboração teórica mais concreta e particularizada, nas quais os nexos e mediações entre os fenômenos são explicitadas. No plano das práticas de intervenção, especialmente nas práticas preventivas e de promoção de saúde, a confusão entre risco e vulnerabilidade é menos frequente, especialmente porque são raras as propostas que se colocam como referência a redução de vulnerabilidade (AYRES et al., 2003). A vulnerabilidade não é binária, ela é multidimensional, ou seja, em uma mesma situação estamos vulneráveis a alguns agravos e não a outros, o que pode nos deixar vulneráveis sob um aspecto pode nos proteger sob 18 outros. A vulnerabilidade não é unitária, não respondendo ao modelo “sim ou não”, há sempre gradações, estamos sempre vulneráveis em diferentes graus. A vulnerabilidade também não é estável, as dimensões e os graus de nossas vulnerabilidades mudam constantemente ao longo do tempo. O conceito de vulnerabilidade desenvolvido numa perspectiva transdisciplinar favorece uma abordagem integradora, ampliando o diálogo entre os diversos campos disciplinares e seus paradigmas. Essa abordagem integradora auxilia na compreensão dos problemas ambientais complexos pelos quais passam a cidade contemporânea, especialmente quando nos referimos à noção de qualidade de vida urbana. Conceitos integradores têm a capacidade de fornecer analogias e metáforas que facilitam a comunicação entre os distintos paradigmas, profissionais e não especialistas envolvidos nas discussões do conceito. Ao contrapor os significados de termos análogos utilizados por diferentes paradigmas e disciplinas, podemos criar condições para um novo olhar. Essa construção implica que ao nos debruçarmos sobre um problema complexo, as contradições e complementaridades sejam superadas. 4 VULNERABILIDADE SOCIAL Lidar com dificuldades da vida acaba se transformando em vulnerabilidades estruturais para certos grupos e territórios com as injustiças ambientais. A vulnerabilidade faz parte da condição humana da mesma forma que enfrentá-la, sendo expressão simultânea da liberdade humana e de seu abuso. Ela deriva das opções de desenvolvimento econômico e tecnológico, do poder exercido pelos seres humanos sobre outros, ou sobre o funcionamento da natureza, que reage e intervém nos ciclos da vida humana e não humana (PORTO, 2007). As discussões sobre vulnerabilidade que buscam integrar diferentes e irredutíveis dimensões da realidade analisada (sociais, econômicas, culturais, ambientais e de saúde) explicitam aspectos éticos essenciais para enfrentar problemas urbanos e socioambientais. Os estudos sobre populações excluídas dos países subdesenvolvidos e diferentes populações e regiões submetidas a riscos naturais ou antropocêntricos em seus modos de sobrevivência em face das precárias condições de vida e trabalho são uma importante origem Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 19 conceitual. Dessa forma, o tema vulnerabilidade foi desenvolvido neste campo para designar tanto os processos geradores quanto as características das populações e regiões com maior dificuldade de absorver esses impactos. A partir do final do século XX ocorreu o fim da contraposição entre natureza e sociedade, presente nas teorias sociais do século XIX. A natureza nem é mais predeterminada nem designada, transformando-se em produto social, sob as condições naturais de reprodução no universo civilizatório (socialização da natureza). Dessa forma, o real desafio tornou-se a transformação de ameaças civilizacionais à natureza em ameaças sociais, econômicas e políticas sistêmicas, características da sociedade de risco (BECK, 2011). De acordo com Porto (2007), a vulnerabilidade social pode ser definida como a redução da capacidade de antecipar, sobreviver, resistir e recuperar- se dos impactos decorrentes de desastres ou eventos de risco. Sua análise busca articular, num enfoque transdisciplinar, o entendimento das contribuições dos processos biológicos, geofísicos e tecnológicos aos processos socioeconômicos e políticos por trás do ciclo de geração-exposição- efeitos de certos grupos populacionais, em diferentes escalas espaciais e temporais. Diante do cenário atual das mudanças climáticas, uma questão central a ser discutida é como se darão os processos adaptativos diante de tais cenários, quais regiões e comunidades estão mais vulneráveis e quais medidas podem ser tomadas para serem revertidas essas vulnerabilidades e impactos. A adaptabilidade, ou resiliência, refere-se ao grau dos ajustes possíveis, a curto ou longo prazo, que impedem ou reduzem efeitos negativos através de práticas, processos e estruturas de um sistema. A sensibilidade está relacionada ao grau de transformações que um sistema responderá em face de tais mudanças. Nesse contexto, a vulnerabilidade expressa a extensão dos danos ou perigos que um sistema passa a sofrer com as mudanças, resultando não apenas da sensibilidade de certos sistemas, mas do modo como as pessoas, populações e sociedades irão se adaptar. As contradições e conflitos sociais na formação do território das cidades constituem um tema especial para os estudos urbanos, de planejamento e da gestão das grandes cidades. A cidade é a expressão da produção social, da dinâmica de transformação e uso do território e dos 20 recursos naturais, isso significa pensar a urbanização e o urbano como expressões do modelo de sociedade que estamos desenvolvendo, sendo este contraditório, desigual e conflituoso (PENNA; FERREIRA, 2014). O espaço urbano entra no circuito de produção e consumo da sociedade, com suas contradições e lutas pelo espaço (movimentos sociais, políticas públicas, ações regulatórias de governos, ação de mecanismos imobiliários e empresariais, dentre outros). A variedade de fatores e o caráter multidimensional da vulnerabilidade fazem com que a problemática urbana seja tratada pontualmente. O conceito de vulnerabilidade tratado tem como objetivo garantir uma linha explicativa e integradora que expresse a conjuntura de carências, para além da relação de pobreza e renda. Mesmo que processos políticos, econômicos e culturais estejam por detrás da produção de vulnerabilidades sociais, de forma macroestrutural, elas emergem nos territórios concretos onde as pessoas vivem, trabalham e se encontram expostas a diferentes riscos. Porto (2007) também diferencia vulnerabilidades populacional e institucional, sendo que aquela corresponde a grupos sociais específicos, mais vulneráveis a certos riscos, enquanto esta é relacionada à ineficiência de uma sociedade e suas instituições de regular, fiscalizar, controlar e mitigar determinados riscos. A vulnerabilidade institucional decorre de fragilidades nos marcos jurídico-normativos, nas políticas e ações institucionais, bem como de restrições dos recursos econômicos, técnicos e humanos disponíveis. O conceito de vulnerabilidade é, simultaneamente, construto e construtor dessa percepção ampliada e reflexiva, que identifica as razões últimas de um agravo e seus impactos em totalidades dinâmicas formadas por aspectos que vão de suscetibilidades orgânicas à forma de estruturação de programas de saúde, passando por aspectos comportamentais, culturais, econômicos e políticos (AYRES et al., 2003). As abordagens de vulnerabilidade e risco requerem aproximações multidisciplinares; ao se falar em processos de urbanização é necessário considerar que essas novas dinâmicas estão vinculadas a novos aspectos de transformações socioeconômicas e espaciais das cidades, às novas dinâmicas populacionais, a mudanças no mercado de trabalho, a desigualdades regionaise à nova ocupação do território. O conflito entre urbanização, desenvolvimento e meio ambiente se manifesta no aumento de riscos, seja Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 21 pela ocupação de áreas frágeis biofisicamente, seja na produção de vulnerabilidades sociais (MARANDOLA JUNIOR et al., 2013). 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O processo de urbanização das cidades trouxe novos desafios, impactando diretamente nas condições de vida das populações, especialmente das mais vulneráveis. Entende-se que a melhor forma de impactar sobre a coletividade é por meios das políticas públicas, uma vez que essas são produzidas do embate político entre diferentes classes e poderes em jogo na arena social. A promoção da saúde surge como uma nova orientação no setor saúde, que ao extrapolar sua própria área de conhecimento, abrange questões mais amplas para o desenvolvimento e obtenção da qualidade de vida. O conceito de vulnerabilidade, como conceito integrador, é capaz de auxiliar na compreensão e abordagem transdisciplinar da questão urbana e da sociedade de risco. Ao compreender uma abordagem dinâmica possibilita o diálogo entre diversas abordagens com vista à construção de uma sociedade com mais qualidade de vida. Outros temas que necessitam de maior aprofundamento, ampliando assim a compreensão da questão, são: participação social e “empoderamento” dos agentes responsáveis pela saúde urbana, no caso, a própria população. Assim, poderá ser construído um quadro teórico mais amplo sobre a problemática da qualidade de vida urbana e suas vulnerabilidades. REFERÊNCIAS ADRIANO, J. R. et al. A construção de cidades saudáveis: uma estratégia viável para a melhoria da qualidade de vida? Ciência & Saúde Coletiva, v. 5, n. 1, p. 53-62, 2000. AKERMAN, M. et al. Avaliação em promoção da saúde: foco no “município saudável”. Rev Saúde Pública, v. 36, n. 5, p. 638-646, 2000. AYRES, J. R. C. M. et al. O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios. In: CZERESNIA, D.; FREITAS, C. M. Promoção da Saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2003. p. 117-139. 22 BECK, U. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Editora 34, 2011. BONETI, L. W. Políticas públicas por dentro. 2. ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2007. BUSS, P. M. Promoção da saúde e qualidade de vida. Ciência & Saúde Coletiva, v. 5, n. 1, p. 163- 177, 2000. BUSS, P. M. Uma introdução ao conceito de promoção da saúde. In: CZERESNIA, D.; FREITAS, C. M. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2003. p. 15- 38. CARTA DE OTTAWA. Primeira conferência internacional sobre promoção da saúde. 1986. In: BRASIL. Ministério da Saúde. As cartas da promoção da saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2002. MARANDOLA JUNIOR, E. et al. Crescimento urbano e áreas de risco no litoral norte de São Paulo. Rev. Bras. Est. Pop., Rio de Janeiro, v. 30, n. 1, p. 35-56, 2013. PENNA, N. A.; FERREIRA, I. B. Desigualdades socioespaciais e áreas de vulnerabilidades nas cidades. Mercator, Fortaleza, v. 13, n. 3, p. 25-36, 2014. PORTO, M. F. S. O conceito transdisciplinar de vulnerabilidade. In: PORTO, M. F. S. Uma ecologia política dos riscos: princípios para integrarmos o local e o global na promoção da saúde e da justiça ambiental. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007. p. 145-186. VITTE, C. C. S. A qualidade de vida urbana e sua dimensão subjetiva: uma contribuição ao debate sobre políticas públicas e a cidade. In: VITTE, C. C. S.; KEINERT, T. M. M. Qualidade de vida, planejamento e gestão urbana: discussões teórico-metodológicas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. p. 89-110. WESTPHAL, M. F. O movimento cidade/municípios saudáveis: um compromisso com a qualidade de vida. Ciência & Saúde Coletiva, v. 5, n. 1, p. 39-51, 2000. Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 23 Capítulo 2 A METRÓPOLE EM PEDAÇOS: A FRAGMENTAÇÃO E OS PADRÕES DE CONURBAÇÃO DA REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA5 José Vandério Cirqueira6 A injunção [...] não pode ser una a não ser dividindo-se, rasgando-se, diferindo de si mesma, falando a cada vez diversas vezes – e com diversas vozes. (Jacques Derrida, 1994, p. 33) 1 A INSTITUCIONALIZAÇÃO DAS REGIÕES METROPOLITANAS NO BRASIL: OS DESAFIOS DA GESTÃO TERRITORIAL No Brasil, atualmente, existem oficializadas 35 Regiões Metropolitanas (RMs) e três regiões integradas de desenvolvimento econômico (RIDEs)7. No final da década de 1960 e início de 1970, elas começaram a ser definidas e reconhecidas pelo governo federal. No ano de criação das mesmas, Eurico de Andrade Azevedo (1967, p. 121) demonstrou que a institucionalização dessas 5 Este texto é fruto de parte do capítulo 01 da dissertação de mestrado em geografia intitulada Fragmentação da metrópole: constituição da Região Metropolitana de Goiânia e suas implicações no espaço intraurbano de Aparecida de Goiânia, orientada pelo professor Dr. Tadeu Pereira Alencar Arrais, defendida no Instituto de Estudos Socioambientais da UFG, no ano de 2009. 6 Doutor em geografia, professor do quadro permanente do IFG, líder do Grupo de Estudos em Ambiente e Sociedade (– GEAS), e-mail: vanderioifg@gmail.com 7 Para mais detalhes quanto às RMs e RIDEs, ver o relatório Regiões Metropolitanas do Brasil, do Observatório das Metrópoles (GARSON; RIBEIRO; RODRIGUES, 2010). Segundo esse relatório, “Algumas RMs contam ainda com colares metropolitanos, áreas de expansão metropolitana e entorno metropolitano definidos em lei. No caso das RIDEs, vale lembrar ainda, que na sua composição inclui municípios de diferentes unidades de federação. As 38 RMs/RIDEs comportam 444 municípios e estão distribuídas por 22 unidades da federação nas cinco grandes regiões” (GARSON; RIBEIRO; RODRIGUES, 2010, p. 2). 24 regiões metropolitanas no Brasil seguia uma lógica mundial que ocorria nos países desenvolvidos, e que no Brasil foram reconhecidas pelo seguinte conceito: A região metropolitana caracteriza-se por um conjunto de aglomerações urbanas em torno da cidade grande, com a qual desenvolvem uma série de relações, que passam a constituir um sistema socioeconômico próprio que, no conjunto, é mais importante do que a simples soma de suas partes. [...] O que releva notar é que esses complexos humanos abrangem extensas áreas, sem apresentar solução de continuidade no espaço urbanizado, num fenômeno de conurbação, onde o maior empolga o menor, ou, quando menos, o faz diretamente dependente, entrelaçando os problemas, fazendo-os carentes de solução comum. As RMs brasileiras só foram reconhecidas com a constituição de 1969, em plena Ditadura Militar. Esse momento histórico possibilitou a institucionalização dessas Regiões de Planejamento, que até a Constituição de 1988 eram de responsabilidade federal. Os militares viram na criação dessas áreas urbanas maior possibilidade de gestão territorial, pois no momento havia um grande fervor sobre as megacidades, a urbanização intensa em curso e, consequentemente, a sua transformação em territórios de gestão. Ronaldo Guimarães Gouvêa (2005, p. 101) alerta que, nas RMs do Brasil não há uma ação de fomento politicamente capaz de instaurar uma intervenção integrada e descentralizada na administração, na promoção de infraestrutura básica e na geração de emprego e renda. O autor argumenta que essa insuficiência de gestão integrada está no descompromissado e ausente planejamento urbano do Brasil, que se delonga desde início do século XX. O fenômeno da concentração populacional nas RMs, das conurbações e das novas “funções urbanas e regionais com alto grau de diversificação, espacialização e integração socioeconômica, exige planejamento integrado e ação conjunta permanente dos entes públicos nela atuantes” (GOUVÊA, 2005, p. 101). MarceloLopes de Souza (2003) discute que as primeiras RMs brasileiras8, as quais tinham o objetivo de tornar mais racional, sob o ângulo econômico, a prestação dos serviços comuns das metrópoles, como coleta de 8 As primeiras RMs foram: Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 25 lixo, abastecimento de água, etc., no interesse de uma gestão integrada. Mas havia outro objetivo por trás desse, alerta Souza (2003), o objetivo de geopolítica interna diz respeito a facilitar a intervenção do regime nos espaços-chave da vida econômica e político-social brasileira. Conforme demonstra Fany Davidovich (2003, p. 11), as primeiras RMs do Brasil se sustentaram sobre uma base conservadora. Nelas, um planejamento altamente “centralizado impôs um modelo que prescindiu de práticas de cooperação intermunicipal e que preteriu a efetiva representação política dos municípios participantes da região metropolitana”. Esse momento de centralização política e concentração urbana possibilitou a generalização de extensas áreas metropolitanas e acirrados processos de conurbação. Luís Dórich (1966, p. 7), discutindo o futuro das cidades latino- americanas já na década de 1960, apontou sérios problemas urbanos ligados ao crescimento desordenado e aos recentes processos de conurbação das cidades pobres da América Latina. A partir dessa reflexão, o autor demonstrou-se pessimista, argumentando que essas problemáticas cidades carecem de “órgãos de governo metropolitano que se encarregarão de coordenar todos os aspectos fundamentais dos serviços públicos”. Conforme defende Souza (2003), quando as aglomerações urbanas aceleram seu crescimento e se destacam, apresentando-se como áreas econômicas fortalecidas, com polarização regional, então elas passam a ser efetivamente constituídas enquanto RMs, e “nelas os espaços urbanos se acham fortemente ‘costurados’, especialmente com a ajuda da ‘linha’ mais importante, [...] que são os deslocamentos diários dos trabalhadores” (SOUZA, 2003, p. 33)9. Essa complexidade de elementos das metrópoles brasileiras incita a necessidade de apoio institucional e de enfrentamento dos problemas de ordem interna e regional. Segundo Gouvêa (2005, p. 245), as Regiões Metropolitanas brasileiras “carecem de apoio institucional para equacionar questões que, por sua complexidade, magnitude e abrangência, não se limitam ao âmbito de uma municipalidade específica, por mais importante que seja”. Sandra Lencioni 9 Souza (2003) trata a conurbação de forma pragmática, não considerando o conceito de Gedds (1994), que a classifica como qualquer forma de integração e polarização de uma cidade a outra, sendo assim uma cidade-região ou metrópole, não necessariamente sendo rígida a necessidade de encontro morfológico das cidades. Ou seja, conurbação não é somente um termo, e sim um conceito. Com relação a esse assunto, Beaujeu-Garnier (1980, p. 135) diferencia conurbação de aglomerado urbano, definindo a aglomeração como “a forma mais simples de desenvolvimento urbano; define-se classicamente como uma cidade envolta por arredores; quer dizer que, neste caso, é monocêntrica”. Já a “conurbação é uma aglomeração com várias cabeças. Nela, numerosos problemas têm de ser tratados em comum” (p. 136). 26 (2003) destaca a emergência de um novo fato urbano, delineado por distintas escalas de análise. Segundo a autora, nas metrópoles mais recentes ocorrem certas particularidades em sua produção espacial, estas, por sua vez, estão vinculadas à latente estratificação social no bojo do corpo urbano. As RMs do Brasil são muito variadas entre si no tamanho e portam consigo distintos problemas, tanto no âmbito social e econômico quanto ambiental. Esses problemas urbanos, consequentemente, estão relacionados aos temas da ingovernabilidade urbana e às propostas de superação dessas questões estruturais da metrópole, caso do trabalho de José Luís Fiori (2000). Há também trabalhos que cuidam de temas relacionados aos desafios da governança metropolitana, conforme elucidam Sérgio de Azevedo e Virgínia R. dos Mares Guia (2000). Esses trabalhos preocupam-se, de forma mais veemente, com a gestão interna, a equalização das complexidades, a participação popular e o enfrentamento dos problemas urbanos partindo a escala local. Conseguinte a esta perspectiva, o caso dos trabalhos de Souza (2003), Orlando Alves dos Santos Junior (2000) e Jose Luís Coraggio (2000) também suscitam as experiências de superação dos problemas metropolitanos diante do crivo da política de gestão local e horizontal, da mediação entre a cooperação e o conflito. Davidovich (2003, p. 12) argumenta que a implementação dessas novas regiões metropolitanas a cargo dos Estados se desenvolveu de forma abrupta e descontrolada, caracterizando uma “imprecisão de conceitos e de atribuições, principalmente quanto às linhas de financiamento e aos recursos financeiros”. Por outro lado, há de se considerar, conforme destaca Souza (2003), que essas novas RMs, dotadas de pouco teor verdadeiramente metropolitano, têm um lado positivo no que tange à busca mais flexível de soluções para a região, de forma local e mais democrática. Segundo Souza (2005), Milton Santos (1993), ao se preocupar com a desintegração e espraiamento das cidades, como também Luis Cesar Ribeiro (2000, 2004) ao utilizar o conceito de metrópole dual ou repartida, tentam chamar a atenção para a fragmentação, porém se limitam ao tecido socioespacial. Para Souza (2005), deve ser elucidado o fator mais importante, a dimensão política, principalmente no caso das metrópoles nacionais, por estarem embebidas pela violência urbana, tráfico de drogas e de armas e o conflito entre polícia e traficantes, que alardeiam o espectro da ingovernabilidade urbana. O autor denomina esse fenômeno de fragmentação do tecido sociopolítico-espacial. O necessário, no momento, é poder perceber que as RMs brasileiras Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 27 nasceram da intenção de gestão e planejamento regional. Esse planejamento sempre esteve vinculado às relações de poder e aos arranjos institucionais. Portanto, as RMs brasileiras foram baseadas em dois principais objetivos: agente político, voltado ao enfrentamento dos desafios metropolitanos; e o agente de gestão e de controle territorial. O último objetivo se sobressaiu, e o primeiro ainda não se materializou, figurando apenas em esparsas experiências pouco sólidas e raras exceções. 2 A METRÓPOLE EM PEDAÇOS: OS PADRÕES DE CONURBAÇÃO DA REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA No aspecto intraurbano, Goiânia nasceu diferenciada, devido a seu plano urbano radio-concêntrico – moderno para o período de 1930 no país – e o zoneamento rígido e funcional dos setores comerciais, industriais e dos setores residenciais, embasados nos moldes das cidades-jardins. Assim, seu plano se organizou como uma réplica do plano urbano de Versalhes, na França, não se esquecendo da arquitetura Art Déco, que modelou sua paisagem, conforme destaca Célson Ferrari (1986). Segundo James H. Johnson (1974), esses planos radio-concêntricos com cidades-jardins se tornaram modismo que expressava estilo monumental e reprodutor do poder. O processo de mudança da capital da cidade de Goiás para Goiânia, na década de 1930, foi contraditório, pois se baseou em um planejamento arrojado, moderno, devido à sua instalação no interior de um Estado de Goiás ainda marcado por traços da cultura agrária. Segundo Egmar Felício Chaveiro (2004, p. 127), Goiânia nasceu devido ao interesse de sanar o atraso existente no Estado de Goiás, ou seja, “fora inventada no seio de uma diversidade de conflitos para antecipar a modernização conservadora” em curso. Mas devido ao fato de Goiâniater sido gerada nesse universo sertanejo, na sua característica metropolitana ainda se encontra um comportamento interiorano. A sua invenção, a sua construção e o desenvolvimento, em certa medida, marcam a história da desconstrução do plano moderno, de tal modo que a cidade vive, hoje, num momento de travessia na elaboração de outra configuração espacial, que não perde aquele, 28 todavia não o obedece. Temos hoje uma Goiânia articulada aos eixos de transformação do mundo, da Região Centro-Oeste e do estado de Goiás, sem perder a sua genealogia, mas nunca presa a ela. [...] Goiânia metropoliza-se conservando, todavia, traços e signos da tradição agrária do estado de Goiás. Isso lhe dá a sua especificidade. (CHAVEIRO, 2004, p. 140). Em contrapartida à perspectiva citada acima, autores como Barsanufo Gomides Borges (1990) e Nasr Fayad Chaul (1997) não se ativeram ao caráter singular da produção espacial de Goiás, e se dedicaram ao tratar do assunto discutindo as ações de intervenção e modernização do território goiano. Desse modo, a produção espacial goiana não ocorreu desligada do todo, mas foi participante e integrada desigualmente da configuração espacial brasileira. Sobre a produção da metrópole goiana, Tadeu Alencar Arrais (2005, p. 351) mostra que “na análise da Região Metropolitana de Goiânia (RMG) não podemos deixar de notar a primazia de Goiânia, ou seja, como foi construída sua centralidade”. Essa polarização causa um dilema aos habitantes das cidades no entorno de Goiânia, pois não encontram serviços necessários nos seus municípios, obrigando-se a migrar em busca não somente de trabalho, mas de serviços coletivos, como hospitais, escolas, serviços de bancos, etc., fazendo com que Goiânia acabe drenando a renda desses municípios, concentrando mais poder e fragilizando a autonomia dos municípios à sua volta. Essa condição de dependência e não de interação dos municípios do entorno de Goiânia levou Arrais (2005, p. 353) a chamar a atenção para o desafio político desse fenômeno: A disparidade que se construiu na relação de Goiânia com os demais municípios da RMG, compreendida à luz da mobilidade e centralização, sugere não somente um desafio interpretativo, mas antes de tudo, um desafio político. É preciso pensar alternativas institucionais que atendam às demandas de todas as cidades da RMG, com políticas de geração de emprego e também descentralização dos serviços públicos. [...] Ao pensar e sugerir um equilíbrio entre mobilidade e centralidade, estamos pensando, antes de tudo, no rompimento de um padrão de fragmentação do tecido territorial próprio dos ambientes metropolitanos. Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 29 A própria rígida dualidade urbana ou, como comenta Ribeiro (2000), a metáfora da “cidade partida”, por si só não explica a complexidade da cidade atual e suas várias naturezas. Segundo o mesmo autor, ao analisar a cidade dual, este afirma que ela é a expressão de uma nova ordem urbana, que tem como resultado a fragmentação do espaço urbano como sua expressão maior. Se essa nova ordem é a fragmentação, então não deveria ser denominada de dualidade, pois sabe-se que múltiplos atores, de diferentes formas, usufruem, se relacionam e transformam o espaço urbano, tendo assim um espaço fragmentado, um mosaico de interposições, intersecções e sobreposições. Vale lembrar que na cidade há uma luta por apropriação dos distintos segmentos sociais, conforme discute Heitor Frúgoli Jr. (2000), e essa luta faz com que atores santificados ou antagônicos se relacionem numa complexa teia de envolvimento, de subjugações e de dependência simultânea. O processo de crescimento das periferias de Goiânia acarretou na sua conurbação com os municípios vizinhos, reproduzindo no decurso desse processo a formação da RMG. Vários fatores determinaram esse crescimento urbano. De um modo geral, o crescimento urbano nas cidades dos países ditos subdesenvolvidos está ligado à ação do Estado como regulador do território. A disputa pela terra urbana acarreta na formação de periferias precárias, favelas ou áreas de habitação sub-humana. Ermínia Maricato (1996, p. 63) discute esse assunto da seguinte forma: A maior tolerância e condescendência para com a produção ilegal do espaço urbano vem dos governos municipais aos quais cabe a maior parte da competência constitucional de controlar a ocupação do solo. A lógica concentradora da gestão pública urbana não admite a incorporação ao orçamento público da imensa massa, moradora da cidade ilegal, demandatária de serviços públicos. Seu desconhecimento se impõe, com exceção de ações pontuais definidas em barganhas políticas ou períodos pré-eleitorais. Essa situação constitui, portanto, inesgotável fonte para o clientelismo político. Na contramão dessa lógica peculiar e perversa dos países subdesenvolvidos, Mark Gottdiener (1993) aponta outros modelos de suburbanização ampliada das metrópoles estadunidenses. Para o referido autor, a suburbanização nos Estados Unidos tem conotação de bairros- 30 dormitórios a serviço das novas classes médias tecnocráticas, expressando um novo estilo de vida no país. A suburbanização se instaurou após a decadência da cidade central, sendo motivada, principalmente, pela generalização de meios de transporte mais flexíveis, como o automóvel. Gottdiener (1993, p. 17), ao realizar uma crítica à ecologia urbana, argumenta que há uma ligação estruturante no meio urbano com o modo de produção vigente, sendo que a produção social do espaço urbano está ligada a padrões espaciais e forças profundas que residem em modos de organização social. Essas forças se estruturam de forma “hierárquica pela qual todos os espaços de assentamento são integrados através de ações de formas sistêmicas”. Nesse sentido, as forças sociais do capitalismo tardio são determinantes para a organização dos novos assentamentos urbanos, tendo a iniciativa privada a necessidade de um novo modelo de habitação, além da ação do Estado como os principais motivadores da expansão urbana estadunidense. Este exemplo elucida que, no caso mais específico do Brasil, o crescimento urbano se centra mais voltado à ampliação desordenada do espaço urbano, através da manutenção de um estilo de vida precário nas periferias. No caso específico da conurbação da RMG, pode-se afirmar que ela se iniciou no final da década de 1960. Vale lembrar que, neste caso restrito, considera-se conurbação somente como o simples encontro entre duas cidades. Posteriormente, a conurbação onde é hoje a RMG, se generalizou como um fenômeno urbano, que não representava mais somente o encontro entre cidades, mas a integração entre municípios vizinhos. No período de 1960, 1970 e 1980 a conurbação entre Goiânia e Aparecida de Goiânia e o crescimento urbano dos outros centros que se localizavam próximos à capital, passou a se enquadrar no processo inicial de formação do Aglomerado Urbano de Goiânia (AGLUG). Vale lembrar que a década de 1980 foi o período de criação deste Aglomerado Urbano. Somente após a década de 1990 que o desenvolvimento urbano da RMG pôde ser considerado uma conurbação no sentido conceitual, aquele apontado por Patrick Geddes (1994) e Jacqueline Beaujeu-Garnier (1980), ou seja, uma conurbação que apresenta “várias cabeças”, nodalidades e articulação entre entorno e a cidade polo. Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 31 A partir do momento em que houve um processo avançado de “encontro entre cidades” (conurbação física), e de integração intermunicipal, como também a congregação de situações similares entre os municípios do entorno de Goiânia, formando assim uma região com especificidade própria é que foi considerada a existência da RMG como uma metrópole no sentido estrito da palavra, sendo a escala intrametropolitana uma nova escalamontada em Goiás. Os elementos motivadores dessa conurbação foram vários. Dentre eles, e um dos mais importantes advém da ação do poder público como incentivador da indústria da suburbanização, conforme destacou Sérgio de Moraes (1991). Juntamente com o Estado, a iniciativa privada contribuiu com os fatores responsáveis pela conurbação e a expansão generalizada das periferias de Goiânia e, posteriormente, com a expansão urbana dos municípios do entorno. O Estado autoritário da Ditadura Militar, no final dos anos de 1970, com a desapropriação e/ou realocação de indesejados de bairros em processo de gentrificação e dos fundos de vales, direcionou o movimento de ocupação para Aparecida de Goiânia. Outro elemento que merece destaque são as políticas de transportes coletivos, drenando a população, renda e o emprego, fomentando a mobilidade e o parcelamento do solo das periferias. A multiplicação de polos econômicos secundários nas periferias também impulsionou a atração de população e o desenvolvimento urbano desigual, promovendo a conurbação entre Goiânia e Aparecida de Goiânia. A diversificação e a modernização das atividades econômicas de Goiânia também contribuíram para a construção de um polo regional, sendo assim um fator responsável pela atração de migrações das mais diversas áreas da nação que se dirigiam para Goiânia. Quando ela não mais suportou, ou quando acharam necessário depositar o novo contingente de subtrabalhadores, detentores das mais exploradas categorias ocupacionais, buscaram direcionar esses sujeitos aos assentamentos humanos dos municípios vizinhos, caso emblemático de Aparecida de Goiânia. O fácil acesso à terra urbana nos arrabaldes de Goiânia e a oferta de empregos com menor exigência técnica contribuíram, fortemente, com os processos de periferização e de conurbação. Um último elemento relevante a se considerar foi a expansão urbana induzida pelos vetores de crescimento 32 urbano, que são determinados pelas vias e rodovias de integração intermunicipal, implantando no seu curso os novos bairros pauperizados. Após o desenvolvimento das conurbações, gradativamente foi se montando uma metrópole espraiada, nas décadas de 1980 e 1990. A concentração urbana de Goiânia contrastava com os vazios urbanos de Aparecida de Goiânia, que perduram até hoje, e os outros loteamentos dispersos que iam surgindo nas proximidades de Senador Canedo, Goianira e Trindade. Essa estrutura dispersa começou a ser desfeita no momento atual, fortalecendo assim a ideia da metrópole Goiânia como uma região integrada e dinâmica. Por outro lado, o termo metropolização de Goiânia tornaria insuficiente, pois não houve nas décadas de 1970 e 1980 uma metropolização dotada de desenvolvimento urbano, e sim uma periferização, em síntese, uma simples expansão urbana, conforme defende David Clark (1985). Com base nas discussões levantadas por Moraes (1991), Lana de Souza Cavalcanti (2001) e Clorisnete Borges Marinho (2005), entre outras, a partir da década de 1970 a região sul de Goiânia sofreu acirrada expansão urbana, conurbando-se com Aparecida de Goiânia. Essa expansão para sentido sul da capital foi posteriormente sofrendo grande valorização fundiária e imobiliária, hoje é uma das regiões mais valorizadas. Marinho (2005, p. 77) argumenta que, a abertura da via T-63 impulsionou a mobilidade e o desenvolvimento da região, e a “pavimentação das vias da faixa sul dinamizou a sua acessibilidade, contribuindo, assim, para a produção de uma localização otimizada na capital”. Essas modificações no espaço intraurbano de Goiânia causaram a valorização do solo urbano e maior acirramento da conquista pela moradia, fazendo com que a população que chegava buscasse novas áreas. Na mesma dinâmica metropolitana de Goiânia, as cidades de Aparecida de Goiânia e, posteriormente, Trindade, Senador Canedo e Goianira, foram sendo impactadas pelo crescimento desordenado. Somente Senador Canedo não é anterior à Goiânia, mas as demais são pretéritas à capital. Trindade surgiu no século XIX, Goianira e Aparecida, no início do século XX. O crescimento explosivo que elas sofreram causou forte impacto em suas estruturas internas, justificando assim diferentes padrões de conurbação na RMG, com tempos, espaços e configurações socioterritoriais particulares. O mapa sobre a expansão urbana da RMG (mapa 1) ilustra quanto os Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 33 eixos rodoviários foram determinantes para o direcionamento do crescimento urbano da RMG. A maior extensão do tecido urbano segue para a região sul, delineando profunda conurbação entre Goiânia e Aparecida de Goiânia. Trindade, Senador Canedo e Goianira apresentam relativo estágio de conurbação, e Hidrolândia e Aragoiânia apresentam iniciado fenômeno de conurbação. O primeiro padrão de conurbação (padrão A), é o de Aparecida de Goiânia com a capital estadual. Outro modelo de conurbação se desenhou no sentido oeste e noroeste da capital, através dos municípios de Trindade e Goianira, e das rodovias GO-060 e GO-070, respectivamente, sendo a conurbação de Goianira mais recente do que a de Trindade (padrão B). O outro padrão de conurbação é o de Senador Canedo, no sentido leste da capital, este está ligado à ação induzida do Estado em promover assentamentos humanos ligados à moradia popular (padrão C). Há também um padrão (D) de conurbação similar entre os municípios de Hidrolândia (ao sul de Aparecida de Goiânia) e Aragoiânia (sudoeste de Aparecida de Goiânia), sendo uma conurbação que se encontra em estágio inicial e se forma fisicamente com a cidade de Aparecida de Goiânia, sabendo que existe também forte integração funcional com a capital, completando a organização das conurbações da RMG. Mas o que chama a atenção dessa conurbação embrionária é a sua morfologia urbana, pois está ligada não aos processos de produção do espaço urbano e sim do espaço periurbano ou rural-urbano, usando a conceituação de Johnson (1974). 34 Mapa 1: Região Metropolitana de Goiânia – Expansão Urbana (2000) Fonte: PINTO, J. V. C. Fragmentação da metrópole: constituição da Região Metropolitana de Goiânia e suas implicações no espaço intraurbano de Aparecida de Goiânia. 173 f. 2009. Dissertação (mestrado), Geografia, IESA-UFG, Goiânia, 2009. Mais importante que classificar a forma da conurbação, é necessário compreender os seus vetores de expansão e sua integração, que é amarrada Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 35 pela mobilidade intrametropolitana. Segundo Flávio Villaça (1998, p. 82), os eixos viários são um dos elementos mais determinantes para o crescimento urbano e a constituição da conurbação. “À medida que a cidade cresce, ela se apropria e absorve os trechos urbanos das vias regionais, como nos casos das rodovias antigas que, com o tempo, se transformaram em vias urbanas”. A partir do momento em que a malha urbana de Goiânia transbordou para Aparecida de Goiânia, esta vem transbordando-se para Hidrolândia. Na verdade, o que ocorre é uma indução do crescimento urbano e não um transbordamento propriamente dito, pois não se deve esquecer de que o município que sofre crescimento, em decorrência da demanda metropolitana, já tinha velhas formas espaciais que vão sendo ressignificadas ou descaracterizadas. Além da região sul da RMG, a região oeste apresenta considerada expansão urbana, composta por dispersos loteamentos, principalmente nos municípios de Goiânia e Trindade, o mesmo acontece com a região noroeste, no município de Goianira. Boggione, Ferreira e Silva (2005, p. 687) tratam desse assunto e mostram que os vetores do crescimento urbano de Goiânia estão mais acirrados nas regiões tratadas anteriormente, sintetizando a argumentação da seguinte forma: Entre os anos de 1975 e 2002, a área urbana de Goiânia praticamente duplicou, sendoque os setores norte e oeste foram os que apresentaram maiores expansões. Em particular, a região sul foi o que apresentou menor expansão e nos próximos anos esta região não mais se expandirá, pois naquela região a área urbana de Goiânia já atingiu o limite municipal, contudo é importante em trabalhos futuros, mensurar os vetores de crescimento da área urbana do município de Aparecida de Goiânia, que atualmente tem sua expansão influenciada por Goiânia. Em decorrência desses vetores de crescimento urbano foram se construindo distintos padrões de conurbação entre Goiânia e as cidades do seu entorno. Na RMG existem diferenciados estágios de conurbação. Distintos no sentido de tempo de formação, grau de contato entre os tecidos urbanos de Goiânia, integração funcional entre os municípios, e, por último, diversificação e dinamização econômica, reproduzindo maior ou menor autonomia e complementaridade entre os municípios que se conurbam com 36 a centralidade metropolitana. De forma objetiva, na RMG se desenvolveram quatro estágios diferenciados de conurbação: a conurbação Aparecida de Goiânia com Goiânia; depois a conurbação Trindade/Goianira com Goiânia; em seguida, a conurbação Senador Canedo com Goiânia; e, por último, o estágio inicial da conurbação Aragoiânia/Hidrolândia com Aparecida de Goiânia. Quadro 1: Os padrões de conurbação na Região Metropolitana de Goiânia Fonte: Organização José Vandério Cirqueira (2017). Nome da conurbação Quais cidades conurbam-se Região que se conurba Principais características A Aparecida Aparecida de Goiânia com Goiânia Sul de Goiânia – Densidade de contato físico com Goiânia; – Novas centralidades; – Novas lógicas de mobilidade; – Especulação e valorização imobiliária. B Trindade/ Goianira Trindade e Goianira com Goiânia Noroeste e oeste de Goiânia – Expansão urbana desordenada dirigida pela iniciativa privada; – Fragmentação dos bairros; – Ocupação popular da terra urbana. C Senador Canedo Senador Canedo com Goiânia Leste de Goiânia – Ocupação dispersa dirigida pelo poder público e capital privado; – Loteamentos populares e condomínios fechados; – Forte integração funcional com Goiânia. D Argoiânia/ Hidrolândia Aragoiânia e Hidrolândia com Aparecida de Goiânia Sul e Sudoeste de Aparecid a de Goiânia – Estágio inicial de conurbação; – Reduzido contato físico com Aparecida de Goiânia; – Empreendimentos industriais, empresariais atacadistas e imobiliários; – Ocupação rural-urbana do espaço. Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 37 O primeiro caso iniciou na década de 1960, motivado pela expansão urbana induzida pela ação do poder público, como gestor do território, facilitando o parcelamento do solo e a ocupação desordenada fora do município de Goiânia, consequentemente, no município de Aparecida de Goiânia. A ação do poder público teve como respaldo o discurso de amenizar as distorções que estavam se montando na nova capital Estadual, planejada três décadas atrás. Essa primeira conurbação (conurbação Aparecida), nas últimas décadas, vem sofrendo reestruturações, tendo como síntese a formação de novas centralidades, dinamização econômica (polos empresariais e industriais) e valorização do solo urbano (condomínios fechados verticais e horizontais), fortalecendo sua diferenciação das demais (ver Mapa 2). Na conurbação Aparecida, sua vinculação maior se dá, evidentemente, devido à localização na região sul de Goiânia, por outro lado, é uma conurbação integrada a quase todas as áreas da porção centro-sul da capital, pois a extensa área limitada com Goiânia e as várias vias e rodovias de acesso possibilitam essa articulação. 38 Mapa 2: Conurbação entre Goiânia e Aparecida de Goiânia Fonte: PINTO, J. V. C. Fragmentação da metrópole: constituição da Região Metropolitana de Goiânia e suas implicações no espaço intraurbano de Aparecida de Goiânia. 173 f. 2009. Dissertação (mestrado), Geografia, IESA-UFG, Goiânia, 2009. A segunda conurbação (conurbação Trindade/Goianira) iniciou nos primeiros anos da década de 1990 e teve como impulso as ações imobiliárias, em grande parte da iniciativa privada, constituindo tanto novos condomínios Cidade, Resiliência e Meio Ambiente - 39 horizontais (caso da região de Trindade), loteamentos irregulares dispersos como extensão do eixo industrial e de comércio varejista na rodovia GO-070 (região de Goianira). Nessa conurbação existe uma característica principal ligada à coesão socioeconômica (setores populares), fragmentação dos setores conurbados e com baixa ligação ao centro tradicional dos municípios que pertencem, proliferação de comércio de bairro, devido à demanda local produzida pela desintegração dos bairros aos centros comerciais, e lineamento da mancha urbana pelas rodovias e suas áreas adjacentes, estando mais integrada ao subcentro de Campinas, em Goiânia, conforme alertaram Correa, Paula e Pinto (2005). O terceiro padrão é o da conurbação Senador Canedo. Nessa conurbação, o traço característico que lhe diferencia das demais é que, na última década, o poder Estadual interferiu decisivamente no contato físico entre Senador Canedo e Goiânia através da produção de loteamentos para classes populares. Portanto, é uma conurbação fortemente marcada pela ação estadual e a demanda habitacional produzida pela expansão urbana da região leste de Goiânia. Outro diferencial é que a conurbação Senador Canedo se integra à Goiânia por três vias de acesso, estando mais vinculada ao centro tradicional e aos subcentros próximos da Avenida Anhanguera, na porção leste da capital. O último padrão de conurbação é o de Hidrolândia/Aragoiânia. Vale ressaltar que essas duas cidades apresentam contatos físicos com Aparecida de Goiânia ainda em estágio primário. A integração via mobilidade também é muito baixa, comparada com as outras conturbações; portanto, a apresentação desse quadro de conurbação é um esforço de antever a configuração da futura integração física. A perspectiva fragmentária da metrópole em pedaços reforça a tendência ao processo de conurbação nessa região sul, principalmente ao acompanhar as recentes transformações no eixo rodovia BR-153 (Aparecida de Goiânia e Hidrolândia), marcada por polos empresariais, empreendimentos comerciais atacadistas e condomínios habitacionais; e no eixo GO-040 (Aparecida de Goiânia e Aragoiânia), marcada pelos condomínios habitacionais e loteamentos de chácaras e sítios rurais. Mas no momento atual, o que se verifica é que essa conurbação se diferencia também por estar acontecendo entre Aparecida de Goiânia, Hidrolândia e Aragoiânia, ou seja, no segundo anel de expansão urbana da RMG. A 40 conurbação Aragoiânia/Hidrolândia tem como agente estruturante a produção periurbana ou rural-urbana do espaço, conforme já foi destacado. Nas duas cidades, loteamentos tipo chácaras, e no caso de Hidrolândia, o distrito rural de Nova Fátima, ao sul do ribeirão das Lages, que divide Hidrolândia de Aparecida de Goiânia, são os vetores de assentamento urbano das regiões, sendo assim, uma conurbação motivada pela auréola rural- urbana de setores de chácaras, sítios, granjas e os arranjos locais de horticultura, e também por empreendimentos atacadistas e loteamentos habitacionais. Segundo Johnson (1974, p. 201), é na “aureola rururbana donde se mezclan varias características rurales y urbanas”. Sendo essas áreas uma indefinição ou fusão do urbano com o rural. Com a consolidação de uma metrópole no interior de Goiás, o padrão urbano desse Estado se redirecionou. Goiânia não mais se articulava sozinha. Seu crescimento transbordou para além dos limites municipais da jovem capital cerradeira, através de um desenvolvimento metropolitano agressivo e perverso, constituindo-se hoje numa metrópole
Compartilhar