Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 964-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processos cujo julgamento ainda não foi concluído em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: MI 4367 AgR/DF; ADI 4619/SP; ADI 3424/DF; Pet 4770 AgR/DF. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ▪ É possível, em tese, o ajuizamento de ADI contra deliberação administrativa de tribunal, desde que ela tenha conteúdo normativo com generalidade e abstração, devendo, contudo, em regra, a ação ser julgada prejudicada caso essa decisão administrativa seja revogada. ▪ Exige-se quórum de maioria absoluta dos membros do STF para modular os efeitos de decisão proferida em julgamento de recurso extraordinário no caso em que não tenha havido declaração de inconstitucionalidade. ENTIDADES DESPORTIVAS ▪ É inconstitucional previsão do Estatuto do Torcedor que condicionava a participação dos times em campeonatos à comprovação da regularidade fiscal e trabalhista. DIREITO ADMINISTRATIVO SERVIDORES PÚBLICOS ▪ STF modulou os efeitos da decisão que afirmou que os servidores públicos federais não possuem direito aos quintos no período de 08/04/1998 a 04/09/2001; com isso, o Tribunal resguardou a situação daqueles que recebiam as verbas por força de decisão judicial ou administrativa. ▪ É inconstitucional o pagamento de subsídio mensal e vitalício a ex-Vereadores, assim, como o pagamento de pensão por morte aos dependentes dos ex-ocupantes deste cargo FUNDEF ▪ União deverá indenizar Estados prejudicados com o cálculo incorreto do VMNA DIREITO PROCESSUAL CIVIL COMPETÊNCIA ▪ Justiça comum deve julgar causa de servidor celetista que passou a ser regido pelo regime estatutário (pós CF/88). REPERCUSSÃO GERAL ▪ O STF reconheceu a repercussão geral na discussão sobre a inclusão dos expurgos inflacionários na correção monetária dos depósitos judiciais (Tema 1.016) e determinou a suspensão nacional de todos os processos que envolvam o tema. DIREITO PENAL CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA ▪ O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/90. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 2 DIREITO PROCESSUAL PENAL INQUÉRITO POLICIAL ▪ Não há nulidade na ação penal instaurada a partir de elementos informativos colhidos em inquérito policial que não deveria ter sido conduzido pela Polícia Federal considerando que a situação não se enquadrava no art. 1º da Lei 10.446/2002. PROVAS ▪ Não viola a SV 14 quando se nega que o investigado tenha acesso a peças que digam respeito a dados sigilosos de terceiros e que não estejam relacionados com o seu direito de defesa. ▪ É constitucional lei estadual que transforma o cargo de datiloscopista da Polícia Civil em perito papiloscopista. NULIDADES ▪ Não viola a SV 11 a decisão que mantém as algemas durante julgamento no júri de réu que integra milícia, possui extensa folha de antecedentes criminais e foi transferido para presídio federal de segurança máxima em virtude da sua alta periculosidade. HABEAS CORPUS ▪ Não cabe HC contra decisão de Ministro do STF que decreta a prisão preventiva de investigado ou réu ▪ A concessão do benefício da transação penal impede a impetração de habeas corpus em que se busca o trancamento da ação penal? EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA ▪ Se o Tribunal de 2ª instância não analisou a necessidade da prisão preventiva em razão de ter aplicado o antigo entendimento do STF sobre a execução provisória, antes de ser decretada a liberdade, deve o Tribunal fazer essa análise. ▪ Se o Tribunal de 2ª instância determinou a execução provisória da pena, mas o juiz já havia negado o direito do condenado de recorrer em liberdade, não cabe a soltura do réu com base no novo entendimento do STF de que é proibida a execução provisória da pena. ▪ Não se conhece de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de Ministro do STJ que nega liminar mantendo decisão do TJ que determinou a execução provisória da pena em caso de condenação pelo Tribunal do Júri. DIREITO TRIBUTÁRIO IMUNIDADE TRIBUTÁRIA ▪ A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF/88. DIREITO DO TRABALHO / PROCESSO DO TRABALHO COMPETÊNCIA ▪ Justiça comum deve julgar causa de servidor celetista que passou a ser regido pelo regime estatutário (pós CF/88). Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 3 DIREITO CONSTITUCIONAL CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE É possível, em tese, o ajuizamento de ADI contra deliberação administrativa de tribunal, desde que ela tenha conteúdo normativo com generalidade e abstração, devendo, contudo, em regra, a ação ser julgada prejudicada caso essa decisão administrativa seja revogada É cabível ação direta de inconstitucionalidade contra deliberação administrativa do Tribunal que determina o pagamento de reajuste decorrente da conversão da URV em reais (“plano real”) aos magistrados e servidores. Depois que a ADI foi proposta, e antes que fosse julgada, o TRT decidiu revogar essa deliberação administrativa. Diante disso, indaga-se: o mérito da ação foi julgado? NÃO. Em decorrência da revogação da deliberação, o STF julgou prejudicada a ADI, por perda superveniente de objeto. STF. Plenário. ADI 1244 QO-QO/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 19/12/2019 (Info 964). Imagine a seguinte situação: Em dezembro de 1994, o órgão especial do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região proferiu decisão administrativa determinando o pagamento, a partir de abril de 1994, do reajuste de 10,94%, correspondente à diferença entre o resultado da conversão da URV em reais, aos magistrados e servidores da Justiça do Trabalho. O Procurador Geral da República ajuizou uma ADI no STF contra essa decisão do TRT-15. Essa decisão administrativa do Tribunal de Justiça pode ser impugnada por meio de ADI? SIM. O STF decidiu que a decisão administrativa do TRT-15, nesse caso concreto, teve conteúdo normativo, com generalidade e abstração, porque concedeu, de forma ampla, um reajuste para uma coletividade de pessoas, como se fosse uma lei. Desse modo, o STF entendeu que era cabível o controle abstrato de constitucionalidade da decisão administrativa do TJ por meio de ADI. É cabível ação direta de inconstitucionalidade contra deliberação administrativa do Tribunal que determina o pagamento de reajuste decorrente da conversão da URV em reais (“Plano Real”) aos magistrados e servidores. STF. Plenário. ADI 1244 QO-QO/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 19/12/2019 (Info 964). Em sentido semelhante: STF. Plenário. ADI 3202/RN, rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 5/2/2014 (Info 734). Depois que a ADI foi proposta, e antes que fosse julgada, o TRT decidiu revogar essa deliberação administrativa. Diante disso, indaga-se: o mérito da ação foi julgado? NÃO. Em decorrência da revogação da deliberação, o STF julgou prejudicada a ADI, por perda superveniente de objeto. Sempre que uma lei ou ato normativo que estava sendo impugnado por ADI for revogado, haverá perda do objeto? O que acontece caso o ato normativo que estava sendo impugnado na ADI seja revogado antes do julgamento da ação? Regra: haverá perda superveniente do objeto e a ADI nãodeverá ser conhecida (STF ADI 1203). Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 4 Exceção 1: não haverá perda do objeto e a ADI deverá ser conhecida e julgada caso fique demonstrado que houve “fraude processual”, ou seja, que a norma foi revogada de forma proposital a fim de evitar que o STF a declarasse inconstitucional e anulasse os efeitos por ela produzidos (STF ADI 3306). Exceção 2: não haverá perda do objeto se ficar demonstrado que o conteúdo do ato impugnado foi repetido, em sua essência, em outro diploma normativo. Neste caso, como não houve desatualização significativa no conteúdo do instituto, não há obstáculo para o conhecimento da ação (STF ADI 2418/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 4/5/2016. Info 824). Exceção 3: caso o STF tenha julgado o mérito da ação sem ter sido comunicado previamente que houve a revogação da norma atacada. Nesta hipótese, não será possível reconhecer, após o julgamento, a prejudicialidade da ADI já apreciada (STF. Plenário. ADI 951 ED/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 27/10/2016. Info 845). No caso concreto, o STF considerou que não estava presente nenhuma das três exceções acima expostas. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE Exige-se quórum de maioria absoluta dos membros do STF para modular os efeitos de decisão proferida em julgamento de recurso extraordinário no caso em que não tenha havido declaração de inconstitucionalidade Exige-se quórum de MAIORIA ABSOLUTA dos membros do STF para modular os efeitos de decisão proferida em julgamento de recurso extraordinário repetitivo, com repercussão geral, no caso em que NÃO tenha havido declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo. Qual é o quórum para que o STF, no julgamento de recurso extraordinário repetitivo, com repercussão geral reconhecida, faça a modulação dos efeitos da decisão? • Se o STF declarou a lei ou ato inconstitucional: 2/3 dos membros. • Se o STF não declarou a lei ou ato inconstitucional: maioria absoluta. STF. Plenário. RE 638115 ED-ED/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/12/2019 (Info 964). Modulação dos efeitos do julgado no caso de processos objetivos de constitucionalidade No julgamento de ADI, ADC ou ADPF, a Lei prevê expressamente que o STF poderá modular os efeitos da decisão que julga determinado ato contrário à CF. Em outras palavras, a Lei permite que o STF determine que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade somente valham a partir da decisão proferida (ex nunc) ou ainda a partir de determinada data futura (efeitos prospectivos). Veja o que diz a Lei nº 9.868/99: Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado. Mesma regra pode ser encontrada no art. 11, da Lei nº 9.882/99. Regra: efeitos EX TUNC (retroativos) Excepcionalmente o STF pode, pelo voto de, no mínimo, 8 Ministros (2/3): * restringir os efeitos da declaração; ou * decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado; ou * de outro momento que venha a ser fixado. Desde que haja razões de: * segurança jurídica ou; * excepcional interesse social Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 5 Modulação dos efeitos do julgado no caso de processos subjetivos. É possível a modulação dos efeitos do julgado no caso de processos subjetivos, como na hipótese da decisão proferida em um recurso extraordinário (controle difuso)? SIM. O STF entende que, excepcionalmente, admite-se, em caso de controle difuso de constitucionalidade, a modulação temporal dos efeitos da decisão proferida. Com o objetivo de seguir o mesmo modelo previsto no art. 27 da Lei n. 9.868/99, o STF decidiu que é necessário o quórum de 2/3 para que ocorra a modulação de efeitos em sede de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida. Considerou-se que esta maioria qualificada seria necessária para conferir eficácia objetiva ao instrumento. Nesse sentido: É possível a modulação dos efeitos da decisão proferida em sede de controle incidental de constitucionalidade. STF. Plenário. RE 522897/RN, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 16/3/2017 (Info 857). Vale ressaltar que esse quórum de 2/3 é para o caso de o STF declarar inconstitucional a lei ou ato normativo. Se o STF, em um recurso extraordinário repetitivo, declarar que determinada lei ou ato normativo é constitucional, será possível modular os efeitos dessa decisão? Qual será o quórum? SIM. Neste caso, o quórum será de maioria absoluta: Exige-se quórum de MAIORIA ABSOLUTA dos membros do STF para modular os efeitos de decisão proferida em julgamento de recurso extraordinário repetitivo, com repercussão geral, no caso em que NÃO tenha havido declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo. STF. Plenário. RE 638115 ED-ED/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/12/2019 (Info 964). Qual é o quórum para que o STF, no julgamento de recurso extraordinário repetitivo, com repercussão geral reconhecida, faça a modulação dos efeitos da decisão? • Se o STF declarou a lei ou ato inconstitucional: 2/3 dos membros. • Se o STF não declarou a lei ou ato inconstitucional: maioria absoluta. ENTIDADES DESPORTIVAS É inconstitucional previsão do Estatuto do Torcedor, inserida pela Lei do PROFUT, que permitia o rebaixamento do clube em caso de não comprovação da regularidade fiscal e trabalhista A Lei 13.155/2015 institui o PROFUT (Programa de modernização da gestão e de responsabilidade fiscal do futebol brasileiro). Essa lei alterou o Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671/2003) para incluir entre os critérios técnicos, além da colocação obtida em campeonato anterior, a apresentação de Certidão Negativa de Débitos Federais, de certificado de regularidade de contribuição ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e comprovação de pagamentos de obrigações previstas nos contratos de trabalho e nos contratos de imagem dos atletas. Assim, por força da Lei nº 13.155/2015, um clube de futebol da série “A” (“1ª divisão”) do Campeonato Brasileiro caso não cumprisse os requisitos de regularidade fiscal, regularidade com o FGTS e com os salários dos atletas seria rebaixado para a série “B”. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 6 Para o STF, a exigência da regularidade fiscal fere a autonomia das entidades desportivas em relação à sua organização e seu funcionamento (art. 217 da CF/88) e constitui forma indireta de coerção estatal ao pagamento de tributos. A retirada do clube do campeonato pelo não pagamento de tributos ou do FGTS é medida gravíssima, que demonstra falta de proporcionalidade e razoabilidade, além de configurar uma sanção política. Com a exclusão automática do campeonato, o clube jamais conseguiria pagar tributos e refinanciamentos, trazendo prejuízos à União, aos atletas, aos funcionários e à ideia de fomentar o desporto. Resultado: foi declarada a inconstitucionalidade do art. 40 da Lei nº 13.155/2015, na parte em que altera o art. 10, §§ 1º, 3º e 5º da Lei nº 10.671/2003, mantendo-se a vigência e eficácia de todos os demais dispositivos impugnados.STF. Plenário. ADI 5450 MC-Ref/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/12/2019 (Info 964). PROFUT A Lei 13.155/2015 institui o PROFUT (Programa de modernização da gestão e de responsabilidade fiscal do futebol brasileiro). Essa lei alterou o Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671/2003) para incluir entre os critérios técnicos, além da colocação obtida em campeonato anterior, a apresentação de Certidão Negativa de Débitos Federais, de certificado de regularidade de contribuição ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e comprovação de pagamentos de obrigações previstas nos contratos de trabalho e nos contratos de imagem dos atletas. Assim, por força da Lei nº 13.155/2015, um clube de futebol da série “A” (“1ª divisão”) do Campeonato Brasileiro caso não cumprisse os requisitos de regularidade fiscal, regularidade com o FGTS e com os salários dos atletas seria rebaixado para a série “B”. Veja o art. 40 da Lei nº 13.155/2015, que alterou os §§ 1º, 3º e 5º do art. 10 do Estatuto do Torcedor prevendo isso que acabei de explicar: Art. 10. É direito do torcedor que a participação das entidades de prática desportiva em competições organizadas pelas entidades de que trata o art. 5º seja exclusivamente em virtude de critério técnico previamente definido. (obs: o caput não foi alterado) § 1º Para os fins do disposto neste artigo, considera-se critério técnico a habilitação de entidade de prática desportiva em razão de: I - colocação obtida em competição anterior; e II - cumprimento dos seguintes requisitos: a) regularidade fiscal, atestada por meio de apresentação de Certidão Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União - CND; b) apresentação de certificado de regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS; e c) comprovação de pagamento dos vencimentos acertados em contratos de trabalho e dos contratos de imagem dos atletas. (...) § 3º Em campeonatos ou torneios regulares com mais de uma divisão, serão observados o princípio do acesso e do descenso e as seguintes determinações, sem prejuízo da perda de pontos, na forma do regulamento: I - a entidade de prática desportiva que não cumprir todos os requisitos estabelecidos no inciso II do § 1º deste artigo participará da divisão imediatamente inferior à que se encontra classificada; II - a vaga desocupada pela entidade de prática desportiva rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo será ocupada por entidade de prática desportiva participante da divisão que receberá a entidade rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo, obedecida a ordem de classificação do Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 7 campeonato do ano anterior e desde que cumpridos os requisitos exigidos no inciso II do § 1º deste artigo. (...) § 5º A comprovação da regularidade fiscal de que trata a alínea a do inciso II do § 1º deste artigo poderá ser feita mediante a apresentação de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União - CPEND. ADI O Partido Humanista da Solidariedade (PHS) e o Sindicato Nacional das Associações de Futebol Profissional ajuizaram ADI contra o art. 40 da Lei nº 13.155/2015 e alguns outros dispositivos que faziam exigências aos clubes. O principal é o art. 40, mas veja também os demais impugnados: • art. 5º, incisos II, IV e V e parágrafo único: tratam sobre as entidades de administração do desporto; • art. 19, inciso III: prevê que fica criada, no âmbito do Ministério do Esporte, a Autoridade Pública de Governança do Futebol - APFUT, com competência para requisitar informações e documentos às entidades desportivas profissionais; • arts. 24 a 27: disciplinam regras de gestão temerária nas entidades desportivas profissionais de futebol. • art. 38: modificam alguns dispositivos da Lei nº 9.615/98 para tratar sobre as entidades de desporto. Para os autores, tais dispositivos ofendem a autonomia das entidades desportivas, prevista no art. 217, I, da CF/88: Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados: I - a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento; II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento; III - o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não- profissional; IV - a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional. O que o STF decidiu? O STF julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ADI e declarou • a inconstitucionalidade do art. 40 da Lei nº 13.155/2015 na parte em que altera o art. 10, §§ 1º, 3º e 5º, da Lei nº 10.671/2003; • a constitucionalidade dos demais dispositivos da Lei. Violação aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade e forma de sanção política Conforme vimos acima, o art. 40 da Lei nº 13.155/2015 prevê que a entidade desportiva deverá cumprir requisitos de natureza fiscal (apresentação de Certidão Negativa de Débitos) como critério técnico, havendo até mesmo a possibilidade de rebaixamento de divisão para a agremiação que não cumprir tais determinações. Ocorre que esses requisitos não são desportivos, mas sim fiscais e trabalhistas, ou seja, não possuem nenhuma relação com o desempenho esportivo da entidade. Logo, para o STF, fazer exigências não desportivas para que o clube participe da competição ou permaneça em determinada divisão do campeonato são condições que não possuem proporcionalidade e razoabilidade. Isso porque essas previsões constituem formas de cobrança de tributos por intermédio de limitações arbitrárias, com a utilização de meios gravosos e indiretos de coerção estatal destinados a compelir o contribuinte inadimplente a pagar o tributo. Essa prática configura, portanto, sanção política, o que afronta a jurisprudência do STF. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 8 Cobrança do tributo por vias oblíquas (sanções políticas) A Fazenda Pública deverá cobrar os tributos em débito mediante os meios judiciais (execução fiscal) ou extrajudiciais (lançamento tributário, protesto de CDA) legalmente previstos. O Fisco possui, portanto, instrumentos legais para satisfazer seus créditos. Justamente por isso, a Administração Pública não pode proceder à cobrança do tributo por meios indiretos, impedindo, cerceando ou dificultando a atividade econômica desenvolvida pelo contribuinte devedor. Quando isso ocorre, a jurisprudência afirma que o Poder Público aplicou “sanções políticas”, ou seja, formas “enviesadas de constranger o contribuinte, por vias oblíquas, ao recolhimento do crédito tributário” (STF ADI 173). Exs.: apreensão de mercadorias, não liberação de documentos, interdição de estabelecimentos. A cobrança do tributo por vias oblíquas(sanções políticas) é rechaçada por quatro súmulas do STF e STJ: Súmula 70-STF: É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo. Súmula 323-STF: É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Súmula 547-STF: Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais. Súmula 127-STJ: É ilegal condicionar a renovação da licença de veículo ao pagamento de multa, da qual o infrator não foi notificado. Desse modo, a orientação jurisprudencial do STF e do STJé a de que o Estado não pode adotar sanções políticas, que se caracterizam pela utilização de meios de coerção indireta que impeçam ou dificultem o exercício da atividade econômica, para constranger o contribuinte ao pagamento de tributos em atraso, estando o ente público vinculado ao procedimento de execução fiscal para a cobrança de seus créditos, no qual é assegurado ao devedor, o devido processo legal. “Morte civil” A imposição de rebaixamento (decesso a categoria inferior da competição esportiva) acarreta a verdadeira morte civil do clube, diante dos imediatos e drásticos efeitos sobre as receitas a serem por ele obtidas, como direitos de imagem, direito de arena e patrocínios. Há, em razão disso, uma grave desproporcionalidade na consequência prevista na lei para o comportamento do clube. Se eventual inadimplência do clube – que deve ser cobrada pelas vias normais – resultasse na sua automática exclusão do campeonato do ano seguinte, isso inviabilizaria a percepção de seus rendimentos e, consequentemente, o pagamento de suas dívidas. Também prejudicaria a União, que não receberia mais os valores relativos a refinanciamentos ou a atuais tributos; os atletas e funcionários da entidade esportiva, que não seriam mais pagos; e a própria ideia de fomentar o desporto. Demais dispositivos da Lei foram julgados constitucionais Quanto aos demais artigos impugnados, o STF concluiu que eles são constitucionais. A Lei nº 13.155/2015 previu condições mais favoráveis (facilitadas) para que as entidades desportivas pagassem suas dívidas fiscais perante a União e suas obrigações relativas ao FGTS. Dessa forma, a exigência de contrapartidas por parte das entidades aderentes se afigura plenamente constitucional. A lei pretendeu, com isso, promover a melhoria do padrão de gestão do futebol profissional, mas sem interferência na autonomia das entidades assegurada pelo art. 217 da Constituição Federal. Ressaltou, por fim, que a adesão a esse regime de cooperação se deu de forma voluntária pelos clubes. Por ser uma adesão facultativa ao regime fiscal benéfico, não se poderia, portanto, admitir que aqueles que aderiram obtivessem o refinanciamento de suas dívidas sem se submeter às regras de contrapartida Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 9 disciplinadoras de rigor financeiro e de gestão. Essas regras não constituem nenhuma intervenção externa, haja vista que são os dirigentes eleitos da própria entidade que continuam a administrar. Além do caráter voluntário da adesão, as exigências estabelecidas no Profut atenderam ao princípio da razoabilidade, porquanto respeitadas as necessárias proporcionalidade, justiça e adequação entre os dispositivos impugnados e as normas constitucionais protetivas da autonomia desportiva. O legislador teve por objetivo garantir a probidade e a transparência da gestão do desporto e, sobretudo, a recuperação e a manutenção dessas entidades desportivas, que, se tivessem prosseguido como estavam, não teriam conseguido manter suas atividades. O Min. Relator registrou a informação de que, dos 20 clubes profissionais de elite do futebol brasileiro que aderiram ao programa 19 possuem dívidas gigantescas. Em suma: A Lei nº 13.155/2015 institui o PROFUT (Programa de modernização da gestão e de responsabilidade fiscal do futebol brasileiro). Essa lei alterou o Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671/2003) para incluir entre os critérios técnicos, além da colocação obtida em campeonato anterior, a apresentação de Certidão Negativa de Débitos Federais, de certificado de regularidade de contribuição ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e comprovação de pagamentos de obrigações previstas nos contratos de trabalho e nos contratos de imagem dos atletas. Para o STF, a exigência da regularidade fiscal fere a autonomia das entidades desportivas em relação à sua organização e seu funcionamento (art. 217 da CF/88) e constitui forma indireta de coerção estatal ao pagamento de tributos. A retirada do clube do campeonato pelo não pagamento de tributos ou do FGTS é medida gravíssima, que demonstra falta de proporcionalidade e razoabilidade, além de configurar uma sanção política. Com a exclusão automática do campeonato, o clube jamais conseguiria pagar tributos e refinanciamentos, trazendo prejuízos à União, aos atletas, aos funcionários e à ideia de fomentar o desporto. Resultado: foi declarada a inconstitucionalidade do art. 40 da Lei nº 13.155/2015, na parte em que altera o art. 10, §§ 1º, 3º e 5º da Lei nº 10.671/2003, mantendo-se a vigência e eficácia de todos os demais dispositivos impugnados. STF. Plenário. ADI 5450 MC-Ref/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/12/2019 (Info 964). DIREITO ADMINISTRATIVO SERVIDORES PÚBLICOS STF modulou os efeitos da decisão que afirmou que os servidores públicos federais não possuem direito aos quintos no período de 08/04/1998 a 04/09/2001; com isso, o Tribunal resguardou a situação daqueles que recebiam as verbas por força de decisão judicial ou administrativa Os servidores públicos federais, quando desempenhavam funções gratificadas tinham direito de incorporar, em sua remuneração, a vantagem decorrente do cargo em comissão ou da função de direção, chefia e assessoramento. Isso estava previsto na redação original do art. 62 da Lei nº 8.112/90. Isso ficou conhecido como incorporação de quintos em razão do exercício de funções gratificadas. Houve uma discussão se os servidores públicos federais tiveram direito à incorporação dos quintos no período que vai de 08/04/1998 a 04/09/2001. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10 Após várias decisões favoráveis aos servidores, o STF decidiu em sentido contrário. Em 2015, o STF decidiu que não era permitida a incorporação dos quintos nesse período e que essa possibilidade acabou com a edição da MP 1.595-14 (convertida na Lei nº 9.527/97). Ocorre que muitos servidores estavam recebendo os quintos referentes ao período de 08/04/1998 a 04/09/2001 por força de decisões judiciais ou administrativas. Como ficou a situação dessas pessoas? O STF, em embargos de declaração, decidiu modular os efeitos da decisão e afirmou o seguinte: • é indevida a cessação imediata do pagamento dos quintos quando houve uma decisão judicial transitada em julgado em favor do servidor. Neste caso, o servidor já incorporou definitivamente os quintos ao seu patrimônio jurídico; • se o servidor estava recebendo os quintos em razão de decisão administrativa ou de decisão judicial não definitiva, o pagamento dos quintos é indevido. No entanto, os efeitos da decisão foram modulados, de modo que aqueles que recebem a parcela até a data de hoje terão o pagamento mantido até a sua absorção integral por quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores. Em outras palavras, a remuneração ou os proventos não diminuirão de valor imediatamente. No entanto, quando houver um aumento, esse valor dos quintos sumirá, sendo absorvido pelo aumento. STF. Plenário. RE 638115 ED-ED/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/12/2019 (Info 964). Incorporação de quintos por servidores públicos em razão do exercício de funções gratificadas Os servidores públicos federais, quando desempenhavam funções gratificadas tinham direito de incorporar, em sua remuneração, a vantagem decorrente do cargo em comissão ou da função de direção, chefia e assessoramento. Isso foi previsto na redação original do art. 62 da Lei nº 8.112/90: Art. 62. Ao servidor investido em função de direção, chefia ou assessoramento é devida uma gratificaçãopelo seu exercício. (...) § 2º A gratificação prevista neste artigo incorpora-se à remuneração do servidor e integra o provento da aposentadoria, na proporção de 1/5 (um quinto) por ano de exercício na função de direção, chefia ou assessoramento, até o limite de 5 (cinco) quintos. (obs: essa redação não está mais em vigor) (...) Assim, esses quintos passavam a integrar a remuneração e depois a aposentadoria do servidor. Isso ficou conhecido como incorporação de quintos em razão do exercício de funções gratificadas. Discussão quanto ao período que vai de 08/04/1998 a 04/09/2001 A MP 1.595-14, de 10 de novembro de 1997, posteriormente convertida na Lei nº 9.527/97, extinguiu a possibilidade de incorporação dos “quintos”. Em 2001, foi editada a Medida Provisória 2.225-45, que acrescentou na Lei nº 8.112/90 o art. 62-A, com a seguinte redação: Art. 62-A. Fica transformada em Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada - VPNI a incorporação da retribuição pelo exercício de função de direção, chefia ou assessoramento, cargo de provimento em comissão ou de Natureza Especial a que se referem os arts. 3º e 10 da Lei nº 8.911, de 11 de julho de 1994, e o art. 3º da Lei nº 9.624, de 2 de abril de 1998. Parágrafo único. A VPNI de que trata o caput deste artigo somente estará sujeita às revisões gerais de remuneração dos servidores públicos federais. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11 Com base nesse art. 62-A, os servidores públicos passaram a alegar que a incorporação dos quintos voltou a existir (voltou a ser possível) no período mencionado pelo dispositivo, ou seja, entra a data da Lei nº 9.624/98 (08/04/1998) até o dia da MP 2.225/45 (04/09/2001). Houve várias ações judiciais discutindo o tema e a jurisprudência do STJ era favorável aos servidores: (...) 5. Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que “a Medida Provisória n.º 2.225-45/2001, com a revogação dos artigos 3º e 10 da Lei n.º 8.911/94, autorizou a incorporação da gratificação relativa ao exercício de função comissionada no período de 8/4/1998 a 4/9/2001, transformando tais parcelas, desde logo, em VPNI - Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada.” (RMS 21960 / DF, rel. Min. Félix Fischer, Quinta Turma, DJ 07/02/2008). (...) STJ. 1ª Seção. REsp 1261020/CE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 24/10/2012. Em razão disso, muitos servidores obtiveram decisões favoráveis que transitaram em julgado. Além disso, administrativamente, diversos órgãos e entidades da administração pública federal concederam a incorporação aos servidores. Decisão do STF Ocorre que tivemos mais um capítulo nesse enredo. Em 2015, o STF decidiu que não era permitida a incorporação dos quintos nesse período e que, realmente, essa possibilidade acabou com a edição da MP 1.595-14 (convertida na Lei nº 9.527/97): Recurso extraordinário. 2. Administrativo. 3. Servidor público. 4. Incorporação de quintos decorrente do exercício de funções comissionadas no período compreendido entre a edição da Lei 9.624/1998 e a MP 2.225-48/2001. 5. Impossibilidade. 6. Recurso extraordinário provido. STF. Plenário. RE 638115, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 19/03/2015. Afirmou o Min. Gilmar Mendes: “Como se pode perceber, o art. 3º da MP 2.225-45, de 2001, apenas transformou em Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – VPNI a incorporação das parcelas a que se referem os arts. 3º e 10 da Lei 8.911, de 11 de julho de 1994, e o art. 3º da Lei 9.624, de 2 de abril de 1998. O texto é claro. Não há como considerar, a menos que se queira ir de encontro à expressa determinação legal, que o citado artigo tenha restabelecido ou reinstituído a possibilidade de incorporação das parcelas de quintos ou décimos. (...) Em conclusão, não há no ordenamento jurídico norma que permita essa “ressurreição” dos quintos/décimos levada a efeito pela decisão recorrida.” Desse modo, desde 11/11/1997 é indevida qualquer concessão de parcelas remuneratórias referentes a quintos ou décimos. Como ficaria a situação dos servidores que estavam recebendo os quintos referentes ao período de 08/04/1998 a 04/09/2001? Em 2017, o STF, ao julgar embargos de declaração, afirmou que esses pagamentos deveriam ser cessados. Veja o que disse o Min. Gilmar Mendes: “Nesses termos, tendo em vista que o pagamento dos quintos incorporados no período entre 8.4.1998 até 4.9.2001 foi declarado inconstitucional e refere-se a relação jurídica de trato continuado, há que se reconhecer a necessidade de cessação imediata do pagamento da mencionada verba, sem que isso caracterize afronta à coisa julgada e sem que seja necessário o ajuizamento de ação rescisória. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12 Da mesma forma, os efeitos das decisões administrativas, que reconheceram o referido direito aos servidores com base em hipótese considerada inconstitucional pelo STF, não devem subsistir, devendo o pagamento ser cessado imediatamente.” (STF. Plenário. RE 638115 ED, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 30/06/2017) Novos embargos de declaração Os servidores não desistiram e opuseram segundos embargos de declaração. Nestes novos embargos tiveram êxito (pelo menos parcialmente) porque o STF decidiu modular os efeitos da decisão e afirmou o seguinte: • é indevida a cessação imediata do pagamento dos quintos quando houve uma decisão judicial transitada em julgado em favor do servidor. Neste caso, o servidor já incorporou definitivamente os quintos ao seu patrimônio jurídico; • se o servidor estava recebendo os quintos em razão de decisão administrativa ou de decisão judicial não definitiva, o pagamento dos quintos é indevido. No entanto, os efeitos da decisão foram modulados, de modo que aqueles que recebem a parcela até a data de hoje terão o pagamento mantido até a sua absorção integral por quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores. Em outras palavras, a remuneração ou os proventos não diminuirão de valor imediatamente. No entanto, quando houver um aumento, esse valor dos quintos sumirá, sendo absorvido pelo aumento. Veja as exatas palavras do STF: “O Tribunal, por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para reconhecer indevida a cessação imediata do pagamento dos quintos quando fundado em decisão judicial transitada em julgado, vencida a Ministra Rosa Weber, que rejeitava os embargos. No ponto relativo ao recebimento dos quintos em virtude de decisões administrativas, o Tribunal, em razão de voto médio, rejeitou os embargos e, reconhecendo a ilegitimidade do pagamento dos quintos, modulou os efeitos da decisão de modo que aqueles que continuam recebendo até a presente data em razão de decisão administrativa tenham o pagamento mantido até sua absorção integral por quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores. Os Ministros Ricardo Lewandowski e Celso de Mello proviam os embargos de declaração e modulavam os efeitos da decisão em maior extensão. Ficaram vencidos, nesse ponto, os Ministros Marco Aurélio e Rosa Weber. Por fim, o Tribunal, por maioria, também modulou os efeitos da decisão de mérito do recurso, de modo a garantir que aqueles que continuam recebendo os quintos até a presente data por força de decisão judicial sem trânsito em julgado tenham o pagamento mantido até sua absorção integral por quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Rosa Weber. Tudo nos termos do voto do Relator. Afirmaram suspeição os Ministros Luiz Fux e Roberto Barroso”. STF.Plenário. RE 638115 ED-ED/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/12/2019 (Info 964). SERVIDORES PÚBLICOS É inconstitucional o pagamento de subsídio mensal e vitalício a ex-Vereadores, assim, como o pagamento de pensão por morte aos dependentes dos ex-ocupantes deste cargo Importante!!! Algumas leis municipais preveem que a pessoa que tiver exercido o cargo de Vereador fará jus, após deixar o mandato, a um subsídio mensal e vitalício. Alguns chamam isso de representação, outros de pensão vitalícia e outros de pensão civil. A previsão desse pagamento é compatível com a CF/88? Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13 NÃO. O STF fixou a seguinte tese a respeito do tema: Lei municipal a versar a percepção, mensal e vitalícia, de “subsídio” por ex-vereador e a consequente pensão em caso de morte não é harmônica com a Constituição Federal de 1988. STF. Plenário. RE 638307/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 19/12/2019 (Tema 672 – repercussão geral) (Info 964). Imagine a seguinte situação concreta: A Lei 907/84 do Município de Corumbá (MS) concedia aos ex-Vereadores que tivessem exercido o cargo durante quatro legislaturas ou por 16 anos o pagamento de “subsídio mensal e vitalício”, a título de pensão, no valor da parte fixa da remuneração dos membros ativos da Câmara Municipal. Essa previsão é compatível com a CF/88? NÃO. Essa previsão viola o art. 39, § 4º da CF/88 porque esse dispositivo somente autoriza o pagamento de subsídio para quem ocupa o cargo, não podendo ser concedido para ex-ocupantes: Art. 39 (...) § 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. O Brasil adota a forma republicana de governo e esta prevê o caráter temporário do exercício de mandatos eletivos. A referida lei municipal afronta, ainda, o art. 37, XIII, da Constituição Federal, que proíbe a vinculação ou a equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público. A lei atrela (vincula) o valor do benefício vitalício ao montante remuneratório fixo percebido pelos membros da Câmara Municipal em exercício. Logo, o Plenário do STF declarou a não recepção da Lei 907/1984, do Município de Corumbá (MS), e fixou a seguinte tese a ser aplicada nos casos semelhantes: Lei municipal a versar a percepção, mensal e vitalícia, de “subsídio” por ex-vereador e a consequente pensão em caso de morte não é harmônica com a Constituição Federal de 1988. STF. Plenário. RE 638307/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 19/12/2019 (Tema 672 – repercussão geral) (Info 964). Outros precedentes envolvendo ex-Governadores Vale ressaltar que o entendimento acima explicado já era aplicado para os casos de pensão concedidas a ex-Governadores: O Supremo Tribunal tem afirmado que a instituição de prestação pecuniária mensal e vitalícia a ex- governadores, comumente designada sob o nomen juris “subsídio”, corresponde à concessão de benesse que não se compatibiliza com a Constituição Federal (notadamente com o princípio republicano e o princípio da igualdade, consectário daquele), por desvelar tratamento diferenciado e privilegiado sem fundamento jurídico razoável, com ônus aos cofres públicos, em favor de quem não exerce função pública ou presta qualquer serviço à administração, sendo também inconstitucionais prestações de mesma natureza concedidas aos cônjuges supérstites dos ex-mandatários. STF. Plenário. ADI 3418, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 20/09/2018. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14 Os ex-Governadores (ou as viúvas) que foram beneficiados com esse “subsídio” ou com a “pensão” dela decorrente terão que devolver as quantias que receberam antes do STF declarar inconstitucional a previsão da Constituição Estadual? NÃO. O STF afirmou que: Não é necessária a devolução dos valores percebidos até o julgamento da ação. Isso por conta dos princípios da boa-fé, da segurança jurídica e, ainda, da dignidade da pessoa humana. STF. Plenário. ADI 4545/PR, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 5/12/2019 (Info 962). FUNDEF União deverá indenizar Estados prejudicados com o cálculo incorreto do VMNA O valor da complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) deve ser calculado com base no valor mínimo nacional por aluno extraído da média nacional. A complementação ao Fundef realizada a partir do valor mínimo anual por aluno fixada em desacordo com a média nacional impõe à União o dever de suplementação de recursos, mantida a vinculação constitucional a ações de desenvolvimento e manutenção do ensino. Em outras palavras, os Estados prejudicados com o cálculo incorreto do valor mínimo nacional por aluno deverão ser indenizados por conta do montante pago a menor a título de complementação pela União no período de vigência do FUNDEF, isto é, nos exercícios financeiros de 1998 a 2007. O tema acima foi definido pelo STJ (no REsp 1101015/BA) e pelo STF nas ACO 648/BA, ACO 660/AM, ACO 669/SE e ACO 700/RN, jugadas em 6/9/2017. Diante disso, é possível que o Ministro do STF, Relator de ações com pedidos semelhantes, decida monocraticamente e julgue procedente os pedidos formulados por outros Estados- membros contra a União. Não haverá, neste caso, violação ao princípio da colegialidade. STF. Plenário. ACO 701 AgR/AL, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 18/12/2019 (Info 964). FUNDEF FUNDEF significa Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério e vigorou de 1997 a 2006. O FUNDEF foi instituído pela EC 14/96, regulamentado pela Lei nº 9.424/96, e pelo Decreto nº 2.264/97. A EC 14/96, que alterou o art. 60 do ADCT da CF/88, previu o seguinte: Art. 60. Nos dez primeiros anos da promulgação desta emenda, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios destinarão não menos de sessenta por cento dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal, a manutenção e ao desenvolvimento do ensino fundamental, com o objetivo de assegurar a universalização de seu atendimento e a remuneração condigna do magistério. § 1º A distribuição de responsabilidades e recursos entre os estados e seus municípios a ser concretizada com parte dos recursos definidos neste artigo, na forma do disposto no art. 211 da Constituição Federal, e assegurada mediante a criação, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de um fundo de manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental e de valorização do magistério, de natureza contábil. (...) § 3º A União complementará os recursos dos Fundos a que se refere o § 1º, sempre que, em cada Estado e no Distrito Federal, seu valor por aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente. (...) Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15 § 7º A lei disporá sobre a organização dos Fundos, a distribuição proporcional de seus recursos, sua fiscalização e controle, bem como sobre a forma de cálculo do valor mínimo nacional por aluno. A fim de regulamentar este art. 60 do ADCT, foi editadaa Lei nº 9.424/96 (atualmente revogada), criando o FUNDEF. O FUNDEF era um fundo financeiro de natureza contábil e sem personalidade jurídica, gerido pela União, composto por 15% do ICMS e do IPI-exportação arrecadados, assim como o mesmo percentual para fundos de participação obrigatórios (FPE e FPM) e ressarcimento da União pela Desoneração de Exportações decorrentes do Fundo Kandir. Com este fundo, cada Estado e cada Município recebia o equivalente ao número de alunos matriculados na sua rede pública do Ensino Fundamental. Além disso, havia um valor mínimo nacional por aluno/ano. Não atingido o piso com a aplicação apenas dos recursos estaduais e municipais, a lei determinava o aporte de dinheiro da União para efetuar a complementação. Se, mesmo sendo aplicados esses percentuais de recursos no Fundo, não se conseguisse alcançar um valor mínimo por aluno, então, neste caso, a União deveria complementar os recursos do FUNDEF, ou seja, repassar mais dinheiro para a educação dos Estados e Municípios. Isso estava previsto no § 3º do art. 60 do ADCT e também no art. 6º da Lei nº 9.424/96: Art. 6º A União complementará os recursos do Fundo, a que se refere o art. 1º sempre que, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, seu valor por aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente. § 1º O valor mínimo anual por aluno, ressalvado o disposto no § 4º, será fixado por ato do Presidente da República e nunca será inferior à razão entre a previsão da receita total para o Fundo e a matrícula total do ensino fundamental no ano anterior, acrescida do total estimado de novas matrículas, observado o disposto no art. 2º, § 1º, incisos I e I. (...) O Decreto nº 2.264/97 (atualmente revogado) foi publicado pelo Presidente da República com o objetivo de definir esse “Valor Mínimo Nacional por Aluno” (VMNA), nos termos do §1º do art. 6º da Lei nº 9.424/96. Os critérios definidos no Decreto nº 2.264/97 foram considerados válidos pela jurisprudência? NÃO. O Decreto nº 2.264/97 afirmou que o VMNA deveria ser calculado levando-se em conta a receita e o número de alunos em cada Estado isoladamente, sob o argumento de que o Fundo é estadual, sem intercomunicação. Em outras palavras, o Decreto determinou que a complementação dos valores fosse feita com base em coeficientes regionais, e não pela média nacional. A jurisprudência, contudo, afirmou que esse parâmetro do Decreto era ilegal considerando que a Lei nº 9.424/96 exigiu que o critério a ser utilizado levasse em conta a média nacional. O STJ, ao apreciar o tema em sede de recurso repetitivo, assim fixou a tese: Para fins de complementação pela União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental - FUNDEF (art. 60 do ADCT, redação da EC 14/96), o "valor mínimo anual por aluno" (VMAA), de que trata o art. 6º, § 1º da Lei 9.424/96, deve ser calculado levando em conta a média nacional. STJ. 1ª Seção. REsp 1101015/BA, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 26/05/2010 (recurso repetitivo). Desse modo, o valor da complementação da União ao FUNDEF deveria ser calculado com base no valor mínimo nacional por aluno extraído da média nacional. Como a finalidade do Fundef era a superação de desigualdades regionais, não havia sentido em se fixar a complementação num patamar abaixo da média nacional. Assim, o Decreto nº 2.264/97 extravasou a delegação legal conferida pelo §1º do art. 6º da Lei nº 9.424/96. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16 Vale ressaltar que o Decreto nº 2.264/97 foi sucedido por outros que também repetiram a mesma metodologia de cálculo. Obs: o STJ que decidiu a forma de cálculo do valor por aluno porque, segundo o STF, isso é matéria de natureza infraconstitucional (Tema 422 do STF), cuja competência é do STJ. Ações propostas pelos Estados-membros Com base no que foi acima exposto, diversos Estados-membros propuseram ações contra a União alegando que o VMNA foi definido de forma incorreta e que a União repassou menos do que deveria, o que gerou prejuízos aos Estados. O pedido contido nessas ações foi acolhido pelo STF? SIM. O STF entendeu que os Estados prejudicados com o cálculo incorreto do VMNA deverão ser indenizados por conta do montante pago a menor a título de complementação pela União no período de vigência do FUNDEF, isto é, nos exercícios financeiros de 1998 a 2007. Em suma, o que decidiu o STF: O valor da complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) deve ser calculado com base no valor mínimo nacional por aluno extraído da média nacional. A complementação ao Fundef realizada a partir do valor mínimo anual por aluno fixada em desacordo com a média nacional impõe à União o dever de suplementação de recursos, mantida a vinculação constitucional a ações de desenvolvimento e manutenção do ensino. Em outras palavras, os Estados prejudicados com o cálculo incorreto do valor mínimo nacional por aluno deverão ser indenizados por conta do montante pago a menor a título de complementação pela União no período de vigência do FUNDEF, isto é, nos exercícios financeiros de 1998 a 2007. Essa indenização abrange apenas os danos materiais, não sendo devidos danos morais coletivos por conta desse repasse a menor. STF. Plenário. ACO 648/BA, ACO 660/AM, ACO 669/SE e ACO 700/RN, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgados em 6/9/2017 (Info 876). Caso concreto noticiado no Info 964 STF O Estado de Alagoas ajuizou ação contra a União pedindo o ressarcimento em razão das perdas financeiras ocasionadas pelo erro nos valores repassados ao Estado a título de complementação de recursos do FUNDEF. Desse modo, a ação formulou pedido semelhante ao que foi acima explicado. A ação foi distribuída para o Min. Edson Fachin. O que fez o Min. Edson Fachin, relator desta ação? Entendeu que a matéria estava pacificada e, por isso, decidiu monocraticamente a ação, julgando procedente o pedido do Estado-membro para reconhecer o direito do Estado de recalcular o valor mínimo nacional por aluno (VMNA), com base nos critérios legais corretos. Agravo regimental A União interpôs agravo regimental contra essa decisão monocrática alegando que a ação deveria ter sido julgada pelo Plenário do STF e que, como foi decidida monocraticamente, teria havido violação ao princípio da colegialidade. O que decidiu o Plenário do STF? O Plenário do STF negou provimento ao agravo regimental. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17 Conforme já explicado, o STF, ao julgar o Tema 422 (RE 636978), afirmou que a discussão sobre o cálculo do valor por aluno é matéria infraconstitucional e, portanto, de competência do STJ. O STJ fixou essa forma de cálculo no REsp 1101015/BA, julgado em 26/05/2010. Logo, é possível que os Ministros do STF, monocraticamente, apliquem o entendimento fixado no REsp 1101015/BA e nas ACO 648/BA, ACO 660/AM, ACO 669/SE e ACO 700/RN. STF. Plenário. ACO 701 AgR/AL, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 18/12/2019 (Info 964). Uma última pergunta: o FUNDEF ainda existe atualmente? NÃO. O FUNDEF acabou com a EC 53/2006, que alterou novamente o art. 60 do ADCT. Atualmente vigora o FUNDEB, regulado pela Lei nº 11.494/2007, que impõe à União o dever de complementar os recursos "sempre que, no âmbito de cada Estado e no Distrito Federal, o valor médio ponderado por aluno, calculado na forma do Anexo desta Lei, não alcançar o mínimo definido nacionalmente, fixado de forma a que a complementação da União não seja inferior aos valoresprevistos no inciso VII do caput do art. 60 do ADCT". DIREITO PROCESSUAL CIVIL COMPETÊNCIA Justiça comum deve julgar causa de servidor celetista que passou a ser regido pelo regime estatutário (pós CF/88) Compete à Justiça comum processar e julgar causa de servidor público municipal admitido mediante aprovação em concurso público sob o regime da CLT e que, posteriormente, passou a ser regido pelo estatuto dos servidores públicos municipais (estatutário). Caso concreto: o servidor ingressou no serviço público do Município em 1997 no cargo de auxiliar de serviços gerais sob o regime celetista e, em julho de 2010, passou a ser regido pelo regime estatutário. Em 2013, ele ajuizou ação na Justiça do Trabalho para pleitear o recolhimento de parcelas do FGTS no período em que esteve regido pelas regras da CLT. Como o vínculo do servidor com a administração pública é atualmente estatutário, a competência para julgar a causa é da Justiça comum, ainda que as verbas requeridas sejam de natureza trabalhista e relativas ao período anterior à alteração do regime de trabalho. STF. Plenário. CC 8018/PI, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 19/12/2019 (Info 964). Imagine a seguinte situação adaptada: João ingressou no serviço público do Município de Colônia do Gurguéia (PI), por concurso público, em 1997, no cargo de auxiliar de serviços gerais, cujo regime era celetista. Em julho de 2010, uma lei alterou o regime jurídico do cargo de auxiliar de serviços gerais, que passou a ser estatutário. Em 2013, João ajuizou ação, na Justiça do Trabalho, pedindo que o Município pague as parcelas do FGTS relativas ao período que vai até julho de 2010, época na qual esteve regido pelas regras da CLT. A competência para julgar esta ação é realmente da Justiça do Trabalho? NÃO. A competência será da Justiça comum estadual. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18 Compete à Justiça comum processar e julgar causa de servidor público municipal admitido mediante aprovação em concurso público sob o regime da CLT e que, posteriormente, passou a ser regido pelo estatuto dos servidores públicos municipais (estatutário). STF. Plenário. CC 8018/PI, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 19/12/2019 (Info 964). Como o vínculo do servidor com a administração pública é atualmente estatutário, a competência para julgar a causa é da Justiça comum, ainda que as verbas requeridas sejam de natureza trabalhista e relativas ao período anterior à alteração do regime de trabalho. REPERCUSSÃO GERAL O STF reconheceu a repercussão geral na discussão sobre a inclusão dos expurgos inflacionários na correção monetária dos depósitos judiciais (Tema 1.016) e determinou a suspensão nacional de todos os processos que envolvam o tema Há repercussão geral da questão constitucional referente à inclusão dos expurgos inflacionários na correção monetária dos depósitos judiciais (Tema 1.016). Reconhecida a repercussão geral, o STF determinou a suspensão nacional de todos os processos que envolvam discussão sobre expurgos inflacionários dos planos econômicos nos depósitos judiciais. Tal decisão foi proferida com base no art. 1.035, § 5º do CPC/2015. STF. Plenário. RE 1141156 AgR/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 19/12/2019 (Info 964). Multiplicidade de recursos extraordinários tratando sobre o mesmo tema O legislador percebeu que havia no STF e no STJ milhares de recursos que tratavam sobre os mesmos temas jurídicos. Diante disso, a fim de otimizar a análise desses recursos, a Lei nº 11.672/2008 acrescentou os arts. 543-B e 543-C ao CPC/1973, prevendo uma espécie de “julgamento por amostragem” dos recursos extraordinários e recursos especiais que tiverem sido interpostos com fundamento em idêntica controvérsia ou questão de direito. No CPC/2015 o tema é agora tratado nos arts. 1.036 a 1.041: Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça. Procedimento de julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos 1) Em primeiro lugar, o Presidente ou Vice-Presidente do tribunal de origem (TJ ou TRF) irá identificar e separar todos os recursos interpostos que tratem sobre o mesmo assunto. Exemplo: reunir os recursos especiais nos quais se discuta se o prazo prescricional das ações contra a Fazenda Pública é de três ou cinco anos. 2) Desses recursos, o Presidente do tribunal selecionará 2 ou mais que representem bem a controvérsia discutida e os encaminhará ao STJ ou STF (conforme seja Resp ou RE). Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19 Serão escolhidos os que contiverem maior diversidade de fundamentos no acórdão e de argumentos no recurso especial. Art. 1.036 (...) § 1º O presidente ou o vice-presidente de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal selecionará 2 (dois) ou mais recursos representativos da controvérsia, que serão encaminhados ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça para fins de afetação, determinando a suspensão do trâmite de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitem no Estado ou na região, conforme o caso. 3) Os demais recursos especiais e extraordinários que tratem sobre a mesma matéria e que não foram remetidos como paradigma (modelo) ficarão suspensos no tribunal de origem até que o STJ/STF se pronuncie sobre o tema central. Vale ressaltar que não cabe nenhum recurso contra a decisão proferida no Tribunal de origem que tenha determinado o sobrestamento do RE ou do Resp com fundamento no art. 1.036 do CPC 2015. Interessante novidade introduzida pelo CPC 2015. Se o recurso sobrestado tiver sido interposto fora do prazo, não há motivo para ele ficar suspenso aguardando a decisão do STJ/STF. Logo, a outra parte poderá alegar a intempestividade e pedir que ele não seja conhecido: Art. 1.036 (...) § 2º O interessado pode requerer, ao presidente ou ao vice-presidente, que exclua da decisão de sobrestamento e inadmita o recurso especial ou o recurso extraordinário que tenha sido interposto intempestivamente, tendo o recorrente o prazo de 5 (cinco) dias para manifestar- se sobre esse requerimento. 4) Selecionados os recursos, o Ministro Relator do Tribunal Superior, constatando que realmente existe multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, proferirá decisão de afetação, na qual: I - identificará com precisão a questão a ser submetida a julgamento; II - determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional; III - poderá requisitar aos presidentes ou aos vice-presidentes dos tribunais de justiça ou dos tribunais regionais federais a remessa de um recurso representativo da controvérsia. A providência tratada no item II acima (suspensão do processamento de todos os processos pendentes) está prevista no art. 1.037 e também no § 5º do art. 1.035 do CPC/2015: Art. 1.037. Selecionados os recursos, o relator, no tribunal superior, constatando a presença do pressuposto do caput do art. 1.036, proferirá decisão de afetação, na qual: (...) II - determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes,individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional; Art. 1.035 (...) § 5º Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20 Esse sobrestamento é obrigatório, ou seja, reconhecida a repercussão geral, automaticamente todos os processos pendentes ficarão suspensos? NÃO. O Relator do recurso extraordinário tem a faculdade de determinar ou não o sobrestamento dos processos. A suspensão de processamento prevista no § 5º do art. 1.035 do CPC não consiste em consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no “caput” do mesmo dispositivo, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la. STF. Plenário. RE 966.177 RG/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 7/6/2017 (Info 868). Assim, o § 5º do art. 1.035 deverá ser lido: reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal poderá determinar. Imagine agora a seguinte situação hipotética: A empresa ABC Ltda ingressou com ação judicial questionando determinado tributo federal que entendeu indevido. A fim de evitar a exigibilidade imediata do tributo, a empresa depositou na Caixa Econômica Federal R$ 500 mil, quantia que a União estava cobrando referente ao aludido tributo. 10 anos depois, após ter o seu pedido julgado procedente, a empresa quer levantar os valores depositados. Não seria justo que, após todos esses anos, a empresa recebesse o valor depositado sem qualquer encargo. Desse modo, a parte terá direito de receber a quantia depositada acrescida de correção monetária, para que não seja prejudicada pela demora. De quem é a obrigação de pagar a correção monetária: da União ou da CEF? Da CEF. Segundo o STJ, a responsabilidade pela atualização monetária de valores em depósito judicial é da instituição financeira onde o numerário foi depositado. Nesse sentido, existe um enunciado: Súmula 179-STJ: O estabelecimento de crédito que recebe dinheiro, em depósito judicial, responde pelo pagamento da correção monetária relativa aos valores recolhidos. Logo, o pedido de atualização monetária deve ser dirigido à instituição financeira no processo em que foi realizado o depósito judicial. Ressalte-se, ainda, que a discussão quanto à remuneração dos depósitos judiciais deve ser feita na própria demanda, ou seja, não é necessário que a parte ajuíze uma nova ação (ação autônoma) contra o banco depositário para receber a quantia. Incide o teor do enunciado 271 do STJ: Súmula 271-STJ: A correção monetária dos depósitos judiciais independe de ação específica contra o banco depositário. Na correção monetária do valor depositado deverão incidir os expurgos inflacionários (Plano Verão, Plano Collor I e II etc)? O STJ entendeu que sim. Veja: A correção monetária dos depósitos judiciais deve incluir os expurgos inflacionários. STJ. Corte Especial. REsp 1.131.360-RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 3/5/2017 (recurso repetitivo) (Info 607). E o STF? O STF, percebendo que havia vários recursos extraordinários tratando sobre o tema, decidiu reconhecer a existência de repercussão geral e adotar o rito do julgamento por amostragem, previsto nos arts. 1.036 a 1.041, do CPC, acima explicados. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 21 Além disso, o Min. Relator proferiu decisão determinando a suspensão nacional de todos os processos que envolvam discussão sobre expurgos inflacionários dos planos econômicos nos depósitos judiciais. Tal decisão foi proferida com base no art. 1.035, § 5º do CPC/2015: Art. 1.035 (...) § 5º Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional. Em suma: Há repercussão geral da questão constitucional referente à inclusão dos expurgos inflacionários na correção monetária dos depósitos judiciais (Tema 1.016). Reconhecida a repercussão geral, o STF determinou a suspensão nacional de todos os processos que envolvam discussão sobre expurgos inflacionários dos planos econômicos nos depósitos judiciais. Tal decisão foi proferida com base no art. 1.035, § 5º do CPC/2015. STF. Plenário. RE 1141156 AgR/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 19/12/2019 (Info 964). Ao reconhecer a repercussão geral, o Ministro Relator, obrigatoriamente, tinha que determinar o sobrestamento de todos os processos? O comando do § 5º do art. 1.035 do CPC é obrigatório? NÃO. Conforme já explicado, a suspensão de processamento prevista no § 5º do art. 1.035 do CPC não consiste em consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no “caput” do mesmo dispositivo, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la (STF. Plenário. RE 966.177 RG/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 7/6/2017). DIREITO PENAL CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/90 Importante!!! A conduta de não recolher ICMS em operações próprias ou em substituição tributária enquadra-se formalmente no tipo previsto no art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90 (apropriação indébita tributária), desde que comprovado o dolo. O não repasse do ICMS recolhido pelo sujeito passivo da obrigação tributária, em qualquer hipótese, enquadra-se (formalmente) no tipo previsto art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90, desde que comprovado o dolo. Em outras palavras, o tipo do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90 não fica restrito apenas às hipóteses em que há substituição tributária. O que se criminaliza é o fato de o sujeito passivo se apropriar do dinheiro relativo ao imposto, devidamente recebido de terceiro, quer porque descontou do substituído tributário, quer porque cobrou do consumidor, não repassando aos cofres públicos. STJ. 3ª Seção. HC 399.109-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/08/2018 (Info 633). Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 22 O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90. O valor do ICMS cobrado do consumidor não integra o patrimônio do comerciante, o qual é mero depositário desse ingresso de caixa que, depois de devidamente compensado, deve ser recolhido aos cofres públicos. Vale ressaltar, contudo, que, para caracterizar o delito, é preciso comprovar a existência de intenção de praticar o ilícito (dolo). STF. Plenário. RHC 163334/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 18/12/2019 (Info 964). Imagine a seguinte situação hipotética: João é sócio-gerente de uma loja de confecções. Ele vendeu diversas roupas e, no preço, embutiu os custos que ele teria com o ICMS. Em outras palavras, ele realizou operações que configuramfato gerador de ICMS. O agente entregou a Guia de Informação e Apuração do ICMS (chamada de GIA) ao Fisco Estadual, mas não recolheu o tributo devido. Sobre o tema, vale lembrar a Súmula 436 do STJ: A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco. Diante da ausência de pagamento, João foi cobrado pelo Fisco. Além disso, o Ministério Público denunciou o agente pela prática do crime previsto no art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90. A Lei nº 8.137/90 define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo. Os arts. 1º e 2º da Lei trazem os crimes praticados por particulares contra a ordem tributária. O art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90 é conhecido pela doutrina e jurisprudência como “apropriação indébita tributária”. Veja: Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (...) Art. 2º Constitui crime da mesma natureza: (...) II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; (...) Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Vale ressaltar que João vem praticando essa mesma conduta há pelo menos dois anos. A conduta de João, em tese, enquadra-se no art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90? SIM. Antes de enfrentarmos a questão, vamos fazer uma breve revisão sobre este crime. Bem jurídico O bem jurídico protegido é a ordem tributária, ou seja, o interesse do Estado na arrecadação dos tributos. Alguns autores falam que o bem jurídico é o erário. Apropriação indébita O art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90 é uma forma especial de apropriação indébita. É muito semelhante também com o delito de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A do CP), sendo a principal diferença a seguinte: Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 23 Art. 168-A do CP Art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90 O agente deixa de repassar contribuições previdenciárias recolhidas dos contribuintes. O agente deixa de repassar quaisquer outros tributos (que não contribuições previdenciárias) recolhidas dos contribuintes. Sujeito ativo O sujeito ativo do crime é o sujeito passivo da obrigação. Desse modo, o sujeito ativo do crime é aquele que ostenta a qualidade de sujeito passivo da obrigação tributária, conforme claramente descrito pelo art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90: “deixar de recolher (...) na qualidade de sujeito passivo da obrigação”. Um ponto interessante é que a lei, quando aponta o sujeito ativo do crime como sendo o passivo da obrigação tributária, o faz de maneira geral, isto é, não distingue o sujeito passivo direto do indireto da obrigação tributária. Logo, nada impede que o sujeito ativo deste crime possa ser: • o contribuinte (sujeito passivo direto da obrigação tributária); ou • o responsável tributário (sujeito passivo indireto da obrigação tributária). Assim, o termo “sujeito passivo de obrigação”, previsto no tipo penal, abrange o contribuinte e o responsável (substituição tributária). No caso do ICMS próprio (como no exemplo acima dado), o sujeito ativo do crime será o comerciante. Crime comum Doutrinariamente, é classificado como crime comum, considerando que não se exige qualidade especial do sujeito ativo (pode ser qualquer pessoa que tinha responsabilidade pelo recolhimento e não o fez dolosamente). Sujeito passivo Será a União, o Estado-membro ou o Município tributante. Objeto O objeto do delito é o valor do tributo. No caso, a quantia transferida pelo consumidor ao comerciante. Tipo objetivo Algumas vezes a legislação estabelece que a pessoa tem, como obrigação tributária acessória, que recolher o tributo ou a contribuição social devida por outra e depois repassar esse valor ao ente tributante. Ex1: o empregador, ao efetuar o pagamento do salário do empregado, deverá reter uma parcela desse rendimento e repassar tal valor à Receita Federal. Se a pessoa fizer o desconto e não recolher, no prazo legal, o valor do tributo ou da contribuição social para o Fisco, haverá a prática desse crime. Ex2: Rubens, sócio-gerente de uma sociedade comercial, deixou de recolher, de forma consciente, no prazo legal, o ICMS, referente aos meses de março e abril de 2002, escriturado nos livros fiscais e declarado à administração fazendária. Nessa situação, Rubens praticou, em tese, crime contra a ordem tributária (AGU CESPE 2003). Elemento subjetivo O delito exige, para sua configuração, que a conduta seja dolosa, consistente na consciência (ainda que potencial) de não recolher o valor do tributo. Informativo comentado Informativo 964-STF (05/02/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 24 Vale ressaltar que a motivação não possui importância no campo da tipicidade, ou seja, é dispensável a existência de elemento subjetivo especial. Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. AgRg no Resp 1.477.691/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, DJe 28/10/2016. Não existe modalidade culposa. Não se exige clandestinidade O fato de o agente registrar, apurar e declarar em guia própria ou em livros fiscais o imposto devido não tem o condão de elidir (fazer desaparecer) o crime. Isso porque, para a configuração deste delito, não se exige clandestinidade (não se exige que seja feito às escondidas). O tipo penal criminaliza a mera conduta de dever o imposto? Trata-se de criminalização do mero inadimplemento? NÃO. A conduta reprovável criminalizada por este tipo penal não é “dever imposto”, e sim cobrá-lo de terceiro sem repassá-lo ao Fisco, apropriando-se do valor. Por essa razão, o STF entende que os crimes contra a ordem tributária são compatíveis com a Constituição Federal e não representam prisão por dívida (art. 5º, LXVII, da CF/88): Os crimes previstos na Lei nº 8.137/90 não violam o disposto no art. 5º, LXVII, da Constituição. STF. Plenário. ARE 999425 RG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 02/03/2017 (repercussão geral). O agente tinha a obrigação tributária de recolher o tributo ou contribuição A redação do tipo penal fala em deixar de recolher o “valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado”. Isso significa que nem todo sujeito passivo de obrigação tributária que deixa de recolher tributo ou contribuição social responde pelo crime do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90, mas somente aqueles que “descontam” ou “cobram” o tributo ou contribuição. Sentido das palavras “descontado” e “cobrado” O tipo penal fala que configura o crime deixar de recolher valor de tributo ou de contribuição social, “descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”. Conforme explica o Min. Rogerio Schietti Cruz (HC 399.109-SC), as palavras “descontado” e “cobrado” não estão empregadas aqui no sentido tributário. No Direito Tributário, o sujeito passivo nunca irá “cobrar” o tributo, sendo esta uma atividade do Fisco. O máximo que o sujeito passivo pode fazer é a retenção do tributo para, posteriormente, recolher ao Fisco, como ocorre na substituição tributária. De igual forma, o sujeito passivo não “desconta” tributos. Tecnicamente, para o Direito Tributário, descontar significa dar desconto, ou seja, conferir abatimento nos casos em que há o pagamento antecipado do crédito tributário (art. 158, parágrafo único, do CTN). Diante disso, devemos interpretar tais expressões para fins penais. Nessa linha de raciocínio, tem-se
Compartilhar