Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Alice Bastos Febre Introdução Febre é a elevação da temperatura do corpo que ultrapassa a variação diária normal e ocorre associada a aumento do ponto de ajuste hipotalâmico, em resposta a vários estímulos; É um processo fisiológico complexo que envolve respostas metabólicas e imunológicas. Etiologia Entre as principais causas de febre na criança estão: Doenças infecciosas sistêmicas ou localizadas; Administração de vacinas (influenza, sarampo e outras) ou soros; Desidratação; Lesões teciduais; Neoplasias; Uso de fármacos (inclusive antitérmicos) ou agentes biológicos; Doenças inflamatórias ou hematológicas; Doenças do sistema nervoso central; Entre as principais causas de febre no adulto estão: Doenças infecciosas; Infecções dos tratos respiratórios alto e baixo; Infecções gastrointestinais; Infecções do trato urinário; Infecções cutâneas; Neoplasias; Doenças inflamatórias. Patogênese A temperatura corporal é controlada pelo hipotálamo; Os neurônios existentes no hipotálamo anterior pré- óptico e no hipotálamo posterior recebem dois tipos de sinais: O primeiro dos nervos periféricos que transmitem informações obtidas dos receptores de frio/calor na pele; O segundo proveniente da temperatura do sangue que irriga a região; Esses dois tipos de sinais (citados acima) são integrados pelo centro termorregulador do hipotálamo, visando a manutenção da temperatura corporal; As substâncias que induzem febre são chamadas de pirogênios. Pirogênios Os pirogênios podem ser exógenos e endógenos; Pirogênios exógenos: originam-se fora do paciente; A maioria é composta de produtos microbianos, toxinas microbianas ou microrganismos íntegros (incluindo vírus); Pirogênios endógenos: podem ser algumas citocinas produzidas pelo organismo; Citocinas pirogênicas são: IL-1, IL-6, fator de necrose tumoral (TNF), IFN-alfa e fator neurotrópico ciliar, membro da família de IL-6; Um amplo espectro de produtos bacterianos e fúngicos induz a síntese e a liberação das citocinas pirogênicas; A febre também pode ser uma manifestação de doença mesmo na ausência de infecção microbiana; Processos inflamatórios, traumatismo, necrose tecidual ou complexos antígeno-anticorpo podem estimular a produção de IL-1, TNF e/ou IL-6; Isoladamente ou em conjunto, as citocinas pirogênicas induzem o hipotálamo a elevar o ponto de ajuste até níveis febris. Elevação do ponto de ajuste hipotalâmico O aumento da temperatura corporal é causado pelas prostaglandinas que são produzidas nas células vasculares e perivasculares do hipotálamo; A primeira etapa para produção da febre é a interação de pirogênios exógenos e citocinas pirogênicas com os capilares (citados acima); Alice Bastos As células mieloides e endoteliais são os tipos celulares que primariamente produzem citocinas pirogênicas; As citocinas pirogênicas como a IL-1, IL-6 e o TNF são liberados por essas células e entram na circulação sistêmica. Algumas infecções do SNC induzem a produção de IL-1, TNF e IL-6 pela micróglia e, possivelmente, por neurônios; Nesses casos, as citocinas produzidas no SNC podem elevar o ponto de ajuste hipotalâmica, sem acionar os órgãos circunventriculares. As citocinas (pirógenos endógenos) aumentam as enzimas (ciclo-oxigenases) que convertem o ácido araquidônico em prostaglandinas (especialmente a PGE2); Quando a formação de prostaglandinas é bloqueada por fármacos, a febre pode ser abortada ou diminuída; As concentrações de PGE2 são mais altas nas proximidades dos órgãos vasculares periventriculares: redes de capilares dilatados que circundam os centros reguladores do hipotálamo. Além de produzir febre induzindo a síntese de PGE2 no hipotálamo, as citocinas circulantes também induzem a PGE2 em tecidos periféricos; O aumento da PGE2 na periferia explica mialgias e artralgias inespecíficas que costumam acompanhar a febre. A liberação da PGE2 estimula seus receptores nas células gliais; Tal estimulação determina elevação rápida no 5’-monofosfato de adenosina cíclico (AMPc), um neurotransmissor; A liberação de AMPc pelas células gliais ativa as terminações neuronais do centro termorregulador, causando alterações do ponto de ajuste; Há uma elevação deste ponto; Quando o ponto de ajuste do hipotálamo está elevado, os neurônios do centro vasomotor são ativados, dando início à vasoconstrição; Inicialmente, o indivíduo percebe essa vasoconstrição nas mãos e nos pés; O desvio de sangue da periferia para os órgãos internos reduz a perda de calor através da pele e o indivíduo sente frio; Os tremores, que elevam a produção muscular de calor, podem se iniciar nesse momento, mas serão desnecessários se os mecanismos de conservação elevarem suficientemente a temperatura sanguínea; Os processos de conservação (vasoconstrição) e geração (tremores e aumento da termogênese sem tremores) de calor continuam até que a temperatura do sangue que irriga os neurônios hipotalâmicos atinja o novo ponto de ajuste do termostato; Quando esse patamar é atingido, o hipotálamo mantém a temperatura no nível febril pelos mesmos mecanismos de equilíbrio do calor que funcionam no indivíduo sem febre; Quando o ponto de ajuste hipotalâmico é reajustado para baixo (em resposta à redução da concentração de pirogênios ou ao uso de antipiréticos), os processos de perda de calor por vasodilatação e transpiração são ativados; A perda de calor por transpiração e vasodilatação continua até que a temperatura sanguínea no hipotálamo atinja o limite inferior da regulação. Alice Bastos Importância da febre A resposta febril potencializa a defesa do organismo contra agentes infecciosos e células neoplásicas; A febre causa: 1. Aceleração da quimiotaxia de neutrófilos e da secreção de substâncias antibacterianas (peróxidos, superóxidos, lisozima e lactoferrina); 2. Aumento da produção e das ações antiviral e antitumoral dos interferons; 3. Estimulação das fases de reconhecimento e sensibilização da resposta imunológica, resultando em uma internação mais eficiente entre macrófago e linfócito T e maior proliferação destes últimos; 4. Diminuição da disponibilidade de ferro, a qual limita a proliferação bacteriana e de alguns tumores. Febre X Hipertermia A hipertermia caracteriza-se por aumento descontrolado da temperatura corporal, que excede a capacidade do corpo de perder calor; Não há alteração no ajuste do centro termorregulador hipotalâmico; Ao contrário do que ocorre com a febre nas infecções, a hipertermia não envolve a presença de moléculas pirogênicas; A hipertermia pode ser observada nas seguintes situações: Calor excessivo (excesso de roupas, ambiente superaquecido, fototerapia); Desidratação; Hipernatremia; Intoxicações medicamentosas (salicilatos, atropínicos, fenotiazínicos); Hipertireoidismo; É importante distinguir entre febre e hipertermia, uma vez que a última pode evoluir rapidamente ao óbito e não responde aos antipiréticos. Referências DINARELLO, C. A.; PORAT, R. Febre. In: KASPER, D. L. et al. Medicina interna de Harrison. 19. Ed. Porto Alegre: AMGH, 2017. p. 619-629. KUMAR, V.; ABBAS, A. K.; ASTER, J. C. Inflamação e reparo. In: KUMAR, V.; ABBAS, A. K.; ASTER, J. C. Robbins & Cotran Patologia: bases patológicas da doença. 9. Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. p. 146- 215. RODRIGUES, D.; BRICKS, L. F. Febre. In: MARCONDES, E. et al. Pediatria básica: geral e neonatal – Tomo I. 9. Ed. São Paulo: Sarvier, 2002. p. 215-218.
Compartilhar