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AULA NÚMERO 08 – DEBATE SOBRE O LIVRO “O que faz o brasil, Brasil?” Criação do Brasileiro para Roberto DaMatta: do futebol, do jeitinho, do samba, dos orixás, do carnaval... TÍTULO: O que faz o brasil, Brasil? AUTOR: Roberto DaMatta EDITORA: Rocco - 1996 CAPÍTULO 01: O QUE FAZ O BRASIL, BRASIL? A QUESTÃO DA IDENTIDADE Roberto DaMatta inicia o livro realizando uma distinção entre brasil e Brasil. A terminologia com letra minúscula refere-se apenas a um objeto sem vida, pedaço de coisa que morre e que não tem a menor condição de se reproduzir como sistema; já o Brasil com letra maiúscula apresenta um significado mais amplo e complexo - refere-se ao país, a cultura, ao local geográfico, à manutenção de um vínculo de identidade e de ligação especial...; O autor parte de um pressuposto antropológico, defendendo que embora as sociedades humanas apresentem características semelhantes inerentes à própria condição humana, logo nascem as diferenças - os estilos, os modos de ser e estar, os jeitos de cada qual...; O homem se distingue dos animais pela capacidade de pensar sobre si e refletir sobre quem ele é (de se identificar, justificar e singularizar); Para DaMatta, a construção de uma identidade social, então, como a construção de uma sociedade, é feita de afirmativas e negativas diante de certas questões; A discussão da obra levará à discussão do Brasil como uma moeda ("uma chave dupla"), tendo em vista que o que faz o brasil, Brasil é uma imensa e inesgotável criatividade avassaladora; Destarte, existem dois modos básicos de construir a identidade brasileira: por meio de dados quantitativos (IDH, PIB, PIB per capta, Coeficiente de Gini...) e dados qualitativos (inerente aos aspectos culturais – a qual é desenvolvida pelo autor ao longo da obra); CAPÍTULO 02: A CASA, A RUA E O TRABALHO A rotina brasileira baseia-se no ciclo casa-rua-casa; Roberto DaMatta explora os conceitos de casa e rua, defendendo se tratarem de muito mais que apenas espaços físicos. São espaços de onde se pode julgar, classificar, medir, avaliar e adquirir valores, são modos de ler, explicar e falar do mundo; A rua compensa a casa e a casa equilibra a rua; A casa é vista como um espaço crucial para o processo de socialização do indivíduo perante o mundo que o espera; É também a casa considerada uma dimensão da vida social permeada de valores e de realidades múltiplas - o indivíduo compreende as ideias de certo e errado, de honra, de respeito, de vergonha...; A rua geralmente associa-se a um ambiente perigoso, movimentado, egoísta, de luta, no qual ninguém conhece ninguém; A rua vincula-se àquilo que não se convém realizar em casa - o trabalho, visto para alguns povos como no caso do brasileiro, como um verdadeiro horror, enquanto outros, adeptos da corrente calvinista, enxergam o trabalho como algo sagrado; Vale ressaltar que a visão do autor sobre esse tema é vista por alguns como ingênua, tendo em vistas que alguns espaços domiciliares são, às vezes, verdadeiros cenários de guerra muito mais danosos comparado a determinados espaços nas ruas; Por último, conclui o capítulo apontando para a persistência de algumas questões históricas na contemporaneidade no que diz respeito ao trabalho - a empregada doméstica seria uma manifestação moderna da ama do leite do período da escravidão; CAPÍTULO 03: A ILUSÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS DaMatta discorre acerca da questão da miscigenação racial existente no território brasileiro; Segundo Antonil, “O Brasil é um inferno para os negros, um purgatório para os brancos e um paraíso para os mulatos”. Entretanto, a interpretação dessa frase não se limita somente a fatores biológicos, mas envolve questões sociais, políticas e econômicas; A miscigenação, para nomes como Gobineau, conduziria ao fim do Brasil como povo e como processo biológico; O termo mulato pode ser analisado a partir de duas vertentes. A mais frequente no Brasil é baseada na concepção de que os indivíduos mulatos estariam, de fato, em um paraíso, sendo uma síntese perfeita do melhor que pode existir no negro, no branco e no índio – há uma valorização do intermediário. Entretanto, ao pé da letra, o termo “mulato” vem de “mulo”, utilizado para se referir a um animal híbrido (no caso, seria resultante da união entre negro e branco) e esse intermediário não é visto sob bons olhares em países como os Estados Unidos por justamente não pertencer a nenhum dos extremos; Outros nomes como Buckle, Couty e Agassiz foram importantes e influentes teóricos do racismo no Brasil, exprimindo o medo da mistura e trataram a nossa população como um todo potencialmente degenerado de híbridos incapazes de criarem qualquer aspecto positivo; Da Matta conclui ao refutar a concepção da existência de uma democracia racial pelo fato desta se tratar de um mito que não pode ser negado mas que corresponde a uma forma sutil de esconder uma sociedade que ainda não se sabe hierarquizada e divida entre múltiplas possibilidades de classificação; “O racismo à brasileira” torna a injustiça algo tolerável e a diferença, uma questão de tempo e amor; CAPÍTULO 04: SOBRE COMIDAS E MULHERES... Nesse capítulo, DaMatta explora as dicotomias cozido x cru e alimento x comida; Algumas metáforas associadas a comida que marcam a identidade brasileira também são retratadas – “pão duro”, “na boca da botija”, “com a faca e o queijo na mão”, “água na boca”, “comer”, “pão que o diabo amassou”; O cru e o cozido podem significar com muito mais facilidade um universo complexo, muito além de terminologias exclusivas para se referir a preparo alimentar; O cru seria tudo aquilo que está fora da casa, uma área dura e cruel do mundo social onde todos estariam em constantes competições; Já o cozido é algo social por definição podendo se referir a um estado de preparo alimentar ou a um prato típico consolidado no território brasileiro. O cozido é concebido como algo que permite a relação e a mistura de coisas do mundo que estavam separadas (sólido + líquido); Alimento seria apenas aquilo que o homem consome por necessidade, enquanto comida vincula-se ao prazer. Ex: O queijo para o rato é comida e pro homem, alimento; A comida, segundo o autor, possui um ramo de atuação ainda maior por estabelecer uma identidade definida de um grupo, classe ou pessoa; Aquilo que se consome, de que forma se consome e com quem se consome são elementos constituintes de hábitos culturais; A comida básica do brasileiro é o feijão-com-arroz que representa explicitamente, novamente, o desejo brasileiro pelo intermediário entre os extremos (negro e branco). A culinária também se vincula à construção de um processo lógico e cultural; Comer, comida e os alimentos formam um código complexo, sendo eventualmente utilizados em diversas situações do nosso dia-dia e também formam a identidade de um povo; O ato de comer, às vezes, pode se associar a um cunho sexual, no qual um é satisfeito pela absorção do outro; Além disso, o ato revela também a segregação de gênero muito evidente em diversos contextos na realidade brasileira, uma vez que, na maioria das vezes, a mulher é o objeto a ser comido pelo homem devorador; O homem seria o englobador do mundo, ao passo que a mulher se limitaria a ambientes como a cozinha; CAPÍTULO 05: O CARNAVAL OU O MUNDO COM TEATRO E PRAZER O homem é o único animal que se constrói pela lembrança, pela recordação e pela saudade, e se descontrói pelo esquecimento e pelo modo ativo com que consegue deixar de lembrar. Assim, a memória social é associada ao que se chama “tradição” ou “cultura”; DaMatta discorre sobre a dialética entre festa e rotina. Tanto a festa quanto a rotina são modos que a sociedade tem de exprimir-se; A vida, para a maioria de nós, se define sempre pela oscilação entre rotinas e festas (extraordinários); Na festa, comemos, rimose vivemos o mito ou utopia da ausência de hierarquia, poder, dinheiro e esforço físico; As catástrofes vinculam-se a certas anormalidades existentes no dia-dia que escapam do nosso controle. Esses eventos surgem como tragédias que nos atingem, como catástrofes que colocam em causa nossa capacidade de organização e nossa possibilidade de sobrevivência como coletividade (furacões, tempestades, enchentes, terremotos, pestes, inundações). Desse modo, como no cenário atual marcado pela pandemia do coronavírus, o mundo é vivido desse modo, deixando de fazer o sentido comum, dando a impressão de que está no fim; Por outro lado, essas catástrofes contribuem para a ressignificação do nosso viver pois essas situações promovem o encontro e a solidariedade entre os homens; No caso do Brasil, a festa mais irreverente e que marca a identidade nacional é, sem dúvidas, o Carnaval. O Carnaval é uma catástrofe positiva, é um momento no qual os cidadãos podem abandonar as suas rotinas, são livres, utilizam o corpo como instrumento de prazer, dão risadas, expandem alegria; O Carnaval é definido por DaMatta como uma inversão do mundo, uma reviravolta positiva, esperada, planificada e, por tudo isso, vista como desejada e necessária em nosso mundo social; No Carnaval, em tese, todos são iguais perante a sociedade; CAPÍTULO 06: AS FESTAS DA ORDEM Nesse capítulo, DaMatta discorre sobre as diferenças existentes entre as chamadas festas populares e as festas da ordem; Em primeira análise, todas as festas recriam e resgatam o tempo, o espaço e as relações sociais; As festas da ordem se diferenciam daquelas que promovem sorte ou a orgia, uma vez que explicitam padrões de comportamento, objetivos a serem cumpridos, celebrando as relações sociais tal como elas já operam no mundo diário; Por isso, as festas da ordem são "ritos de reforço", ou seja, há uma nítida relação entre cerimonial e poder; Seriam exemplos de festas da ordem - formaturas, aniversários, casamentos, desfiles comemorativos, procissões religiosas...; Contudo, vale ressaltar, que no caso brasileiro, cada instituição importante possui um lugar próprio e uma forma dramática de representação ritual; As festas da ordem são centralizadoras e buscam a uniformidade e a contenção dos participantes, vinculando-se a dois ingredientes básicos: sacrifício e disciplina; CAPÍTULO 07: OS MODOS DE NAVEGAÇÃO SOCIAL: A MALANDRAGEM E O JEITINHO DaMatta, nesse capítulo, discorre acerca do jeitinho brasileiro enraizado na cultura nacional; Ficamos confundidos e fascinados com a chamada disciplina existente em alguns países. Todavia, não há nada de extraordinário, somente lá a lei é instrumento que faz a sociedade funcionar bem; Alguns exemplos: desrespeito a filas preferenciais, a desobediência de regras de trânsito, a interferência da condição socioeconômica do indivíduo no cumprimento de uma pena; Da junção entre o "pode" e o "não pode" se produzem os tipos de jeitinhos e arranjos que fazem com que possamos operar um sistema legal que quase sempre nada tem a ver com a realidade social; Esse jeitinho busca conciliar todos os interesses, criando uma relação aceitável entre o solicitante, o funcionário-autoridade e a lei universal; O "jeitinho" é um jeito mais harmonioso de resolver a disputa. Contudo, o "sabe com quem você está falando" também é comum, apesar de se construir como uma forma conflituosa e direta - é a famosa carteirada; "Não há no Brasil quem não conheça a malandragem", "esse modo tipicamente brasileiro de cumprir ordens absurdas"; "A malandragem é uma personagem nacional". O malandro seria aquele que frequentemente realiza malandragens; Na literatura brasileira, figuras como Pedro Malasartes são exemplos claros de ilustração desses malandros brasileiros; CAPÍTULO 08: OS CAMINHOS PARA DEUS Outro aspecto bastante presente no cotidiano brasileiro é a fé; Há, para grande parcela populacional, a crença da existência de fronteiras entre o mundo em que vivemos e um outro mundo, onde, um dia, iremos habitar; O alto seria tudo aquilo que é superior, enquanto o baixo é a terra em que vivemos; A religião seria um modo de permitir uma relação globalizada não só com os deuses mas também com todos os homens e com os seres vivos que formam o nosso mundo; A religião surge pela necessidade humana de dar sentido a tudo como as diferenciações de poder tão evidentes na atualidade e ganha força em detrimento dos limites existentes no ramo tecno-científico; No Brasil, evidencia-se um sincretismo. A religião católica que até 1890 era a oficial ainda continua sendo a predominante. Contudo, não podemos negar a influência das religiões de matrizes africanas e de doutrinas como a espírita para a construção da identidade nacional; O milagre seria uma prova de ciclo de troca que envolve pessoas e entidades sobrenaturais na forma de desejos, motivações, sentimentos e vários objetos; Segundo Roberto DaMatta, o povo brasileiro é profundamente religioso, tendo em vista a comemoração do Natal e o vestir branco durante o ano novo; A religiosidade é uma fonte de esperança; Síntese: O Brasil é o Brasil pela política, economia, pela rua, pelo trabalho, pelos valores religiosos, pelas festas, pelo jeitinho... E pensar o que faz o brasil, Brasil não é tarefa fácil – DaMatta percebe a sociedade como se fosse uma divindade, carregando consigo forte influência do Positivismo Comtiano. Precisamos ir em busca de algo que permita fazer do mundo diário, com seu trabalho duro e sua falta de recursos, uma espécie de Carnaval que inventa a esperança de dias melhores
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