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SUMÁRIO 1 POLÍTICAS E PROGRAMAS PARA A INFÂNCIA E JUVENTUDE ............ 4 2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: UM AVANÇO LEGAL A SER DESCOBERTO ................................................................................ 11 2.1 O QUE é o Estatuto da Criança e do Adolescente ........................ 12 2.2 Direitos consagrados no ECA ........................................................ 12 3 QUEM O ESTATUTO PROTEGE ............................................................. 14 3.1 QUANDO o ECA foi criado ............................................................ 14 4 A ATENÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE NO BRASIL ................ 15 5 O ECA E A PUNIÇÃO DE JOVENS ......................................................... 18 6 O ECA E A ADOÇÃO................................................................................ 19 6.1 Quanto os indicadores sociais mudaram desde a promulgação da lei 20 7 ACESSO À EDUCAÇÃO .......................................................................... 21 8 TRABALHO INFANTIL .............................................................................. 21 8.1 TRABALHO INFANTIL ILEGAL POR REGIÃO.............................. 22 9 OS DESAFIOS E AS POSSIBILIDADES DE ESPAÇO PARA A PARTICIPAÇÃO DO JOVEM NA VIDA PÚBLICA .................................... 25 10 EDUCAR PARA A CIDADANIA ................................................................ 29 11 COMO O BRASIL FALHA EM PROTEGER SUAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES .................................................................................... 31 11.1 A REALIDADE É OUTRA .............................................................. 33 12 SOLUÇÕES SIMPLISTAS ........................................................................ 34 13 PROGRAMA INFÂNCIA, ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE (PIAJ) ......... 35 14 SERVIÇO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL INFANTO-JUVENIL E TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL .................................................. 37 15 POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E O SERVIÇO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL ...................................................................................... 38 16 PROCESSO DE TRABALHO DO SERVIÇO SOCIAL .............................. 41 17 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 48 1 POLÍTICAS E PROGRAMAS PARA A INFÂNCIA E JUVENTUDE Sistema de Proteção à Infância, Adolescência e Juventude A infância, a adolescência e a juventude são fases da vida que devem ser integralmente protegidas a partir da promoção e da defesa dos direitos previstos na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, assegura às crianças, aos adolescentes e aos jovens, com prioridade absoluta, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, determinando à família, à sociedade e ao Estado o dever de assegurar o exercício destes e outros direitos fundamentais. A Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), foi promulgada com o objetivo de regulamentar e dar efetividade ao referido regramento constitucional, estabelecendo regras e princípios fundamentados em dois pilares: 1) crianças e adolescentes são sujeitos de direitos; e 2) afirmação de sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Com objetivo de garantir efetividade à proteção integral, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê um conjunto de medidas governamentais a todos os entes federativos, mediante políticas sociais básicas, políticas e programas de assistência social, serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus tratos e abuso, e proteção jurídica e social por entidades da sociedade civil. O Estatuto da Criança e do Adolescente representou uma verdadeira ruptura com a legislação então vigente, o Código de Menores (Lei n° 6.697/1979), uma vez que adotou a doutrina da proteção integral em direção oposta à doutrina da situação irregular, que vigorava até então. Conforme o referido código, os menores de 18 anos de idade eram sujeitos de direito ou mereciam proteção apenas quando se encontravam na situação caracterizada como "irregular", definida no artigo 2o da legislação1. O campo de atuação se restringia ao binómio carência/delinquência, sem um viés garantista. Fonte: semascastanhal.wordpress.com A doutrina da proteção integral, inaugurada com o texto constitucional de 1988, tem por objetivo a promoção e a defesa dos direitos fundamentais das crianças, adolescentes e jovens, que passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direitos e não mais como objetos de compaixão/repressão. O Estatuto da Criança e do Adolescente possui três princípios gerais, a saber: o princípio da prioridade absoluta, o princípio do melhor interesse e o princípio da municipalização, os quais se desdobram em outros princípios específicos. O princípio da prioridade absoluta está previsto no artigo 227 da Constituição Federal e no artigo 4o do ECA, através dos quais é garantida a preponderância do interesse infanto-juvenil nos âmbitos judicial, extrajudicial, administrativo, social e familiar, a fim de facilitar às crianças, aos adolescentes e aos jovens a concretização dos seus direitos fundamentais. A prioridade absoluta para a promoção dos interesses infanto-juvenis abrange, inclusive, a preocupação com a elaboração e execução das leis orçamentarias, ao indicar que o orçamento público deve prever a destinação privilegiada, entre os recursos disponíveis, para a áreas relacionadas à proteção integral da infância e da juventude. A Constituição Federal, em seu artigo 212, por exemplo, estabelece para todos os entes federativos o percentual mínimo de recursos a serem destinados para a manutenção e o desenvolvimento dos sistemas de ensino. Segundo o referido regramento, a União aplicará, anualmente, nunca menos de 18%, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios 25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências. Também é importante destacar que a elaboração e a execução de políticas públicas, especialmente aquelas destinadas ao aspecto preventivo da proteção integral, são essenciais para resguardar os direitos fundamentais de crianças, adolescentes e jovens. O princípio do melhor interesse deve orientar tanto o legislador quanto o aplicador das leis, determinando a prioridade das necessidades da criança, do adolescente e do jovem como critério interpretativo da lei, de solução de litígios e de elaboração de novos regramentos. Quanto ao princípio da municipalização, destaca-se a descentralização político administrativa adotada pelo Estatuto, em que é atribuído ao Poder Público Municipal o dever de executar a política de atendimento, que se materializa com a participação direta da comunidade por meio do Conselho Municipal de Direitos e dos Conselhos Tutelares. Dessa forma, o Estatuto estabelece a importância da atuação dos municípios na implementação e na fiscalização das políticas públicas destinadas à promoção dos direitos da criança, do adolescente e do jovem, uma vez que são estes os entes públicos com melhores condições de adaptar as políticas públicas à realidade local. A condição peculiar de indivíduo em desenvolvimento, e por isso, merecedor de especial proteção, também se encontra consagrada na Lei n° 12.852/2013, que institui o Es-tatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das po-líticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude. Segundo o Estatuto da Juventude, são consideradas jovens as pessoas comidade entre 15 e 29 anos, sendo que aos adolescentes com idade entre 15 e 18 anos aplica-se o Es-tatuto da Criança e do Adolescente e, subsidiariamente, o Estatuto da Juventude, quando suas normas não conflitarem com as normas de proteção integral do adolescente previstas no ECA. Nesse contexto, ressalta-se também que a Emenda Constitucional n° 65, de 13 de julho de 2010, modificou a redação original do artigo 227 da Constituição Federal, com o objetivo de também tutelar os interesses da juventude. Até então, a redação original do preceito constitucional abrangia apenas as crianças e os adolescentes. A referida alteração no texto constitucional, entre outras providências, teve por consequência a determinação de elaboração do estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens e do plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas. Promulgado em 5 de agosto de 2013, o Estatuto da Juventude dispõe, em seu artigo 2o, que as políticas públicas voltadas para a juventude devem ser regidas pelos seguintes princípios: I - Promoção da autonomia e emancipação dos jovens (no sentido de inclusão, liberdade e participação do jovem na vida em sociedade); II - Valorização e promoção da participação social e política; III - Promoção da criatividade e da participação no desenvolvimento do país; IV - Reconhecimento do jovem como sujeito de direitos; V - Promoção do bem-estar, da experimentação e do desenvolvimento integral do jovem; VI - Respeito à identidade e à diversidade individual e coletiva da juventude; VII - Promoção da vida segura, da cultura da paz, da solidariedade e da não discriminação; e VIII - valorização do diálogo e convívio com as demais gerações. A legislação em questão enumera os seguintes direitos que deverão ser garantidos aos jovens: o direito à cidadania, à participação social e política e à representação juvenil; o direito à educação; o direito à profissionalização, ao trabalho e à renda; o direito à diversidade e à igualdade; o direito à saúde; o direito à cultura; o direito à comunicação e à liberdade de expressão; o direito ao desporto e ao lazer; o direito ao território e à mobilidade; o direito à sustentabilidade e ao meio ambiente; e o direito à segurança pública e ao acesso à justiça. O Estatuto da Juventude é regulamentado pelo Decreto n° 8.537, de 5 de outubro de 2015, que também regulamenta a Lei n° 12.933, de 26 de dezembro de 2013 (Lei da Meia Entrada), dispondo sobre o benefício da meia-entrada para acesso a eventos artístico-culturais e esportivos por jovens de baixa renda, por estudantes e por pessoas com deficiência, e estabelece os procedimentos e os critérios para a reserva de vagas a jovens de baixa renda nos veículos do sistema de transporte coletivo interestadual. Para efeitos do referido decreto, é considerado jovem de baixa renda, a pessoa com idade entre 15 e 29 anos que pertence à família com renda mensal de até dois salários mínimos, inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico). Os jovens de baixa renda terão direito ao benefício da meia-entrada mediante a apresentação da Identidade Jovem acompanhada de documento de identificação com foto expedido por órgão público e válido em todo o território nacional. As pessoas com deficiência terão direito ao benefício da meia-entrada mediante a apresentação do cartão de Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social ou de documento emitido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que ateste a aposentado-ria. Registra-se que o Decreto em questão também prevê que se a pessoa com deficiência ne-cessitar de acompanhamento, ao seu acompanhante também se aplica o direito ao benefício. Quanto à reserva de vagas a jovens de baixa renda nos veículos do sistema de transporte coletivo interestadual, o Decreto n° 8.537/2015, regulamentando o Estatuto da Juventude, prevê a reserva de 2 vagas gratuitas em cada veículo, comboio ferroviário ou embarcação do serviço convencional de transporte interestadual de passageiros e a reserva de 2 vagas com desconto de 50%, no mínimo, no valor das passagens, a serem utilizadas depois de esgotadas as vagas gratuitas. Segundo o § 2o do artigo 13 do referido Decreto, para fazer uso das vagas gratuitas ou com desconto, o beneficiário deverá solicitar o bilhete de viagem do jovem nos pontos de venda, com antecedência mínima de 3 horas em relação ao horário de partida da linha do serviço de transporte, podendo solicitar também a emissão do bilhete de viagem de retorno, observados os procedimentos da venda de bilhete de passagem. O Ministério Público possui um papel muito importante na defesa das crianças, adolescentes e jovens. O Estatuto da Criança e do Adolescente elenca, em seu artigo 201, um rol exemplificativo de atribuições judiciais e extrajudiciais atribuídas ao Parquet. Trata-se de direitos difusos, coletivos e individuais a serem defendidos pelo órgão ministerial. Segundo leciona Galdino Augusto Coelho Bordallo, o artigo 201 do ECA não se restringe à defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogéneos, possuindo, também, atribuição para a defesa dos direitos puramente individuais. É o que se infere do art. 201, incisos III (que dispõe sobre a legitimidade para propositura de ação de alimentos), VIII (que trata da legitimidade para propositura de medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis para o respeito dos direitos e garantias legais asseguradas às crianças e adolescentes) e IX (legitimidade para impetrar mandado de segurança). O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê também que a intervenção do Ministério Público é obrigatória na defesa dos direitos e interesses em todos os atos processuais e em todos os processos em curso na Vara da Infância e Juventude, acarretando nulidade do processo a falta de intervenção do Ministério Público. O artigo 5o da Lei Complementar n° 75, de 20 de maio de 1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União, no inciso III, alínea e, prevê a defesa dos direitos da família, da criança e do adolescente como função institucional do Ministério Público da União. No âmbito estadual, a Lei Complementar n° 13, de 25 de outubro de 1991, que dispõe sobre a organização, atribuições e estatuto do Ministério Público do Estado do Mara-nhão, prevê, no artigo 26, que, além das funções previstas na Constituição Federal, nesta e em outras leis, incumbe ao Ministério Público: exercer a fiscalização dos estabelecimentos prisionais e dos que abriguem idosos, crianças e adolescentes, incapazes ou pessoas porta-doras de deficiência. A referida legislação prevê, ainda, no artigo 35, que compete ao Promotor de Justiça, velar pelo cumprimento das normas legais e regulamentares pertinentes à criança e ao adolescente, relativas a seu trabalho, aos costumes e ao ingresso a espetáculos públicos, tendo, para isso, no exercício de suas funções, livre acesso a todos os locais em que se tornar necessária sua presença. O artigo 35 da Lei Complementar Estadual em questão também prevê que compete ao Ministério Público, exercer as atribuições conferidas pela legislação especial relativa à criança e ao adolescente, promovendo a aplicação das medidas pertinentes, quando se tra-tar de fato definido como infração penal. Os menores de 18 anos, por serem penalmente inimputáveis, em razão da presunção de que não possuem capacidade de entender plenamente o caráter ilícito do fato, de acordo com um critério biológico, podem ter a si atribuídos a prática de atos infracionais, ou seja, condutas descritas como crime ou contravenção penal, mas que, por não possuírem todos os elementos que definem o fato típico, ilícito e culpável, não podem ter porconsequência a responsabilização pelo cometimento de um crime ou contravenção penal. Fonte:www.wreducacional.com.br Ato infracional é a ação violadora das normas que definem os crimes ou as contravenções. É o comportamento típico, previamente descrito na lei penal, quando praticado por crianças ou adolescentes, sujeitos à aplicação de medidas socioeducativas. Segundo o artigo 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente, verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - Advertência; II - Obrigação de reparar o dano; III - Prestação de serviços à comunidade; IV - Liberdade assistida; V - Inserção em regime de semiliberdade; VI - Internação em estabelecimento educacional; e VII - Medidas previstas no art. 101, I a V I4. A referida inimputabilidade pela imaturidade biológica encontra-se legalmente prevista no artigo 228 da Constituição Federal e no artigo 27 do Código Penal. Prescreve o artigo 228 da Constitucional Federal que "são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial". Igualmente, a normativa do artigo 27 do Código Penal estabelece: "os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial". A idade mínima para adquirir a maioridade penal tem sido alvo de críticas por ser considerada insuficiente para responder às demandas da sociedade, notadamente em face da aceleração do desenvolvimento psíquico dos adolescentes na atualidade e da sensação de impunidade vivenciada pela sociedade moderna, que pugna por uma punição estatal compatível com a gravidade da conduta. Sem adentrar no mérito da questão da redução da maioridade penal, é importante mencionar que, para a análise do enfraquecimento do sistema, é necessária uma reflexão acerca do efetivo cumprimento dos princípios previstos na legislação vigente, o que ultrapassa uma análise simplista do ponto de vista puramente legislativo.1 2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: UM AVANÇO LEGAL A SER DESCOBERTO “Proteger nossas crianças” é a ideia básica que permeia debates políticos, sociais e culturais no Brasil. Quando se fala em assuntos como políticas de educação, violência urbana e acesso a conteúdo na internet, esse argumento abstrato é usado de forma recorrente. Por trás desse debate há uma lei federal sancionada em 1990 que regula como o Estado, a sociedade e a família devem lidar com pessoas com menos de 18 anos: o Estatuto da Criança e do Adolescente, popularmente chamado 1 Extraído do link: www.avlma.com.br pela sua sigla, ECA. Em 267 artigos, o texto tem como ponto de partida a “doutrina da proteção integral”, ou seja, o princípio de que as crianças e os adolescentes devem ser protegidos e assistidos pelo Estado, pela família e pela sociedade com prioridade e garantias de direitos básicos. O ECA é a base jurídica no Brasil para qualquer medida, intervenção ou discussão sobre os direitos dos menores de 18 anos. 2.1 O QUE é o Estatuto da Criança e do Adolescente A Constituição Federal de 1988 estabeleceu na legislação brasileira, por meio de seu artigo 227, que crianças e adolescentes formam um grupo de pessoas que têm direitos específicos e demandam proteção especial tanto do Estado quanto da sociedade e da família. O ECA, sancionado dois anos depois, em 1990, é um conjunto de normas que buscam regulamentar detalhadamente o princípio estabelecido pelo artigo 227 da Constituição. A lei define quais são esses direitos, quem deve aplicá-los ou garanti- los, e como isso deve ser feito. O estatuto é subordinado à Constituição, ou seja, qualquer de seus artigos que contradiga algum direito assegurado no texto de 1988 não tem validade. Mudar a proibição para qualquer tipo de trabalho abaixo dos 14 anos de idade, por exemplo, que está garantida no ECA, só seria possível com alteração constitucional, já que consta também na Constituição. Uma mudança do tipo requer um processo longo no Congresso e grande apoio parlamentar. Ao mesmo tempo, por ser uma lei complementar à Constituição, o ECA está acima de qualquer outro tipo de lei na hierarquia jurídica brasileira. Um decreto presidencial, por exemplo, não tem competência para acabar com a existência dos conselhos tutelares — órgãos instituídos pelo estatuto de forma permanente e autônoma. 2.2 Direitos consagrados no ECA PROTEÇÃO INTEGRAL: Devem ser dadas, aos menores de 18 anos, “todas as oportunidades e facilidades” para que tenham a chance de desenvolvimento “físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”. ABSOLUTA PRIORIDADE: Crianças e adolescentes devem ter prioridade na hora de receber “proteção e socorro em quaisquer circunstâncias”, no atendimento público e na hora da definição de políticas públicas, como no serviço de saúde. DIREITOS FUNDAMENTAIS: O ECA reitera que as crianças e adolescentes têm os mesmos direitos fundamentais assegurados pela Constituição a todos os brasileiros, como direito à vida, à saúde, ao lazer, à dignidade, à cultura e à liberdade. REGISTRO CIVIL: O registro de crianças, por meio da certidão de nascimento, é gratuito, sem sanções ou multas para casos de atraso. Também é gratuito, a qualquer tempo, o reconhecimento de paternidade. ADOÇÃO: Com o ECA, um filho adotado passou a ter os mesmos direitos e deveres de filhos biológicos. Eventuais conflitos no processo de adoção dão preferência aos interesses e ao bem-estar do adotando. PUNIÇÕES DIFERENTES DE ADULTOS: Adolescentes não estão sujeitos ao direito penal comum. Caso cometam algum crime, aqui chamado de ato infracional, podem ser aplicadas medidas socioeducativas, dentre as quais a mais severa é a internação, em unidades exclusivas para adolescentes. PROTEÇÃO SEXUAL: A lei estabelece quais são as violações sexuais contra crianças e adolescentes, que não podem ser envolvidos em cenas pornográficas ou de sexo explícito, com penas de prisão para os responsáveis pelo conteúdo de teor sexual. EDUCAÇÃO: Os pais são obrigados a matricular os filhos no sistema de ensino e zelar pela frequência regular. As crianças e adolescentes têm direito à educação pública gratuita. As escolas devem reportar casos de evasão escolar ou casos em que identifiquem maus-tratos envolvendo os alunos, além de dever respeitar “os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente”. Outras garantias da lei incluem: proibição de criança ou adolescente viajar para o exterior sem autorização de ambos os pais ou outros responsáveis pela guarda; atendimento pré-natal gratuito a gestantes; e proibição de qualquer tipo de trabalho a pessoas com menos de 14 anos. 3 QUEM O ESTATUTO PROTEGE O ECA define os direitos das crianças e dos adolescentes. Para isso, entende- se que crianças são todas as pessoas com menos de 12 anos, e adolescentes são todos aqueles entre os 12 anos até os 18 anos de idade. Em alguns casos excepcionais, o ECA também vale para pessoas de até 21 anos — quando um adolescente de 17 recebe uma medida de internação de três anos. A partir dos 21 o jovem é liberado compulsoriamente da internação como medida socioeducativa, e deixa de precisar do acompanhamento de um responsável para acessar a Justiça. Um dos caminhos essenciais para a efetivação dos direitos previstos no ECA é o devido registro civil do recém-nascido. Sem a documentação adequada, as crianças não têm acesso a nenhum dos serviços públicos oferecidos pelo Estado, como o SUS (Sistema Único de Saúde) ou o sistema de ensino. A emissão da certidão de nascimento é um direito assegurado pelo ECA — sem custos ou represálias aos pais que atrasarem sua efetivação. Segundo o governo federal,o país “erradicou” o sub-registro em 2014. Naquele ano, apenas 1% das crianças com até um ano de idade não possuíam certidão de nascimento. 3.1 QUANDO o ECA foi criado Sancionado em 13 de julho de 1990 e em vigor desde 11 de outubro do mesmo ano, o Estatuto da Criança e do Adolescente começou a ser desenhado institucionalmente durante o processo de elaboração da Constituição de 1988, que reconheceu os menores de 18 anos como agentes de direito. A construção do ECA e de suas ideias, porém, começa alguns anos antes, com grupos e movimentos brasileiros demandando um sistema de proteção mais humanizado do que o que existia no país até então. 4 A ATENÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE NO BRASIL TEORIA DO DISCERNIMENTO (1890). Primeira legislação específica para crianças e adolescentes, já na República. Pessoas entre 9 e 14 anos deveriam ser avaliadas para saber se tinham ou não discernimento sobre os delitos que praticaram. Se sim, poderiam ser punidas. Fonte:www.forquilhinhanoticias.com.br MAIORIDADE PENAL AOS 14 ANOS (1923) Crianças de até 14 anos não poderiam ser punidas por crimes. A autoridade responsável ainda deveria registrar “o estado físico, mental e moral do menor, e a situação social, moral e econômica dos pais” ou do responsável pela guarda. PRIMEIRO CÓDIGO DE MENORES (1927). Estabeleceu pela primeira vez a maioridade penal aos 18 anos. Os jovens entre 14 e 17 anos que cometessem crimes deveriam ser levados a instituições de “preservação” e “reforma”. SERVIÇO DE ASSISTÊNCIA AOS MENORES (1941) Getúlio Vargas instala o modelo de assistência aos menores de 18 anos centralizada no governo federal, subordinado ao Ministério da Justiça, encaminhando menores abandonados a colônias e reformatórios. MILITARES E AS FEBEMS (1964) A ditadura militar desmontou o SAM de Vargas e instaurou a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem). Uma das ações foi criar as Fundações Estaduais de Bem-Estar do Menor (Febem), onde 53 mil crianças foram internadas entre 1967 e 1972. NOVO CÓDIGO DE MENORES (1979) Estabelece que os menores de 18 anos sob responsabilidade do Estado eram os em “situação irregular” — o que incluía jovens vítimas de maus-tratos, “em perigo moral” por viver em “ambiente contrário aos bons costumes”, autores de “infrações penais”, jovens com “desvio de conduta”, entre outras situações. Não tratava de prevenção nem de garantia de direitos específicos para essa população, e sim de como lidar com um conflito já instalado. EMENDA CRIANÇA (1985) O Congresso aprovou a Emenda Criança, que reconhecia os jovens como sujeitos de direitos (ou seja, têm direitos garantidos por lei) e resultou na criação dos dispositivos constitucionais responsáveis pelo surgimento do ECA. A Constituição de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, neste contexto, representam “uma importante mudança de paradigma, vindo a refutar antigas concepções de infância e adolescência associadas à passividade, ou à imagem da criança como alguém que ‘um dia será’ um sujeito”, escreve Irene Rizzini, diretora do Ciespi (Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância), em artigo de 2015. O papel dos movimentos sociais Em meio à abertura política da ditadura militar e à ascensão dos movimentos sociais, a sociedade civil se colocou como um agente importante na efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes, dando voz a pautas que depois seriam incorporadas pela Constituição e pelo ECA. Entre os grupos que se organizaram em torno do tema estavam, por exemplo, a Igreja Católica, com as Pastorais da Criança, e o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, que passou a se articular no início dos anos 1980 e, em 1985, se institucionalizou enquanto entidade da sociedade civil. A organização popular culminou na criação da Frente Nacional de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, grupo que participou da proposição do debate e da legislação que resultou no ECA. Criou-se também, em 1988, o Fórum Nacional do Direito da Criança e do Adolescente, grupo que permanece ativo na fiscalização do cumprimento dos direitos dos menores de 18 anos, além de propor leis. COMO é a rede de atenção estabelecida pelo ECA A descentralização da política de proteção à infância e à juventude é um ponto destacado por especialistas no tema. Ela tenta superar a centralização federal característica das leis adotadas no Brasil antes do estatuto. Essa descentralização tem como princípio o engajamento de diferentes setores da sociedade em torno da proteção à criança e ao adolescente, e, do ponto de vista institucional se traduz na tríade: Tríade de garantia de direitos CONSELHOS DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Têm existência obrigatória tanto no nível federal (Conanda), quanto nos níveis estadual e municipal. São instituições permanentes formadas por membros do Poder Executivo e da sociedade civil com a função de participar na definição e fiscalização das políticas públicas na área. FUNDOS DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Surgem junto dos conselhos, também nos três níveis de governo, e sua função é financiar os projetos criados pelos conselhos locais. Os conselhos também são responsáveis por gerenciar os fundos, enquanto o poder público é responsável por executar as decisões dos conselhos. CONSELHOS TUTELARES Todo município do país deve ter pelo menos um Conselho Tutelar. Os conselheiros são eleitos pela população e têm a função de identificar e acompanhar menores de 18 anos em situação de risco, decidindo qual a medida de proteção mais adequada para cada caso. A rede de atenção à infância e adolescência conta com profissionais específicos atuando em diversas instituições: Operadores do direito: trabalham nos conselhos de direitos, nos conselhos tutelares e no sistema de Justiça, como o Ministério Público, as Defensorias Públicas e os Juizados Especiais da Infância e Juventude Executores de medidas de proteção: atuam nas instituições da área de assistência social, como Centros de Desenvolvimento Social, abrigos para menores de 18 anos, instituições de ensino profissionalizante, e centros de atendimento médico e psicológico com foco na adolescência, por exemplo Executores de medidas socioeducativas: estão nas instituições direcionadas aos jovens que cometeram atos infracionais, são parte do Sinase (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo) 5 O ECA E A PUNIÇÃO DE JOVENS Baseado nas diretrizes do ECA, o Sinase (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo) entrou em vigor apenas em 2012 com a pretensão de “assegurar efetividade e eficácia” das medidas socioeducativas. Existem diferentes medidas socioeducativas, aplicadas em correspondência à gravidade e circunstância do ato infracional: advertência, reparação do dano, prestação de serviço à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação. Um dos princípios do Sinase é priorizar as medidas cujo cumprimento seja em liberdade, acompanhada por agentes do Estado. No entanto, o número de internados supera a soma de jovens submetidos às outras medidas. Atualmente, o ECA prevê três anos como tempo máximo de internação, e o jovem pode ficar internado até os 21 anos em casos específicos, quando é liberado compulsoriamente. Um projeto de lei que tramita no Congresso propõe aumentar o limite para oito anos e internação até os 26 anos de idade. A internação de jovens infratores e o gerenciamento das unidades socioeducativas são competências dos governos estaduais. Uma proposta de emenda à Constituição tramita no Congresso atualmente para diminuir a maioridade penal no Brasil de 18 para 16 anos. Votações sobre a proposta têm sido adiadas há anos, diante da ação de políticos e grupos da sociedade civil que se opõem à alteração. Por serem regras constitucionais,as eventuais mudanças se sobreporiam ao ECA nesse tema. Essa proposta está ainda em análise em uma comissão do Senado. Para ser aprovada, ainda precisaria passar na comissão, em duas votações no plenário do Senado, em uma comissão da Câmara e em mais duas sessões no plenário da Câmara. Em cada votação em plenário, seriam necessários 60% dos votos dos parlamentares. Quem se opõe à diminuição da maioridade penal argumenta que a legislação atual já pune os adolescentes infratores e é necessário aprimorar o sistema de medidas socioeducativas, e não permitir que jovens de 16 e 17 anos possam ser encaminhados às penitenciárias. Também se argumenta que eventuais punições iguais às de maiores de idade põem em risco os jovens que já estão situação de vulnerabilidade social, aumentando a probabilidade de reincidência e de uma vida adulta envolta em violência. Quem defende a redução da maioridade penal argumenta que aos 16 anos um jovem já possui discernimento moral e inclusive já tem o direito a votar, portanto pode ser punido da mesma forma que um adulto. Outro argumento comum é que, por não enfrentarem as mesmas punições, menores de 18 anos são usados em organizações criminosas e isso seria um fator relevante no quadro de violência do país. 6 O ECA E A ADOÇÃO O Estatuto está na origem do atual sistema de adoção no Brasil. A lei define como direito fundamental da criança e do adolescente, em seu artigo 19, “ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral”. Antes, as regras para a adoção eram ditadas pelo Código Civil de 1916, que criava uma relação pouco estreita entre adotando e adotante. O parentesco se limitava a quem adotou e quem foi adotado — a criança, nesse sentido, continuava formalmente estranha ao resto da família, e os futuros filhos do adotado não herdariam qualquer parentesco com a família adotiva. O ECA muda o foco da legislação, priorizando a criança ou adolescente a ser adotado. Estabelece que a falta de condições econômicas dos pais não pode ser motivo para a perda da guarda dos filhos, e caso haja transferência de guarda — por vontade dos pais biológicos ou pela definição de um juiz — a preferência é por “reais vantagens para o adotando”. QUAN 6.1 Quanto os indicadores sociais mudaram desde a promulgação da lei Em mais de 25 anos, os números registram uma melhoria significativa na vida de crianças e adolescentes do Brasil desde a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Em publicação que comemora os 25 anos da lei, em 2015, o Unicef (órgão da ONU para a criança e o adolescente) destacou os avanços nos indicadores. Os dados demonstram, contudo, que a melhoria na qualidade de vida de crianças e adolescentes do Brasil se dá de forma desigual geograficamente — as mais prejudicadas são as crianças indígenas. O ECA garante “às gestantes, nutrição adequada, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral” gratuito pelo SUS. Mais de 60% dos partos no Brasil, hoje, acontecem após pelo menos sete consultas de pré-natal. No início da década de 1990, menos da metade das gestantes passavam por tantas consultas. As crianças que mais morrem são as indígenas: duas vezes mais que o resto da população. Segundo o Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas de 2008, as crianças desses grupos populacionais apresentam “elevadas prevalências de desnutrição e risco de infecção por tuberculose muito acima do observado na população geral”. 7 ACESSO À EDUCAÇÃO Enquanto 98,2% da população brasileira entre 6 a 14 anos vai regularmente à escola, a taxa entre a população de 15 a 17 cai para 84,2%, indicando evasão escolar. Ainda assim, entre 1990 e 2013, a população com idade escolar obrigatória fora da escola caiu de 19,6% para 7% no Brasil. Fonte:blogdopedrojorge.com.br O Unicef indica também o crescimento de 30 mil para 700 mil no número de crianças com deficiência matriculadas nas escolas no país. O ECA garante o direito dessas crianças receberem atendimento especializado nas instituições de ensino. Ainda assim, “apenas 22% das instituições de ensino têm dependências adaptadas a crianças com deficiência e só 12% têm sala de atendimento especializado”. 8 TRABALHO INFANTIL A Constituição de 1988 e o ECA permitem que menores de 18 anos trabalhem a partir dos 16, desde que a função não seja insalubre ou exponha o jovem a abusos físicos e psicológicos. Adolescentes de 14 e 15 anos também podem ser empregados, mas apenas na condição de aprendiz. Qualquer situação de trabalho abaixo desta idade é ilegal. Norte e Nordeste são as regiões com maior prevalência desse tipo de trabalho infantil ilegal. 8.1 TRABALHO INFANTIL ILEGAL POR REGIÃO Segundo o IBGE, entre os que têm até 13 anos mais de 74% sequer recebem salário pelo trabalho. Os dados são de 2016. Eram 190 mil entre 5 e 13 anos trabalhando naquele ano. Quando o universo se expande para todos os menores de 18 anos, 998 mil trabalhavam em situação irregular em 2016. Em 1992, 5,4 milhões de crianças viviam em situação de trabalho infantil ilegal. EM CIDADES COM MAIS DE 100 MIL HABITANTES Esse índice de homicídios, que inclui casos em todas as cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes, tem crescido. O número mais recente, de 2014, é o mais alto desde que o levantamento existe. Incluindo todo o Brasil e abrangendo a faixa etária de 0 a 18 anos, em 2014 foram 11.142 homicídios. Em 1990, os casos não ultrapassavam a marca dos 5.000. O aumento do número de homicídios supera o crescimento populacional desse período. O assassinato de jovens é o indicador que mais piorou desde a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Os jovens que mais morrem são os homens pretos e pardos. Ao Nexo, Irene Rizzini, do Ciespi, disse que o ECA é “apenas uma lei”, que “não faz mágica e muda tudo”. Os jovens continuam vivendo os mesmos problemas sociais disseminados no país, sendo a violência o exemplo mais evidente. Esse é o mesmo argumento que aponta que uma mudança na legislação, reduzindo a maioridade penal, por exemplo, não transformaria o quadro da criminalidade e violência no Brasil. POR QUE o ensino do ECA para profissionais é importante A existência da lei, ainda que um marco institucional importante, não é capaz de garantir sozinha a transformação social. Fazer do ECA uma referência quanto aos direitos de crianças e adolescentes segue sendo um desafio, a despeito da idade da legislação. Isso inclui a ampliação do conhecimento especializado entre os profissionais que trabalham na área. Para Alvaro Chrispino, doutor em educação pela UFRJ e professor do Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro, os educadores brasileiros, por exemplo, deveriam conhecer mais profundamente a legislação, uma vez que a educação como direito é tratada pelo Estatuto. Ao Nexo Chrispino disse que o sistema educacional “perde todas as vezes que, por desconhecimento, os educadores patrocinam acontecimento que ferem direitos explícitos no ECA e incorrem em ilegalidades”. “É aterrador o fato de as instituições formadoras dos futuros professores e gestores, bem como os titulares dos sistemas de ensino público, não possuírem, como atividade recorrente, cursos de capacitação sobre o tema [do ECA]”, escreveu Chrispino em artigo de 2009. Karyna Sposato, professora de direito da UFS (Universidade Federal de Sergipe) e consultora do Unicef na área de justiça da infância e juventude, disse ao Nexo que, de modo geral, o ensino do ECA nos cursos de direito se restringe a disciplinas não obrigatórias e o assunto é “infelizmente visto como de menor importância”. Sposato afirmou queno direito brasileiro há pouco interesse e estudo sobre a questão das crianças e adolescentes e que isso leva a decisões judiciais “fundadas em juízos de valor e preconceito” e que prejudicam essa população. “O exemplo das crianças Guarani Kaiowá das aldeias no Mato Grosso do Sul (MS) é contundente. Sob o argumento da indigência, crianças indígenas têm sido retiradas forçosamente de seus pais e colocadas em abrigos públicos. As crianças indígenas representam 60% das crianças internadas no estado”, disse. COMO o ECA aborda a proteção sexual de crianças e adolescentes Segundo estimativas do governo federal, 500 mil crianças e adolescentes são vítimas de exploração sexual no Brasil. Meninas são a maioria, e a faixa etária predominante é dos 7 aos 14 anos. Esses números são relativos ao período de 2012 a 2015. O governo estima que apenas 7,5% dos casos de violação sexual contra menores de 18 anos são reportados, o que dificulta o combate e a proteção dessa população. Denúncias de abuso ou exploração sexual infantil podem ser feitas através do Disque 100, que está disponível 24 horas por dia. É garantido o anonimato de quem telefona, e a ligação é gratuita. O abuso sexual não tem caráter comercial, dentro ou fora do contexto familiar. A exploração sexual de crianças e adolescentes inclui ganhos em dinheiro para terceiro e acontece em diferentes circunstâncias, envolvendo grupos pequenos ou grandes redes criminosas: prostituição, pornografia, turismo sexual ou tráfico de pessoas. Rodovias são locais que concentram pontos de exploração sexual de menores de 18 anos. O ECA dedica seus artigos 240 e 241 para discorrer sobre as violações sexuais contra a criança e o adolescente, definindo o crime e quais as penas. O artigo 240 discorre sobre a produção de conteúdo pornográfico com a participação de menores de 18 anos. Já o 241 trata da exposição de crianças e adolescentes a esse tipo de conteúdo e também trata do aliciamento ou assédio. O artigo 241 estabelece que “aliciar, assediar, instigar ou constranger” uma criança para “com ela praticar ato libidinoso” é um crime. Proíbe a exposição de menores de 18 anos a conteúdos “pornográficos” ou de “sexo explícito”. A nudez, por si só, não é mencionada, e cabe aos responsáveis ou, eventualmente, à Justiça, definir se um conteúdo com nudez se qualifica como pornográfico ou de sexo explícito ou o que seria um “ato libidinoso”. Da mesma forma, o Código Penal brasileiro delimita como criminosa a ação de aliciar menores de 18 anos ou vulneráveis para a “conjunção carnal ou outro ato libidinoso”. Também é crime expor tal público a esse tipo de situação. A interpretação do que é um “ato libidinoso”, portanto, também cabe aos responsáveis ou à Justiça.2 2 Extraído do link: www.nexojornal.com.br 9 OS DESAFIOS E AS POSSIBILIDADES DE ESPAÇO PARA A PARTICIPAÇÃO DO JOVEM NA VIDA PÚBLICA Política institucional brasileira voltada para os jovens ainda é recente apesar de avanços históricos em prol da juventude serem observados há anos no país A inserção da juventude nos debates políticos é um desafio comum em grande parte das democracias do mundo. Isso porque participar da vida pública vai além de ter um título de eleitor e comparecer às urnas de dois em dois anos. Exercer o voto é apenas um dos passos da atuação política de um cidadão engajado. Mas se o ato de negociar é inerente desde a mais tenra infância, quando birras e choro são utilizados para expressar necessidades e contrariedades, como aprimorar essa prática na juventude para o bem comum? Para avaliar a participação da juventude na esfera pública é preciso esclarecer alguns conceitos acerca do que se entende sobre juventude, quando ela começa, o que a caracteriza e quando termina. A definição de uma faixa etária da juventude é controversa. A Organização das Nações Unidas (ONU) afirma que juventude é a fase entre 15 e 24 anos, mas aceita formalmente em muito de seus programas de estudo e participação cidadã “jovens de até 35 anos”. A ONU admite, no relatório A Juventude na Ibero América: tendências e urgências, publicado em 2004, que “cada época e sociedade impõem a essa etapa da vida fronteiras culturais e sociais que definem determinadas tarefas e limitações a esse grupo da população”, diz o documento. Ao realizar sua Estratégia Juvenil, a Unesco usa diferentes definições de jovens, dependendo do contexto. Para atividades em nível internacional, utiliza a definição universal da ONUs. Para as atividades em nível nacional, por exemplo, os “jovens” podem ser entendidos de forma mais flexível, seguindo a definição adotada pelo Estado em questão. Pode basear-se, por exemplo, na definição dada na Carta da Juventude Africana, onde “juventude” significa “todas as pessoas com idades compreendidas entre os 15 e os 35 anos. Em seu site, a Unesco complementa que “a juventude é uma categoria mais fluida do que um grupo de idade fixo. No entanto, a idade é a forma mais fácil de definir essas pessoas, particularmente em relação à educação e ao emprego. Portanto, a juventude é frequentemente indicada como uma pessoa entre a idade em que ela pode deixar o ensino obrigatório e a idade em que ela encontra seu primeiro emprego. Fonte: www.sergioemagalileoto.com.br “A verdade é que é impossível uma definição estanque sobre o significado da juventude. No Brasil, segundo o Estatuto da Juventude, sancionado em 2013, é jovem todo cidadão com idade entre 15 e 29 anos. A presença desta parcela da população, cerca de 50 milhões, na esfera pública enfrenta empecilhos estruturais. Um dos passos para começar a transformar essa realidade é modificar as instituições para que elas se tornem mais receptivas às demandas. A participação empoderada dos jovens depende dos espaços disponíveis em suas comunidades e das chances que têm para se expressarem e serem ouvidos. Essas oportunidades aumentam a confiança e a vontade de participar de temas que sejam próximos de seu cotidiano. “ Nos últimos anos tivemos importantes avanços históricos para juventude brasileira, como a inclusão do termo jovem na Constituição Federal, Estatuto da Juventude, criação da Secretaria Nacional de Juventude e Conselho Nacional de Juventude, entre outros pontos, mas a política de juventude em termos de política institucional ainda é muito recente no país. Sem dúvidas é preciso avançar e fortalecer ainda mais essa política institucionalmente”, afirma Ricardo Prates Bassi, 34 anos, coordenador desde 2015 do Departamento de Políticas para a Juventude (DPJ) no Governo do Estado do Rio Grande do Sul. O órgão foi constituído originalmente em 2011 como Coordenadoria Estadual de Juventude, então ligado ao Departamento de Direitos Humanos e Cidadania da Secretaria Estadual da Justiça e Direitos Humanos. Em 2016, seguindo a diretriz do Governo Federal e a experiência de outros estados, emancipou-se e reestruturou-se fruto de antigas reivindicações da juventude, o que, segundo Bassi, permite ao departamento mais autonomia de trabalho. “Diante da importância e a transversalidade do tema, era necessário que houvesse uma projeção das políticas públicas de juventude no Rio Grande do Sul. O DPJ tem em seu planejamento estratégico o eixo ‘protagonismo juvenil’ que inclui, além de outras iniciativas, fomentar junto aos municípios gaúchos a criação de coordenadorias municipais de juventude e conselhos municipais. Nesse sentido, muitas cidades estão avançando, mas não raro o DPJ se depara com a falta de sensibilização para as políticas de juventude. Gestores e prefeitos desconhecem a importância de dar voz e promover oportunidades para os jovens, o que impede o conhecimento e acesso dos mesmos às políticas públicas que lhes são de direito”, complementa. Na outra ponta, um segundo desafio para a participaçãojuvenil na vida pública é reverter o descrédito gerado pelos sucessivos escândalos de corrupção e desvios éticos de políticos brasileiros, que afastam a população da cultura de participação e das decisões coletivas. Reflete essa realidade o número de jovens brasileiros que cada vez mais estão atrasando o início formal de sua participação cidadã no sistema política, como o título de eleitor entre 16 e 17 anos. Segundo números do IBGE, a população brasileira nessa faixa etária soma cerca de 6,8 milhões de pessoas, porém, o número de eleitores nessa faixa é de 1,4 milhões, o que equivale a cerca de 20% do total de jovens nesta faixa etária. De acordo com dados do TSE, eleitores entre 16 e 17 anos representam atualmente pouco menos de 1% do eleitorado brasileiro. Em todo o país, apenas um em cada cinco jovens para os quais o voto é facultativo tirou seu título e está habilitado para exercer este direito em 2018. “Salvo aquele jovem que milita ou está em algum partido, eu vejo o jovem bem afastado da questão pública por um cenário complexo de situações que acompanhamos e que estamos acompanhando. Mas isso se observa não apenas com o jovem, mas todas as pessoas de maneira geral. Focamos nosso trabalho na questão do desenvolvimento jovem almejando o seu protagonismo, que é uma questão social urgente, e também aproveitar a potencialidade, o talento e criatividade em iniciativas juvenis já existentes para resgatar o poder público não como uma ponta isolada, mas como um meio de aproximação e transformação da sociedade”, diz Filipe Tisbierek, 41 anos, coordenador de Políticas Públicas para Juventude em Porto Alegre. Tisbierek assumiu o órgão depois da reforma administrativa proposta pelo prefeito Nelson Marchezan Júnior este ano em que reduziu o número de secretarias de 37 para 23. Assim, a Secretaria da Juventude foi extinta e virou um órgão dentro da nova Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (SMDS). “Vivemos um momento de transição complexo porque antes tínhamos estrutura de secretaria com equipe, sede e orçamento e fui convidado para assumir esse órgão muito mais simples e resumido e com todas as dificuldades financeiras que são públicas e notórias. Estamos priorizando um levantamento de todas as entidades, instituições e movimentos que atuam com a juventude ou movimentos de jovens dos mais diversos que sejam mais abrangentes do que apenas o hip-hop e o skate, que são manifestações genuínas e legítimas, mas não são as únicas. Nós precisamos enxergar o todo porque tem muita riqueza e pluralidade em Porto Alegre”, reitera. Conselhos municipais e tecnologia como engajamento Exemplo de espaço para o exercício da cidadania dos jovens, os conselhos da Juventude compõem uma das esferas de atuação e interlocução dessa parcela da população com o poder público no planejamento e acompanhamento da execução das políticas públicas. Ligados ao Poder Executivo, é neles que representantes da sociedade civil organizada podem debater sobre os projetos e as necessidades comuns e inseri-los na agenda governamental. Atualmente, o Brasil conta com o Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), além de dezenas de conselhos estaduais e centenas de conselhos municipais, com diferentes formatos e estruturas de funcionamento. O Conselho Estadual da Juventude (Conjuve-RS) foi criado por lei em 2013, e o Conselho Porto-Alegrense da Juventude, instituído em 2007. “Estamos concluindo uma fase de reestruturação do conselho para que ele tenha uma vida orgânica, pois é um dos espaços legítimos da participação da população”, diz Tisbierek. Além das formas tradicionais de atuação no sistema público, uma ferramenta valiosa para a educação cidadã e o engajamento juvenil é a habilidade dos jovens para dominar e manusear com rapidez a tecnologia. Ciente da presença dos jovens nas redes sociais, o DPJ atua com uma página no Facebook regularmente atualizada para divulgar ações e parcerias, divulgar projetos e responde dúvidas de usuários. O perfil no Twitter na extinta Secretaria Municipal da Juventude está desatualizado desde outubro de 2014, e nem foi substituído por outro depois da reforma administrativa. Informações referentes aos projetos sociais são compartilhadas nos canais da Prefeitura no Facebook e no Twitter. A única interface digital constatada e atualizada mais regularmente pelos órgãos municipais voltados para a juventude é o perfil do Conselho Municipal da Juventude no Facebook. “Com os avanços tecnológicos, vejo que os jovens estão ligados no que acontece ao redor, querem participar e darem sua contribuição, mas o outro lado precisa ser mais atrativo. Vemos que o interesse existe, falta apenas incentivo. Sempre que ocorre (procura de jovens via redes sociais ou canais digitais), respondemos para que ele possa ser contemplado em sua questão plenamente”, diz Bassi. 10 EDUCAR PARA A CIDADANIA Levar a educação política para a escola é uma das formas para fomentar a cultura cidadã e o protagonismo juvenil nas decisões públicas. Foi com essa motivação que a economista pela UFRGS e mestre em Administração Pública na Universidade de Columbia Diana Engel Gerbase criou em Porto Alegre a Mobis, startup e ONG sem fins lucrativos que tem como objetivo educar jovens para a cidadania. “A Mobis começou com uma vontade minha porque a educação para a cidadania não faz parte do currículo escolar brasileiro, apesar do direito ao exercício da cidadania estar na Constituição Federal e ser considerado um fator de interesse público. Nos Estados Unidos, onde fiz o Ensino Médio, tive disciplinas como governo, leis, simulação de juri, políticas públicas, entre outras. Aí fui estudar e me aprofundar no tema e vi que o Brasil é uma das oito democracias no mundo que não ensina cidadania, nem como disciplina, nem como conteúdo obrigatório”, diz. Após anos de atuação em uma consultoria estratégica em um grupo internacional de pesquisa, seu projeto saiu do papel em 2013 quando firmou parceria com uma escola, o Colégio Estadual Florinda Tubino Sampaio, do bairro Petrópolis, em Porto Alegre para um projeto piloto por sete semanas. Neles, cinco turmas do 1º ano do Ensino Médio receberam formação em cidadania, aprendendo a resolver conflitos e a solucionar problemas reais por meio do diálogo. “O piloto trouxe a realidade da escola brasileira de restrições, de falta da estrutura, de precariedade de recursos, da má remuneração dos professores… tudo. Por mais que a gente estude e leia sobre esse universo, tem coisas que a gente só vê na prática. Usamos muitas ferramentas de avaliação de impacto, fomos como uma esponja para absorver ao máximo e aplicar no futuro”, detalha. Ao final do período, repetiram a mesma pergunta realizada antes da execução do projeto sobre a propensão de participar e observaram um aumento de 20% no número de alunos que se mostraram mais engajados depois das aulas. Além disso, 53% deles disseram que se sentiam responsáveis pelo Estado e 35% declararam conseguir pensar mais em ações para resolver problemas na volta. Fundada oficialmente este ano por Diana e mais quatro parceiros – Ana Luiza Cardoso, Chico Baldini, Melissa Baruffi e Bruno Paim, recebendo, depois, o apoio de Tobias Chanan como associado, a startup está hoje no Parque Científico e Tecnológico da Pucrs (Tecnopuc). Agora, a Mobis quer montar uma plataforma online de recursos educacionais abertos, disponível para financiamento coletivo por meio do site Benfeitoria, repleta de conteúdo, metodologias, atividades e ferramentas disponíveis para professores de todo o Brasil que queiram preparar indivíduos para a participação ativa na democracia. “Há uma questão cultural do brasileiro de não se engajar em causas sociais, agravada pela crise em curso que estamos vivendo. Precisamos fazer um convencimento enorme para mobilizar as pessoas, para sairmosda zona de conforto. As pessoas adoram reclamar, reclamar hoje em dia é status, mas poucas pessoas dirigem essa energia para fazer algo transformador porque não adianta a gente só ficar reclamando. Afinal, a sociedade civil tem poder, ela pode fazer se se organizar. Estamos tentando iniciar um processo para fazer uma transformação de comportamento. A injustiça social sempre me incomodou, mas não adiante ter leis e regras adequadas se o cidadão não entende realmente o que está ali. Surgimos para mudar isso”, conclui Diana.3 11 COMO O BRASIL FALHA EM PROTEGER SUAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES Mesmo com uma das legislações mais avançadas do mundo, metade das meninas e meninos com menos de 17 anos não tem direitos básicos respeitados. Fonte: 889noticias.mx Apesar de uma legislação infanto-juvenil avançada, metade das crianças e adolescentes brasileiros (49,7%) não tem acesso a pelo menos um dos seguintes direitos fundamentais: educação, informação, proteção contra o trabalho infantil, moradia, água e saneamento. Além disso, mais de 34% de meninas e meninos de até 3 Extraído do link: www.fmss.org.br 17 anos vivem em casas com renda per capita insuficiente para comprar uma cesta básica, ou menos de 350 reais. O cruzamento desses dados – que fazem parte do relatório do Unicef Pobreza na infância e na adolescência, divulgado em agosto – revela que, no Brasil, a pobreza na infância e na adolescência é complexa e tem múltiplas dimensões, que vão além do dinheiro e da legislação. "O Brasil tem uma das legislações mais avançadas do mundo para proteger crianças e adolescentes, mas também é um dos países onde crianças e adolescentes estão mais desprotegidos", afirma o coordenador da Comissão da Infância e do Juventude do Condepe (Conselho Estadual de Direitos Humanos de São Paulo), Ariel de Castro Alves. Ele se refere ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Aprovado em 1990, o ECA é referência mundial como legislação de proteção à criança e ao adolescente e foi formulado a partir da Constituição Federal de 1988, uma das primeiras a contemplar a proteção integral e os direitos e garantias fundamentais da criança e do adolescente. "A legislação brasileira é excelente, uma das mais modernas do mundo, mas não é cumprida. Começamos pelo descumprimento da própria Constituição, já que crianças e adolescentes, na prática, jamais foram prioridade no Brasil", diz a presidente da Comissão de Direitos da Criança e do Adolescente da OAB, Silvana do Monte Moreira. De acordo com o Unicef, mais de 18 milhões de meninas e meninos vivem na pobreza. Entre os direitos fundamentais, o acesso ao saneamento é o direito mais descumprido e afeta mais de 13,3 milhões de crianças e adolescentes, seguido pela educação (8,8 milhões), água (7,6 milhões), informação (6,8 milhões), moradia (5,9 milhões) e proteção contra o trabalho infantil (2,5 milhões). Quase 14 mil crianças e adolescentes não têm acesso a nenhum dos seis direitos. Um relatório de 2017, também do Unicef, mostrou que o Brasil é, entre os países onde não há conflito armado, o quinto em assassinato de crianças e adolescentes, atrás apenas de Venezuela, Colômbia, El Salvador e Honduras. A Fundação Abrinq afirma que o número de mortes violentas de pessoas menores de 19 anos passou de 5 mil, em 1990, para 10,9 mil, em 2015. 11.1 A REALIDADE É OUTRA Antes do ECA, a criança fora da escola, explorada no trabalho infantil ou vítima de violência, entre outros exemplos de violação de direitos, não era considerada um "sujeito de direito". "Com a promulgação do estatuto, quem passou a estar em situação irregular foi a família, o Estado e toda a sociedade, que não garantiram proteção integral às crianças e aos adolescentes", diz Alves. O ECA prevê que todo município tenha os seguintes programas especializados para crianças e adolescentes: atendimento de famílias e fortalecimento de vínculos; enfrentamento ao abuso e exploração; erradicação do trabalho infantil; atendimento de droga dição; atendimento às vítimas de maus-tratos e violência; convivência familiar e comunitária, incluindo programas de apoio sócio familiar e acolhimento institucional; medidas socioeducativas e programas de oportunidades e inclusão, visando o preparo dos jovens para o mercado de trabalho. Só que essa não é realidade na maioria das cidades. Parte do problema pode ser explicada pela política de cortes orçamentários em políticas públicas e programas sociais, que enfraqueceu principalmente órgãos de formulação e monitoramento da população infanto-juvenil, como o Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), o PPCAAM (Programa de Proteção de Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte) e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI). "Esses cortes e a falta de atenção ao ECA têm ampliado as desigualdades sociais e gerado mais pobreza para as crianças, adolescentes e seus familiares", analisa Alves. Moreira também ressalta a incapacidade do Estado em atender demandas protetivas do público infanto-juvenil. "As varas da infância acumulam competências com outras áreas, como criminal em algumas comarcas, do idoso em outras, além de não terem equipes técnicas para atender os casos que lá chegam. E, quando têm, os técnicos são insuficientes", comenta. 12 SOLUÇÕES SIMPLISTAS O desrespeito aos direitos básicos gera, junto com a pobreza, um outro problema: a criminalidade infanto-juvenil. De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça, o Brasil tem 189 mil adolescentes cumprindo medidas socioeducativas. Em 2015 eram 96 mil. O aumento no número de menores infratores fomenta discussões sobre a redução da maioridade penal, hoje em 18 anos, e coloca em evidência o ECA, que é atacado por aqueles que defendem a diminuição da maioridade para 16 anos. Para os especialistas, a redução da maioridade penal é uma medida simplista para um problema complexo. "Essa proposta, que ganha força em períodos pré- eleitorais, é demagógica e ilusória", afirma Alves. "O principal argumento contra é que cuidado e prevenção, através de políticas sociais, custa muito menos que repressão: cada aluno na rede pública custa, em média, 2 mil reais por ano, enquanto que um interno na Fundação Casa de São Paulo custa cerca de 10 mil reais por mês", argumenta o coordenador, citando dados do Condepe. A redução da maioridade penal também lançaria mais cedo o menor infrator dentro de um sistema que, na prática, é de formação de criminosos. "Teríamos criminosos ‘profissionalizados' nas cadeias mais cedo, dentro de um sistema prisional falido, que é dominado pelo crime organizado e pela corrupção e que nunca resolveu o problema da violência, pois a reincidência, conforme dados da CPI do Sistema Carcerário, é de 70%", afirma Alves. O atual encarceramento dos jovens infratores na Fundação Casa também não é a solução. "A Fundação Casa de São Paulo tem apresentado reincidência de 20%, e esse percentual não leva em conta os jovens que completam 18 anos e vão para as cadeias pela prática de novos crimes", informa Alves. "De socioeducativas, as unidades voltadas aos jovens infratores nada têm. São apenas espaços amontoados de adolescentes jogados em locais imundos, insalubres e em número superior à capacidade", afirma Moreira. "É cômodo para o Estado tender a medidas retrógradas, como a redução da maioridade penal ou o aumento do tempo de internação do adolescente infrator, pois é mais fácil punir que prevenir, prender que educar." "Temos que incluir socialmente e garantir oportunidades à juventude. Se o adolescente procura escola, trabalho e profissionalização, mas não encontra vaga, ele vai para o crime. O crime só inclui quando o Estado exclui", diz Alves.4 13 PROGRAMA INFÂNCIA, ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE (PIAJ) O que é?Com o objetivo de garantir o princípio da proteção integral às crianças, adolescentes e jovens com distintas e contextualizadas metodologias e perspectivas, fortalecendo as comunidades e coletivos na construção de uma sociedade em que a violência seja superada e uma cultura de paz e tolerância sejam efetivos entre todos e todas. O Programa Infância, Adolescência e Juventude (PIAJ), incentiva e apóia atividades educativas com foco no Estatuto dos Direitos da Criança e Adolescentes e outros referenciais de apoio na defesa e proteção destas categorias sociais, estimulando a participação política em suas comunidades, Conselhos de Direito e Fóruns da Criança, Adolescente e Juventude. Como começou? No início da década de 2000, a Cáritas Brasileira define uma política nacional para infância e adolescência como horizonte político pedagógico para sua ação. Intensifica-se a formação para o protagonismo e o trabalho junto aos Conselhos de Políticas Públicas incorporados à juventude. É neste contexto que nasce o PIAJ, o Programa de Infância, Adolescência e Juventude da Cáritas Brasileira, que vincula a garantia e a promoção dos direitos deste público à concepção de desenvolvimento solidário e sustentável. O que realizamos? 4 Extraído do link: www.cartacapital.com.br A Cáritas Brasileira realiza encontros nacionais de adolescentes, formação política com grupos e comissões regionais de adolescentes e jovens a partir das campanhas e mobilizações para garantia de direitos. Fonte:infancianobrasil.blogspot.com Dentre as ações desenvolvidas podemos destacar: o Voto Adolescente, o Enfrentamento à Violência e Exploração Sexual, a Participação na Gestão de Políticas Públicas, a campanha contra a redução da maioridade penal, seminários regionais e nacionais com temáticas sobre a conjuntura atual e elaboração dos planos de ação regional e nacional. Por meio do PIAJ, a Cáritas também tem atuado nos espaços de mobilização para efetivação dos direitos, como na prevenção e erradicação do trabalho infantil, campanhas contra a violência e extermínio de jovens e pela aprovação do Estatuto da Juventude. O conjunto dessas ações está justificado a partir das demandas apresentadas pelos indicadores sociais que apontam situações de vulnerabilidade social e violações dos direitos humanos envolvendo infância, adolescência e juventude no Brasil. Nossos horizontes O desafio para a sociedade brasileira é o enfrentamento das múltiplas violências (domestica, cultural, econômica, institucional e social) que envolvem tais sujeitos, garantindo o princípio da proteção integral, afirmados nos instrumentos nacionais e internacionais (Constituição Federal, Estatuto da Criança e Adolescente, indicadores das Conferências Nacionais, Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças, Adolescentes e Jovens). Agindo assim, podemos chegar à consolidação total dos Direitos Humanos para toda a humanidade, pois enquanto tivermos Direitos Humanos violados, teremos crianças, adolescentes e juventudes em situação de exclusões sociais e vulneráveis às diversas violências. 5 14 SERVIÇO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL INFANTO-JUVENIL E TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL O serviço acolhimento institucional, previsto pela Política de Assistência Social, configura-se como mais uma opção de proteção à criança e adolescente, cujo objetivo é a reintegração familiar e reduzir a reincidências das situações de risco, de modo que busca atuar no sentido de preservar a vida em família. As legislações que dão suportes à proteção social de crianças e adolescentes trouxeram importantes avanços no sentido de conferir atendimento digno, direitos, condições para o desenvolvimento pleno de crianças e adolescentes que estão em situação de risco social e pessoal e a reintegração familiar, quando possível, trazendo alterações no trabalho de acolhimento institucional, como a garantia do direito à convivência familiar e comunitária, e o fortalecimento de vínculos familiares. A Política de Assistência Social é uma das políticas que materializam os direitos desse segmento. Essa prevê a intersetorialidade e o trabalho em rede, ou seja, a articulação entre políticas e seus serviços para atender as necessidades das famílias e seus membros. Essa rede é composta pelo sistema de garantia de direitos como Conselho Tutelar, Conselhos de Direitos de Crianças e Adolescentes, Judiciário, CREAS, CRAS, Ongs e outras entidades de assistência social que prestam serviços de acolhimento institucional ou defesa de direitos do segmento. O trabalho em rede 5 Extraído do link: caritas.org.br para garantir integralidade no atendimento remete também à interdisciplinaridade nos processos de trabalho das equipes, tanto das organizações governamentais como na não governamental, portanto, uma articulação de saberes e práticas, considerando os multifatores que geram riscos sociais. Nesse sentido, o processo de trabalho do profissional é importante na materialização de tais serviços, dirigidos ao público-alvo - crianças e adolescentes que se encontram em situação de risco social - e, ao mesmo tempo, enfrentam inúmeros desafios no contexto contemporâneo de crise econômica, política e fiscal impactando nas políticas públicas desenvolvidas pelo aparato público como forma de satisfazer as necessidades dessa população, haja vista aquelas serem desenvolvidas sob o contexto economicista e neoliberal. Nesses aspectos, o objetivo do artigo é situar e discutir o processo de trabalho dos assistentes sociais nos serviços de acolhimento institucional para crianças e adolescentes em situação de risco social, pontuando análise sobre o processo de trabalho do assistente social a partir do entendido da categoria trabalho, sua inserção na divisão sócio técnica do trabalho, suas atribuições e as ações previstas para serem desenvolvida por esses profissionais. 15 POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E O SERVIÇO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL A garantia do Direito à Convivência Familiar e Comunitária - DCFC de crianças e adolescente, a partir da atenção voltada a esse público e suas famílias, está inserido na Política Nacional de Assistência Social (PNAS, 2004), no Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (PNCFC, 2006) e no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), alterado pela Lei n. 12.010/09. Sua operacionalização está descrita nos documentos: Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes (MDS, 2009) e Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais (MDS, 2009) como finalidade de todos os serviços de acolhimento. O Sistema Único de Assistência Social (SUAS, 2005) prevê, nos Serviços de Proteção Especial de Alta Complexidade de crianças e adolescentes, as modalidades: Atendimento Integral Institucional, Casa Lar, Família Acolhedora, República, considerando ainda que cada município, em função das necessidades locais, pode criar serviços de Casa de Passagem. Os serviços de acolhimento institucional cumprem a finalidade de acolher e oferecer proteção integral a crianças e adolescentes quando necessitam ser afastados, temporariamente, do convívio familiar de origem ou quando já não contam mais com a proteção e os cuidados de suas famílias e esforços no sentido de trabalhar com as famílias de origem para um possível processo de reintegração familiar. Essas legislações, como as que regem a política de Assistência Social, colocam a família como seio ideal para o desenvolvimento de crianças e adolescentes, devendo esta ser assistida com políticas básicas de saúde, educação, lazer, esporte, cultura, profissionalização e outros direitos sociais, que lhe possibilitem exercer as funções decuidar, socializar, educar e proteção. O acolhimento institucional, nesse novo contexto de centralidade na família, poderá ser uma das medidas de proteção social, mas deve seguir o princípio da excepcionalidade e da provisoriedade, cujo § 2º, do art. 19 do ECA/1990, incluído pela Lei no 12.010/2009, prevê: § 2o A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária (BRASIL, 1990, p. 10). Outra alteração realizada no art. 19 do ECA/1990 é em relação à avaliação dada a situação de cada criança e adolescente em acolhimento institucional. Antes não havia um mecanismo de controle daqueles que estavam institucionalizados, apenas na entrada e saída da entidade. Porém, com a inclusão do § 1º, art. 19, do ECA/1990, incluído pela Lei nº 12.010/2009, houve a seguinte mudança: § 1º Toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 6 (seis) meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe Inter profissional ou multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei (BRASIL, 1990, p. 7). O retorno da criança em acolhimento para sua família de origem ou extensa tem prioridade e implica num trabalho social com a família. Assim, a promoção da reintegração familiar é, também, responsabilidade das entidades que acolhem crianças e os adolescentes e inclui a família extensa como possibilidade da criança e do adolescente preservarem os vínculos familiares. Destaca-se, ainda, o atendimento personalizado em pequenos grupos. No acolhimento dos grupos de irmão e/ou primos, os mesmos devem ser mantidos unidos, a fim de preservar os vínculos familiares existentes, buscando-se sempre a não transferência para outras entidades. Devendo o momento do desligamento ser assistido por equipe técnica que irá montar estratégias de realizar essa desinstitucionalização de maneira gradativa. A legislação busca tecnificar os processos de trabalho das equipes ao estabelecer a necessidade de acompanhamento individual, mediante Plano Individual de Acompanhamento – PIA: § 5º O plano individual será elaborado sob a responsabilidade da equipe técnica do respectivo programa de atendimento e levará em consideração a opinião da criança ou do adolescente e a oitiva dos pais ou do responsável. No artigo 112, § 6º, estabelece o modo de operacionalizá-lo: constarão do plano individual, dentre outros: I – Os resultados da avaliação interdisciplinar; II – Os compromissos assumidos pelos pais ou responsável; e III – a previsão das atividades a serem desenvolvidas com a criança ou com o adolescente acolhido e seus pais ou responsável, com vista na reintegração familiar ou, caso seja esta vedada por expressa e fundamentada determinação judicial, as providências a serem tomadas para sua colocação em família substituta, sob direta supervisão da autoridade judiciária (BRASIL, 2013). Ou seja, deve conter informações sobre a criança e adolescente e o acompanhamento da família de origem (estratégias e ações), monitoramento e avaliação das ações desenvolvidas. 16 PROCESSO DE TRABALHO DO SERVIÇO SOCIAL Sob esse entendimento, dentro dos espaços das instituições de acolhimento para crianças e adolescentes, o Serviço Social não trabalha com fragmentos da vida social, mas articula-os com a totalidade. Fonte:sjptransparencia.blogspot.com As situações que são vivenciadas pelos sujeitos, principalmente, relativas à criança e ao adolescente, quando da sua situação de risco social, e com a institucionalização, são consideradas e analisadas na sua dimensão universal e em sua especificidade, o que desafia a cada instante o profissional a apreender, revelar e solucionar as diversas expressões da questão social que permeiam o contexto desses sujeitos. Ao se analisar o modelo de políticas sociais contemporâneas, em especial os serviços destinados a crianças e adolescentes em situação de risco social, vislumbra- se em suas normativas a ideia de proteção social a ser garantida por conjunto de atores sociais, instituições, políticas setoriais, entes governamentais, organizações não-governamentais, conselhos de direitos e tutelares, movimentos sociais, dentre outros, denominado de redes inter setoriais e sócio assistencial ou sistema de garantia de direitos. Dentro da Política de Assistência Social, faz-se necessário destacar a proteção social especial de alta complexidade, em especial o serviço de acolhimento institucional para crianças e adolescentes em situação de risco social que deve garantir proteção integral a esse segmento (BRASIL, 2004), mas também a reintegração familiar, quando possível, demandando para os profissionais um trabalho social com a família de origem ou extensa. Dentre os serviços tipificados nacionalmente para as crianças e adolescentes que tiveram seus vínculos rompidos e que por conta da situação de risco e por se encontrarem sem referência e/ou em situação de ameaça necessitam ser retirados de seu núcleo familiar e/ou comunitário, estão: família acolhedora, acolhimento institucional, casa lar, albergue, república, casas de passagem, família substituta, trabalho protegido e medidas socioeducativas restritivas e privativas de liberdade (semiliberdade, internação provisória e sentenciada). O Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do direito da criança e adolescente também busca a implantação da proteção social, dando ênfase na rede de políticas públicas que são necessárias para essa proteção integral. Para a efetivação do direito à convivência familiar, tal como é o foco do plano, destaca-se o trabalho com as famílias numa perspectiva de fortalecimento dos vínculos, uma das atribuições posta para o Serviço Social. Esse trabalho inclui a inserção da família e seus membros na rede de serviços na condição de cidadania, isso porque é necessário oferecer subsídios para que as famílias tenham condições para cumprir com as suas responsabilidades, considerando que a família é o núcleo principal de socialização e proteção da criança e do adolescente (BRASIL, 2006). A inclusão na rede de serviços da política de assistência social e nos serviços de outras políticas sociais remete à perspectiva de intersetorialidade (entre políticas setoriais) e do trabalho em rede (rede sócio assistencial), além do trabalho interdisciplinar ou em equipes nos quais os processos de trabalho específico se articula a outros processos de trabalho, porque o profissional de Serviço Social atua na interseção e articulação de políticas, para atender integralmente às necessidades das famílias. O trabalho do profissional, além de ações de acompanhamento individual das crianças e adolescentes residentes nas instituições de acolhimento institucional; inclusão da família de origem na rede de serviços que garanta as seguranças afiançáveis da assistência social, inclui o trabalho socioeducativos com essas famílias a fim de dar suporte às famílias no reestabelecimento dos vínculos entre seus membros e romper a cultura da violação de direitos como estabelece o Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária. O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NAS EQUIPES INTERDISCIPLINARES DOS SERVIÇOS DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RISCO SOCIAL As situações de risco social que implicam no rompimento dos elos familiares, deixam as crianças e adolescentes desprotegidos e vulneráveis. Nessa perspectiva é que surgiu e atualmente foi reordenado o serviço
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