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2016 Políticas sociais em educação Profª. Rafaela Westphal Copyright © UNIASSELVI 2016 Elaboração: Profª. Rafaela Westphal Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 379.2010981 W537p Westphal; Rafaela Políticas sociais em educação / Rafaela Westphal : UNIASSELVI, 2016. 169 p. : il. ISBN 978-85-515-0009-5 1.Política e Educação – História Brasil. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. III aPresentação Caro acadêmico, esta unidade é o início de seus estudos sobre a Política de Educação. As discussões aqui travadas acompanharão você ao longo deste caderno e proporcionarão a base para compreender da melhor forma o restante do conteúdo trabalhado de forma crítica. Nosso objetivo é estudar toda a trajetória da política de educação. Isso implica em iniciarmos pelas práticas educacionais no Brasil Colônia, identificando como ocorriam, quem ministrava, como e para quem o acesso à educação era garantido. Na sequência, conheceremos as práticas educativas do Primeiro Império e as principais garantias que este momento da história assegurou aos seus cidadãos com relação à educação brasileira Na segunda unidade vamos nos aprofundar em conhecer a realidade atual em nosso país, bem como adentrar ao que de fato está sendo garantido aos cidadãos brasileiros no que tange o acesso à educação. Nosso objetivo é discutir qual a realidade apresentada nos dias atuais sobre o acesso e a permanência na educação e pensarmos possíveis atuações do profissional de serviço social na Política de Educação. É fundamental reconhecer o espaço de atuação do profissional de serviço social na educação, e ainda conhecer a rede de proteção e garantia de direitos sociais para que os profissionais possam realizar os atendimentos e os encaminhamentos necessários em cada uma das situações. Para nossa atuação é fundamental o conhecimento das legislações pertinentes. Por isso, ao longo deste caderno estaremos analisando diretamente as legislações, tanto no âmbito da Política de Educação, quanto a respeito das legislações pertinentes ao exercício profissional do assistente social. Por fim, conheceremos um pouco do que foram os marcos históricos da luta de nossa categoria pela inserção dos assistentes sociais na Política de Educação. Para tal, faremos uso de normativas de nosso Conselho de Profissão - CFESS. Veremos um pouco da trajetória para se constituir a escola como campo de atuação dos assistentes sociais, abordando as possibilidades e as atribuições do assistente social junto à Política de Educação e também os programas que hoje estão disponíveis para que os estudantes se inseriam em se mantenham no Ensino Superior. IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Assim, teremos muito estudo e conhecimento para ser adquirido pela frente, e ao final deste livro, acadêmico, você será capaz de compreender como funciona hoje a Política de Educação e qual o papel do assistente social inserido nesta política. V VI VII UNIDADE 1 – TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL .................................................... 1 TÓPICO 1 – PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS ........................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 3 2 PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS .............................................................................. 3 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................................................... 10 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................................................... 14 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 15 TÓPICO 2 – CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO ............................................. 17 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 17 2 PRIMEIRA REPÚBLICA E AS PRÁTICAS EXCLUDENTES .................................................. 17 3 REFORMA DE FRANCISCO CAMPOS ...................................................................................... 22 4 MANIFESTOS PELA PRÁTICA PEDAGÓGICA ...................................................................... 25 5 ERA VARGAS .................................................................................................................................... 31 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................................................... 36 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 38 TÓPICO 3 – DITADURA E MOVIMENTO ESTUDANTIL ....................................................... 39 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 39 2 DITADURA ........................................................................................................................................ 39 3 MOVIMENTOS SOCIAIS .............................................................................................................. 42 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................................................... 46 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................................................... 53 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 54 UNIDADE 2 – POLÍTICA DE EDUCAÇÃO NOS DIAS ATUAIS ............................................ 55 TÓPICO 1 – LEGISLAÇÃO ATUAL NO BRASIL ......................................................................... 57 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 57 2 LEGISLAÇÃOATUAL NO BRASIL ............................................................................................. 57 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................................................... 69 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 70 TÓPICO 2 – DESIGUALDADES NA EDUCAÇÃO ..................................................................... 71 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 71 2 DESIGUALDADES REGIONAIS, ANALFABETISMO ........................................................... 71 3 PRECARIEDADE DAS ESCOLAS ................................................................................................ 75 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................................................... 83 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 84 TÓPICO 3 – INSEGURANÇA DE QUEM DEIXA A ESCOLA ................................................... 87 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 87 2 GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA ............................................................................................... 87 sumário VIII 3 EVASÃO ESCOLAR POR DEMANDA DE TRABALHO ........................................................ 93 4 MAU COMPORTAMENTO NA ESCOLA .................................................................................. 98 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................................................... 102 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................................................... 107 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 108 UNIDADE 3 – A ATUAÇÃO DOS ASSISTENTES SOCIAIS JUNTO À POLÍTICA DE EDUCAÇÃO .............................................................................................................. 109 TÓPICO 1 – BUSCA PELO ESPAÇO DE ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL E SUAS INTERVENÇÕES ......................................................................................................... 111 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 111 2 RECONHECENDO O ESPAÇO DE ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ............................................................................................................................... 111 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................................................... 124 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 125 TÓPICO 2 – ESPAÇOS DE PARTICIPAÇÃO E CONTROLE SOCIAL .................................... 127 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 127 2 SERVIÇO SOCIAL E OS CONSELHOS DE DIREITOS .......................................................... 127 2.1 CONSELHO DE EDUCAÇÃO .................................................................................................. 130 2.2 CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E ADOLESCENTE - CONANDA .................................................................................................................................. 133 3 CONFERÊNCIAS .............................................................................................................................. 135 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................................................... 138 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 139 TÓPICO 3 – PROGRAMAS PARA GARANTIA DA EDUCAÇÃO .......................................... 141 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 141 2 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: DIREITO À DIVERSIDADE ........................................................ 141 3 EDUCA MAIS BRASIL .................................................................................................................... 146 4 PROUNI .............................................................................................................................................. 146 5 FIES ...................................................................................................................................................... 147 6 PRONATEC ........................................................................................................................................ 149 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................................................... 153 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................................................... 159 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 160 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................... 161 1 UNIDADE 1 TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS Esta unidade tem por objetivos: compreender como iniciou o processo de educação no Brasil; compreender conceitos críticos, como o de violência estrutural, que nos guiarão na análise crítica sobre as situações, inclusive sobre a educação; identificar como a educação foi, e não, vista como direito ao longo de sua história no Brasil; analisar as principais normativas que foram instituídas ao longo da história da educação em nosso país; compreender quais as principais características de cada período político em nosso país. Esta unidade está dividida em três tópicos. Em cada um deles você encontrará atividades visando à compreensão dos conteúdos apresentados. TÓPICO 1 - PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS TÓPICO 2 - CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO TÓPICO 3 - DITADURA E MOVIMENTO ESTUDANTIL 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS 1 INTRODUÇÃO Caro acadêmico, neste primeiro tópico sobre as trajetórias educacionais no Brasil, fomentaremos uma discussão que nos permitirá avaliar desde os primórdios da educação no país até os dias atuais, bem como as instituições e atores que estão desenvolvendo as políticas de educação. Não é proposta, aqui, uma análise detalhada de cada um destes sujeitos, mas sim uma visão geral sobre o que se tem em vigência atualmente no que concerne à política educacional. É importante enxergarmos além do imediatismo e nos perguntarmos o propósito real desta política. Começaremos pelas práticas educacionais no Brasil Colônia, identificando como ocorriam, quem ministrava, como e para quem o acesso à educação era garantido. Na sequência, conheceremos as práticas educativas do Primeiro Império e as principais garantias que este momento da história assegurou aos seus cidadãos com relação à educação brasileira. Seremos guiados por fundamentação teórica crítica que nos permitirá, além de conhecer, ser capaz de identificar as lacunas que os períodos traziam para a educação brasileira. Assim, convido você,acadêmico, a iniciar o estudo! 2 PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS Iniciando nossos estudos, é importante apresentar as considerações de Johan Galtung (1990), que possui formação em sociologia, sobre o que ele chamou de violência indireta e violência direta. A violência direta é mais perceptível. Esta violência é aquela que atinge diretamente o corpo da pessoa que a sofre, e pode ser identificada, por exemplo, pelas agressões físicas que uma pessoa desfere contra a outra, ou, em uma escala ainda maior, pode ocorrer por meio de guerras entre países. Ao sofrer essa violência, não se tem dúvidas se é ou não vítima. No entanto, o que nos interessa neste caderno não é apenas o conceito de violência direta, que pode ocorrer também entre crianças e adolescentes, ou ainda, que pode trazer os pais como violadores de direitos ou outros adultos, sejam UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 4 esses familiares ou não. Há também a violência indireta ou também podemos chamar de violência estrutural. A violência indireta/estrutural foi definida por Johan Galtung (1990) desta forma, pois, como o próprio nome diz, não é diretamente sentida no corpo dos sujeitos, mas é uma forma de violência sutil que atinge as pessoas quando os acessos às políticas sociais ou recursos, sejam eles materiais ou culturais, não são igualitários. NOTA Johan Galtung nasceu em 24 de outubro de 1930 na Noruega. Contribuiu com estudos sobre seu conceito de violência estrutural, conflitos, resoluções e construção da paz. Conheça nosso autor através da imagem a seguir. FIGURA 1 - JOHAN GALTUNG FONTE: Disponível em: <https://www.transcend.org/galtung/>. Acesso em: 8 abr. 2016. A violência estrutural diz respeito às situações que trazem prejuízo ao sujeito, como, por exemplo, uma demanda de saúde que possui solução, no entanto, não é respondida pelo poder público, ou ainda, o acesso à educação que pode ser precário em algumas localidades do país. Neste caso está presente a violência, pois os sujeitos sofrem sem acesso ao serviço enquanto a solução ao seu problema existe, está disponível, mas, por uma questão de desigualdade, não podem acessar (WESTPHAL, 2013). TÓPICO 1 | PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS 5 Assim, “a violência está inscrita na estrutura e manifesta-se por um poder desigual e, em consequência, por oportunidades desiguais na vida” (GALTUNG, 1990, p. 340). Esta violência ocorre quando privamos uma pessoa de atingir seu potencial por falta de acesso aos recursos que necessita para tal. Dessa forma, a violência estrutural está inscrita atualmente nas relações diárias onde são evidentes exclusões sociais por meio de desigualdades de acesso, o que atualmente se acirra pelo reflexo do sistema capitalista no qual vivemos, mas vamos ver que, na história da educação, a formação da violência estrutural já iniciava antes da formação do sistema capitalista. Lembrando dos conceitos até então trabalhados e que nos acompanharão ao longo deste caderno, vamos agora adentrar no início da educação no Brasil, propriamente dito. Iniciaremos os debates sobre o Brasil Colônia, onde estudiosos como Otíza de Oliveira Romanelli (1991) sinalizam que no início da história educacional do país já eram introjetadas distinções entre o ensino que era destinado a camadas sociais mais baixas e à elite, bem como a imposição de uma cultura de letramento. No período colonial (1554 a 1759) as principais escolas eram fundadas por padres jesuítas que importavam a cultura europeia para a colônia, além de recrutar fiéis e servidores. O conhecimento dos padres era transmitido inicialmente a donos de terra e senhores de engenho. Mesmo que estes tivessem direito à educação na época, esta ocorria de modo restrito, sendo excluídos desta parcela social ainda as mulheres e os filhos primogênitos das famílias. As pessoas selecionadas para a educação recebiam ainda formação para assumir no futuro a liderança do clã, da família e negócios (ROMANELLI, 1991). Não podemos esquecer que a educação dos jesuítas também estava voltada à evangelização. Por meio de sua catequese, asseguraram a conversão da população indígena, sendo criadas escolas elementares para os “curumins”. NOTA Curumim é uma palavra de origem tupi e designa, de modo geral, as crianças indígenas. FONTE: Disponível em: <http://www.dicionarioinformal.com.br/curumim/>. Acesso em: 4 ago. 2016. Ao mesmo tempo, há uma clara divisão entre os que poderiam ter acesso ao ensino e de que forma este acesso ocorreria, ou seja, havia uma dupla fragmentação, pois o ensino também era diferente conforme a classe social. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 6 Assim, os padres acabaram ministrando, em princípio, educação elementar para população índia e branca em geral (salvo para mulheres), educação média para os homens da classe dominante, parte da qual continuou nos colégios preparando-se para o ingresso na classe sacerdotal, e educação superior religiosa só para esta última. A parte da população escolar que não seguia a carreira eclesiástica encaminhava-se para a Europa a fim de continuar os estudos, principalmente na Universidade de Coimbra, de onde deviam voltar os letrados. A obra de catequese, que em princípio constituía o principal objetivo da presença da Companhia de Jesus no Brasil, acabou gradativamente cedendo lugar em importância da educação de elite (ROMANELLI, 1991, p. 35). NOTA De acordo com Oliveira (2011), a educação para os índios era básica, apenas o suficiente para que pudessem aprender a ler e escrever e, desta forma, apreender a organização que os jesuítas estavam lhes passando. O que podemos perceber através deste trecho extraído do livro de Romanelli é a preocupação em trazer o ensino para a colônia brasileira, inicialmente através do ensino feito pelos padres jesuítas. De certa forma, até podemos avaliar como positivo o início da educação em nosso pais. Por outro lado, enquanto acadêmicos e profissionais de Serviço Social, também nos cabe fazer uma análise mais detalhada sobre esta situação. Como vemos, o acesso à educação foi garantido inicialmente através dos jesuítas. Mas, por outro lado, realizavam uma distinção entre as pessoas que poderiam ou não ter acesso a esta educação. As mulheres, como pudemos perceber, ficaram excluídas deste processo, e os homens, dependendo de sua classe social, poderiam ter acesso ao ensino, sendo que estudos mais aprimorados eram destinados aos homens de classe dominante. Na fase colonial este tipo de ação escolar é também o instrumento do qual vai servir-se a sociedade nascente para impor a cultura transplantada. A forma como foi feita a colonização das terras brasileiras e, mais, a evolução da distribuição do solo, da estratificação social, do controle do poder político, aliadas ao uso de modelos de cultura letrada, condicionaram a evolução da educação escolar brasileira. A necessidade de manter os desníveis sociais teve, desde então, na educação escolar, um instrumento de reforço de desigualdades (ROMANELLI, 1991, p. 23). Se recordarmos a leitura inicial que fizemos de Galtung e exercitarmos um pouco mais nosso pensamento crítico, podemos identificar, já neste período da educação colonial, a violência estrutural se instalando na sociedade por meio de: TÓPICO 1 | PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS 7 • Privação do ensino para a mulher. • Diferenciação do ensino para as classes dominantes e classes baixas. Esta diferenciação entre as pessoas, que foi cravada na sociedade naquele momento, impediu que estas pessoas se desenvolvessem intelectualmente de forma plena, além de instaurar e reforçar um pensamento cultural de que cada pessoa já possui um local datado dentro de uma classe social e dentro de um lugar de gênero com funções específicas, como se isto fosse algo naturalizado. Na perspectiva de gênero, Ribeiro (2003) complementa os estudos sobre a condição feminina na colônia brasileira e afirma que durante 322 anos (período entre 1500 e 1822)a educação feminina ficava restrita aos cuidados com a casa, marido e filho, sem acesso ao processo de alfabetização. O pedido para que as mulheres fossem alfabetizadas partiu do padre Manuel da Nóbrega, destinado à rainha de Portugal, Catarina. O padre gostaria que especialmente as índias da colônia aprendessem a ler e escrever. Nóbrega também fez este pedido especial, pois as índias brasileiras sofriam uma dominação sexual masculina muito forte dos colonos portugueses, e o padre pensou que a instrução para leitura e escrita das indígenas freasse um pouco os assédios (RIBEIRO, 2003). Então, caro acadêmico, o que podemos ver, nesta época, é que as mulheres sofriam uma violência dupla, eram privadas do acesso ao ensino e ao mesmo tempo sofriam da violência de gênero, aqui, no caso, por meio do abuso sexual. A primeira mulher brasileira a aprender a ler e escrever foi Catarina Paraguassu, ironicamente ou não, possuía o mesmo nome da rainha de Portugal, que inicialmente negou o pedido do padre Manuel da Nóbrega. NOTA Catarina Paraguassu foi identificada como filha de Diogo Lavares Correia, o Caramuru, e da índia Moema (RIBEIRO, 2003, p. 81). Com relação à educação feminina no Brasil Colônia, Ribeiro (2003) aponta ainda que, por não saber ler e escrever, as mulheres brancas com posses eram vítimas da exploração financeira de homens ao seu redor, seja por irmãos, esposos ou até mesmo filhos, que roubavam suas propriedades por meio de falsificações testamentais. Como podemos perceber, a limitação do acesso das pessoas à educação traz consequências. Este sujeito não consegue desenvolver todo o seu potencial, UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 8 sofre com a violência estrutural e ainda acaba se tornando mais suscetível a outras formas de violência. Então, caro acadêmico, conseguimos identificar como foi o início das práticas acadêmicas em nosso país. Agora, vamos retomar a trajetória da educação no Brasil e iniciar o período imperial. Os padres jesuítas foram expulsos do país quando o Marquês de Pombal (1699- 1782), Ministro do Estado em Portugal, optou por realizar reformas nas moradias das colônias que a eles pertenciam. Com isso, o modo como a educação ocorria foi alterada e o ensino passou a ser entendido como público (GHIRALDELLI, 2009). Para compreender melhor as mudanças que ocorreram através da intervenção do Marquês de Pombal, a seguir tem-se uma parte do texto de Ghiraldelli. [...] Nasceu naquele país o que de certo modo se pode chamar de ensino público; ou seja, um ensino mantido pelo Estado e voltado para a cidadania – uma noção que, forjada pelo Iluminismo, requisitava do indivíduo a compreensão de seus direitos e deveres em uma sociedade que passava a exigir das pessoas uma gradual independência de pensamento e discurso. A partir de 1759, o Estado assumiu a educação em Portugal. Apareceram os concursos públicos e a análise da literatura destinada à escola (isso incluía a censura, pois o Iluminismo português não implicou uma liberação completa dos autores do movimento). No Brasil desapareceu o curso de humanidades, ficando em seu lugar as “aulas régias”. Eram aulas avulsas de latim, grego, filosofia e retórica. Ou seja, os professores, por ele mesmos, organizavam os locais de trabalho e, uma vez tendo colocado a “escola” para funcionar, requisitavam do governo o pagamento pelo trabalho do ensino (GHIRALDELLI, 2009, p. 27). Assim, a partir de 1759 ocorre um avanço com relação ao modo como a educação era vista, passando a ser responsabilidade então do Estado cuidar de seus cidadãos para que tenham acesso à educação. A estrutura da educação no Brasil se tornou maior a partir de 1808, momento em que a Corte Portuguesa chegou ao Brasil. Com isso foram inseridos cursos profissionalizantes em nível médio, superior e militares. Foi neste momento também que o ensino foi dividido em três níveis, sendo: o primário, escola de ler e escrever; o secundário, continuou com o esquema de aulas régias, e o ensino superior que era disponibilizado em alguns segmentos e em alguns Estados de nosso pais, como por exemplo, o curso de medicina disponível na Bahia e Rio de Janeiro (GHIRALDELLI, 2009). Sobre este momento da educação brasileira vamos pontuar, com base em Ghiraldelli (2009), em sua obra História da educação brasileira, algumas datas importantes que foram constituindo a historicidade desta que hoje é a política educacional. • Em 1822 Dom Pedro I Proclamou a Independência do Brasil. TÓPICO 1 | PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS 9 • Em 1824 foi outorgada a primeira Constituição do Brasil, quando pela primeira vez é garantido o direito à educação, conforme vemos no trecho da Carta: [...] Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte. [...] XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos. XXXIII. Collegios, e Universidades, aonde serão ensinados os elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes (BRASIL, 1824). • Em 1827 instituíram o Método Loncasteriano de ensino, que consistia no auxílio dos estudantes mais avançados aos que possuíam alguma dificuldade de ensino. • Em 1838, criação do Colégio Pedro II, cujo objetivo era ser modelo enquanto instituição de ensino secundário. • Em 1854 é criada a Inspetoria Geral da Instrução Primária e Secundária, que orientava e supervisionava o ensino, tanto nos locais públicos quanto privados. • Em 1879, Leôncio de Carvalho cria o Decreto 7.247, que instituiu a liberdade do ensino, que consistia na seguinte prerrogativa: Quem se achasse capacitado para ensinar poderia fazê-lo. A frequência nos cursos secundários e superiores tornou- se livre. O estudante, assim, teria a liberdade de aprender com quem desejasse, mas ao final deveria prestar exames nas instituições. Assim, caro acadêmico, comparando o período do Brasil Colônia com o Período Imperial, vimos que ao longo dos anos houve alguns avanços com relação às primeiras práticas educacionais. Um dos avanços, por exemplo, é que no Período Imperial, a educação foi mencionada enquanto direito previsto na Constituição, e ainda sem distinção entre gênero e classe social. Logo, em termos de garantia de direitos, houve avanço. Para que você, acadêmico, aprofunde um pouco mais seus estudos sobre este período de constituição da política de educação, sugere-se a leitura do texto a seguir, de Maria Isabel Moura Nascimento (2016). DICAS Caro acadêmico, você pode aprofundar ainda mais o seu conhecimento com as indicações de leituras a seguir. Estes autores trabalharão o conceito de violência que será útil não só neste caderno, mas ao longo de sua vida profissional. Seguem as indicações: ODALIA, Nilo. O que é violência. São Paulo: Nova Cultural, Brasiliense, 1985. 93p. (Coleção Primeiros passos). MICHAUD, Yves. A violência. São Paulo: Ática, 1989. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 10 LEITURA COMPLEMENTAR O IMPÉRIO E AS PRIMEIRAS TENTATIVAS DE ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NACIONAL (1822-1889) Maria Isabel Moura Nascimento Este período histórico foi determinado pelas transformações ocorridas no século XVIII, desencadeadas a partir da Revolução Francesa (1789) e da Revolução Industrial iniciada na Inglaterra, que abriram o caminho para o avanço do capitalismo para outros países. No início do século XIX, a hegemonia mundial inglesa na área econômica amplia-se com a conquista de novos mercados. A França, por outro lado, sob o comando de Napoleão Bonaparte, passava a lutar pelo domínio de outros países, inclusive Portugal. Em 1808, a família real portuguesa transferiu-se para o Brasil, para fugir do ataque francês. A presença da Corte Portuguesa no Brasil, com todo o seu aparato, propiciou o desencadeamento de transformações na Colônia. Neste processo, foram abertos os portos brasileiros ao comércio exterior, acabandocom o monopólio português. Para suprir as carências oriundas do longo período colonial, foram criadas várias instituições de Ensino Superior, “com a finalidade estritamente utilitária, de caráter profissional, visando formar os quadros exigidos por essa nova situação” (WEREBE, 1994). Assim, foram criados diversos cursos de nível superior: na Academia Real da Marinha (1808), Academia Real Militar (1810), Academia Médico-cirúrgica da Bahia (1808) e Academia Médico-cirúrgica do Rio de Janeiro (1809). Após três séculos de domínio político e exploração econômica do Brasil por parte de Portugal, que manteve durante todo o período colonial uma posição parasitária com relação à produção brasileira, com o novo contexto da economia mundial, de expansão do capitalismo, que impunha uma nova postura dos países com relação à produção e à comercialização, já não era possível suportar o domínio de Portugal, que onerava os produtos brasileiros na disputa por mercados e onerava a aquisição de mercadorias estrangeiras necessárias para o consumo interno no Brasil. Diante do enfraquecimento econômico e político de Portugal e o contexto de contradição entre a política econômica portuguesa e a política econômica internacional, ocorreu a conquista brasileira de sua autonomia política e econômica. A Independência brasileira foi conquistada em 1822, com base em acordos políticos de interesse da classe dominante, composta da camada senhorial brasileira, que entrava em sintonia com o capitalismo europeu. A Assembleia Constituinte e Legislativa instalada após a proclamação da Independência para legar nossa primeira Constituição iniciou os trabalhos TÓPICO 1 | PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS 11 propondo uma legislação particular sobre a instrução, com o objetivo de organizar a educação nacional. A Constituição outorgada em 1824, que durou todo o período imperial, destacava, com respeito à educação: “A instrução primária é gratuita para todos os cidadãos”. Para dar conta de gerar uma lei específica para a instrução nacional, a Legislatura de 1826 promoveu muitos debates sobre a educação popular, considerada premente pelos parlamentares. Assim, em 15 de outubro de 1827, a Assembleia Legislativa aprovou a primeira lei sobre a instrução pública nacional do Império do Brasil, estabelecendo que “em todas as cidades, vilas e lugares populosos haverá escolas de primeiras letras que forem necessárias”. A mesma lei estabelecia o seguinte: os presidentes de província definiam os ordenados dos professores; as escolas deviam ser de ensino mútuo; os professores que não tivessem formação para ensinar deveriam providenciar a necessária preparação em curto prazo e às próprias custas; determinava os conteúdos das disciplinas; devem ser ensinados os princípios da moral cristã e de doutrina da religião católica e apostólica romana; deve ser dada preferência aos temas, no ensino de leitura, sobre a Constituição do Império e História do Brasil. Os relatórios do Ministro do Império Lino Coutinho de 1831 a 1836 denunciaram os parcos resultados da implantação da Lei de 1827, mostrando o mau estado do ensino elementar no país. Argumentava que, apesar dos esforços e gastos do Estado no estabelecimento e ampliação do ensino elementar, a responsabilidade pela precariedade do ensino elementar era das municipalidades pela ineficiente administração e fiscalização, bem como culpava os professores por desleixo e os alunos por vadiagem. Admitia, no entanto, que houve abandono do poder público quanto ao provimento dos recursos materiais, como os edifícios públicos previstos pela lei, livros didáticos e outros itens. Também apontava o baixo salário dos professores; a excessiva complexidade dos conhecimentos exigidos pela lei e que dificultavam o provimento de professores; e a inadequação do método adotado em vista das condições particulares do país. Podemos observar, nos relatórios do ministro, que o entusiasmo inicial com a instrução popular esbarrava não somente nas condições reais do país, mas no discurso ideológico do governo que dizia estar preocupado em levar a instrução ao povo, sem providenciar, todavia, os recursos para criar as condições necessárias para a existência das escolas e para o trabalho dos professores. O Ato Adicional de 6 de agosto de 1834 instituiu as Assembleias Legislativas provinciais com o poder de elaborar o seu próprio regimento, e, desde que estivesse em harmonia com as imposições gerais do Estado, caber- lhe-ia legislar sobre a divisão civil, judiciária e eclesiástica local; legislar sobre a instrução pública, repassando ao poder local o direito de criar estabelecimentos próprios, além de regulamentar e promover a educação primária e secundária. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 12 Ao Governo Central ficava reservado o direito, a primazia e o monopólio do Ensino Superior. Graças à descentralização, em 1835, surgiu a primeira escola normal do país, em Niterói. Baseado nessa lei, cada província passava a responder pelas diretrizes e pelo funcionamento das suas escolas de ensino elementar e secundário. Logo se defrontaram, porém, com as dificuldades para dar instrução de primeiras letras aos moradores dos lugares distantes e isolados. Neste período, o acesso à escolarização era precário ou inexistente, tanto por falta de escolas, quanto de professores. Para atender à demanda de docentes, saíram os decretos para criação das primeiras escolas normais no Brasil, com o objetivo de preparar professores para oferecer a instrução de primeiras letras. Graças à descentralização da educação através do Ato Adicional, em 1835 surgiu a primeira Escola Normal do país, em Niterói. Em seguida, outras Escolas Normais foram criadas visando melhorias no preparo do docente. Em 1836 foi criada a da Bahia, em 1845 a do Ceará e, em 1846, a de São Paulo. Em 1837, na cidade do Rio de Janeiro, foi criado o Colégio Pedro II, onde funcionava o Seminário de São Joaquim. O Colégio Pedro II fornecia o diploma de bacharel, título necessário na época para cursar o nível superior. Foram também criados nessa época colégios religiosos e alguns cursos de magistério em nível secundário, exclusivamente masculinos. O Colégio Pedro II era frequentado pela aristocracia, onde era oferecido o melhor ensino, a melhor cultura, com o objetivo de formar as elites dirigentes. Por este motivo, era considerado uma escola modelo para as demais no país. A presença do Estado na educação no período imperial era quase imperceptível, pois estávamos diante de uma sociedade escravagista, autoritária e formada para atender a uma minoria encarregada do controle sobre as novas gerações. Ficava evidenciada a contradição da lei que propugnava a educação primária para todos, mas na prática não se concretizava. O governo imperial atribuía às províncias “[...] a responsabilidade direta pelo ensino primário e secundário, através das leis e decretos que vão sendo criados e aprovados, sem que seja aplicado, pois não existiam escolas e poucos eram os professores” (NASCIMENTO, 2004, p. 95). Em 1879, a reforma de Leôncio de Carvalho instituiu a liberdade de ensino, o que possibilitou o surgimento de colégios protestantes e positivistas. Em 1891, Benjamin Constant, baseado nos ensinamentos de Augusto Comte, elaborou uma reforma de ensino de nítida orientação positivista, defensora de uma ditadura republicana dos cientistas e de uma educação como prática neutralizadora das tensões sociais. TÓPICO 1 | PRIMEIRAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS 13 O mundo desenvolvido caminhava para uma organização econômica que era considerada “mundial”, onde o ideal para os teóricos idealizadores desta economia era assegurar a divisão internacional do trabalho para que “[...] garantisse o crescimento máximo da economia [...] não tinha sentido tentar produzir bananas na Noruega, pois elas podiam ser produzidas de forma muito mais barata em Honduras” (HOBSBAWM, 1992, p. 66). O liberalismo econômico impunha as regrase tudo o que era possível para demonstrar que esta prática era melhor para a economia mundial. Nesta perspectiva, os conflitos estavam estabelecidos: a Industrialização e a Depressão “[...] formaram-nas num grupo de economias rivais, em que os ganhos de uma pareciam ameaçar a posição de outras. A concorrência se dava não só entre empresas, mas também entre nações” (HOBSBAWM, 1992, p. 68). Com o protecionismo industrial estabelecido, as bases industriais do mundo adequaram-se e para isso fez-se necessário incentivar as poucas indústrias nacionais para este novo modelo e para produzirem com vistas ao mercado interno. Era preciso mão de obra preparada, escolarizada, e o Brasil, com sua economia baseada na agricultura, na exploração bruta do trabalho, não atingia as exigências dos interesses externos. Diante de muitos conflitos, o Brasil passa a ser denominado republicano, com a libertação dos escravos para atender às demandas do mercado internacional. E, paralelo a isso, são incentivados os discursos e pequenas ações para acabar com o analfabetismo no país. No final do Império, o quadro geral do ensino era de poucas instituições escolares, com apenas alguns liceus provinciais nas capitais, colégios privados bem instalados nas principais cidades, cursos normais em quantidade insatisfatória para as necessidades do país. Alguns cursos superiores que garantiam o projeto de formação (médicos, advogados, de políticos e jornalistas). Identificando o grande abismo educacional entre a maioria da população brasileira que, quando muito, tinham uma casa e uma escola, com uma professora leiga para ensinar os pobres brasileiros excluídos do interesse do governo imperial. FONTE: Disponível em: <http://www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/periodo_imperial_intro. html>. Acesso em: 4 ago. 2016. 14 Neste tópico, vimos: • Os conceitos apresentados por Johan Galtung de violência estrutural/indireta e violência direta, e especialmente como o conceito de violência estrutural pode ser usado como norte para análises críticas da conjuntura de períodos passados, como os estudados neste tópico, bem como este conceito pode ser usado para pensar as conjunturas atuais, e isto não apenas para a Política de Educação, mas para todas as garantias afiançadas enquanto direito. • O início das práticas educativas no Brasil Colônia. • Como o ensino era feito de acordo com as classes sociais e as mulheres eram excluídas deste espaço de aprendizado. • As diferenças entre o ensino no período colonial e no período imperial. • Que com o início do período imperial a educação passou a ser vista como um direito do cidadão e inclusive foi citada desta forma na primeira Constituição brasileira, de 1824. RESUMO DO TÓPICO 1 15 A partir dos assuntos estudados neste tópico, faça uma análise crítica sobre os tópicos a seguir aplicando os conceitos de Galtung de violência direta e violência indireta. Você não precisa se prender apenas a esse autor, pode utilizar outros autores que já conheça ou, até mesmo, pesquisar novos para construir seu raciocínio. a) Como você analisa o início do ensino no Brasil Colônia? b) Quais os pontos positivos e os negativos? c) Olhando, hoje, sobre a situação vivenciada no Brasil Colônia, qual seria sua intervenção no sentido de apontar fragilidades e pensar em intervenção para melhoria? d) No Primeiro Império, o que você apontaria de fragilidades e de possíveis melhorias? e) Qual a sua opinião sobre a garantia da educação na primeira Constituição no Brasil? AUTOATIVIDADE 16 17 TÓPICO 2 CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Caro acadêmico, para darmos continuidade aos nossos estudos sobre a trajetória da educação brasileira, vamos agora estudar o período compreendido como República Velha (1989-1930). Neste tópico você apreenderá as principais manifestações e evoluções quanto à educação. Discutiremos sobre as reformas propostas pelos governantes e como essas diferem entre si. Neste tópico ainda você conhecerá alguns dos conceitos de sociólogos como Bourdieu e poderá perceber como os conceitos que estes sociólogos estudam não estão assim tão distantes de nossa realidade, ao contrário, basta olhar criticamente as situações por nós vivenciadas e conseguiremos desmistificar o que às vezes alguns governantes procuram deixar vendado. 2 PRIMEIRA REPÚBLICA E AS PRÁTICAS EXCLUDENTES O período republicano teve início após movimentos feitos por militares que eram contrários ao então regime imperial. O imperador não conseguiu acompanhar o progresso econômico que estava vigente no país. Com o início da República, o poder do imperador cessou. Neste período houve duas manifestações em favor da educação no sentido de cobrança enquanto prioridade do povo, essas Ghiraldelli (2009) apresentou como: 1 Entusiasmo pela educação: solicitava a ampliação de escolas, e 2 Otimismo pedagógico: buscava métodos e conteúdos para o ensino. Apesar destas duas tentativas de movimentos, elas não duraram muito, havendo críticas negativas com relação ao período da Velha República, pois, ao contrário do que prometiam, a educação foi deixada de lado, e segundo o dado apontado por Guiraldelli (2009), em 1920, 75% das pessoas em idade escolar eram analfabetas. Após a primeira Guerra Mundial, a cultura dos Estados Unidos da América passou a ser introduzida no Brasil por meio da leitura de livros e intelectuais do país. A vinda de leituras de outros países, como também da Europa, que passaram a adentrar o Brasil, faz parte do movimento do otimismo pedagógico. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 18 A atuação do Governo Federal neste período ocorreu através de algumas medidas, sendo esta a Reforma de Benjamin Constant (1891). • A Reforma de Benjamin Constant criou o Ministério da Instrução, Correios e Telégrafos, que propôs mudança nos currículos de modo que as matérias humanísticas fossem substituídas por matérias de cunho mais positivista. • Declarou o ensino livre, laico e gratuito. • Dividiu a escola primária em dois níveis, sendo o primeiro de sete a 13 anos e o segundo de 13 a 15 anos. • Passou a exigir diploma para o magistério em escolas públicas e, para as particulares, apenas atestado de inidoneidade moral (GUIRALDELLI, 2009). Ao final da primeira república houve ainda a Reforma Rocha Vaz (1925), que procurou estabelecer a mesma linha de ensino que ocorre entre a educação dos Estados e União. Com relação à reforma de Benjamin Constant, Delaneze (2007, p. 52) também contribui com esclarecimentos sobre esse período: [...] A proposta de Benjamin Constant estava destinada ao fracasso quanto ao desejo de se efetivar a instrução popular no país. Destinada apenas ao Distrito Federal, nela estavam contidos os princípios de liberdade, gratuidade e laicidade do ensino. No entanto, a obrigatoriedade, instituída pela reforma Leôncio de Carvalho, fora abolida, fortalecendo a corrente em prol da desoficialização do ensino como tarefa do Estado. O método pedagógico colocado pela Reforma Benjamin Constant era o intuitivo, o mesmo instituído no fim do Império pela própria Reforma Leôncio de Carvalho. Mas a instrução moral e religiosa foi substituída por uma instrução leiga, embora a Igreja tenha continuado a expandir sua rede de escolas. Com o fim do padroado, até mesmo o direito eclesiástico ficou suprimido das faculdades de Direito. No Ensino Superior, uma das intenções da reforma era a eliminação paulatina dos exames preparatórios, os quais perduraram ainda por algum tempo. Em consonância com Romanelli, a Reforma Benjamin Constant não chegou a ser posta em prática, a não ser em alguns aspectos. Faltava para a execução da reforma, segundo a autora, além de infraestrutura institucional que lhe pudesse assegurar a implantação, o apoio político das elites. Em 1891, o Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, criado para tratar de assuntos relacionados à educação, foi fechado. Além disso,a Lei nº 26, do dia 30 de dezembro de 1891, expressa medidas que embargam a concretização de alguns pressupostos estabelecidos na reforma, como a supressão da verba destinada ao Conselho Superior da Instrução Pública e da verba destinada à Escola de Astronomia e Engenharia Geográfica, ambos criados por decretos de Benjamin Constant. O governo também ficou autorizado a rever os regulamentos de todas as instituições dependentes do extinto Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos. Um relatório do ministro João Barbalho Uchoa Cavalcanti, sucessor de Benjamin, TÓPICO 2 | CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO 19 descreve que a Inspetoria da instrução primária e secundária da Capital Federal expediu um ofício mandando suspender a execução do novo plano de estudos secundários. [...]. Então, acadêmico, como podemos ver, a tentativa de reforma de Benjamin Constant não teve tanto apoio no período republicano quanto o inovador gostaria. Delaneze (2007, p. 51), em seu texto, aponta que o ato da criação do Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos tenha sido apenas um ato político, afinal, a autora aponta que o legado da República “foi o federalismo educacional e a falta de uma política de educação para as classes populares” (DELANEZE, 2007, p. 51). Nesse sentido, a reforma proposta por Benjamin Constant estava destina ao fracasso, pois o Estado não entendia como necessidade ou até mesmo dever a responsabilidade de garantir o acesso à educação para toda a população. Se o governo estava preocupado em trazer a educação para um modelo mais positivista de modo que pudesse alavancar aos que dela desfrutassem, por que investir então na população de classe baixa? O que acontece, caro acadêmico, é que neste período da história da educação brasileira fica evidente a exclusão social e o pensamento positivista e capitalista de que, para que a sociedade funcione, é necessário que cada um cumpra seu papel. Para isso é preciso que as pessoas compunham diferentes classes sociais, cada uma cumprindo com o que dela é esperado. Esta é a engrenagem do sistema capitalista. E das camadas mais baixas, o que se espera? Sim, se espera apenas a reprodução de seus esforços diários para o trabalho. No pensamento positivista, as classes populares mais baixas não precisam pensar, não precisam crescer intelectualmente e desenvolver o seu potencial enquanto pessoas. Até porque, se essas o fizerem, podem começar a entender a exploração que sofrem e reivindicar seu lugar social igualitário, e isto seria um perigo para a manutenção do sistema capitalista. Para mostrar melhor a vocês como esta exclusão social ocorria no período da Primeira República, convido a lermos juntos mais um trecho de Delaneze (2007, p. 54): [...] A República não ampliou as oportunidades quanto à educação. De acordo com Teixeira, tinha-se um ensino primário de oportunidades reduzidas; um ensino secundário pago, para servir de estrangulamento a qualquer rápido desejo de ascensão social; e um ensino superior gratuito, para atender aos filhos da elite do país. Mesmo a escola que se designava popular não era popular, mas tipicamente de classe média. A escola primária e a normal prosperavam, mas como escolas de classe média; a escola acadêmica e o ensino superior ficavam ainda mais restritos, destinados a grupos da classe superior alta. Por conseguinte, “abaixo dessas classes, média e superior, dormitava, esquecido, o povo”. Assim, o que podemos analisar deste período? Como foi explicitado no início deste caderno, o que se propõe é uma análise crítica da história da educação brasileira, bem como a análise dela nos dias atuais. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 20 Vamos, então, retomar o conceito de Galtung de violência estrutural. Vimos que no período republicano, Benjamin Constant tentou realizar a reforma na educação de modo que essa fosse “livre, leiga e gratuita”, mas, como Delaneze (2007) já apontou, estava destinado ao fracasso desejar que a educação fosse proposta às classes populares também. A reforma não se efetivou. O governo republicano foi contra, como vimos anteriormente. O que podemos analisar disso? A estrutura da sociedade, neste momento, estava priorizando a educação para as classes elitizadas, pois gostaria de manter exatamente a estrutura social que possuía, com os pobres trabalhando para as elites e preferencialmente não alfabetizados ou com ensino mínimo. De acordo com Galtung (1990), vemos que as camadas menos favorecidas economicamente no período da Primeira República também foram vítimas da violência estrutural ao serem excluídas do sistema educacional. Estas pessoas deixaram de desenvolver suas habilidades intelectuais, não tiveram a oportunidade de crescer financeiramente por meio do estudo, por estarem em uma condição de vulnerabilidade social e econômica, foram destinadas a continuar nesta mesma condição. A violência estrutural é exatamente isso, quando a sociedade priva alguém de alcançar seu potencial, seja qual for a política ou área de direito constitucional garantido, pois vemos “furos”, ou melhor, a “não garantia de direitos” em outros setores, como, por exemplo, a saúde, que acaba atingindo com maior intensidade a classe social menos favorecida. A violência estrutural não ocorre apenas na educação, caro acadêmico. O pior é que a população não chega a ter consciência de que sofre uma violência, e agora falamos da violência estrutural, isso porque, como elas não têm acesso à educação, este assunto não é com elas tratado. Neste aspecto, outro autor nos auxilia a explorar ainda mais os conceitos de violência estrutural, o sociólogo francês Bourdieu. Embora Bourdieu não aborde da mesma forma que Galtung a violência estrutural, ele trabalha com o conceito de violência simbólica. Afirma que essa é uma violência doce, imperceptível aos olhos do sujeito que a sofre e, até mesmo, aos olhos do sujeito praticante. Se compararmos com a violência estrutural, vemos esta mesma similaridade, a dificuldade de percepção de que estamos sofrendo a agressão. Para Bourdieu a violência simbólica “é uma forma de poder que exerce sobre os corpos, diretamente e como que por magia, sem qualquer coação física, mas esta magia só atua como apoio de pré-disposições colocadas, como molas propulsoras na zona mais profunda dos corpos” (BOURDIEU, 1999, p. 25). O sociólogo ainda descreve ainda que o poder simbólico é relacional, ou seja, tudo que é real, é relacional, nada existe sem a relação que os cercam. Desta maneira nos permite a “dominação simbólica [...] se exerce não na lógica pura das consciências cognoscentes, mas através dos esquemas de percepção, de avaliação que são constitutivos dos habitus” (BOURDIEU, 1999 p. 24). TÓPICO 2 | CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO 21 O conceito de habitus é justamente a internalização de nossas ações e da ideologia em que vivemos, de modo que essas ações e pensamentos passam a ser naturalizados por nós, como se a incorporação dos costumes e ideologias que vivemos sejam práticas que nasceram conosco e não uma construção social. O autor salienta ainda que a violência simbólica é disseminada por meio dos instrumentos de dominação, tais como os meios de comunicação, instituições de ensino, instituições em que trabalhamos, entre outras. O que se quer evidenciar é que a violência simbólica engloba todas as outras manifestações, é uma forma de violência macrossocial. O que significa que contribui para a violência de gênero, a partir de designações de atribuições destinadas aos homens e às mulheres, de acordo com o sexo, contribui também para que a manutenção da exploração capital X trabalho continue ocorrendo, e para que a violência estrutural se repita na falta de acesso e garantia dos direitos constitucionais. Acadêmico, convido você a ler uma síntese dos conceitos de Bourdieu feita por Westphal: Bourdieu (2005; 2011) discute a violência através dos conceitos de habitus, campoe capital. Para o autor, há a existência de um poder simbólico coercitivo exercido pelas forças dominantes (classe, Estado) sobre os indivíduos, introduzindo maneiras de pensar, agir, sentir, ou seja, são esquemas de ação e pensamento que acabam sendo incorporados de maneira naturalizada pelos sujeitos, formando assim um “habitus”. Para exercer o poder coercitivo sobre as pessoas são utilizados os instrumentos de dominação, tais como a mídia e a escola (WESTPHAL, 2013, p. 24). Neste sentido, nos apropriando da teoria de Bourdieu, podemos analisar que a violência simbólica age de forma coercitiva, de modo que as vítimas acreditam que o que estão vivenciando é algo natural, e, por ser natural, não percebem que estão sendo vítimas de violência. Com base em Bourdieu (2005), analisamos que a violência simbólica é a raiz de todas as outras formas de violência, principalmente as mais subjetivas, como a violência de gênero, violência estrutural, violência psicológica, exploração dos trabalhadores por meio do capitalismo, entre outras. Hoje, analisando criticamente a educação no período republicano, podemos perceber que a violência simbólica neste período era bem forte, e estruturava ainda mais a desigualdade entre as classes sociais. Para quem viveu neste período talvez achasse isso natural. Quantos de nossos avós, ou bisavós não contam com orgulho que não puderam permanecer na escola, pois precisavam auxiliar nos trabalhos da casa, lavoura ou indústria? Pois, se seus avós, bisavós ou conhecidos fazem menção a este período desta forma, eles foram vítimas da violência simbólica e violência estrutural. Essa análise mostra o quanto a violência simbólica é forte, pois ela é dificilmente reconhecida por quem a sofre, e é ainda internalizada de forma natural pelas vítimas. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 22 Para fechar a discussão sobre a educação na Primeira República, vemos a seguir uma imagem de uma escola desta época. FONTE: Disponível em: <http://fabiopestanaramos.blogspot.com. br/2011/02/criminalidade-e-educacao-no-inicio-da.html>. Acesso em: 22 abr. 2016. FIGURA 2 - ESCOLA NA PRIMEIRA REPÚBLICA DICAS Para se aprofundar no assunto sobre a Primeira República, você, acadêmico, pode acessar o link: <http://fabiopestanaramos.blogspot.com.br/2011/02/criminalidade-e- educacao-no-inicio-da.html>. 3 REFORMA DE FRANCISCO CAMPOS Caro acadêmico, vamos continuar nossa caminhada sobre a história da educação brasileira, e agora seguiremos pelos anos seguintes à República Velha. Falaremos sobre o período dos anos 30. Durante a década de 1930 o Brasil continuou crescendo, sendo que o setor da indústria acabou crescendo ainda mais. É natural que com o crescimento da cidade as pessoas também possuam anseio pelo crescimento, e para tal é necessário que elas tenham acesso, no mínimo, à educação, certo? Foi isso o que o Governo Vargas (1930-1945) tentou fazer. Um dos atos foi a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública (ROMANELLI, 2001). TÓPICO 2 | CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO 23 O primeiro agente a assumir o Ministério foi Francisco Campos, que tomou algumas medidas em sua gestão, entre elas as que vemos nos decretos: Decreto 19.850 (BRASIL, 1931): cria o Conselho Nacional de Educação, enquanto órgão consultivo do ministro da Educação e Saúde Pública nos assuntos relativos ao ensino. Decreto 19.851 (BRASIL, 1931): dispõe que o ensino superior no Brasil tem como finalidade: elevar o nível da cultura geral, estimular a investigação científica em quaisquer domínios dos conhecimentos humanos; habilitar ao exercício de atividades que requerem preparo técnico e científico superior; concorrer, enfim, pela educação do indivíduo e da coletividade, pela harmonia de objetivos entre professores e estudantes e pelo aproveitamento de todas as atividades universitárias, para a grandeza na Nação e para o aperfeiçoamento da Humanidade. Decreto 20.158 (BRASIL, 1931): organiza o ensino comercial, regulamenta a profissão de contador e dá outras providências. Decreto 21.241 (BRASIL, 1931): consolida as disposições sobre a organização do ensino secundário e dá outras providências. Este último decreto talvez seja o mais significativo para nossos estudos sobre a educação brasileira. Não que os demais não o sejam, mas este, em especial, tratará sobre as organizações que foram propostas e colocadas em prática pelo então Ministro Francisco Campos. Este decreto vai delimitar a proposta de divisão do ensino em fases, a primária e a secundária. DICAS Para que você, acadêmico, compreenda melhor o que estamos falando, indico a leitura deste decreto na íntegra: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/ decreto-21241-4-abril-1932-503517-publicacaooriginal-81464-pe.html>. IMPORTANT E Enquanto profissionais de Serviço Social, estaremos constantemente em contato com leis, decretos e normativas, por isso indico sua aproximação com estes documentos ainda na academia. Não deixe de consultar o material indicado. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 24 Sobre a reforma de Francisco de Campos, Norberto Dallabrida (2009) contribui colocando que o então Ministro Campos buscou organizar a cultura escolar do Ensino Secundário, sua meta também foi acabar com o regime de cursos preparatórios e exames parcelados. Assim, algumas medidas desta organização que o ministro pregou foram: QUADRO 1- REFORMA DE FRANCISCO CAMPOS • Padronização das regras para o ensino em todo o Brasil. • Ampliação do tempo de ensino, de cinco para sete anos. • Divisão destes anos em: Nível Fundamental (possuímos até hoje) e Nível Complementar. • Nível Fundamental: cinco anos de ensino e fornecia formação geral. • Ensino Secundário: dois anos de duração e era preparatório para o Ensino Superior. • Na formação do Ensino Secundário poderia indicar se gostaria de seguir para área jurídica, saúde: medicina, odontologia ou farmácia, ou área de engenharia e arquitetura. • Obrigatoriedade da presença dos alunos em no mínimo três quartos das aulas de sua série escolar. • Avaliação constante do aluno; até abril o professor deveria postar por arguição oral ou a trabalhos práticos realizados por este estudante. • Durante o ano eram cobradas quatro provas parciais das disciplinas, uma prova oral e ainda provas finais. • Para entrar em colégio de ensino secundário, o estudante deveria prestar provas de avaliação para ingresso, e estas deveriam ocorrer na segunda semana de fevereiro, isto em nível nacional. • Transferências de escolas somente eram permitidas em períodos de férias. FONTE: Adaptado de Dallabrida (2009) e Brasil (1932) Ao analisarmos um pouco mais a fundo o conteúdo dos decretos de Campos e também este pequeno quadro montado anteriormente, das prerrogativas da Reforma, podemos observar que o ministro pretendia educar, ou melhor, reeducar os estudantes de modo que estes permaneceriam no ensino obrigatoriamente, afinal a presença era controlada. Mas reeducação não ocorreria apenas no sentido de cobrar presença, mas também através de seu desempenho, que era medido por meio das avaliações. As exigências para formação deste estudante se tornaram maiores. Com isso, o que podemos avaliar são aspectos positivos e também negativos: Positivo no sentido de que, com a obrigação da frequência, se garante que estas crianças e adolescentes estariam na escola e não trabalhando, então de certa forma era também uma maneira de proteção para estas crianças e adolescentes, mesmo que talvez o ministro não tenha pensado exatamente desta forma. TÓPICO 2 | CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO 25 Talvez sua preocupação tenha sido no sentido de garantir a educação a toda a população e garantir também a expansão da ascensão da economia brasileira, e para isso seria necessário que a população fosse alfabetizada e que se garantissem índices mais elevados na educação. Uma mensagem mesmo que subjetiva deste sentido pode ser vista no Decreto 19.851, ondeCampos expõe que a educação é para a grandeza da nação, a grandeza da nação pode ser vista por meio do crescimento econômico, o que é reflexo da ascensão do capitalismo. Para a ação e intervenção do profissional de Serviço Social é preciso procurar compreender o que o texto tem a nos dizer. Quando estes agentes políticos propõem mudanças na educação, propulsionam algo além da inserção de crianças e adolescentes na educação. Nosso olhar técnico deve ser treinado para identificar o além do imediatismo das normatizações. Nos cabe estreitar o olhar para os benefícios que esta normatização traz, bem como as carências, os favorecidos e os excluídos, ou quando há uma relação de igualdade para a população nesta normatização. 4 MANIFESTOS PELA PRÁTICA PEDAGÓGICA Assim como cabe ao assistente social o olhar crítico sobre uma realidade que nos é apresentada, outros sujeitos sem a formação em Serviço Social também podem ter este olhar um pouco mais aguçado criticamente, para perceber e reivindicar práticas mais igualitárias e garantias de direito. Assim, caro acadêmico, algumas pessoas estavam se organizando na década de 40 para reivindicar melhorias no sistema de ensino no Brasil. Primeiramente vamos sinalizar a presença da Associação Brasileira de Educação (ABE), que foi criada em 1924, e era responsável por promover eventos para a área da educação. Em 1931 foi promovida a IV Conferência Nacional da Educação, na qual se propunha estudar as “grandes diretrizes da educação popular”. Neste encontro fizeram-se presentes o Presidente Getúlio Vargas e o então Ministro de Educação Francisco Campos. Sobre este momento, Ivashista e Vieira (2016, p. 4) descrevem: [...] Nesse encontro Getúlio Vargas solicitou aos educadores presentes a apresentação de uma filosofia para a educação do país, ou seja, princípios orientadores da política educacional. No entanto, sendo impossível o consenso de ideias, houve a cisão, em dois blocos, dos educadores presentes, sendo que um era constituído pelos conservadores - e aí se incluía o grupo católico - e o outro era constituído pelos liberais, elitistas e igualitaristas, logo, configurava-se um cenário de embate entre grupo pioneiro e o de perspectiva conservadora, do qual fazia parte o grupo católico. UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 26 Neste momento então não foi possível chegar a nenhum resultado final sobre a situação. Assim, em 1932, intelectuais assinaram então o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, o documento foi assinado por 26 educadores, entre eles Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira e Lourenço Filho. Para compreender do que se trata este documento, convido você, acadêmico, à leitura de partes extraídas do texto original, no quadro a seguir. Este texto possui alguns fragmentos e partes que foram destacadas em negrito, às quais daremos destaque em nossa discussão após a leitura: QUADRO 2 - O MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO NOVA (1932) - A RECONSTRUÇÃO EDUCACIONAL NO BRASIL - AO POVO E AO GOVERNO • Na hierarquia dos problemas nacionais, nenhum sobreleva em importância e gravidade ao da educação. Nem mesmo os de caráter econômico lhe podem disputar a primazia nos planos de reconstrução nacional. Pois, se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de suas condições econômicas, é impossível desenvolver as forças econômicas ou de produção sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à iniciativa, que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza de uma sociedade. No entanto, se depois de 43 anos de regime republicano, se der um balanço ao estado atual da educação pública, no Brasil, se verificará que, dissociadas sempre as reformas econômicas e educacionais, que era indispensável entrelaçar e encadear, dirigindo-as no mesmo sentido, todos os nossos esforços, sem unidade de plano e sem espírito de continuidade, não lograram ainda criar um sistema de organização escolar, à altura das necessidades modernas e das necessidades do país. • [...] Onde se tem de procurar a causa principal desse estado antes de inorganização do que de desorganização do aparelho escolar, é na falta, em quase todos os planos e iniciativas, da determinação dos fins de educação (aspecto filosófico e social) e da aplicação (aspecto técnico) dos métodos científicos aos problemas de educação. Ou, em poucas palavras, na falta de espírito filosófico e científico, na resolução dos problemas da administração escolar. • [...] Mas o educador, como o sociólogo, tem necessidade de uma cultura múltipla e bem diversa; [...] perceber, além do aparente e do efêmero, "o jogo poderoso das grandes leis que dominam a evolução social", e a posição que tem a escola, e a função que representa, na diversidade e pluralidade das forças sociais que cooperam na obra da civilização. [...] É certo que, com a efervescência intelectual que produziu no professorado, se abriu, de uma vez, a escola a esses ares, a cujo oxigênio se forma a nova geração de educadores e se vivificou o espírito nesse fecundo movimento renovador no campo da educação pública, nos últimos anos. • [...] Ora, se a educação está intimamente vinculada à filosofia de cada época, que lhe define o caráter, rasgando sempre novas perspectivas ao pensamento TÓPICO 2 | CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO 27 pedagógico, a educação nova não pode deixar de ser uma reação categórica, intencional e sistemática contra a velha estrutura do serviço educacional, artificial e verbalista, montada para uma concepção vencida. • [...] A educação nova, alargando a sua finalidade para além dos limites das classes, assume, com uma feição mais humana, a sua verdadeira função social, preparando-se para formar "a hierarquia democrática" pela "hierarquia das capacidades", recrutadas em todos os grupos sociais, a que se abrem as mesmas oportunidades de educação. Ela tem, por objeto, organizar e desenvolver os meios de ação durável com o fim de "dirigir o desenvolvimento natural e integral do ser humano em cada uma das etapas de seu crescimento", de acordo com uma certa concepção do mundo. • [....] A escola tradicional, instalada para uma concepção burguesa, vinha mantendo o indivíduo na sua autonomia isolada e estéril, resultante da doutrina do individualismo libertário, que teve aliás o seu papel na formação das democracias e sem cujo assalto não se teriam quebrado os quadros rígidos da vida social. A escola socializada, reconstituída sobre a base da atividade e da produção, em que se considera o trabalho como a melhor maneira de estudar a realidade em geral (aquisição ativa da cultura) e a melhor maneira de estudar o trabalho em si mesmo, como fundamento da sociedade humana, se organizou para remontar a corrente e restabelecer, entre os homens, o espírito de disciplina, solidariedade e cooperação, por uma profunda obra social que ultrapassa largamente o quadro estreito dos interesses de classes. • [...] Mas, do direito de cada indivíduo à sua educação integral, decorre logicamente para o Estado que o reconhece e o proclama, o dever de considerar a educação, na variedade de seus graus e manifestações, como uma função social e eminentemente pública, que ele é chamado a realizar, com a cooperação de todas as instituições sociais. A educação que é uma das funções de que a família se vem despojando em proveito da sociedade política, rompeu os quadros do comunismo familiar e dos grupos específicos (instituições privadas), para se incorporar definitivamente entre as funções essenciais e primordiais do Estado. • [...] Assentado o princípio do direito biológico de cada indivíduo à sua educação integral, cabe evidentemente ao Estado a organização dos meios de o tornar efetivo, por um plano geral de educação, de estrutura orgânica, que torne a escola acessível, em todos os seus graus, aos cidadãos a quem a estrutura social do país mantém em condições de inferioridade econômica para obter o máximode desenvolvimento de acordo com as suas aptidões vitais. Chega-se, por esta forma, ao princípio da escola para todos, "escola comum ou única", que, tomado a rigor, só não ficará na contingência de sofrer quaisquer restrições, em países em que as reformas pedagógicas estão intimamente ligadas com a reconstrução fundamental das relações sociais. Em nosso regime político, o Estado não poderá, de certo, impedir que, graças à organização de escolas privadas de tipos diferentes, as classes mais privilegiadas assegurem a seus filhos uma educação de classe determinada; mas está no dever indeclinável UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 28 de não admitir, dentro do sistema escolar do Estado, quaisquer classes ou escolas, a que só tenha acesso uma minoria, por um privilégio exclusivamente econômico. • [...] A laicidade, gratuidade, obrigatoriedade e coeducação são outros tantos princípios em que assenta a escola unificada [...] A laicidade, que coloca o ambiente escolar acima de crenças e disputas religiosas. De fato, se a educação se propõe, antes de tudo, a desenvolver ao máximo a capacidade vital do ser humano, deve ser considerada "uma só" a função educacional, cujos diferentes graus estão destinados a servir às diferentes fases de seu crescimento. FONTE: Adaptado de AZEVEDO, F. et al. O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932). Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n. especial, p.188–204, ago. 2006. Disponível em: <http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/edicoes/22e/doc1_22e.pdf>. Acesso em: 22 abr. 2016. IMPORTANT E Não deixe de conhecer o texto na íntegra. É uma parte importante da história da educação brasileira, e simboliza um marco neste período histórico. O link para o documento está a seguir. Aproveite para pesquisar sobre os educadores que assinaram o documento. Tenha em mente que a única coisa que ninguém pode lhe tirar é o conhecimento! <http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/edicoes/22e/doc1_22e.pdf>. Então, acadêmico, inicialmente, através destes fragmentos do Manifesto de 1932, vemos que os intelectuais deram um “puxão de orelha” nos governantes ao afirmar que não há problema maior e mais emergente que a educação em um país. Buscaram sensibilizar o governo de que havia um descompasso entre a educação brasileira e o crescimento, economia e política do país, sendo a primeira deixada de lado. Percebemos que os 26 intelectuais mostraram preocupação com a igualdade de ensino para todas as camadas sociais e criticaram firmemente o ensino excludente destinado às classes mais baixas. Os autores do documento promoveram um comparativo entre a distinção de ensino para as classes que a educação atual estava promovendo e a proposta da nova educação. Para fazer esta sensibilização eles usaram uma vertente biológica, alegando que a educação é uma necessidade a todos os seres humanos, independentemente de classe. A linha de raciocínio que buscaram seguir é que, se é uma necessidade biológica, é para todos, afinal todos são formados biologicamente pelas mesmas substâncias, partículas e moléculas. Ao mesmo tempo em que usam a biologia para colocar o ensino enquanto necessidade, apontam também algumas dificuldades que estes sujeitos possam TÓPICO 2 | CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO 29 enfrentar, e argumentam sobre a importância de se respeitar estas diferenças entre os corpos, colocando que algumas pessoas podem sentir maiores dificuldades que outras, cada um possui seus limites. Além destes apontamentos, os intelectuais ainda colocaram enquanto responsabilidade do Estado promover o desenvolvimento integral do sujeito, ou seja, é uma responsabilidade pública garantir o ensino à sua população. Mais ainda, apontam que a educação deve ser laica, ou seja, sem influência da religião nas práticas educativas. A educação é unicamente para ensinar e formar as pessoas e não para evangelizar. Em 1º de novembro de 1932, Getúlio Vargas lançou o Decreto 20.040, no qual gostaria que uma comissão fosse eleita para escrever um pré-projeto para Constituição. A Associação Brasileira de Educação, neste momento, ficou encarregada de montar uma comissão para elaborar quais seriam as competências das esferas federais, estaduais e municipais. Este anteprojeto foi fixado em oito capítulos e não seguiu todas as reivindicações que apareceram no documento anterior. Este documento, no entanto, trouxe para a União a atribuição de elaborar um Plano Nacional de Educação. Assim, o documento Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, fez alguns apontamentos realizados pela associação brasileira de educação sobre o pré-projeto para a nova constituição, em 1934, reforçando a educação enquanto direito do cidadão e dever do Estado em garanti-la. No Artigo a seguir, vemos que é reconhecido enquanto direito a todos, e já cita também que um dos focos da educação está voltado à vida econômica do pais. Como podemos ver, a questão econômica e desenvolvimentista do país está atrelada nesta redação da Constituição: Art. 149 - A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela família e pelos poderes públicos, cumprindo a estes proporcioná- la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no país, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da nação, e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana (BRASIL, 1934). Vendo este único artigo da Constituição de 1934 que trata da questão da educação enquanto direito, é um avanço em relação à primeira Constituição que o Brasil teve, na qual se apontava apenas a instrução primária enquanto direito, e gratuita. Esta Constituição também se difere pelo fato de trazer a responsabilidade da União, para que esta: • Seja responsável por fixar o Plano Nacional de Educação. • Fiscalize sua execução em todo o território nacional. Ao mesmo tempo, a responsabilidade de elaboração do Plano Nacional de Educação ficou a cargo do Conselho Nacional de Educação, sendo que caberia UNIDADE 1 | TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO 30 a este também sugerir medidas para possíveis problemas que pudessem surgir, além de verificar a distribuição adequada de fundos para o setor educacional. Com relação aos recursos da educação, esta Constituição trouxe alguns aspectos interessantes, em que caberia uma análise nossa. Veja os pontos destacados: Art. 156 - A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez por cento, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte por cento, da renda resultante dos impostos na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos. Parágrafo único - Para a realização do ensino nas zonas rurais, a União reservará no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à educação no respectivo orçamento anual. Art. 157 - A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma parte dos seus patrimônios territoriais para a formação dos respectivos fundos de educação. § 1º - As sobras das dotações orçamentárias acrescidas das doações, percentagens sobre o produto de vendas de terras públicas, taxas especiais e outros recursos financeiros, constituirão, na União, nos Estados e nos Municípios, esses fundos especiais, que serão aplicados exclusivamente em obras educativas, determinadas em lei. § 2º - Parte dos mesmos fundos se aplicará em auxílios a alunos necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar, bolsas de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, e para vilegiaturas (BRASIL, 1934, grifo nosso). Acadêmico, enquanto profissionais de Serviço Social vocês irão compor espaços como os Conselhos de Direitos, trabalhando na educação, saúde ou assistência. É interessante atentar para o fato de que cada política tem um percentual de recursos que devem ser investidos nela. O fato de esta Constituição ter se atentado para a educação é algo que merece destaque. É interessante que destinem partes de sobras das dotações para obras educacionais. Um dos focos a ser pensado é a garantia do fornecimento
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