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FACULDADE DE FILOSOFIA E TEOLOGIA PAULO VI – 03 de Maio de 2020 Jardel Cerqueira - RGM: 20162008 - Prof. Eduardo Nery Nunes – Homilética A pastoral da palavra Desde os primórdios da Igreja, a Palavra esteve presente; se pensar o prólogo do Evangelho de São João, tudo foi feito pela Palavra e para a Palavra; e a Palavra existia antes de tudo, ou seja estava presente antes da criação. Ao longo do tempo, a Igreja percebeu que a Palavra era o mais poderoso dos instrumentos. Por ela se constrói a memória, o presente e o futuro, em outras palavras, transcende-se o tempo, constrói relações. A Igreja tem a Fé (para os crentes), ou crença (para os cientistas da religião), na Palavra, e a Palavra está a serviço do outro: olhar para o outro e se perguntar: “que serviço eu posso prestar ao outro?”. Todavia, é válido recordar que ao longo da história da Igreja, essa dimensão chegou a estar obscurecida (não esquecida), de modo especial a pregação, atualmente homilia. Com o Concílio Vaticano II, todos os documentos apresentam a importância da Palavra; de modo especifico, a Sacrosanctum Concilium (SC) e a Dei Verbum (DV). O número 7 da SC afirma que o senhor está “Presente pela Palavra, pois é Ele mesmo que fala quando se leem as Sagradas Escrituras na Igreja”. Dessa forma é muito direta a importância de percebermos a presença do Senhor pela leitura da Palavra. Muitos fieis frequentam as liturgias sacramentais e não se dão conta da presença tão ilustre do Senhor. Incorporada na liturgia dos sacramentos, a Palavra de Deus é a forma para respondê-Lo. Fala-se com Ele empregando sua própria Palavra. Dialoga-se com Deus nos mesmos termos que Ele nos revela. Nesse sentido, o Concílio Vaticano II buscou apresentar que a Palavra está situada na ação pastoral da Igreja. A principal manifestação da Palavra na ação pastoral da Igreja é, sem dúvida, aquela que acompanha o testemunho do fiel, explica-o e interpreta-o, e faz dele chamada evangelizadora para as pessoas e o mundo; toda ação pastoral é direcionada para essa Palavra. O restante das ações pastorais têm como objeto o fato de que a Igreja continue sendo medianeira da salvação para o mundo, continue sendo o lugar onde a Palavra se pronuncia, significa, dá sentido ao mundo e produz nele os seus frutos. Ainda nessa perspectiva, no primeiro ano do seu pontificado, o papa Francisco escreveu a exortação apostólica Evangelli Gaudium, no capítulo III ele dedica ao anúncio do Evangelho. A partir do nº135 e seguintes, ele dedica uma sessão sobre como deve ser a pregação e qual o seu valor: a homilia é o ponto de comparação para avaliar a proximidade e a capacidade de encontro de um Pastor com seu Povo. Ela não pode ser um espetáculo de divertimento, não corresponde à lógica dos recursos mediáticos, mas deve dar fervor e significado a celebração. Exige que a homilia oriente a assembleia, e também o pregador, para uma comunhão com Cristo na Eucaristia, que transforme a vida. Ali se encontra a fala da Igreja, que é mãe e como mãe que prega ao seu povo, como uma mãe que fala ao seu filho, sabendo que o filho tem confiança de que tudo o que se lhe ensina é para seu bem, porque se sente amado. Além disso, a boa mãe sabe reconhecer tudo o que Deus semeou no seu filho, escuta as suas preocupações e aprende com Ele. Ou seja, dentro da homilia se revela duas funções litúrgicas primordiais: a de ser aplicação da mensagem ao hoje e aqui de nossas vidas; e a de ser ponte entre a liturgia da palavra e a liturgia eucarística ou sacramental. Conforme visto durante o curso e nesse texto, no culto cristão Palavra e Sacramentos, embora são diferentes, expressam e se completam mutuamente e constituem uma única ação simbólico-sacramental na qual se faz presente e participada a obra da Criação e da Salvação, cumprida em Cristo por Deus. Dessa forma, não pode haver celebração sem a proclamação da Palavra de Deus, nem tão pouco alterada a ordem; visto que, a Palavra é destinada a suscitar a fé, a motivar a oração e o gestos rituais dos sacramentos, e a recordar todos os fatos do cotidiano que os trazem para aquela celebração sacramental. Assim sendo, é função da homilia ressaltar esses vínculos, para que dessa forma os fiéis façam uma autêntica experiência com Deus. Como já mencionado, a importância da Palavra vem desde os primórdios da Igreja, ou melhor, muito antes da Criação. Mas uma passagem das Sagradas Escrituras que ilustra essa estima é Lc 4, 16-21. Na liturgia sinagogal do sábado, o Senhor Jesus proferiu sua primeira homilia; é com essa certeza que a Igreja da continuidade com tudo dito no AT, dessa presença do Senhor, na proclamação da Palavra leva-a a não omitir nunca a leitura litúrgica da Escritura, lendo nela tudo o que se refere a Cristo, e atualizando esse mistério na vida de seus filhos. Em síntese, a boa pregação da Palavra, uma boa homilia, pressupõe uma boa pastoral da Palavra. Primeiro por parte do ministro, seja ordenado (ou extraordinário visto que a realidade do Brasil requer a celebração da Palavra) que ele seja claro na exposição da Palavra e que durante a liturgia leve os fiéis a fazerem a síntese do mistério Pascal em suas vidas, conforme mencionado. Para isso, não deve evitar situações que não são apropriadas para o momento litúrgico e saber lidar com todos os tipos de pessoas, de maneira que todos se sintam acolhidos fiéis para que possam viver o que celebram. Dessa maneira, conclui-se que aquilo desejado de uma pregação, é que ela possa anunciar a mensagem no momento oportuno, trazer ao ouvinte uma mensagem de vida, impregnada de esperança cristã, e que proclame o Mistério da Salvação, sendo profética e capaz de iluminar, purificar, e aprofundar a religiosidade popular. Em fim possa formar os ouvintes para uma vida cristã adulta e comunitária. Bibliografia extra BECKHÄUSER, Alberto. Sacrosanctum Concilium: texto e comentário. 1.ed. São Paulo: Paulinas, 2012. BOROBIO, Dionisio (org.). A celebração na Igreja: liturgia e sacramentologia fundamental. (vol I). Trad. Adail U. Sobral. São Paulo: Edições Loyola, 1990. FRANCISCO, Papa. Evangelli Gaudium – A Alegria do Evangelho. São Paulo: Paulinas, 2013. GUINDA, Francisco Javier Calvo. Homilética. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, Colección SMT, 2003.