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Percursos da imigração italiana do Sul do Brasil: entre regionalismos e a unificação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
ARTIGO FINAL 
Disciplina: HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO SUL - HUM03066 
Professor: Fabio Kuhn
Aluna: Debora Mazzini
Percursos da imigração italiana do Sul do Brasil: entre regionalismos e a unificação
Em 1820, D. João VI estabeleceu um decreto que criava as denominadas colônias “oficiais” que iriam receber os imigrantes e suas famílias, que vinham para o país, de diferentes localidades com a promessa de lotes de terra e condições de trabalho. A partir desta determinação, foram construídos diferentes percursos pelos imigrantes vindos de diversas regiões da Europa para o país nos anos seguintes. Neste contexto, o artigo busca aprofundar os estudos e reflexões acerca da imigração italiana no Rio Grande do Sul, analisando como estes imigrantes provenientes de diversas regiões da Itália, interagiam entre si e com a localidade que se instauraram no sul do país. É importante ressaltar o reconhecimento dos imigrantes como um grupo heterogêneo, com diferentes valores que orientavam suas condutas, gerando conflitos e solidariedade nas colônias.
Ao analisar as regiões coloniais do Rio Grande do Sul, a partir de uma revisão bibliográfica de diferentes artigos e textos que analisam caminhos traçados por grupos de imigrantes vindos da Itália no sex XIX, o presente artigo identificou três grupos principais para se compreender as relações sociais e construção identitárias da colonização, os católicos, os maçons e os austríacos. Desta forma, para uma melhor compreensão dos percursos traçados pelos imigrantes italianos, o texto foi divido em quatro momentos que buscam refletir desde o contexto histórico da imigração para se compreender de onde surgem os valores e costumes trazidos pelos imigrantes até os pequenos conflitos e estruturas sociais construídas nos principais territórios de colonização.
Contexto de vinda
Antes de se refletir sobre as relações, conflitos e estruturas sociais vivenciadas pelos italianos nas colônias do Rio Grande do Sul, é necessário para uma melhor compreensão de sua heterogeneidade situar o momento histórico e motivos que os traziam da Itália para o Brasil. 
No século XIX a Itália é caracterizada pelas fortes identidades regionais, num contexto do país que recém passava pela unificação em 1870, com a tomada de Roma pelas tropas do Reino de Piemonte que era mais forte politicamente e militarmente, uniu os reinos da península itálica, no entanto cada região conservava sua cultura local. As novas formas de produção adotadas e o avanço do capitalismo, modificou as realidades econômicas, social e política do país. Com o crescimento industrial no meio urbano e os investimentos nos latifúndios para abastecimento de matérias-primas, os mais afetados foram os camponeses e pequenos comerciários, que buscaram na emigração alternativas para a sobrevivência, bem como resistência em relação ao sistema adotado. Desta maneira, a vinda para a América do Sul dos italianos representava para estes uma fuga da miséria que assolava os campos e cidades onde viviam na Itália, e para outros era uma perspectiva de melhores oportunidades de trabalho no cenário urbano. Por isso, muitos decidiram emigrar, com o intuito de melhorar as condições de vida (MAESTRI, 2005).
A vinda de imigrantes europeus para o Rio Grande do Sul, fez parte inicialmente de um projeto geopolítico do governo imperial no século XIX e início do século XX, que considerava a imigração um fator importante para preencher os chamados “vazios demográfico” no Sul do país. Pós independência, a decisão de manter as imigrações na região sul tem relação também com a ideia de fortalecer as fronteiras. Um aspecto importante neste contexto é a questão indígena, que parecia ser desconsiderada quando se pensava na ocupação de terras. Também a perspectiva da imigração num contexto de fim do trabalho escravo e substituição pelo trabalho livre, principalmente como uma substituição do negro escravo pelo branco europeu em um processo de colonização visto como civilizatório, baseado na pequena propriedade. 
O processo imigratório no Rio Grande do Sul inicia em 1875 com a criação de núcleos coloniais, com a perspectiva da venda de terras devolutas do Império, o aumento agrícola e populacional na região sul, as principais colônias a receber imigrantes italianos foram Conde D’Eu, Dona Isabel e Caxias (Campo dos Bugres), e mais tarde em 1877 a colônia de Silveira Martins. Grande parte dos migrantes provinham do norte da Itália: Vêneto, Lombardia, Friuli e Trentino- Alto Ádige.
Segundo os estudos de Giron (1989), a imigração italiana não formava um grupo coeso em sua chegada ao Brasil, haviam três grupos politicamente antagônicos: os “austríacos” que defendiam o domínio da Áustria sobre a Itália; os “carbonários” que defendiam a unificação do país e os “católicos” que desejavam a manutenção do domínio papal sobre os Estados Romanos.
O recorte espacial presente neste artigo serão estas quatro colônias citadas, para se compreender sobre as relações estabelecidas pelos imigrantes italianos considerando suas ideologias e crenças conflituosas para construção de uma identidade nesta nova terra.
 
Conde d’Eu, Dona Isabel e Caxias
Nos anos 1870 a 1876, as colônias Conde D’Eu e Dona Isabel foram administradas pela Província, por meio de Comissões de Terras que eram encarregadas da medição e demarcação de lotes para a vinda dos imigrantes. A partir de 1876, se intensificou a chegada de italianos nestas colônias, sendo estas administradas pelo Governo Imperial por meio de diretores e funcionários nomeados no Ministério da Agricultura, Comércio e Obras. No mesmo período foi criada a colônia Caxias, no local chamado pelos tropeiros que subiam a serra em direção a Bom Jesus de “Campo dos Bugres”. As primeiras levas de imigrantes vieram do Piemonte e Lombardia, e depois do Vêneto. 
Em 1884 essas colônias são, por Decretos de n. 9183 e 9182, elevadas à condição de povoações comuns e passam a ser administradas pelos municípios de São João de Montenegro (Conde d'Eu e Dona Isabel) e por São Sebastião do Caí (Caxias), na condição de distritos. A administração das colônias sistematizou o processo de povoamento e relacionamento com os imigrantes, sendo elo de ligação com as esferas maiores do poder político.
Não existia uma convivência pacífica voltada apenas para o trabalho e centralidade em lotes isolados nas colônias, as demandas de organização social, administrativa e de relacionamentos causavam brigas, crimes, distúrbios e desafios as ordens das autoridades frequentemente. Os principais conflitos nestas regiões, eram oriundos do enfrentamento de grupos de imigrantes com ideias antagônicas quanto à postura política e religiosa, além dos conflitos com as autoridades que não bem vistas pelos imigrantes. Num dos relatos apresentados no artigo de Luchese, é possível identificar os conflitos enfrentados na região devido as ideologias opostas e também a relação que se estabelecia com as autoridades sobre esta demanda.
“O engenheiro Oliveira afirmava que naquelas colônias o que estava na "moda entre os habitantes" era o espírito de nacionalidade. Segundo ele, os habitantes eram olhados por quase todos com rancor, senão ódio e entre si os colonos queriam estabelecer a preponderância de suas nações. Como a quase totalidade da população estava constituída de dois povos rivais - os austríacos e os italianos. Os resultados disso, segundo Oliveira, seria que em tempo muito próximo as colônias se esfacelariam e talvez o Governo Imperial tivesse que passar por momentos desagradáveis, acarretando-lhe descrédito perante o mundo civilizado. Continuava comentando que os habitantes das colônias Dona Isabel e Conde d'Eu entendiam que, pelo fato de o Governo Imperial haver transferido as mesmas para o regimento comum, estavam eles totalmente independentes, até mesmo das leis do País...” (Luchese, 210,pag. 317)
Os imigrantes que se estabilizaram nas colônias de maneira mais voltada às atividadesurbanas se envolviam mais efetivamente em conflitos políticos e nas questões de nacionalidade, conforme Luchese aponta nos registros coletados da época. Os colonos que viviam mais afastados na vida urbana, no campo como agricultores, se envolviam mais em conflitos movidos por interesses econômicos, como a divisa de terras, impostos, negociação de lotes e estradas. 
A grande maioria dos imigrantes nesta região eram de origem católica romana, contrários à Unificação Italiana e defendiam a devolução dos territórios pontifícios ao Papa, oposto a estes imigrantes, em minorias tinham os imigrantes italianos protestantes que fundaram na colônia Conde D’Eu em 1895 a Igreja Evangélica Metodista Episcopal do Brasil, no entanto existem poucos registros da atuação direta dos mesmos.
O papel dos diretores e autoridades das colônias era de buscar a conciliação entre os imigrantes nestes conflitos. Mas nem sempre conseguiam impor respeito e ordem na convivência com os colonos, sendo relatado diversos casos do uso da força policial e a detenção de imigrantes. Frente as dificuldades de entendimento com as autoridades brasileiras e a falta de pertencimento com a cultura local, houve também o avesso aos conflitos internos dos imigrantes, uma união na busca pela segurança e reconhecimento dos costumes que estes traziam. A criação em 1878 da Sociedade Italiana de Mútuo Socorro Stella D’Itália, foi uma instituição estabelecida para fins mutuais no contexto social da colônia Conde D’Eu, permitindo a organização dos imigrantes, bem como a sua articulação política, econômica e social na comunidade.
Colônia de Silveira Martins
O território da colônia de Silveira Martins foi demarcado em 1877 pelo Império brasileiro, para receber imigrantes italianos agricultores vindos principalmente de Vêneto. Organizada na Serra do Martinho a 22km do Município de Santa Maria e a 285km da cidade de Porto Alegre, foram divididos 716 lotes com 22 hectares para cada família de imigrantes que chegavam ao local. O nome da colônia provém de uma homenagem a Gaspar Silveira Martins, que era Ministro da Fazenda na época.
A estrutura que distribuiu os lotes na colônia, divida em linhas e travessões, isolava os colonos que moravam no interior voltados às atividades agrícolas, daqueles que viviam no meio urbano e se dedicavam ao comercio e profissões liberais. Este distanciamento entre os habitantes dos centros urbanos e era intensificado pelas rivalidades de crença e nacionalidade dos imigrantes que não comungavam dos mesmos valores e posicionamentos ideológicos e políticos, tensionando disputas de poder e conflitos. Boa parte dos colonos que exerciam atividades urbanas como comerciantes, artistas, professores e funcionários públicos eram maçons e anticlericais, já os imigrantes interioranos se identificavam com a Igreja Católica. 
Manfroi esclarece que “eram católicos antes de serem italianos – dado que a Itália era um Estado-Nação recém-criado e identifica-se com o liberalismo e o anticlericalismo. Para esses camponeses, a Igreja era a instituição normatizadora de suas vidas, tanto no plano social quanto individual” (MANFROI, 2001). As relações ligadas ao meio religioso contribuíram fortemente para a manutenção da identidade dos imigrantes, resolução de conflitos entre eles e com as autoridades, negociações políticas e unidades de grupos da colônia. As redes de sociabilidade na Colônia de Silveira Martins eram formandas por pequenos grupos de convivência, devido ao pouco contato dos moradores de linhas afastadas. 
Em grande maioria os imigrantes italianos não demonstravam interesse em participar da política local a nível administrativo de negociações com o governo. Demonstravam preocupação maior em se reconstruir suas, constituir patrimônio e garantir sua sobrevivência material e religiosa.
Os imigrantes anticlericais conseguiam melhor desenvolvimento e articulação junto as autoridades no meio urbano devido ao poder público local ser em sua maioria também com ideais maçons e anticlericais no estado.
Conforme relata Possamai, os primeiros religiosos a de fato se estabelecerem na região colonial foram os palotinos em 1886, sua presença foi de grande valor para os colonos como uma representatividade de sua pátria de origem, ciente de que os costumes católicos luso-brasileiros não tinham os mesmos aspectos do catolicismo romano que seguiam.
 “Os palotinos eram disciplinados, obedientes, zelosos, tinham senso de hierarquia eclesiástica e, em sua maioria, uma moral impecável. Viam o catolicismo romano como a única forma autêntica de catolicismo, fora da qual não haveria salvação e verdade. O bispo teve nessa congregação um forte aliado no projeto de restauração católica no Rio Grande do Sul. As maiores resistências encontradas pelos ultramontanos nessa região se deram em Silveira Martins e Dona Francisca. Na sede de Silveira Martins, os funcionários públicos, os profissionais liberais, comerciantes e artesãos eram, em sua maioria, maçons e anticlericais.” (Possamai,2005, pág. 52)
Cabe ressaltar os imigrantes oriundos de Trentino-Alto Ádige e de Trieste, províncias do Império Austro-húngaro, que tinham um conflito particular em relação ao demais imigrantes italianos. Os trentinos estabelecidos nas colônias não eram reconhecidos como italianos e nem como austríaco pelos demais, eram chamados de “os sem bandeira”. Os imigrantes trentinos eram defensores da fé católica e apoiavam a Igreja Católica, o que os afastava da nacionalidade e valorização da pátria italiana era os valores austríacos que por apoiar-se na fala do Papa, que excomungou o reino italiano, considerando-o um Estado ateu. Para Possamai (2005, p. 92-93), “os trentinos consideravam-se mais católicos do que os italianos pelo fato de não serem originários de um Estado condenado pelo Papa”.
Conclusão
Com base no referencial teórico de diferentes perspectivas quanto a colonização italiana no sul do Brasil, é possível perceber que este processo nas colônias foge em certos momentos a romantização histórica do pacifismo e heroísmo pregado ao papel dos imigrantes no processo de colonização. O processo de assimilação e construção de identidade dos imigrantes italianos não obedeceu a um único centro, existiram diferentes fatores e sujeitos: autoridades municipais, padres, religiosos e colonos eram dotados de algum tipo de poder, sendo que cada sujeito histórico interferiu na realidade a partir da posição de ocupavam no campo social, político e religioso.
Nas conversas e casos relatados no cotidiano das colônias, baseados em arquivos e depoimentos de colonos e administradores, é notável que este processo foi permeado de conflitos, angústias e dificuldades diversas. Os colonos italianos reagiram frente as dificuldades com manifestações, negociações e diversos conflitos, não vivendo da maneira idealizada apenas do trabalho e ocupação pacifica do território, grande parte dos discursos da historiografia apresentam os imigrantes italianos como uma massa homogênea, conhecer as vivencias diárias e individuais das colônias coloca em reflexão a estrutura em que se consolidou estas regiões e suas culturas.
As trajetórias de migrações tem um valor histórico característico que ainda há muito a se refletir sobre a riqueza dos escritos das pequenas colônias sobre o cotidiano e as vivencias dos habitantes nestes espaços, o modo como se construíam as relações e de que forma isto reflete historicamente nas interações sociais e na construção de uma identidade italiana unitária. 
REFERENCIAS
CORRÊA, Marcelo Armellini. Dos alpes do Tirol à serra gaúcha: a questão da identidade dos imigrantes trentinos no Rio Grande do Sul (1875-1918). Dissertação (Mestrado) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2014.
GIRON, L. S. As sombras do Littório: o fascismo na região colonial italiana no Rio Grande do Sul. Tese (Doutorado em História) – PUCSP, São Paulo, 1989
LUCHESE, Terciane Ângela. Autoridades locais e imigrantes italianos: conflitos e consensos. História, Franca, v. 29, n. 1, p. 308-327, 2010.
MANFROI, Olívio. A Colonizaçãoitaliana no Rio Grande do Sul: implicações econômicas, políticas e culturais. 2. ed. Porto Alegre: EST, 2001. P 167.
MACHADO, Paulo Pinheiro. A política de colonização do Império. Porto Alegre: EdUFRGS, 1999.
MAESTRI, Mário. Os senhores da terra: a colonização italiana no Rio Grande do Sul. 2ed. Passo Fundo. UPF, 2005.
MARIN, J.R. O projeto de restauração católica na excolônia Silveira Martins. Porto Alegre, RS. Dissertação de mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, 1993.
POSSAMAI, Paulo César. “Dall’ Italia Siamo Partiti”: a questão da identidade entre os imigrantes italianos e seus descendentes no Rio Grande do Sul (1875-1945). Passo Fundo: UPF, 2005.
ZANINI, Maria Catarina Chitolina. Um olhar antropológico sobre fatos e memórias da imigração italiana. Mana vol.13 no.2 Rio de Janeiro Oct. 2007

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