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Fibromialgia: Definição, Epidemiologia e Fisiopatologia

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Luiz Felipe Alcântara Ferreira - Medicina
DOR
FIBROMIALGIA
Tópicos
● Definição
● Epidemiologia
● Etiologia
● Fisiopatologia
● Quadro Clínico
● Diagnóstico
● Tratamento
Introdução
A síndrome da fibromialgia (FM) é uma síndrome clínica que se manifesta com dor no
corpo todo, principalmente na musculatura. Junto com a dor, a fibromialgia cursa com
sintomas de fadiga (cansaço), sono não reparador (a pessoa acorda cansada) e outros
sintomas como alterações de memória e atenção, ansiedade, depressão e alterações
intestinais. Uma característica da pessoa com FM é a grande sensibilidade ao toque e à
compressão da musculatura pelo examinador ou por outras pessoas.
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Definição
A fibromialgia é uma síndrome álgica musculoesquelética crônica, de duração superior
a 3 meses, generalizada, na qual existe um distúrbio do processamento dos centros
aferentes, causando dor. De natureza não autoimune e não inflamatória; causa grande
impacto na qualidade de vida e é uma das doenças reumáticas mais comuns. Embora
seja muito frequente, seu diagnóstico permanece um desafio, demorando em média
mais de 2 anos para o diagnóstico ser feito.
Epidemiologia
➔ Um dos distúrbios musculoesqueléticos mais prevalentes (prevalência variando
em torno de 0,7% a 5% da população);
➔ Afeta com muito maior proporção o sexo feminino;
➔ Idade mais frequente de diagnóstico varia entre 35 e 60 anos;
➔ A fibromialgia pode coexistir com outras doenças reumatológicas - artrite
reumatóide, lúpus eritematoso sistêmico, espondilite anquilosante, osteoartrite,
etc - e que, portanto, não deve ser considerada como apenas um diagnóstico de
exclusão.
Etiologia
Acredita-se que sua causa seja, essencialmente, multifatorial, com aspectos genéticos e
psicológicos exercendo papel sobre o desenvolvimento da doença.
➔ Traços de personalidade
➔ Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC)
➔ Depressão
➔ Ansiedade
➔ Alterações do padrão do sono e da resposta neuroendócrina ao estresse
➔ Heranças genéticas
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Fisiopatologia
Sensibilização Central
Portadores de fibromialgia estão em um estado de centralização da dor, o que significa
que eles sentem mais dor do que o esperado para certo estímulo nociceptivo. Algumas
alterações do sistema nervoso central interpretam esse estímulo como sensações
desagradáveis e os traduzem em dor, além de amplificá-los.
As fibras da dor (fibras C desmielinizadas) são estimuladas repetida, rápida e
prolongadamente – em um somatório temporal dos impulsos neurais. Isso amplifica os
potenciais de ação nos neurônios do corno posterior da medula. E essa
hiperestimulação causa despolarização dos receptores N-metil-D-aspartato (NMDA),
gerando alterações da transcrição que afetam o processamento da dor.
Além disso, há uma inibição das vias descendentes inibitórias da dor. Essas vias
modulam a resposta medular aos estímulos dolorosos e estão prejudicadas em
portadores de fibromialgia, o que potencializa a sensibilização central.
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Os níveis de neurotransmissores estão implicados na percepção da dor pelo indivíduo,
facilitando ou dificultando a transmissão do estímulo. Esses transmissores também
controlam o sono, humor, memória e atenção, e por isso pacientes com fibromialgia
muito frequentemente também apresentam alterações do padrão do sono, humor, da
memória e da atenção, como veremos adiante nas manifestações clínicas.
Alterações Musculares
Além da sensibilização central, na fibromialgia, há alterações musculares. Foram
observadas, por técnicas de imunohistoquímica, atrofia muscular de fibras tipo II, bem
como fibras reticulares, maior quantidade de lipídeos e de mitocôndrias. Essas
alterações são secundárias à redução da microcirculação local, causando hipóxia e
reduzindo a energia disponível. Como, na contração, há maior necessidade de oxigênio,
isso acaba causando hipóxias focais cronicamente. Esse processo ativa os receptores
adenosina A2, sensibilizando fibras nervosas não-mielinizadas.
Além disso, há desregulação vascular, aumento de substância P nos músculos, de
interleucina-1 (IL-1) no tecido cutâneo e fragmentação do DNA de fibras musculares.
Todos esses processos parecem estar implicados também na fisiopatologia da
fibromialgia.
Alterações Neuro-hormonais e Autonômicas
Na fibromialgia, há também importantes alterações neuro-hormonais e autonômicas. A
cronicidade da dor e alterações nos mecanismos nociceptivos no SNC geram uma
hipersecreção do hormônio ACTH (adrenocorticotrófico). Essa hipersecreção ocasiona
uma resposta sustentada ao estresse pelo eixo hipotálamo-hipófise- suprarrenal (HHS).
Estudos mostram aumento dos níveis de ACTH em nível basal e em estresse, além de
níveis elevados de cortisol – particularmente no fim do dia – e de ciclo circadiano
interrompido.
Altos níveis de ACTH aumentam os níveis do hormônio somatostatina, que, por sua vez,
inibe o GH. Este hormônio também é produzido na fase IV do sono, fase esta que é
interrompida nos pacientes fibromiálgicos. Logo, os níveis de GH nesses indivíduos é
reduzido, particularmente durante o sono.
Alterações na frequência cardíaca de repouso, diminuição da variabilidade desta ao
longo do dia e hipotensão ortostática sugerem uma hiperreatividade persistente do
sistema nervoso autônomo (SNA) em pacientes com fibromialgia.
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Um aumento do tônus simpático durante o sono foi sugerido como possível explicação
para a fragmentação do sono, além de poder explicar fadiga, rigidez matinal, distúrbios
do sono, ansiedade e irritabilidade nesses pacientes.
Com relação às alterações do sono, um aspecto importante do sono desses indivíduos é
a presença de sono alfa-delta. Mas o que seria isso? O sono não-REM possui quatro
fases. À medida que essas fases progridem e o sono mais profundo é alcançado, a
frequência das ondas cerebrais diminui. Na vigília com olhos fechados, as ondas
possuem uma frequência entre 8 Hz e 13Hz – chamadas de ondas alfa. A fase I é uma
transição da vigília e, no eletroencefalograma, se associa a ondas teta (4 a 7 Hz); já a
fase IV é constituída majoritariamente por ondas delta (<4 Hz). É a fase IV, formada pelas
ondas delta, a responsável pelo sono reparador e recuperador da energia física. Em
pacientes com fibromialgia, há redução da eficiência do sono, com pequenos
despertares noturnos frequentes, diminuição da duração de sono de ondas lentas e
intrusão de ondas alfa nas fases do sono profundo. Esse padrão é chamado de sono
alfa-delta e está presente em cerca de 90% dos pacientes. No entanto, o sono alfa-delta
não é específico da fibromialgia, podendo estar presentes em outras condições e até em
indivíduos normais.
Quadro Clínico
Os principais sintomas da fibromialgia podem ser vistos como uma tríade principal que
inclui:
➔ Dor difusa crônica (generalizada, de intensidade variável, migratória, bilateral,
acima e abaixo do tronco e no esqueleto axial, com duração maior que 3
meses);
➔ Fadiga;
➔ Distúrbios do sono.
O paciente geralmente apresenta exame físico normal, à exceção da presença de dor
difusa. Esta pode ser identificada tanto pela contagem de pontos dolorosos, como pela
palpação digital de várias regiões do corpo. Pode haver dor abdominal, pélvica, cefaléia
e dor torácica além da dor musculoesquelética. Comorbidades comuns incluem os
transtornos psiquiátricos: transtorno de ansiedade generalizada são reportados em 35%
a 62% dos indivíduos com fibromialgia; transtorno depressivo maior, em 58% a 86%, e o
transtorno bipolar do humor em 11%.
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Diagnóstico
➔ Critérios antigos (1990)
◆ Dor difusa (bilateral, acima e abaixo do tronco, acometendo esqueleto
axial, por no mínimo 3 meses);
◆ Detecção de onze pontos dolorosos à palpação (dentre 18), os chamados
tender points.
➔ Critérios Novos
◆ IDG - índice de dor generalizada: marcar as áreas que o paciente sentiu
dor nos últimos 7 dias.
◆ EGS - escala de gravidadedos sintomas: marcar a gravidade dos sintomas
nos últimos 7 dias.
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➔ Classifica-se como fibromialgia se 3 condições estiverem presentes:
◆ IDG ≥ 7 e EGS ≥ 5, ou IDG 3-6 e EGS ≥ 9;
◆ Sintomas estáveis e presentes por pelo menos 3 meses;
◆ Não houver outra causa que explique os sintomas.
Diagnóstico Diferencial
Diagnóstico Diferencial
A fibromialgia possui também uma ampla gama de diagnósticos diferenciais,
principalmente aqueles que cursam com dor crônica. Dentre os principais, temos:
➔ Síndrome Miofascial
➔ Osteoartrite
➔ Artrite reumatoide
➔ Espondiloartrites
➔ Hipotireoidismo
➔ Deficiência de vitamina D/osteomalácia
➔ Polimialgia reumática
➔ Miopatias inflamatórias
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➔ Distrofias musculares
➔ Parkinsonismo
➔ Hipopotassemia
➔ Uso de certos medicamentos (estatinas, bloqueadores de H2) ou drogas ilícitas
(cocaína, cannabis).
Tratamento Geral
➔ Não medicamentoso
◆ Educação do paciente sobre a doença;
◆ Exercícios músculo-esqueléticos;
◆ Terapia cognitivo-comportamental.
➔ Medicamentoso
◆ Antidepressivos tricíclicos;
◆ Relaxantes musculares;
◆ Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs);
◆ Inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSNs);
◆ Inibidor da monoamina oxidade (MAO);
◆ Antagonista de serotonina;
◆ Antiparkinsonianos;
◆ Analgésicos simples e opiáceos leves;
◆ Gabapentinoides.
Tratamento Medicamentoso
Infiltração Anestésica Local
➔ Mecanismo de ação
Os Anestésicos Locais atuam na membrana celular ligando-se reversivelmente a um
receptor específico no poro dos canais de sódio (Na +) dos nervos. O processo de
condução de fenômenos excitatórios através do nervo é resultado de fenômenos
eletroquímicos. A condutibilidade se dá através de uma diferença de potencial da
membrana, que tem seu interior mais negativo que o exterior, estabelecido
principalmente pela bomba de sódio e potássio, transportando sódio para o meio
extracelular e potássio para o meio intracelular. AL impedem a geração e condução de
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impulsos nervosos ao interferir na permeabilidade da membrana ao sódio, bloqueando
esses canais e impedindo a condução de estímulo na fibra nervosa. A gradação de
bloqueio nervoso é afetada pelo diâmetro do nervo. Quanto maior o diâmetro da fibra
nervosa, maiores as concentrações de fármaco para atingir um bloqueio eficiente.
➔ Indicado para Fibromialgia?
Muito indicado, uma das principais formas de tratamento.
Antidepressivos Tricíclicos
➔ Mecanismo de ação
◆ Inibição da captação do neurotransmissor: Os ADTs e a amoxapina são
inibidores potentes da captação neuronal de norepinefrina e serotonina no
terminal nervoso pré-sináptico. A maprotilina e a desipramina são
inibidores relativamente seletivos da captação de norepinefrina.
◆ Bloqueio de receptores: Os ADTs também bloqueiam os receptores
serotoninérgicos, α-adrenérgicos, histamínicos e muscarínicos. As ações
nesses receptores provavelmente são responsáveis por muitos dos seus
efeitos adversos. A amoxapina também bloqueia os receptores 5-HT2 e
dopamina D2.
Estes fármacos agem alterando o metabolismo da serotonina e a noradrenalina, e nos
nociceptores periféricos e mecânico- receptores, promovendo analgesia periférica e
central, potencializando o efeito analgésico dos opióides endógenos, aumentando a
duração da fase 4 do sono n-REM, melhorando os distúrbios de sono e diminuindo as
alterações de humor destes pacientes.
A amitriptilina de 12,5-50mg, ministrada normalmente de 2 a 4 horas antes de deitar,
demonstra melhora na fadiga, no quadro doloroso e no sono destes pacientes.
A ciclobenzapina, um agente tricíclico com estrutura similar à da amitriptilina, é uma
droga que não apresenta efeitos antidepressivos, sendo utilizada como miorrelaxante.
Doses de 10 a 30 mg, tomadas 2 a 4 horas antes de deitar, apresentam eficácia
significativa no alívio da maioria dos sintomas da fibromialgia. A eficácia e a
tolerabilidade da amitriptilina e da ciclobenzapina no tratamento da fibromialgia podem
ser consideradas semelhantes.
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➔ Indicado para Fibromialgia?
Sim. Constitui um dos principais tratamentos.
AINES
➔ Mecanismo de ação
Os principais efeitos terapêuticos dos AINE derivam de sua capacidade de inibir a
produção de PG. A primeira enzima na via sintética das PG é a COX , também conhecida
como PG G/H-sintase. Essa enzima converte o AA nos intermediários instáveis PGG2 e
PGH2, além de promover a produção de prostanóides, TxA2 e uma variedade de PG. A
COX -1, que é expressa na maioria das células, constitui a fonte dominante de
prostanóides para funções de manutenção, com a hemostasia . Em contrapartida, a COX
-2, induzida por citocinas, estresse de cisalhamento e promotores de tumor, é a fonte
mais importante de formação de prostanóides na inflamação e, talvez, no câncer. Todavia
, ambas as enzimas contribuem para a geração de prostanóides autorreguladores e
homeostáticos , com importantes funções na fisiologia normal.
➔ Indicado para Fibromialgia?
Não faz parte da primeira linha de tratamento.
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