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Direito Constitucional Aplicado Milena Barbosa de Melo e Silvia Cristina da Silva Artigo científico DIREITO CONSTITUCIONAL APLICADO Milena Barbosa de Melo1 Silvia Cristina da Silva2 RESUMO O estudo que se apresenta tem como objetivo primordial apresentar uma maneira eminentemente simplificada sobre constituição, poder constituinte e controle de constitucionalidade. Portanto, será possível no decorrer da leitura compreender não apenas definições técnicas, mas essencialmente sua materialização concreta, ou seja, será possível que o leitor consiga entender como o estudo funciona na prática. O artigo foi dividido em três capítulos, e inicia tratando de questões gerais, mas bastante essenciais sobre o conceito de constituição e suas classificações, bem como a Constituição Brasileira passa a se apresentar. Em seguida foi possível compreender o funcionamento do poder constituinte e, por fim, no terceiro capítulo se apresentou as minúcias que giram em torno do processo de constitucionalidade. Palavras-chave: Constituição. Poder Constituinte. Controle de Constitucionalidade. Desenvolvimento. Democracia. INTRODUÇÃO O presente texto tem como objetivo apresentar os elementos de substancial importância para o processo de realização das atividades no âmbito do sistema constitucional brasileiro. Sendo assim, o estudo será dividido em três capítulos nos quais será possível compreender não apenas definições e funcionamento sobre a Constituição, poder constituinte e controle de constitucionalidade, mas essencialmente, perceber o processo de funcionamento de todo o ordenamento jurídico brasileiro a partir de uma perspectiva meramente constitucional. Será, portanto, possível que se entenda como se deu o surgimento da Constituição Federal (CF) de 1988, comumente denominada de Constituição Cidadã. Ademais, em seguida, será possível compreender o processo de classificação específico de cada Constituição e, em especial da Constituição Brasileira. No capítulo 2, o leitor poderá compreender o funcionamento do Poder Constituinte para que, ao fim da leitura, seja possível perceber o processo de realização do controle de constitucionalidade de determinados dispositivos constitucionais. Sendo assim, no último capítulo o leitor poderá aperfeiçoar os estudos voltados ao controle de constitucionalidade, sabendo exatamente qual tipo de instrumento deverá ser interposta em qual situação e, por fim, não menos importante, será possível entender o funcionamento do controle de constitucionalidade no âmbito dos tratados internacionais como uma ferramenta essencial para fomentar a segurança nacional. O estudo apresentado foi construído a partir de coleta de dados para sistematização das jurisprudências e, ainda, por meio de pesquisa bibliográfica. 1 Doutora em Direito Internacional pela Universidade de Coimbra- Portugal. Professora Universitária- UEPB. Consultora e pesquisadora Jurídica. E-mail: milenabarbosa@gmail.com 2 Mestre Interdisciplinar em Educação, Ambiente e Sociedade – UNIFAE. Professora Universitária. E- mail: silviaadvbidi@gmail.com 1 CONSTITUIÇÃO: INÍCIO E FIM O processo de construção e funcionamento de uma sociedade invoca, de maneira direta, uma projeção superior de organização, situação que acaba por ser evidenciada pelo exercício do poder pelo líder que se encontra naquela sociedade. 1.1 Aspectos Conceituais da Constituição Muitas são as formas de organização do Estado, de maneira que se percebe a impossibilidade de universalizar uma única maneira para estabelecimento das regras que serão aplicadas por cada ente estatal. Desta maneira, torna-se possível identificar que, em determinados países, o processo normativo atravessa características eminentemente participativas, mas em outros países a condição de participação da sociedade pode ser dada de maneira menos interativa. Contudo, muito embora exista a diferenciação nesse processo de participação democrática nos países, não se pode olvidar que, mesmo nos países com liberdades fundamentais restritas, existe uma regra suprema que tem por objetivo não apenas descrever as instituições, mas, também, observa um caráter de extrema importância que é o de influenciar a sua organização e, em consequência, o seu funcionamento. Partindo da importância excepcional de existir um texto superior que tenha como objetivo primordial a organização e funcionamento de qualquer Estado, identifica-se a presença de um instrumento que reveste tais exigências e, que durante o processo de evolução e consolidação de um território, veio a ser sedimentada, nomeadamente, Constituição. Nesse sentido, torna-se razoável indicar a compreensão acerca do fundamento basilar da constituição realizada por Silva (1999 p. 37) “ao indicar como lei fundamental no processo de funcionamento do Estado e, nesse caso, acaba por englobar a forma de governo, direitos e garantias que são fundamentais para a sociedade, exercício do poder”. Em resumo, pensar a Constituição a partir deste paradigma, identifica-se apenas como um instrumento que seria responsável por organizar o equacionamento das relações que surgem com os elementos constitutivos do Estado, nomeadamente, povo, poder e território. Entretanto, muito embora se saiba que existe uma forte ligação entre o instrumento constitucional e, ainda, os elementos constitutivos, não se pode deixar de observar que a compreensão da definição do conceito e funcionamento do Estado devem perpassar também em outros aspectos, nomeadamente, sociológico político, jurídico e cultural. A compreensão de Constituição a partir de uma perspectiva sociológica indica que deve possuir em seus meandros características da força social, como é a proposta apresentada por Ferdinand Lassale (1985) que a formação de uma constituição deve transcorrer a somatória dos fatores reais do poder dentro de uma sociedade. Já no sentido político indica-se a compreensão de que a formação de uma Constituição decorre do conjunto de expressões políticas que emanam de uma sociedade e, ao ser sistematizada pelo instrumento que exerce o poder, estabelece- se um conjunto de preceitos essenciais. O sentido jurídico da Constituição é evidenciado por Hans Kelsen, no qual indica que o documento constitucional reveste uma característica evidentemente de uma obrigação do “dever-ser” e, portanto, afasta a concepção naturalista do texto legal da constituição, visto que ressalta a participação direta do homem na construção das normas constitucionais e, portanto, especifica que o referido texto decorre da vontade anunciada pelo conjunto de pessoas que se encontram naquele território. Ademais, torna-se importante observar o preceituado por Lenza (2018 p. 28) ao observar que: E, por fim, como visto, a Constituição Nacional encontrará o seu fundamento de validade na norma hipotética fundamental, esta, o fundamento de validade de todo o sistema. Trata-se de norma suposta, e não posta, uma vez que não editada por nenhum ato de autoridade. Figura no plano logico- jurídico, prescrevendo a observância do estabelecido na Constituição e nas demais normas jurídicas do sistema, estas últimas fundamentadas na própria Constituição. A norma fundamental, hipoteticamente suposta, prescreve a observância da primeira constituição histórica. Nesse sentido, observa-se, tão somente que, nessa concepção, o sistema constitucional é apresentado numa seara eminentemente verticalizada, onde as normas inferiores deverão estar em consonância com o evidenciado pela norma superior. No caso da concepção da Constituição a partir de um sistema cultural observa-se que o texto constitucional decorre de fatos culturais que são identificados pela sociedade que, em conformidade ao estabelecido por Canotilho: as Constituições positivas são um conjunto de normas fundamentais, condicionadas, pela Cultura total, eao mesmo tempo condicionantes destas emanadas da vontade existencial da unidade política e, reguladoras da existência, estrutura e fins do Estado e do modo de exercício e limite do poder político. (CANOTILHO, 2005, p. 70). Ao analisar as concepções, observa-se que existe uma situação bastante clara: o unilateralismo, ou seja, muito embora existam evidências positivas em cada ponto apresentado, não se pode limitar a compreensão do texto constitucional a apenas uma concepção, seria, portanto, pecar por restrição de valores e fundamentos essenciais para a construção de um todo. É justamente nesse aspecto que se evidencia a necessidade de se estruturar uma compreensão uniforme de Constituição, de maneira que todos os elementos venham a ser evidenciados. Numa concepção abrangente, o processo de construção de uma Constituição pertencente a um Estado de direito é revista de compostos coletivos, onde variados elementos da vida em sociedade são levados em consideração para a construção de um texto que irá estruturar e ordenar todas as atividades. E, neste aspecto, observa-se o evidenciado por Silva (1999) ao apontar que uma Constituição é um conjunto de elementos que, unidos pela situação coletiva e social, apresenta uma estrutura especial cujo objetivo substancial é a realização de atividades benéficas para o território. Portanto, tem a possibilidade de criar e recriar, sempre que necessário, levando em consideração a necessidade apresentada pela sociedade. Sendo assim, o objetivo primordial de uma determinada Constituição é estruturar um sistema estatal em suas variadas atribuições, nomeadamente, a fixação do regime político, especificação dos direitos e garantias fundamentais da sociedade, o fundamento dos direitos econômicos, culturais e, por fim, sociais. Dessa maneira, observa-se que, independentemente de sua concepção, uma Constituição deverá zelar pelo bem coletivo e, em assim fazendo, os interesses da sociedade estarão fundamentalmente protegidos. Destaca-se, portanto, que o objetivo de uma Constituição deverá ter pressupostos amplamente interdisciplinares, visto que se torna essencial equacionar diversos interesses sociais. 1.2 Classificação das Constituições No que tange a especificação das espécies de Constituição que pode ser identificada nos estudos desenvolvidos no Âmbito do Direito Constitucional, há diversas classificações. O que deve ser levado em consideração nesse estudo é que a classificação ocorre a partir de critérios específicos, nomeadamente: • Origem; • Modo de elaboração; • Conteúdo; • Forma; • Estabilidade. Dessa maneira, de acordo com o critério “origem”, as constituições poderão ser promulgadas e outorgadas. Uma constituição promulgada tem como pressuposto essencial a participação popular, visto que será construída a partir da votação de uma Assembleia Nacional Constituinte, cujos membros foram eleitos através da realização de sufrágio para exercer as funções na referida Assembleia. Nesse sentido, observa-se o especificado por Silva (1999, p. 43) que “são populares ou democráticas as constituições que se originam de um órgão constituinte composto de representantes do povo, eleitos para o fim de as elaborar e estabelecer”. Portanto, torna-se perceptível que o pressuposto essencial para a construção de uma constituição promulgada é a participação popular e, de fato, isso se torna possível quando existe a possibilidade de a população se inserir no contexto político. No caso do ordenamento jurídico brasileiro é comum a realização desse processo de participação na construção do texto Constitucional de maneira que, não apenas a Constituição Federal de 1988 se encaixe no referido rol, mas também as constituições de 1891, 1934 e 1946. De maneira contrária ao especificado nas constituições promulgadas, observa-se que nas constituições outorgadas não existe a participação da população no decorrer do processo de elaboração do texto da Constituição e, portanto, será o próprio agente que detém o poder político que irá impor as determinações sem anuência da população. Este tipo de Constituição não se coaduna com as especificações observadas em países democráticos, mas países que detém uma visão política autoritarista. Muito embora o Brasil, nos dias atuais, apresente uma Constituição que é constituída a partir da participação popular, já existiu, em sua história, a presença de textos constitucionais outorgados pelo poder político, como foi o caso das Constituições de 1824, 1937, 1967 e 1969. Dando seguimento ao estudo das classificações das Constituições tem-se aquela que decorre da forma de elaboração do texto constitucional, que pode ser dogmática e histórica. No primeiro caso, objetiva-se a elaboração de um texto constitucional a partir de teorias e dogmas que prevalecem no momento em que o documento está sendo estruturado. No segundo caso, a Constituição é elaborada resultante do processo evolutivo da história do Estado. A partir da perspectiva de Lenza (2018, p. 41) “a constituição histórica é fruto de um lento e contínuo processo de formação ao longo do tempo e, portanto, reúne não apenas, a história, mas também os costumes do país”. Em seguida, no terceiro ponto, observa-se a classificação de uma constituição quanto ao conteúdo e, assim, as constituições podem ser formais ou materiais. No primeiro aspecto observa-se que a Constituição tem como pressuposto essencial a maneira como o texto constitucional se apresenta, ou seja, numa Constituição formal prevalece a maneira como ela é construída e, não essencialmente, o conteúdo de suas normas. Portanto, compreende-se que uma Constituição só pode ser classificada como formal quando é apresentada de maneira solene em um documento escrito a partir do exercício do poder constituinte e, ainda, só poderá sofrer algum tipo de modificação quando existir um processo próprio que permita a modificação. Diante do exposto, observa-se que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é eminentemente formal, visto que qualquer dispositivo previsto na constituição tem caráter constitucional e, portanto, só poderá ser modificada se atravessar um processo de modificação peculiar que, no caso do Brasil, seria através da Emenda Constitucional. Referente à classificação material, a Constituição observa o seu conteúdo e, não a maneira como ela foi incorporada no texto constitucional. Dessa maneira, será observado que mesmo as normas que façam parte de uma constituição escrita, mas não possuam o caráter específico necessário, não poderão ser consideradas normas constitucionais. Quanto à forma, as Constituições podem ser classificadas tanto na modalidade escrita, como na modalidade não escrita. Vários questionamentos podem surgir neste momento no sentido de tentar compreender como é que uma Constituição pode não estar devidamente formalizada em algum texto específico, mas é o que ocorre, por exemplo, na Inglaterra, onde as normas constitucionais não estão dispostas em um documento único e formal. O que pode ser destacado neste ponto é que são Constituições em que a utilização dos costumes, jurisprudência e normas internacionais são preponderantes. Segundo Lenza (2018, p. 38) “a classificação da constituição como escrita é estabelecida por um complexo de normas que foram sistematizadas em um único documento”. Ademais, observa-se que as normas que compõem um sistema escrito são evidentemente fundamentais para a formação de um Estado. Portanto, nesse aspecto, observa-se que a Constituição Brasileira de 1988 encontra-se no panorama de Constituição Escrita, pois seu texto é devidamente sistematizado e organizado em um documento único a partir das normas que são essenciais para o funcionamento do Estado de direito. E, por fim, observa-se uma classificação que se refere à estabilidade da estrutura constitucional que pode ser segundo grande parte da doutrina: rígida, flexível e semirrígida.No primeiro aspecto, observa-se que rígida é aquela Constituição capaz de permitir modificações em seu texto a partir de medidas específicas e formais. Isso implica, necessariamente, a realização de um processo eminentemente complexo, que difere, contudo, do processo que se aplica na criação de legislação infraconstitucional. No que se refere às constituições flexíveis observa- se a possibilidade de modificação do texto constitucional através do mesmo processo que se destina à criação de uma lei ordinária. E, por fim, no que tange às constituições semirrígidas existe a inclusão das duas formas apresentadas anteriormente e, portanto, o processo de mudança no texto constitucional para questões consideradas materialmente constitucionais só pode ocorrer através de um procedimento rigoroso e, as demais questões tratadas no documento constitucional podem ser modificadas a partir de um processo padrão que estabelece a criação de uma lei ordinária. No caso, o sistema constitucional brasileiro adota a classificação rígida, visto que o processo de modificação do texto constitucional só pode ocorrer através de procedimento rigoroso próprio, ou seja, através de procedimento constitucional. 1.3 Aplicabilidade das Normas Constitucionais Ao se deparar com textos constitucionais surge, automaticamente, uma questão eminentemente importante que vem a ser a estruturação do estado de bem estar social a partir das diretrizes estabelecidas nas normas construídas para este feito. E, consequentemente, o Sistema Normativo Constitucional acaba por ser enquadrado como o sistema legal mais importante de todo o ordenamento jurídico de um país e, portanto, deve ser observado que todas as demais normas que compõem o complexo jurídico daquele país devem estar em consonância com o especificado em seu texto. Assim, ao se perceber o fenômeno da hierarquia normativa na estrutura constitucional, observa-se que a eficácia do conjunto de regras constitucionais só poderá ser observada quando houver, de fato, equilíbrio entre todos os entes normativos dispostos no ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido, a construção da aplicabilidade das normas constitucionais só pode ser observada em constituições rígidas, em virtude justamente, da sua estrutura hierarquizada e, portanto, as normas que estão num patamar inferior no conjunto constitucional devem, necessariamente, estar em consonância ao estabelecido pelo texto Constitucional de um país. Ademais, no que tange ao texto constitucional, observa-se que devem apresentar eficácia, mas alguns pontos podem versar sobre questões eminentemente jurídicas e outras com um caráter social. Nessa mesma compreensão, Temer (2002, p. 23) especifica que: eficácia social se verifica na hipótese de a norma vigente, isso é, com potencialidade para regular determinadas relações, ser efetivamente aplicada a casos concretos. Eficácia jurídica, por sua vez, significa que a norma está apta a produzir efeitos jurídicos na medida em que a sua simples edição resulta na revogação de todas as normas anteriores que com ela conflitam. (TEMER, 2002, p. 23). Observa-se que, muito embora as normas constitucionais devessem estar em pleno sistema de funcionamento e aplicabilidade no sistema social de um país, essa questão irá depender, contudo, do tipo de conteúdo que estiver contido em seu texto normativo. Sendo assim, as normas constitucionais podem ser de eficácia plena, contida e limitada. (NASCIMENTO, 2005, sp) No primeiro ponto, nomeadamente normas de eficácia plena encontram-se aqueles dispositivos normativos que possuirão vigência e eficácia apenas com o processo de publicação de seu texto. Em seus estudos sobre aplicabilidade das normas, Silva (1999, p. 101) especifica que: normas constitucionais de eficácia plena são as que receberam do constituinte normatividade suficiente à sua incidência imediata. Situam-se predominantemente entre os elementos orgânicos da constituição. Não necessitam de providência normativa ulterior para sua aplicação. Criam situações subjetivas de vantagem ou de vínculo, desde logo exigíveis. (SILVA, 1999, p. 101). Portanto, parece apropriado observar que o sistema observado nas normas de eficácia plena reveste a condição de auto aplicabilidade, bastante similar, contudo, ao apresentado pelo sistema constitucional norte americano. As normas de eficácia plena afastam a necessidade de utilização da existência de um instrumento posterior para que a norma cumpra seu efeito legal. Não existe, portanto, nenhum questionamento sobre sua funcionalidade, pois ela apresenta um sistema claro e direto. No sentido de facilitar o processo de compreensão no que se refere às normas de eficácia plena indica-se a especificação do preceituado nos seguintes dispositivos constitucionais, nomeadamente o artigo 2º da Constituição Federal ao estabelecer que os poderes executivo, legislativo e judiciário estão diretamente relacionados com a União; o artigo 14º § 2º ao especificar § 2º determinadas restrições para o processamento de alistamento eleitoral. Ainda no que se refere ao processo de compreensão das normas constitucionais de eficácia plena, observa-se o julgado a seguir, onde fica claro que o STF reconhece, de fato, a autonomia da defensoria pública estadual conforme a EC45/02 e, portanto, torna improcedente o pedido realizado pelas partes ao contestar essa possibilidade. O Tribunal, por unanimidade, julgou procedente a ação direta para declarar a inconstitucionalidade da alínea "c" do inciso IV do artigo 2º da Lei nº 12.775, de 22 de março de 2005, do Estado de Pernambuco, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente. Licenciada a Senhora Ministra Ellen Gracie (Presidente). Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente). Plenário, 02.04.2007 (ADI3569, Rel Min. Sepúlveda Pertence, 02.04.2007, DJ, 11.05.2007). As normas de eficácia contida possuem uma estruturação diferenciada, pois apesar de se perceber eficácia no ato da publicação da norma, exige-se a materialização de um dispositivo normativo infraconstitucional para que a eficácia seja de fato, sedimentada. Dessa maneira, segundo Lenza (2018, p. 136) “ao tratar de normas constitucionais de eficácia contida observa que a norma infraconstitucional poderá, de certa forma, ocasionar uma redução na abrangência e eficácia da norma constitucional”. No caso que se apresenta com as normas de eficácia contida existe, verdadeiramente, um caráter limitativo e restritivo da norma constitucional e, portanto, sua eficácia depende de instrumentos normativos que surjam posteriormente à publicação da norma em comento. Por isso, torna-se conveniente observar o especificado por Silva (1999, p. 7) ao perceber que normas constitucionais de eficácia contida são: aquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos à determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do Poder Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas anunciados. (SILVA, 1999, p. 7). Dessa maneira, observa-se que existe realmente a previsão normativa de determinado direito no sistema constitucional, mas que, posteriormente, surgem determinadas circunstâncias que apresentam uma limitação ao ponto normativo e, portanto, uma norma infraconstitucional deverá surgir para que o aspecto normativo tenha eficácia de fato. Vejamos, por exemplo, as questões relacionadas ao exercício da profissão de médico e advogado, onde inicialmente a questão pode ser enquadrada no livre exercício da profissão, ou seja, tendo o direito de desempenhar a função que se deseja, mas a liberdade não é irrestrita, pois depende que o profissional esteja devidamente inscrito no órgão correspondente, no caso do médico o conselho regional de medicina e, no caso do advogado a OAB. Observa- se,portanto que, após a edição da norma que estabelece o exercício livre da profissão, posteriormente surge a necessidade de que o profissional esteja devidamente inscrito na associação profissional correspondente. Por fim, observa-se o caso das normas de eficácia limitada que compreende- se como aqueles dispositivos normativos que não possuem a força real para produzir todos os efeitos normativos que são inerentes à condição de um dispositivo constitucional e, portanto, necessitam, para que se torne eficaz, de uma norma infraconstitucional que venha integrá-la no sistema normativo. Assim, , observa-se que existe o estabelecimento de um dever para o legislador pátrio, que inspiram o processo de organização estatal e, ainda constroem um sentido teleológico no processo de aplicabilidade das normas. Ao observar a existência de normas de eficácia limitada pode surgir o questionamento da sua real necessidade no âmbito do sistema jurídico de um país. A resposta pode ser encontrada tão somente ao se perceber que as referidas normas possuem um caráter valorativo e, portanto, acabam por conceder ao sistema normativo como um todo a possibilidade de se ampliar a sua aplicação e, consequentemente o favorecimento de toda a sociedade. Contudo, mesmo em se tratando de normas constitucionais de eficácia limitada, torna-se possível identificar na Constituição Federal de 1988, exemplos essenciais, nomeadamente, o artigo 7º, XX que “especifica a proteção do trabalho da mulher através de medidas específicas. Fica evidente que, nesse caso, a norma constitucional especifica apenas a importância de respeito do gênero feminino no mercado de trabalho” e, por isso, para que “haja a integração da mulher no mercado de trabalho brasileiro, outras normas que integrem a mulher de maneira adequada ao que supõe a Constituição Federal se torna essencial”. 1.4 A Constituição Brasileira de 1988 face à sua classificação No que se refere ao processo classificatório da Constituição Brasileira de 1988 encontra-se um aspecto eminentemente particular, pois apresenta a seguinte classificação: promulgada, escrita, analítica, formal, rígida e dogmática. Os aspectos que hoje podem ser encontrados no processo classificatório da Constituição Federal representam, de fato, o aperfeiçoamento que surge em decorrência do processo evolutivo no âmbito da ordem jurídica e social na sociedade brasileira. E, durante todo o texto constitucional, torna-se possível perceber que a sistematização dos conteúdos constitucionais favorece aspectos do estado de bem estar social. A Constituição Federal de 1988 é promulgada, pois foi pensada em conjunto com um sistema social democrático, visto que, após quase 20 anos de ditadura e, com a manifestação da população através dos atos representados pelas “Diretas Já”. Surge, inevitavelmente um aumento significativo da participação popular nas decisões do governo, que foi sedimentada através da criação de uma comissão própria de estudos constitucionais cujo objetivo era realizar pesquisas acerca dos interesses da população brasileira e, em seguida, apresentar soluções fundamentais para que as necessidades fossem integradas no trabalho a ser desenvolvido pela assembleia nacional constituinte. Como consequência do processo de organização da Constituição de 1988 surge um texto extenso com 245 artigos e, diante do seu aspecto de participação da sociedade, denominou-se de constituição cidadã. E, muito embora seja um conjunto normativo complexo e extenso e, em virtude de alguns dispositivos normativos terem eficácia contida ou limitada, existe a necessidade de uma norma infraconstitucional com o objetivo de tornar eficaz aquele dispositivo constitucional. A CF de 1988 estrutura vários elementos e, em especial, alguns pontos que modificaram a maneira de como o sistema político-social deveria se apresentar, nomeadamente, a previsão de uma eleição direta que poderá ocorrer através de dois turnos, implementou a independência do poder judiciário, ampliação dos direitos do trabalhadores, a possibilidade de se emitir medidas provisórias onde será permitido ao presidente emitir em situações de emergência determinadas regras e que, posteriormente serão apreciadas pelo congresso nacional. Por fim, um extenso texto de especificação e proteção dos direitos fundamentais. Em seguida, observa-se que a CF de 1988 tem o caráter de rigidez, pois observa que o texto Constitucional, como um todo, só pode ser modificado a partir de um método jurídico próprio. Portanto, a CF de 1988 sendo rígida vem admitir ainda a possibilidade de modificação em seu texto, mas este procedimento só pode ocorrer a partir de uma medida judicial rigorosa, de maneira que a modificação do sistema constitucional se dará, portanto, através de emenda constitucional. No que se refere ao processo de extensão da CF de 1988, aplica-se a classificação de ser analítica, em virtude do grande volume de informações que se apresente em seu texto constitucional. Durante o texto constitucional é possível identificar a presença de elementos que evidenciam o valor de uma sociedade democrática, o respeito à diversidade e, em especial, respeito à vida. Deixa claro que o sistema brasileiro tem o dever de estabelecer políticas de igualdade no sentido de reduzir a pobreza. Apresenta também um rol extenso de direitos e garantias que são essenciais na vida de qualquer indivíduo que esteja no território brasileiro, sendo ele, nacional ou estrangeiro. Portanto, a CF de 1988 traz com minúcias a importância do valor humano e, ainda, de como alcançar uma vida digna e fraterna e, isso pode ser percebido logo no início com o evidenciado no texto Constitucional que está descrito da seguinte forma: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem- estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (BRASIL, 1988). A Constituição Federal de 1988 ainda é escrita e, muito embora, se questione que todas as constituições sejam, rememora-se o evidenciado no tópico anterior sobre a constituição inglesa. Dessa maneira, no caso do texto brasileiro, existe a formalização do conteúdo constitucional através de um escrito único, afastando, portanto, a utilização direta do sistema costumeiro. O que se percebe com os elementos apresentados acerca da Constituição Federal de 1988 é que o texto seria o resultado de reivindicações da população no que tange aos direitos e garantias fundamentais, mas que apesar das lutas observadas no âmbito da sociedade brasileira, observa-se que existe a evidência em muitos pontos do respeito ao exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, bem-estar, justiça e igualdade, dentre outros. Sendo assim, não se pode olvidar a grande responsabilidade que não apenas os governantes, mas também que toda a sociedade possui, no que tange ao respeito e motivação da democracia. É essencial, portanto, respeitar todos os preceitos estabelecidos pela constituição, não apenas por ser uma carta suprema, mas essencialmente por favorecer uma ordem jurídica fundamental de um Estado. 2 CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS E O PODER CONSTITUINTE Como visto, o termo Constituição pode ser compreendido em diferentes acepções. No sentido amplo, Constituição pode ser compreendida como ato de constituir, firmar, formar ou organizar, de outro lado, juridicamente a Constituição pode ser entendida como a Lei fundamental e suprema de um Estado, a qual, em suas normas, define a estrutura ea organização do Estado, estabelecendo a forma de Estado, a forma de Governo, o sistema de Governo e demais normas relacionadas aos Poderes do Estado (MORAIS, 2019). No entanto, é fato que a Constituição traduz também o contexto histórico em que surge, é mantida ou até modificada. Nesse sentido, Ferraz (1994) afirma que a Constituição não se desliga do fator social e do contexto dos valores que pretende realizar. Esse contexto histórico revelado por meio da Constituição pode ser muito bem percebido na história das Constituições Brasileiras, isso porque tivemos ao menos sete Constituições de 1824 a 1988. Assim, analisaremos as seguintes Constituições Brasileiras: de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, Emenda Constitucional 1/1969, e 1988. A Constituição de 1824 foi antecedida de marcos históricos, dos quais a Constituição não pode se dissociar. A sequência histórica entre a vinda da corte Portuguesa para a colônia Brasil, o retorno de D. João XI a Portugal, e o posterior de Dia do Fico, de 1822, promovido por D. Pedro I ao negar o retorno para Portugal, antecedem a independência do Brasil que gerou a necessidade da elaboração de uma Constituição. No período pós-independência do Brasil, D. Pedro I convocou a primeira Assembleia Constituinte e Legislativa, mas as ideias liberais confrontavam os interesses e pretensões pela permanência do poder de um só homem, divergência que resultou na dissolução arbitrária da Assembleia (LENZA, 2018). Logo após dissolver a Assembleia, D. Pedro I cria o Conselho de Estado com o objetivo de tratar dos negócios de maior monta e, portanto, elaborar uma Constituição que estivesse de acordo com os interesses totalitários (LENZA, 2018). Em 25 de março de 1824, foi outorgada a Constituição Política do Império do Brasil, a qual durou cerca de 65 anos, tendo como características o centralismo político e administrativo, pela manutenção do absolutismo e unitarismo do Poder do Estado, além do Poder Moderador. A Constituição de 1824 estruturou o Estado Brasileiro como sendo um Estado unitário e governado por uma Monarquia Constitucional, o território brasileiro passou de capitanias hereditárias para províncias, a religião oficial era a da Igreja Católica Apostólica Romana, mas permitiam-se cultos domésticos e particulares de outra religião (LENZA, 2018). Outro ponto interessante previsto na Constituição de 1824 foi a instituição do Rio de Janeiro como capital do Império e posterior transformação deste em Município da Corte, tendo sua submissão direta ao Poder Central e não ao poder da Província, isso por meio de adição a Constituição sob o fundamento do Ato Adicional de 1834 e Lei n. 12/1832 (LENZA, 2018). Contudo, o ponto mais importante da Constituição de 1824 foi a previsão do Poder Moderador. Na contramão da Teoria da Montesquieu, na qual o poder do Estado seria separado em três Poderes, no caso, o Poder executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário, o Brasil, por meio da Constituição de 1824, inspirando-se nas ideias de Benjamin Constant, instituiu um quarto Poder, o Poder Moderador (LENZA, 2018). Segundo Lenza (2018), quanto ao Poder Moderador, há duas linhas de pensamento, a primeira linha mais liberal, na qual o Poder Moderador representaria um Poder de coordenação entre os demais Poderes. Já na linha mais conservadora seria um Poder superior que possibilitaria intervenções e imposições do Poder Moderador sobre os demais Poderes. Nesse sentido, o Poder Moderador literalmente moderava e moldava a vontade dos demais Poderes à vontade do Poder Central e absoluto do Imperador. Vale lembrar ainda que, o Poder legislativo no Império era constituído por duas câmaras, uma temporária que passava pelas eleições indiretas, e uma vitalícia, a dos Senadores. Em todos os Poderes o Imperador tinha sua influência. O voto, nesse período era censitário e baseado em critérios econômicos. A Constituição do Império do Brasil era semirrígida e continha alguns direitos civis e políticos. No entanto, apesar de dar alguns passos na direção dos ideais liberais, o Brasil permaneceu sendo uma nação escravocrata até a Lei Áurea em 1888. Antes de passarmos ao Decreto n. 1, de 15 de novembro de 1889 que instituiu o Primeiro Governo Provisório da República, vale ressaltar que, durante o período de vigência da Constituição de 1824 o Brasil vivenciou alguns movimentos populares bastante relevantes, que buscavam a separação ou melhores condições de vida. Lenza (2018), destaca os seguintes movimentos como marcos históricos: Cabanagem (Pará, 1835); Farroupilha (Rio Grande do Sul, 1835); Sabinada (Bahia, 1837); Balaiada (Maranhão, 1838); e Revolução Praieira (Pernambuco, 1848). O decreto que instituiu o primeiro Governo Provisório da República antecedeu justamente a Constituição de 1891. A Monarquia foi enfraquecendo e perdendo apoios basilares de sua manutenção, o que resultou na Proclamação da República pelo Marechal Deodoro da Fonseca, em 15 de novembro de 1889. A insatisfação dos Militares após a guerra do Paraguai, o Manifesto do Centro Liberal e o Manifesto Republicano enfraqueceram a Monarquia, que sofreu uma grande perda quando, em 1874, passou a ter grandes entraves com a Igreja Católica. De todo modo, apesar da queda da Monarquia e ascensão de um Estado republicano, a participação popular nesse processo foi mínima para não dizer nula. Nesse sentido, Lenza (2018, p. 131) afirma: “Isso porque, como visto, tratava- se mais de um golpe de Estado militar e armado do que qualquer movimento do povo. A República nascia, assim, sem legitimidade”. As províncias passaram a ser Estados reunidos na forma de Estado Federal, o qual constituiu os Estados Unidos do Brasil. O Decreto n. 1/1889 foi redigido por Rui Barbosa e instituía o Governo Provisório no Brasil, o qual deveria consolidar o Regime e promulgar a Constituição República, a primeira com a forma de governo Republicano. A Constituição de 1891 foi promulgada em 24 de fevereiro, decorrente da Assembleia Constituinte eleita em 1890. Sob a influência da Constituição dos Estados Unidos da América de 1787 e com a relatoria do Senador Rui Barbosa, o Brasil adotou a Federação como forma de Estado, a República como forma de Governo e o presidencialismo como sistema de governo. Observa-se que foi na Constituição de 1891 que foi instituído no Brasil o Federalismo, inclusive com previsão expressa à proibição de dissolução de qualquer dos Estados Membros, bem como a previsão do presidencialismo como sistema de governo. Em relação à Constituição de 1824, a de 1891 previu o Rio de Janeiro como Distrito Federal, mas manteve esse com status de Município e delimitou uma área para a construção do que seria a capital do Estado. Também foi com a Constituição de 1891 que o Brasil passou a ser um Estado Laico ou não confessional, cessando assim as relações políticas entre Estado e igreja, tais como o padroado e o beneplácito régio. Adotou-se ainda a Teoria Clássica de Montesquieu quanto a separação do Poder do Estado em três Poderes, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, sendo estes harmônicos e independentes entre si, extinguindo-se, portanto, o antigo Poder Moderador (LENZA, 2018). Quanto ao Poder Legislativo, este era exercido em duas casas, uma de representação do povo, na qual eram escolhidos os Deputados, mediante o sufrágio direto, porém de representação minoritária e, o Senado que seria a representação dos próprios Estados, eleitos de igual modo. O Poder Executivo, por sua vez, era exercido pelo Presidente da República, eleito por voto direto, mas não democrático, para um mandato de 04 anos, sem direito a recondução. Nos Estados-membros existiam os ditos presidentes estaduais ou governadores. Também foi com a Constituição de 1891 que passamos a chamar o órgão máximo do Poder Judiciário de Supremo Tribunal Federal. Também nesse período foi reconhecida a vitaliciedade para juízesFederais e a irredutibilidade de vencimentos (LENZA, 2018). A Constituição era classificada como rígida, exigindo-se maior solenidade para sua alteração, além da instituição de cláusulas pétreas. Também foram previstos direitos sociais e garantias, sendo extinta a pena de banimento ou morte, ressalvado o Estado de Guerra. Uma garantia constitucional expressa pela primeira vez foi a do Habeas Corpus. Em setembro de 1926 houve uma reforma constitucional que abalou a autonomia dos Estados, aumentado a possibilidade de intervenção da União nos Estado-membros, além de um movimento que se revelava bastante autoritário. O Período compreendido entre 1889 a 1929 ficou conhecido como a República Velha, essa, por sua vez, teve o seu fim em 1930 com a Revolução de 30 e a instauração de um Governo Provisório, por meio do Decreto n. 19.398 de 1930. Cumpre ressaltar que, nesse período, existia a famosa política do café com leite, em que os Estados de São Paulo e Minas Gerais alternavam-se no Poder e, consequentemente, na Presidência, havendo, no entanto, uma quebra quando Washington Luís buscou colocar como seu sucessor Júlio Prestes, também paulista (PINTO FERREIRA apud LENZA, 2018). Villa (2011) destaca que a década 1920 foi marcada pelas rebeliões tenentistas, além da coluna Prestes, que revelaram as contradições políticas existentes, as quais foram acentuadas após a vitória de Júlio Prestes, indicação do então governo de Washington Luís, nas eleições presidenciais contra Getúlio Vargas. Apesar da vitória, os rumores de fraude nas eleições tomaram o país, além da grave crise econômica reflexo da crise mundial de 1929. Ainda a esse respeito, Villa (2011, p. 30) aponta que “Depois de vários combates, da prisão e exílio de Washington Luís, no mês seguinte, Vargas assumiu a Presidência”. Ainda sobre os episódios sócio-políticos que resultaram na queda da República velha e na Revolução de 1930, Lenza (2018) aponta o assassinato de João Pessoa, que deflagrou o movimento militar no Rio Grande do Sul, e, é nesse contexto que uma Junta Militar transferiu o poder para um governo provisório. No mesmo norte, Villa (2011) afirma que a Revolução de 1930 não deixou resquícios do regime legal anterior, sendo, inclusive, fechado o Poder Legislativo e, para o poder executivo estadual passaram a nomear interventores (a exceção de Minas), além do controle do Judiciário ser exercido por aqueles que, naquele momento, estavam encabeçando o poder. Todo esse cenário é bastante crucial para a compreensão do governo provisório da Revolução de 30, bem como da Constituição de 1934. O Governo Provisório deteve os poderes do Estado até a promulgação da Constituição de 1934. A promulgação ocorreu em razão de pressões e irresignação com relação aos métodos arbitrários do Governo Provisório. Essas pressões tiveram como marco principal a Revolução Constitucionalista de São Paulo, no ano de 1932 (LENZA, 2018). Mas, como aponta Lenza (2018), o ponto positivo ocorrido durante o Governo Provisório foi o Código Eleitoral com a instituição da Justiça Eleitoral, além de medidas como o voto feminino e o sufrágio universal, direto e secreto. No dia 16 de julho de 1934 foi promulgada a nova Constituição, esta, por sua vez, deixou de lado a predominância do liberalismo econômico e da democracia liberal, características da República velha sob a égide da Constituição de 1891 (LENZA, 2018). Com relação à Constituição de 1934, Lenza (2018, p. 137) afirma que “sofreu forte influência da Constituição de Weimar da Alemanha de 1919, evidenciando, portanto, os direitos humanos de 2ª geração ou dimensão e a perspectiva de um Estado social de direito (democracia social)”. Mantiveram-se na Constituição de 34 a forma de Estado, a forma de Governo e o sistema de Governo, respectivamente, Federação, República e o presidencialismo. Quanto à Capital da República, a sede permaneceu no Município do Rio de Janeiro, com a observação aposta nas disposições transitórias da Constituição de que, após pesquisas, a Capital deveria ser transferida para uma localidade mais central do Estado Brasileiro e que, assim, o Distrito Federal passaria a ser um Estado. No, entanto, antes que essa transferência ocorresse, o Rio de Janeiro foi elevado a uma condição de Supermunicípio, equivalendo sua autonomia a autonomia de um Estado, observado os limites constitucionais da época. O Estado Laico foi mantido nesse período. (LENZA, 2018). Um ponto de divergência da República de 1934 para a República Velha é que não seriam mais duas casas de representação no Legislativo, mas sim uma em que Deputados e Senadores atuariam em colaboração, o que a doutrina chama de unicameralismo imperfeito (LENZA, 2018). A Câmara dos Deputados era composta por deputados eleitos diretamente e também por representantes de organizações, eleitos por estas, que traduziam uma influência fascista. Vale destacar que, foi em 1934 que os remédios constitucionais do Mandado de Segurança e Ação Popular tiveram uma previsão expressa no texto constitucional. No entanto, como a própria história revela, a Constituição de 1934 foi bastante efêmera e esbarrou no golpe de 1937. O cenário era, mais uma vez, de instabilidade, mas agora instaurado por feroz antagonismo entre a direita e a esquerda. A direita alinhava-se a influências fascistas e tinham um desejo declarado pelo autoritarismo. Já a esquerda era baseada nos ideais socialistas, comunistas e sindicais, e pendiam para a instauração do socialismo no Brasil. A Ação Integralista Brasileira era a representação da direita, e a representação da esquerda estava na Aliança Nacional Libertadora. Esse choque de forças contrárias e, de certo modo, radicais, resultou em medidas totalitárias pelo então governo da República. Getúlio Vargas, que somente terminaria seu mandato em 1938, após a intentona comunista liderada por Luís Carlos Prestes, decretou o estado de sítio em 1935, e no mesmo ano fechou a Aliança Nacional Libertadora com base na Lei de Segurança Nacional. O Congresso, em apoio a Vargas, declarou o estado de guerra e, diante desse cenário proclamou-se o golpe como uma salvação à ameaça do Comunismo. Assim, em 1937 instaurou-se uma ditadura ou como também chamam o Estado Novo, sendo outorgada a Constituição que ficou conhecida como a Polaca, em razão de sua influência fascista pela Constituição Polonesa de 1935 (LENZA, 2018). Destaca-se nesse período, o fechamento do parlamento, o domínio sobre o judiciário, e a nomeação de interventores para os Estados, ruindo assim a autonomia destes e, portanto, comprometendo o próprio federalismo. De outro lado, para atrair o apoio popular, desenvolveu-se nesse período uma política populista, tendo como carro chefe a Consolidação das Leis Trabalhistas. Por fim, no tocante às características do Estado nos moldes da Constituição de 1937, temos o esvaziamento prático do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, mesmo com a manutenção da teoria tríplice de Montesquieu. O Legislativo seria exercido sob a ótica do Conselho da Economia Nacional e do Presidente da República, sendo inexistente, no entanto, os senadores nessa configuração de Legislativo (LENZA, 2018). Tanto os Deputados quanto o Presidente da República eram eleitos de modo indireto. Todavia, vale destacar que havia previsão para o parlamento com representação dos Deputados, mas segundo a própria Constituição de 37, a Assembleia e o Senado estavam dissolvidos, exercendo, o Presidente, o Poder de expedir leis e decretos, até que fossem marcadas eleições para o novo parlamento (LENZA, 2018). Os direitos sociais sofreram forte encolhimento, além da inexistência de previsão de remédios constitucionais como o Mandado de Segurança e a Ação Popular, sem mencionar a atuação da Polícia Especial e a forte censura prévia que atingia a livre manifestação do pensamento, prevendo, inclusive, a pena de morte porcrimes considerados políticos. Outros pontos traumáticos da Constituição de 1937, fruto de um golpe, foram a suspensão de direitos individuais, a proibição de greves, a tortura como instrumento de repressão e outros, tudo debaixo da égide de uma Constituição e leis por ela resguardadas. O fim do golpe se aproximou quando Getúlio decidiu enviar a Força Expedicionária Brasileira para ajudar os países Aliados a combater os Países do Eixo, ou seja, países fascistas nos quais Getúlio inspirou-se para a Constituição de 1937. Assim, esse e outros eventos geraram insatisfação popular, mas principalmente das Forças Armadas. O Próprio Vargas assinou o Ato Adicional convocando eleições diretas, mas, ainda assim, foi tirado do poder pelos Generais Gaspar Dutra e Góis Monteiro, ou seja, retirado pelas Forças Aramadas. Após a retirada de Vargas, o presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, assumiu a presidência e iniciou o processo de redemocratização, revogando dispositivos da Constituição de 1937 que impediam o exercício democrático. Em 1945, a Lei Constitucional deu poderes ao Parlamento que seria eleito para atuar como Poder Constituinte. A Assembleia Constituinte ocorreu em 1946, promulgando em 18 de setembro de 1946 a Constituição de 46, que marcou definitivamente o fim do Estado Novo e a redemocratização do país. Na Constituição de 1946 foram retomados conceitos do Estado Liberal e do Estado social, assim buscou-se, por meio da Constituição, um equilíbrio entre a livre iniciativa e os direitos sociais (LENZA, 2018). Portanto, o país retomava sua plenitude como uma Federação Republicana e democrática, com sistema presidencialista. O Distrito Federal, localizado no Estado do Rio de Janeiro, passou a constituir o Estado da Guanabara, o qual foi posteriormente fundido com o Rio após a criação de Brasília. O mandado de segurança e a Ação popular foram restabelecidos, o Legislativo retornou a ideia de bicameralismo, e eleições diretas, o Presidente também seria eleito por voto popular. O Judiciário retomou o funcionamento natural. Após a situação política do Presidente Jânio e da negativa ao vice João Goulart, o Congresso instituiu o parlamentarismo, o qual foi derrubado por meio do referendo de 1963, com imediato retorno do presidencialismo. Em 1964, no entanto, sob a acusação de estar a serviço do comunismo internacional, João Goulart foi derrubado pelo movimento militar, instaurando-se a nova ordem revolucionária (LENZA, 2018). A partir de então começaram as edições dos Atos Institucionais, em abril de 1964 foi elaborado o AI n.1, no qual previu-se a possibilidade de aposentadoria de civis e militares, decretação de estado de sítio, e suspensão de direitos políticos sem observar os limites constitucionais. O AI 2/65 estabeleceu eleições indiretas para a presidência, o AI 3 fez o mesmo a nível estadual. Já em 1966, o Congresso foi fechado, sendo reaberto somente para a aprovação da Constituição de 1967, o que ocorreu mediante o AI 4/66 (LENZA, 2018). A Constituição de 1967 colocou em uma Carta Magna todas as intenções dos Atos Institucionais, e seguindo na linha da Constituição de 1937, restringiu direitos individuais e retirou garantias. Apesar de intitular o Estado como Federação, o federalismo nesse período aproximou-se bastante de um Estado unitário, tendo em vista a supressão da autonomia dos Estados e a centralização do poder no Presidente da República e esvaziamento dos demais poderes (LENZA, 2018). Em 1968 foi baixado o Ato Institucional n. 5, por meio de Emenda à Constituição, com uma serie de poderes conferidos ao Presidente que excediam ainda mais o autoritarismo do regime, e, além de já esvaziado, o Poder Legislativo foi suspenso com o decreto de recesso compulsório do Congresso Nacional, fora o fato de excluir de apreciação judicial atos praticados em nome do AI 5. Já em 1969 ocorreu a baixa pelo Militares da Emenda Constitucional n.1/69, autores como Lenza (2018) a consideram como uma forma de Constituição, tendo em vista seu caráter revolucionário. Foi por intermédio da Emenda Constitucional de 1969, que se constitucionalizaram os Atos Institucionais, mantendo o rigor de todos aqueles que já tinham sido produzidos anteriormente, além de aumentar o mando presidencial de quatro para cinco anos. Após essa emenda, tivemos a Lei Falcão que buscava restringir a propaganda eleitoral e assim prejudicar opositores, e o Pacote de Abril de 1977 que modificou a forma de emendar a Constituição e outras medidas. Mas, a partir do pacote de junho de 1978 iniciou-se o que seria a abertura política para mais uma redemocratização, marcada pela revogação do AI 5. O último governo militar foi o de Figueiredo que se findou em março de 1985, esse período foi marcado pela Lei da Anistia, Reforma Partidária, e pelo retorno às eleições diretas estaduais. Em 1983 ocorreu o movimento das Diretas Já. Em 1988, após a Assembleia Constituinte presidida por Ulysses Guimarães, promulgou-se a Constituição, por ele mesmo, denominada de Constituição Cidadã (LENZA, 2018). A Constituição de 1988 estabeleceu direitos e garantias fundamentais, nos colocou novamente como uma Federação Republicana e Democrática, e, após o plebiscito de 1993 previsto pelo Art. 3º das Disposições Transitórias, firmou-se como sistema de governo o presidencialismo. Lembrando que o voto passou a ser direto, secreto e universal. Os pontos marcantes de nossa atual Constituição são: as cláusulas pétreas, o bicameralismo, a independência e harmonia entre os Poderes do Estado, o pleno exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar social, o desenvolvimento, a promoção da igualdade, a justiça, separação da ordem econômica e da ordem social e outros valores supremos (LENZA, 2018). Associada a estes pontos, devemos acrescentar as classificações da Constituição Cidadã que foram traduzidas no capítulo anterior. As Constituições Brasileiras refletem um ciclo grande de influência das disputas políticas internas para a compreensão do fundamento do Estado e de sua soberania traduzida pelo ordenamento Jurídico. Após a análise das características das constituições e seus aspectos históricos, passaremos a compreensão do que seria o Poder Constituinte, cuja atuação foi discutida em algumas das constituições mencionadas acima. 2.1 O Poder Constituinte Barroso (2019), ao tratar de Poder Constituinte observa que, assim como a Constituição surge historicamente antes de uma conceituação enquanto fenômeno, o mesmo ocorre com o Poder Constituinte, ou seja, existindo uma organização política haverá uma força inicial que constituiu aquela organização, conferindo-lhe uma forma, normas e instituições. No mesmo sentido, Barroso (2019) aponta que a teoria constituinte perpassa pela estruturação do próprio Estado Moderno e do Constitucionalismo Moderno, passando, portanto, pela soberania e pela legitimidade política. Por fim, Barroso (2019, p. 117) conceitua o Poder constituinte como: “trata-se do poder de elaborar e impor a vigência de uma Constituição. Situa-se na confluência entre Direito e Política, e sua legitimidade repousa na soberania popular”. Morais (2019, p. 25), de igual modo, conceitua o Poder Constituinte como “a manifestação soberana da suprema vontade política de um povo, social e juridicamente organizado”. Bulos (2018, p. 395) destaca o Poder Constituinte como “a potência que faz a constituição, e, ao mesmo tempo, a competência que a modifica”. Joseph Sieyès foi o responsável por estabelecer a diferença entre o Poder Constituinte e o Poder Constituído, o qual o fez no decorrer da Revolução Francesa. Assim, segundo Sieyès, o Poder Constituinte seria a vontade da nação, em portanto, incondicionado e permanente, tendo como uma barreira somente o direito natural (apud BARROSO, 2019). Seguindo a linha do pensadorfrancês, o Poder Constituído seria formado e teria suas atribuições e competências delineadas pelo Poder Constituinte, e pelo qual também seria delimitado. No mesmo sentido, lançou o conceito de representação política, mudando a ideia de soberania popular pura de Rousseau para a soberania nacional (apud BARROS, 2019). Barroso (2019), ao analisar as Constituições frente aos ciclos históricos políticos apresentados por Jon Elster, destacou os cenários ou eventos históricos em que é possível observar claramente a atuação do Poder Constituinte, tais como: “a) uma revolução; b) a criação de um novo Estado (normalmente pela emancipação de uma colônia ou pela libertação de algum tipo de dominação); c) a derrota na guerra; d) uma transição política pacífica”. Tomando por base o pensamento de Barroso (2019), no Brasil as inúmeras Revoluções motivaram o exercício do Poder Constituinte. No tocante à titularidade, para Sieyès, a titularidade do Poder Constituinte é a Nação, uma vez que tem ligação com a ideia de soberania (MORAIS, 2019). Na modernidade, por outro lado, entende-se que a titularidade do Poder Constituinte pertence ao povo (LENZA, 2018). Bulos (2018), ao tratar das maneiras pelas quais o poder constituinte se expressa, refere-se a estas como formas de manifestação. Já Morais (2019) se refere como espécies de Poder Constituinte. Nesse caso, apenas para fins didáticos, trataremos aqui de espécies de Poder Constituinte. Inicialmente, podemos perceber duas espécies de Poder Constituinte, o primeiro dito Originário, o segundo chamado de Derivado. Este, por sua vez, subdivide-se em derivado reformador, derivado decorrente e derivado revisor. Além dessas duas espécies, há ainda o Poder Constituinte Difuso e o Supranacional. 2.2.1 Poder Constituinte Originário O Poder Constituinte Originário pode ser conceituado como “aquele que instaura uma nova ordem jurídica, rompendo por completo com a ordem jurídica precedente” (LENZA, 2018, p. 209). Nesse sentido, Morais (2019) pontua que há Poder Constituinte tanto na criação da Constituição pela primeira vez em um Estado, quanto também haverá na criação de uma nova Constituição posterior àquela. A este respeito, Lenza (2018) os coloca como Poder Constituinte histórico quando se trata da primeira Constituição, e Poder Constituinte revolucionário quando referente àquelas posteriores (MORAIS, 2019). Embora o poder constituinte originário não esteja condicionado a nenhuma forma, pelas experiências da própria história, podemos dizer que o Poder Originário será exercido mediante Assembleia Nacional Constituinte (também chamada de convenção) ou por meio da outorga, em razão de um Movimento Revolucionário (MORAIS, 2019). A título de exemplo, vamos pensar no Brasil: a primeira constituição do Brasil foi a de 1937, decorrente de um movimento, do mesmo modo que a primeira Constituição do Brasil (1824). Já as Constituições de 1891 e 1988 foram promulgadas por meio de uma Assembleia Nacional Constituinte. Enquanto na outorga prevalece a vontade unilateral, na Assembleia há a vontade deliberada a partir de representação popular (MORAIS, 2019). São características do Poder de 1º Grau, segundo Lenza (2018): inicial, autônomo, ilimitado juridicamente, incondicionado, soberano, um poder de fato e político e, por último, permanente. Inicial, pois instaura uma nova ordem jurídica, e tem como base da nova ordem a Constituição. Autônomo, uma vez que a estrutura e as normas da Nova Constituição serão assentadas por quem está no exercício do Poder Constituinte. Ilimitado, isso porque não tem dever de respeito à norma anterior. Incondicionado e soberano, pois não está adstrito a nenhuma forma pré-estabelecida para manifestação de sua vontade constituinte. É um poder de fato e um poder Político, pois possui uma força social e, portanto, que antecede a nova ordem jurídica, a qual será manifestada através do Poder Constituinte resultando na criação da Constituição. E é, permanente, uma vez que não se esgota na elaboração da Constituição (LENZA, 2018). A doutrina ainda classifica o Poder Constituinte em originário formal e material. Formal é o ato de criação, o qual reveste o complexo normativo com status constitucional. E, material, diz respeito justamente à substância daquilo que é norma constitucional, assim, o material é anterior ao formal (LENZA, 2018). 2.2.2 Poder Constituinte Derivado Como bem aponta Bulos (2018, p. 409), o Poder Constituinte Derivado é aquele que “altera, formalmente, a constituição”. O Poder Constituinte Derivado, como o próprio nome pressupõe, está inserido na Constituição e dela decorre. Desse modo, conhece limitações expressas na própria Constituição, sendo passível de controle de constitucionalidade (MORAIS, 2019). Este Poder divide-se em reformador, decorrente e revisor. O Poder constituinte derivado reformador traduz a possibilidade de alterar a Constituição, por meio de um procedimento especial, solene e específico para a reforma, especificações contidas na própria Constituição. (MORAIS, 2019). Essa característica mais solene para reforma é própria daqueles Estados que possuem Constituições rígidas (vide capítulo anterior). O Brasil, por exemplo, só pode alterar a Constituição mediante um procedimento formal e mais complexo do que para a elaboração de Leis ordinárias ou Complementares, esse processo está descrito nos artigos 59 e 60 da Constituição Federal. A Constituição Brasileira pode ser modificada mediante Emenda Constitucional, observado limites, tais como quórum, votação em cada Casa, além das cláusulas pétreas. O Poder Constituinte derivado decorrente “Consiste na possibilidade que os Estados-membros têm, em virtude de sua autonomia político-administrativa, de se auto organizarem por meio de suas respectivas constituições estaduais, sempre respeitando as regras limitativas estabelecidas na Constituição Federal” (MORAIS, 2019, p. 28). Lenza (2018), seguindo a Classificação de Anna Ferraz, divide o Poder constituinte derivado decorrente em duas modalidades, a primeira seria o decorrente inicial- aquele que elabora a constituição estadual-, e, o segundo seria o decorrente de revisão estadual - nesse há uma finalidade de modificação da constituição estadual, seguindo os limites da própria constituição estadual e da federal. Observa-se que, nos Municípios, não há manifestação do Poder Constituinte derivado decorrente, pois para os Municípios há a elaboração de uma Lei orgânica. O mesmo ocorre para os territórios Federais, os quais integram a União e não possuem uma autonomia federativa, não existindo manifestação de poder derivado decorrente (LENZA, 2018). O Distrito Federal possui uma Lei Orgânica ligada diretamente à União, uma vez que sua autonomia é parcialmente tutelada pela União (LENZA, 2018). O Poder constituinte derivado revisor é, assim como o decorrente e reformador, proveniente do Poder Originário e foi por ele delimitado e condicionado. No artigo 3º das Disposições Transitórias foi estabelecido que “a revisão poderia ocorrer após cinco anos da promulgação da Constituição, por voto da maioria do Congresso, por meio de uma sessão unicameral. O exercício do poder revisor somente pode ocorrer uma única vez”. O Poder revisor diz respeito justamente a uma revisão e ou atualização, mas apesar de na Constituição Brasileira aparentar ser mais simplificado do que o caso do Poder Reformador, vale ressaltar que o poder revisor é mais condicional e temporal que os demais modos do Poder Derivado. 2.2.3 Poder Constituinte Difuso Bulos (2018, p. 435) conceitua o Poder Constituinte Difuso como “aquele que atua na etapa da mutação constitucional. É chamado de difuso porque não vem formalizado nas constituições. Mesmo assim, está presente na vida dos ordenamentos jurídicos”. Quanto à natureza, Bulos (2018) classifica o Poder difuso como sendo um poderde fato, pois é decorrente do fato social, político e econômico. Lenza (2018) destaca que na alteração por meio do poder difuso não há uma modificação do texto, mas um processo informal, o qual resulta em uma alteração no sentido da interpretação do texto. Exemplo clássico de Mutação Constitucional ou apenas de um processo informal de modificação da Constituição foi o ocorrido com a possibilidade do casamento homoafetivo, em 2011, pelo Supremo Tribunal Federal. Bulos (2018) aponta como características do Poder Difuso: Latência que é um poder que somente aparece quando necessário, sendo exercido por aqueles a quem compete aplicar a constituição; permanência, pois tem atuação permanente, embora não seja expressamente previsto; informalidade, pois não se enquadra nem no poder originário, nem no poder derivado, mas decorre de um processo informal; e continuidade, pois geralmente aparece em razão de uma lacuna que será, por meio de um processo informal, colmatada dando continuidade ao a obra do Constituinte. A principal manifestação do Poder difuso é, sem dúvidas, a mutação constitucional. No entanto, o estudo profundo desta cabe melhor quando compreendida a hermenêutica constitucional. 2.2.4 Poder Constituinte Supranacional Segundo Lenza (2018, p. 225) “O Poder constituinte supranacional busca a sua fonte de validade na cidadania universal, no pluralismo de ordenamentos jurídicos, na vontade de integração e em um conceito remodelado de soberania”. Bulos (2018) acrescenta que o poder supranacional almeja romper as fronteiras dos Estados, em nome de uma integração, alcançando assim uma comunidade de nações. Essa ideia e supranacionalismo é também chamado de transnacional, está diretamente ligada à metaconstitucionalidade. São exemplos de uma meta constituição, segundo Bulos (2018), a Constituição da União Europeia. No entanto, o tema ainda está em debate e certamente passará por muitos até que haja uma consolidação, principalmente porque lida com a ideia de um constitucionalismo global. . 3 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE No âmbito da estruturação da Constituição Federal foi especificado um instrumento de substancial importância que se destina tão somente à defesa e preservação de valores evidenciados no texto Constitucional através da utilização de um instrumento de extrema importância, nomeadamente controle de constitucionalidade. A partir do pressuposto que se evidencia é tão somente uma forma de se adequar determinados atos normativos ao que está estabelecido na Constituição. 3.1 Aspectos essenciais no processo de compreensão do controle de constitucionalidade O pressuposto essencial para se realizar o processo de controle de constitucionalidade, no âmbito constitucional, é tão somente que seja um texto rígido, ou seja, que se observe um procedimento demasiadamente rigoroso para o processo de modificação normativa. Segundo Barroso (2006): Um dos fundamentos do controle de constitucionalidade é a proteção dos direitos fundamentais, inclusive e sobretudo os das minorias, em face das maiorias parlamentares eventuais. Seu pressuposto é a existência de valores materiais compartilhados pela sociedade que devem ser preservados das injunções estritamente políticas. A questão da legitimidade democrática do controle judicial é um dos temas que têm atraído mais intensamente a atenção dos juristas, cientistas políticos e filósofos da Constituição, e a ele se dedicará um tópico desta exposição. (BARROSO, 2006, p. 125). Pensar em controle de constitucionalidade de maneira direta seria observar a essência do escalonamento do processo normativo e, portanto, posicionando o sistema constitucional no degrau de supremacia normativa, onde qualquer norma que surja, posteriormente, no sistema jurídico tenha eminentemente um caráter especial de adequação. Nesse sentido Silva (1999, p. 70) aponta que a realização do controle de constitucionalidade: significa que a constituição se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. É, enfim, a lei suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estruturação deste e a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas fundamentais de Estado, e só nisso se notará sua superioridade em relação às demais normas jurídicas (SILVA, 1999, p. 70). Nessa perspectiva, é oportuno observar que o instrumento do controle de constitucionalidade enaltece sobremaneira a supremacia da Constituição, visto que não permitirá de forma alguma a presença de normas no ordenamento jurídico brasileiro que venham a tornar o sistema dúbio. E, por isso, a realização do processo de controle de constitucionalidade deve ocorrer recheado de motivos justos e adequados e, portanto, conseguir enquadrar aquela norma como inadequada no sistema jurídico brasileiro. No substrato prático, o controle de constitucionalidade pode ser observado no artigo 60º da Constituição quando evidencia a possibilidade de emenda à constituição, a partir da discussão e votação de determinada proposta em cada casa do congresso nacional, mas que seja realizada em dois turnos e atingindo três quintos dos votos dos respectivos membros. Muito embora o controle de constitucionalidade seja identificado em várias constituições que antecedem a de 1988, apenas nesta é possível perceber uma expansão significativa das formas de controle, inclusive no que tange ao rol de quem pode interpor uma ação de constitucionalidade. Sendo assim, para além de especificar o rol dos legitimados para propor o controle de constitucionalidade se criou novos instrumentos processuais que vem a reforçar o controle concentrado a ser realizado pelo STF. Ademais, apresentou-se a possibilidade de propor controle de constitucionalidade no âmbito das omissões legislativas, e foi facultada a possibilidade da ADCT (arguição de descumprimento de preceito fundamental). Diante das inovações trazidas pela EC 26/1985 Silva (1999, p. 544-545) observa que: O Brasil seguiu o sistema norte-americano, evoluindo para um sistema misto e peculiar que combina o critério difuso por via de defesa com o critério concentrado por via de ação direta de inconstitucionalidade, incorporando também, agora timidamente, a ação de inconstitucionalidade por omissão (arts. 102, I, a e III, e 103). A outra novidade está em ter reduzido a competência do Supremo Tribunal Federal à matéria constitucional. Isso não o converte em Corte Constitucional. Primeiro porque não é o único órgão jurisdicional competente para o exercício da jurisdição constitucional, já que o sistema perdura fundado no critério difuso, que autoriza qualquer tribunal e juiz a conhecer da prejudicial de inconstitucionalidade, por via de exceção. Segundo, porque a forma de recrutamento de seus membros denúncia que continuará a ser um Tribunal que examinará a questão constitucional com critério puramente técnico- jurídico, mormente porque, como tribunal, que ainda será, do recurso extraordinário, o modo de levar a seu conhecimento e julgamento as questões constitucionais nos casos concretos, sua preocupação, com é regra no sistema difuso, será dar primazia à solução do caso e, se possível, sem declarar inconstitucionalidades (SILVA, 1999, p. 544-545). Portanto, dentro desse panorama, observa-se que qualquer situação jurídica que venha a modificar o texto constitucional, mas não tenha passado pelo devido processo de controle de constitucionalidade poderá incorrer em nulidade do ato. Ademais, não se pode deixar de mencionar o futuro da norma que, em tendo sofrido o processo de controle de constitucionalidade, tenha se deparado com obstáculos substanciais e, portanto, não podem, de maneira alguma, ser incorporadas no sistema jurídico constitucional. Por isso, a norma quese pretendia integrar ao regime jurídico constitucional passa a ser considerada como regra nula. 3.2 O Controle de constitucionalidade concentrado e difuso O sistema de controle de constitucionalidade possui duas vias para a realização do processo, nomeadamente, o difuso e o concentrado. No primeiro caso o controle de constitucionalidade pode ser exercido por qualquer tribunal e, em consequência, por qualquer juiz e, portanto, todo o conjunto normativo que compõe o ordenamento jurídico brasileiro se sujeita ao processo de controle. O que deve ser evidenciado, contudo, nessa questão específica é o respeito ao órgão jurisdicional competente. Nesse sentido, torna-se importante observar o especificado por Lenza (2018, p. 178) ao expressar que: o controle difuso, repressivo, ou posterior, é também chamado de controle pela via de exceção ou defesa, ou controle aberto, sendo realizado por qualquer juízo ou tribunal do Poder Judiciário. Quando dizemos qualquer juízo ou tribunal, devem ser observadas, é claro, as regras de competência processual, a serem estudadas no processo civil. (LENZA, 2018, p. 178). Nesse sentido, o controle difuso ocorre, tão somente, no exame de um caso concreto e, por isso, a declaração de inconstitucionalidade ocorrerá de maneira incidental. Destaca-se, portanto que o pedido será realizado tendo como fundamento essencial a incompatibilidade do pedido com o texto constitucional. O que interessa neste processo específico é tão somente que seja declarado o caso como inconstitucional, para que as partes envolvidas não tenham mais obrigação jurídica. Contudo, as diretrizes normativas permanecerão vigentes para os interesses de terceiros. No caso de a declaração de inconstitucionalidade decorrer de um caso em que envolva lei ou ato normativo do poder público, segue-se o estabelecido no artigo 97º da Constituição Federal de 1988 ao informar que será necessário a maioria absoluta do plenário para conseguir a declaração ora mencionada, nomeadamente: “Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público”. Será justamente através do controle de constitucionalidade difuso que o juiz irá verificar se o caso que se apresenta encontra-se devidamente compatível com o ordenamento constitucional brasileiro e, em caso de ser emitida uma declaração de constitucionalidade, os atos e normas deverão deixar de ser utilizados. A referida ação poderá ocorrer através da realização de ações constitucionais e, ainda por meio de ações ordinárias. Como forma de exemplificar os atos de controle de constitucionalidade no âmbito difuso, indica-se o caso da suspensão da Lei n. 183/08 do Município de São Gonçalo, bem como um contrato administrativo que foi elaborado entre o referido município ora mencionado e uma empresa privada. É de extrema importância constatar que a finalidade do processo de controle difuso não é de extrair a norma que possui algum vício do complexo jurídico nacional, mas tão somente de fomentar a possibilidade de que determinados direitos subjetivos, que possivelmente sejam prejudicados, venham a ser defendidos. Por isso, é importante observar que uma declaração de inconstitucionalidade quando é declarada tem efeito retroativo entre as partes que estão inseridas na lide. Dando continuidade ao estudo que se apresenta, observa-se, nesse momento, o controle de constitucionalidade concentrado, que reveste elementos eminentemente diferentes do controle difuso, visto que no caso do controle concentrado, o processo estará restrito a um único tribunal e, ainda, poderá ser observada em determinadas situações especificas. Arguição de descumprimento de preceito fundamental é um ato que está previsto no artigo 102, parágrafo 1º da CF/88 da seguinte maneira: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: § 1º A arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. (Transformado em § 1º pela Emenda Constitucional nº 3, de 17/03/93). O objetivo que se deseja, a partir da interposição de uma ADPF, é tão somente sanar as lacunas que podem existir a partir das restrições identificadas quanto à incerteza de ser possível propor ou não a ação direta de inconstitucionalidade. Por isso, seu efeito é eminentemente subsidiário, visto que a referida ação só pode ser interposta quando não existir nenhum outro meio cabível para sanar o dano que irá ser causado. Destaca-se, contudo, a possibilidade de uma ADPF ser convertida em ação direta de inconstitucionalidade, mas para que seja possível essa situação, torna-se essencial o preenchimento de determinados elementos normativos nomeadamente, pedido da ação, legitimação, objetivo e, por fim o fundamento. A ação declaratória de constitucionalidade está prevista do artigo 103 mais especificamente nos parágrafos 2º e 3º, respectivamente da seguinte maneira: Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade § 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias. § 3º Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado- Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado. Destaca-se que sua previsão normativa decorre do especificado na EC03/93 e tem por objetivo especifico fortalecer os aspectos apresentados no controle de constitucionalidade concentrado. No que tange aos efeitos da ADECON, observa-se o mesmo que é identificado no caso da ADPF, ou seja, possui efeito erga omnes e, ainda, acaba por vincular todos os órgãos do poder executivo e, ainda, do poder judiciário, excluindo esse caso apenas o poder legislativo. A ação direta de inconstitucionalidade por omissão implicitamente prevista na Constituição Federal de 1988 no artigo 103 § 2º tem por objetivo analisar situações em que o poder público foi omisso em determinadas circunstâncias. Portanto, o processo que se desenrola no âmbito da referida ação possui caráter objetivo, visto que irá tão somente analisar processos que apresentem omissão de cunho inconstitucional. Portanto, a ação em análise se destina tão somente ao processo de suprir uma falha na norma ou ainda, na medida que seria necessária para tornar aquela norma eficaz. Nesse sentido, observa-se o especificado por Tavares (2002 p. 338): No caso da ação direta de inconstitucionalidade para combater a omissão há expressa referência constitucional a ‘omissão de medida’, sem qualquer restrição de qual medida (não se fala, por exemplo, em ‘omissão de medida normativa’), o que leva à conclusão de abertura do remédio para situações de omissão não normativa (TAVARES, 2002, p. 338). Ação direta de inconstitucionalidade interventiva tem por objetivo estabelecer um processo de controle de constitucionalidade acerca de medidas provenientes de atos do Estado e, ainda do Distrito Federal, em que fique evidenciado violação dos direitos sensíveis que estão previstos na CF/88. Nesse sentido Barreto (2013 p. 167) expõe que: A ADI interventiva é cabível quando a lei ou ato normativo estadual ou distrital é contrário aos princípios sensíveis da Constituição Federal, assim chamados em razão de que podem acarretar a sanção política mais severa. (BARRETO, 2013, p. 167). E, nesse sentido, como direitos sensíveis, observa-se o especificado no artigo 34, VII da Constituição Federal de 1988, nomeadamente: VII - assegurar a observância
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