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SUMÁRIO 10. Teoria do Contrato ............................................................................................................................................... 4 10.1 Conceito ............................................................................................................................................................ 4 10.2 Elementos do Contrato .............................................................................................................................. 4 10.3 Princípios Fundamentais ............................................................................................................................ 5 10.3.1 Autonomia da Vontade (ou Autonomia Privada) ................................................................... 5 10.3.2 Observância (ou Supremacia) das Normas de Ordem Pública ........................................ 7 10.3.3 Obrigatoriedade das Convenções (Pacta Sunt Servanda) .................................................. 7 10.3.4 Relatividade dos Efeitos do Contrato .......................................................................................... 7 10.3.5 Função Social do Contrato ............................................................................................................... 8 10.3.6 Boa-fé Objetiva ................................................................................................................................... 11 10.4 Formação do Contrato ............................................................................................................................ 14 10.4.1 Fase da negociação preliminar (pontuação) ......................................................................... 14 10.4.2 Fase da proposta (policitação/oblação)................................................................................... 15 10.4.3 Fase do contrato preliminar ......................................................................................................... 17 10.4.4 Fase de contrato definitivo ou de conclusão do contrato .............................................. 19 10.5 Momento da Conclusão do Contrato ............................................................................................... 19 10.6 Local da Celebração do Contrato ....................................................................................................... 20 10.7 Classificação dos Contratos ................................................................................................................... 20 10.7.1 Contratos Unilaterais ou Bilaterais ............................................................................................. 20 10.7.2 Contratos Onerosos ou Gratuitos .............................................................................................. 21 10.7.3 Contratos Comutativos ou Aleatórios ...................................................................................... 21 10.7.4 Contratos Nominados ou Inominados ..................................................................................... 21 10.7.5 Contratos Paritários ou de Adesão............................................................................................ 22 10.7.6 Contratos Consensuais ou Formais ........................................................................................... 23 10.7.7 Contratos Reais .................................................................................................................................. 23 10.7.8 Contratos Principais ou Acessórios............................................................................................ 23 10.7.9 Contratos Pessoais ou Impessoais ............................................................................................. 23 10.8 Efeitos do Contrato ................................................................................................................................... 24 10.8.1 Exceção de Contrato Não Cumprido ........................................................................................ 24 10.8.2 Direito de Retenção ......................................................................................................................... 24 10.8.3 Revisão dos Contratos .................................................................................................................... 25 10.8.4 Estipulação em Favor de Terceiro .............................................................................................. 26 10.8.5 Vício Redibitório ................................................................................................................................ 27 10.8.6 Evicção .................................................................................................................................................... 30 10.9 Extinção da Relação Contratual ........................................................................................................... 31 10.9.1 Causas Anteriores ou Contemporâneas .................................................................................. 32 10.9.2 Causas Supervenientes .................................................................................................................... 32 11. Contratos em Espécie....................................................................................................................................... 34 11.1 Compra e Venda ........................................................................................................................................ 34 11.1.1 Elementos.............................................................................................................................................. 34 11.1.2 Venda de coisa comum ou venda de bem indivisível em condomínio .................... 36 11.1.3 Venda por medida ou por extensão – venda ad mensuram ......................................... 37 11.1.4 Cláusulas especiais (pactos adjetos) ......................................................................................... 39 11.2 Doação............................................................................................................................................................ 40 11.2.1 Conceito................................................................................................................................................. 40 11.2.2 Elementos.............................................................................................................................................. 41 11.2.3 Natureza Jurídica ............................................................................................................................... 42 11.2.4 Espécies.................................................................................................................................................. 42 11.2.5 Revogação da doação (art. 551, CC)......................................................................................... 45 11.3 Locação .......................................................................................................................................................... 47 11.3.1 Conceito................................................................................................................................................. 47 11.3.2 Natureza jurídica ................................................................................................................................ 47 11.3.3 Regras do contrato de locação ................................................................................................... 47 11.4 Empréstimo ................................................................................................................................................... 49 11.4.1 Conceito.................................................................................................................................................49 11.4.2 Natureza jurídica ................................................................................................................................ 49 11.4.3 Modalidades ........................................................................................................................................ 49 11.4.4 Comodato ............................................................................................................................................. 50 11.4.5 Mútuo ..................................................................................................................................................... 51 11.5 Prestação de Serviço ................................................................................................................................ 53 11.5.1 Conceito................................................................................................................................................. 53 11.5.2 Natureza jurídica ................................................................................................................................ 54 11.5.3 Elementos.............................................................................................................................................. 55 11.5.4 Tutela externa do crédito .............................................................................................................. 56 11.6 Empreitada .................................................................................................................................................... 57 11.6.1 Conceito................................................................................................................................................. 57 11.6.2 Natureza Jurídica ............................................................................................................................... 57 11.6.3 Modalidades de empreitada......................................................................................................... 58 11.6.4 Responsabilidade civil no contrato de Empreitada ............................................................ 58 11.7 Depósito......................................................................................................................................................... 59 11.7.1 Conceito................................................................................................................................................. 59 11.7.2 Natureza jurídica ................................................................................................................................ 59 11.7.3 Modalidades ........................................................................................................................................ 60 11.7.4 Do depósito voluntário ou convencional ............................................................................... 60 11.7.5 Do depósito necessário .................................................................................................................. 61 11.8 Mandato......................................................................................................................................................... 62 11.8.1 Conceito................................................................................................................................................. 62 11.8.2 Natureza jurídica e regras do mandato .................................................................................. 62 11.9 Seguro ............................................................................................................................................................ 64 11.9.1 Conceito................................................................................................................................................. 64 11.9.2 Natureza jurídica ................................................................................................................................ 64 11.9.3 Regras do contrato de seguro .................................................................................................... 64 11.9.4 Do seguro de dano .......................................................................................................................... 68 11.9.5 Do seguro de pessoa....................................................................................................................... 69 11.10 Fiança .............................................................................................................................................................. 70 11.10.1 Conceito................................................................................................................................................. 70 11.10.2 Natureza jurídica ................................................................................................................................ 70 11.10.3 Regras da fiança ................................................................................................................................ 71 11.10.4 Extinção da fiança ............................................................................................................................. 73 QUADRO SINÓTICO ...................................................................................................................................................... 75 QUESTÕES COMENTADAS ......................................................................................................................................... 91 GABARITO ........................................................................................................................................................................ 101 LEGISLAÇÃO COMPILADA......................................................................................................................................... 102 JURISPRUDÊNCIA............................................................................................................................................................. 105 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................................. 120 4 DIREITO CIVIL Capítulo 4 10. Teoria do Contrato 10.1 Conceito Os contratos têm previsão inicial no artigo 42, do Código Civil, e já traz, em sua primeira disposição, a ideia de constitucionalização do Direito Civil. Isto porque, quando a lei determina que nos contratos sejam observadas as funções sociais, como limite da autonomia da vontade, conclui-se que a celebração destes velará pela aplicação dos direitos fundamentais das partes, observada mesmo na relação entre particulares, de forma horizontal. Havia, antigamente, uma concepção individualista sobre os contratos, que eram regidos pelo pacta sunt servanda, decorrente do liberalismo. No entanto, com o advento do neoconstitucionalismo, houve um redimensionamento da autonomia provada e os princípios passaram a ser observados como regras jurídicas. Assim, contrato é o acordo de duas ou mais vontades que visa à aquisição, resguardo, transformação, modificação ou extinção de relações jurídicas de natureza patrimonial. É um negócio jurídico bilateral, decorrente de uma ação humana voluntária e lícita, praticada com a intenção de obter um resultado jurídico. 10.2 Elementos do Contrato Seus elementos são: Existência de duas ou mais pessoas: Essas pessoas podem ser físicas e/ou jurídicas. 5 Capacidade plena das partes para contratar: Se as partes não forem capazes o contrato poderá ser nulo (ex: absolutamente incapaz que não foi representado) ou anulável (ex: relativamente incapaz que não foi assistido). Consentimento: Vontades livres e isentas de vícios (erro, dolo, coação, etc). Objeto do contrato é a prestação: Oobjeto é a atuação das partes no contrato. Ex: no contrato de compra e venda de um relógio, o objeto não é o relógio. Este é a coisa em que a prestação se especializa. O objeto de quem compra é pagar o preço e de quem vende deve entregar a coisa. Portanto é a ação humana. O objeto deve ser: Lícito: não pode ser contrário à lei, à moral, aos princípios da ordem pública e aos bons costumes; Possível: física e juridicamente; Certo, determinado ou determinável: ou seja, deve conter os elementos necessários para que possa ser determinado – gênero, espécie, quantidade e características individuais; Economicamente apreciável: isto é, deverá versar sobre o interesse capaz de se converter, direta ou indiretamente, em dinheiro. Forma prescrita ou não defesa em lei: A regra é que a forma é livre. No entanto em algumas circunstâncias exige-se maior formalidade e solenidade (ex: escritura de compra e venda de imóvel). Quando a lei exigir que um contrato tenha uma determinada forma especial é desta forma que ele deve ser feito (não pode ser feito de outra maneira). Qualquer vício referente à forma torna o contrato nulo. 10.3 Princípios Fundamentais 10.3.1 Autonomia da Vontade (ou Autonomia Privada) Os contratantes têm liberdade para estipular o que lhes convier. Em tese, pode-se contratar sobre o que quiser, mesmo que não previsto em lei (contrato inominado). 6 Trata-se de um dos princípios clássicos, juntamente com o princípio da força obrigatória dos contratos e relatividade dos efeitos do contrato, demonstrando que os efeitos estão limitados às partes. No século XIX, a função principal do Estado era somente de assegurar a ampla liberdade de contratação, de modo que as partes ajustavam as condições dos contratos como bem lhe entendiam, conforme regia o Estado liberal. Contudo, com a mudança do século, ficou demonstrado que a mera e ampla liberdade não era suficiente para haver o equilíbrio contratual, sendo necessário, portanto, a igualdade material, fazendo com o Estado abandonasse sua inércia, havendo, agora, a prevalência do Dirigismo Contratual. Assim a Autonomia Privada traduz literalmente a liberdade contratual, necessária em qualquer contrato, contudo, condicionada a outros princípios limitadores, como a função social dos contratos e da boa-fé objetiva, que iremos analisar posteriormente. Esse princípio, portanto, substituiu o modelo liberal da autonomia da vontade. Dirigismo contratual é a intervenção do Estado e da lei nos contratos. Nesse sentido, é importante fazer a diferenciação entre liberdade de contratar e liberdade contratual. A liberdade de contratar se relaciona com a escolha da pessoa ou das pessoas com quem o negócio jurídico será celebrado, sendo, em regra, uma liberdade plena, já que o direito à contratação inerente à própria concepção da pessoa humana, um direito existencial da personalidade advindo do princípio da liberdade. Por sua vez, a liberdade contratual se 7 relaciona com o conteúdo do negócio jurídico, sendo uma liberdade bem mais restrita, havendo, assim, limitações à carga volitiva das partes. 10.3.2 Observância (ou Supremacia) das Normas de Ordem Pública A liberdade de contratar encontra seus limites inicialmente na própria lei e também na moral e nos bons costumes. Ex: proibição de contrato envolvendo herança de pessoa viva (pacta corvina – art. 426, CC). 10.3.3 Obrigatoriedade das Convenções (Pacta Sunt Servanda) Decorre da ideia de autonomia da vontade, onde a convenção de um contrato passa a ter força de lei, constrangendo os contratantes ao cumprimento do conteúdo completo do negócio jurídico. Atualmente, cada vez mais, vem se atenuando a força desse princípio, em razão dos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato. Uma exceção a esse princípio, é a teoria da imprevisão, chamada cláusula rebus sic stantibus (teoria da onerosidade excessiva) que mitiga o princípio ora estudado. Nesse sentido, a teoria da imprevisão emerge no ordenamento jurídico para RESOLVER o contrato (art. 478 do CC) se sobrevier fato imprevisível (superveniente que não poderia ser previsto no momento da celebração contratual) que acarrete o desequilíbrio contratual, tornando-o excessivamente oneroso para uma das partes e com extrema vantagem para a outra. 10.3.4 Relatividade dos Efeitos do Contrato O contrato é um instituto de direito pessoal e por isso apenas produz efeitos inter partes (vincula somente as partes que nele intervierem, ao contrário do que ocorre com os institutos de direitos reais, que produzem efeitos erga omnes. Não obstante, o próprio 8 ordenamento civil traz algumas exceções a esse princípio: estipulação de um contrato em favor de terceiro (arts. 426 a 438 do CC), promessa de fato de terceiro (arts. 439 a 440 do CC), contrato com pessoa a declarar (art. 471 do CC) e a função social dos contratos e sua eficácia externa (art. 421 do CC). 10.3.5 Função Social do Contrato Trata-se de princípio expresso no artigo 421 do Código Civil, devendo ser observado em toda e qualquer relação contratual e determina que a liberdade de contratar deva observar a probidade e a boa-fé objetiva. Os ditames do referido princípio são baseados na superação do modelo individualista previsto no Código Civil de 1916, que se preocupava apenas com a relação individual gerada no contrato. A nova ordem constitucional de 1988 passou a exigir que todo e qualquer ramo do direito passe por uma “filtragem constitucional”, ou seja, deverão sempre ser observados os princípios fundamentais expressos na Constituição. Assim, com a irradiação dos princípios constitucionais, o Direito Civil passa a definir em suas disposições uma preocupação com o coletivo, limitando a autonomia da vontade sempre que ela possa ferir algum direito fundamental. Assim, a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Na verdade, trata-se de um dispositivo genérico e que deve ser preenchido pelo Juiz dependendo de uma hipótese concreta que lhe é apresentada. Leva-se em consideração a presença de outros subprincípios tais como: a) Dignidade da Pessoa Humana; b) na interpretação do contrato, deve-se atender mais à intenção que o sentido literal das disposições escritas; c) Justiça Contratual (arts. 317 e 478, CC) – protegida por institutos como o da onerosidade excessiva, para dar maior equilíbrio às partes e ao contrato, estado de perigo, lesão, etc. Esse princípio surge para limitar diretamente o Princípio da Autonomia Privada, assim, o contrato não interessa apenas às partes contratantes, mas sim a toda a sociedade pois esse negócio jurídico possui repercussões em âmbito social (sociabilidade do direito). 9 Não foi eliminada a autonomia contratual ou a sua obrigatoriedade, mas apenas se atenuou ou reduziu o seu alcance quando presentes interesses individuais. Enunciado n. 23 do CJF/STJ: “A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio, quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana”. Nesse sentido, mesmo que um determinado contrato esteja de acordo com todos os preceitos legais, ele pode vir a ser declarado nulo/anulável se repercutir negativamente para a sociedade. Desta forma, de acordo com Flávio Tartuce, é correto afirmar que este princípio possui dupla eficácia: interna e externa. Quanto à eficácia interna: o Princípio da Função Social dos Contratos objetiva a proteção da vulnerabilidade contratual (ex.: direitos do consumidor), a proteção contra a onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual (efeito gangorra), proteção da dignidade humana e direitos da personalidade, proteção contra cláusulas antissociaisou abusivas (ex.: Súmula 302/STJ), e conservação contratual, de modo que a extinção contratual deverá ser a última medida a ser tomada (Enunciado n. 360 do CJF/STJ, IV Jornada de Direito Civil e Enunciado n. 22 do CJF/STJ, I Jornada de Direito Civil). Quanto à eficácia externa: diz respeito à proteção dos direitos difusos e coletivos (função socioambiental do contrato) da tutela externa do crédito, ou seja, a possibilidade de gerar efeitos perante terceiros ou das condutas destes repercutirem no contrato (Enunciado 21 do CJF/STJ, I Jornada de Direito Civil). Ainda, o art. 2035, parágrafo único do CC, traz uma norma de grande valia para compreensão desse princípio: 10 Art. 2.035. (…). Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos. Vamos analisar cada trecho grafado: Art. 2.035: esse artigo está disposto nas regras transitórias do CC/02, desta forma, a partir de sua leitura, compreende-se que esse princípio é aplicável ao contrato celebrado na vigência do CC/1916 (retroatividade motivada ou justificada). Ordem pública: ora, se esse princípio se caracteriza como um preceito de ordem pública, como consequência, será imprescindível a intervenção do Ministério Público e do conhecimento ex officio pelo juiz. Função social da propriedade: ao relacionar a função social dos contratos com a função social do direito de propriedade, o legislador acabou por fundamentar, constitucionalmente, o princípio ora estudado, equiparando-o ao previsto no art. 5, XXII e XXIII da CF/88. Assim, tal princípio tem como funções básicas: Abrandar a força obrigatória do contrato (Pacta Sunt Servanda); Coibir cláusulas abusivas, gerando nulidade absoluta das mesmas (Súmula 302, STJ); Possibilitar, sempre que possível, a conservação do contrato (Enunciado 22, I JDC), e o seu equilíbrio; Possibilitar a revisão do contrato quando o mesmo contiver alguma onerosidade excessiva (ex.: teoria da impressão). Súmula 302, STJ – É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado. 11 Enunciado 22, I Jornada: A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas. 10.3.6 Boa-fé Objetiva É expressamente previsto no art. 422, do CC/02 e preconiza a atuação correta das partes, conforme um padrão normal de conduta, independentemente da boa-fé interior (subjetiva) que o contratante acredita ser correto1. E quais seriam essas condutas? Bom, dentre outras hipóteses, pode-se destacar: dever de cuidado, respeito, informação, lealdade, confiança, colaboração ou cooperação (expressamente constante do CPC/15), honestidade, razoabilidade, equidade, etc. Assim, as partes devem agir com lealdade, probidade e confiança recíprocas (art. 422, CC), com o dever de cuidado, cooperação, informando o conteúdo do negócio e agindo com equidade e razoabilidade (usam-se os termos transparência, veracidade, diligência e assistência). Impede-se o exercício abusivo de direito por parte de algum dos contratantes. A violação de qualquer desses deveres (anexos/colaterais) implicará violação positiva do contrato, que ensejará responsabilidade civil objetiva (sem culpa), conforme dispôs o Enunciado n. 24 do CJF/STJ c/c Enunciado n. 363 do CJF/STJ da IV Jornada de Direito Civil: “Os princípios da probidade e da confiança são de ordem pública, estando a parte lesada somente obrigada a demonstrar a existência da violação”. 1 Vide questão 4 12 A observância deste princípio deve estar presente não só no momento da elaboração, como também na conclusão e execução do contrato, devendo ocorrer em TODAS as fases do contrato, inclusive, pós-contratual), que além da função econômica de circulação de riquezas, serve, também, de mecanismo para se atingir a justiça social, solidariedade, dignidade da pessoa humana, que são objetivos primordiais de nossa sociedade, estabelecidos na Constituição Federal. Não se confunde com a boa-fé subjetiva, que se relaciona com as crenças internas do sujeito e é irrelevante nas relações contratuais, pois, se respeitada a boa-fé objetiva, não há que se interferir na crença subjetiva da parte. Além disso, o Princípio da boa-fé objetiva possui algumas funções importantes para regulação dos contratos: Interpretativa (art. 113, CC): Os contratos devem ser interpretados de maneira mais favorável a quem está de boa-fé. Presume-se que o consumidor e o aderente estão de boa-fé. Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. De controle ou reativa (art. 187, CC): aquele que viola a boa-fé objetiva no exercício de um direito comete abuso de direito, ou seja, um ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Integrativa (art. 422, CC): a boa-fé objetiva deve integrar todas as fases contratuais – pré-contratual, contratual e pós. Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. 13 Enunciado 25 – Art. 422: o art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé nas fases pré-contratual e pós -contratual. Enunciado 170 – Art. 422: A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase de negociações preliminares e após a execução do contrato, quando tal exigência decorrer da natureza do contrato. O princípio da boa-fé objetiva possui alguns desdobramentos, vejamos: Venire Contra Factum Proprium: dispõe sobre a vedação de a parte agir com comportamento contraditório ao previamente combinado. Requisitos: o Comportamento anterior; o Comportamento posterior; o Ausência de justa causa; e o Dano ou receio de dano. Supressio2 e Surrectio: são figuras correlacionadas, já que a supressio consiste na perda de um direito pelo decurso do tempo, obstando o seu exercício, em razão da boa-fé. Por outro lado, se uma parte perde o direito, a outra ganha, já que depositou confiança na aceitação do outro quanto à forma de cumprimento da obrigação, mesmo que diversa do que previamente estabelecido. Tu quoque: não se confunde com o venire contra factum propium e consiste na vedação que a parte tem de exigir algo que ela também foi inadimplente. O indivíduo não pode aplicar valoração distinta à obrigação decorrente do mesmo ato. A aplicação deste princípio ocorre na exceptio non adimplementi (exceção do contrato não cumprido), por exemplo. 2 Vide questão 3 14 Duty to mitigaty the loss: conforme mencionado, a boa-fé deve ser observada por todas as partes do contrato, mesmo pelo credor que se depara com uma obrigação inadimplente. Neste caso, é necessário que o credor atue, levando-se em conta as circunstâncias, para tomar medidas que diminuam as perdas decorrentes do inadimplemento. Assim, se tiver ciência do descumprimento de um contrato e mesmo assim não tomar as medidas cabíveis, com o intuito de receber mais juros decorrentes da omissão, por exemplo, está agindo contra a boa-fé essencial nas relações jurídicas. 10.4 Formação do Contrato O contrato é fonte de obrigações, ele nasce da conjunção entre duas ou mais vontades coincidentes. Sem este mútuo consenso, não haverá contrato. No entanto, antes de se estabelecer o acordo final, é possível que ocorram algumas negociações preliminares (que são as sondagens, as conversasprévias e debates, tendo em vista um contrato futuro), sem que haja uma vinculação jurídica entre os participantes, não se criando ainda obrigações. É a chamada fase das tratativas. Apenas no momento em que as partes manifestam a sua concordância é que se formará o contrato, criando obrigações. Os contratos possuem, portanto, quatro fases: fase de negociações preliminares ou de pontuação; fase de proposta, policitação ou oblação; fase de contrato preliminar e fase de contrato definitivo ou de conclusão do contrato. 10.4.1 Fase da negociação preliminar (pontuação) É a fase de responsabilidade pré-contratual, em que ocorrem meras negociações preliminares, antecedendo a proposta. Nesse momento, ocorrem acordos que implicam propostas não formalizadas. Contudo, conforme já estudado neste material, havendo quebra da boa-fé objetiva, poderá surgir uma responsabilização pré-contratual de natureza extracontratual, conforme entendimento majoritário. 15 Todavia, ao se dar início a um procedimento negocitório, é preciso observar sempre se, a depender das circunstâncias do caso concreto, já não se formou uma legítima expectativa de contratar. Dizer, portanto, que não há direito subjetivo de não contratar não significa dizer que os danos daí decorrentes não devam ser indenizados, haja vista que, como vimos, independentemente da imperfeição da norma positivada, o princípio da boa-fé objetivatambém é aplicável a esta fase pré-contratual, notadamente os deveres acessórios de lealdade e confiança recíprocas3. 10.4.2 Fase da proposta (policitação/oblação) É quando a oferta se torna formalizada, havendo a manifestação expressa da vontade de contratar, mas que depende da concordância (pura e simples) da outra parte. Assim, é a manifestação da vontade de contratar, por uma das partes, solicitando a concordância da outra. Portanto, caracteriza-se essa fase como uma declaração unilateral de vontade receptícia. Nesse momento, a proposta (séria, clara, precisa e definitiva) se vincula ao proponente, pois, se a outra parte aceitar, o contrato está formado, assim, ela só produz efeitos ao ser recebida pela outra parte. Essa fase tem força vinculante, obrigando as partes, que são: Proponente, policitante ou solicitante: faz a proposta (vinculado). Oblato, policitado ou solicitado: recebe a proposta. Se a proposta originária é subitamente alterada pelo oblato, há uma contraproposta e os papeis se invertem. 3 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. Teoria geral dos contratos. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. IV, t. I, p. 96. 16 O art. 428 do CC traz hipóteses em que a proposta não se vinculará (exceção), portanto, de imprescindível leitura, vejamos: Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta: I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente. Feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita: trata-se de contrato com declaração consecutiva. Aqui, considera-se também como pessoa presente aquela contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; Feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente: trata-se de contrato com declarações intervaladas, imaginado em caso proposta enviada por carta; Feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; Se antes proposta, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte, o oblato, da retratação do proponente. (direito de arrependimento) Ademais, o art. 430 do CC dispõe que, se a aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao conhecimento do proponente, este comunicará o fato imediatamente ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos. Feita a proposta, esta vincula o proponente ou policitante (art. 427, CC); caso a proposta não seja mantida, obriga a perdas e danos. 17 10.4.3 Fase do contrato preliminar Às vezes não é conveniente às partes celebrar, desde logo, o contrato definitivo; assim podem firmar um contrato-promessa (pactum incontrahendo), sendo que as partes se comprometem a celebrar o contrato definitivo posteriormente (o exemplo clássico é o compromisso irretratável de compra e venda). Apesar disso ele deve ser registrado, presumindo-se irretratável. Se uma das partes desistir do negócio, sem justa causa, a outra poderá exigir-lhe, coercitivamente, o seu cumprimento, sob pena de multa diária, fixada no contrato ou pelo Juiz. As partes se denominam promitentes (na compra e venda: promitente-comprador e promitente-vendedor). Assim, é um pré-contrato (pactum de contrahendo), em que as partes assumem (vinculante) a obrigação de celebrar um contrato definitivo no futuro. Em razão disso, deve possuir os mesmos requisitos essenciais do contrato definitivo, exceto quanto à forma. Ex.: contrato de compra e venda de imóvel, no contrato definitivo, é obrigatória a escritura pública, porém, caso seja um contrato preliminar, essa formalidade é dispensada. A doutrina aduz que são 2 tipos de contrato preliminar previstos no Direito brasileiro, intitulados como compromissos de contrato, vejamos: Compromisso unilateral de contrato ou contrato de opção (art. 466): as duas partes assinam o instrumento, porém apenas uma das partes assume um dever de fazer o contrato definitivo. Assim, dispõe o art. 466: “Se a promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a mesma sem efeito, deverá manifestar-se no prazo nela previsto, ou, inexistindo este, no que lhe for razoavelmente assinado pelo devedor”. Compromisso bilateral de contrato (art. 463): ocorre, ao contrário do compromisso unilateral, quando as duas partes assinam o instrumento e, ao mesmo tempo, assumem a obrigação de celebrar o contrato definitivo. Assim, dispõe o art. 463: “Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à 18 outra para que o efetive. Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente.” O registro não é obrigatório, sendo apenas um fator de eficácia perante terceiros. Assim, na verdade, a redação do parágrafo único do artigo deveria ser “o contrato preliminar poderá ser levado ao registro competente”. Assim, se não registrar, os efeitos serão inter partes; se registrar, serão erga omnes. Enunciado 30: Art. 463: a disposição do parágrafo único do art. 463 do novo Código Civil deve ser interpretada como fator de eficácia perante terceiros. Enunciado 549: Art. 538: a promessa de doação no âmbito da transação constitui obrigação positiva e perde o caráter de liberalidade previsto no art. 538 do Código Civil. Se não registrado na matrícula: haverá um contrato preliminar com efeitos obrigacionais “inter partes”, que gera uma obrigação de fazer o contrato definitivo. Conforme dispõe os arts. 463, 464 e 465, do Código Civil, compromissário comprador tem três opções se o promitente vendedor não celebrar o contrato: o Obrigação de fazer/exigir a celebração, desde que o preço seja pago (art. 463, do CC); o Adjudicação compulsória inter partes, desde que o preço esteja pago (art. 464, do CC); o Perdas e danos (art. 465, do CC). 19 Súmula 239,do STJ: O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis. Se registrado na matrícula: deixará de ser um mero contrato preliminar, passando a se Tratar de um direito real de aquisição do compromissário comprador, que gera efeitos reais erga omnes. (art. 1.225, VIII, do CC), cabendo ação de adjudicação compulsória erga omnes. 10.4.4 Fase de contrato definitivo ou de conclusão do contrato Trata-se da última fase da formação dos contratos, momento em que ocorrerá o aperfeiçoamento do contrato, de modo a gerar todos os efeitos jurídicos e fáticos de sua avença de forma plena, ensejando a responsabilidade civil contrato em caso de inadimplemento. 10.5 Momento da Conclusão do Contrato Desta forma, entende-se que o contrato pode ser formado: Entre presentes (inter praesentes): quando o oblato aceita a proposta, havendo um encontro de vontades, ocorrendo simultaneamente. Não havendo prazo estipulado, a aceitação deverá ser manifestada imediatamente, contudo, se houver prazo, deverá ocorrer no termo concedido, caso contrário não será considerada aceita, salvo de forma tácita. Entre ausentes (inter absentes). o CC adota duas teorias: Regra: Teoria da agnição ou aceitação/informação, na subteoria da expedição, ocorrendo com a expedição da aceitação, art. 434); Exceção: teoria da agnição ou aceitação, na subteoria da recepção, quando houver convenção das partes. 20 Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto: I - no caso do artigo antecedente; (retratação). II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta. III - se ela não chegar no prazo convencionado. Conforme explica Flavio Tartuce, quanto à formação do contrato eletrônico celebrado entre ausentes, a exemplo da contratação por e-mail, segundo o entendimento majoritário, aplica-se a teoria da recepção, conforme dispõe o Enunciado n. 173 do CJF/STJ: “A formação dos contratos realizados entre pessoas ausentes, por meio eletrônico, completa-se com a recepção da aceitação pelo proponente”. 10.6 Local da Celebração do Contrato A regra é que o negócio jurídico se reputa celebrado no lugar em que foi proposto (art. 435, CC). Esta é uma regra dispositiva, isto é, as partes podem dispor de modo diverso, desde que expressa no contrato. 10.7 Classificação dos Contratos 10.7.1 Contratos Unilaterais ou Bilaterais O contrato será unilateral quando apenas um dos contratantes assume obrigações em face do outro. É o que ocorre na doação pura e simples. Outros exemplos: mútuo, comodato, etc. Os contratos unilaterais, apesar de exigirem duas vontades, colocam só uma delas na posição de devedora. O contrato será bilateral quando os contratantes são simultânea e reciprocamente credores e devedores uns dos outros, produzindo direitos e obrigações para ambos. O 21 contrato bilateral também é conhecido como sinalagmatico. A compra e venda é o exemplo clássico: o vendedor deve entregar a coisa, mas por outro lado tem o direito ao preço; já o comprador deve pagar o preço, mas, por outro lado tem o direito de receber o objeto que comprou. Outros exemplos: troca, locação, etc. 10.7.2 Contratos Onerosos ou Gratuitos Os contratos onerosos trazem vantagens para ambos os contratantes, pois estes sofrem um sacrifício patrimonial, correspondente a um proveito desejado (ex: locação – locatário paga aluguel, mas tem o direito de usar o bem; já o locador recebe o dinheiro do aluguel, mas deve entregar a coisa para que seja usada por outrem). Em outras palavras: ambas as partes assumem ônus e obrigações recíprocas. Os contratos gratuitos (ou benéficos) oneram somente uma das partes, proporcionando à outra uma vantagem, sem qualquer contraprestação (ex: doação pura e simples, depósito, comodato, etc). 10.7.3 Contratos Comutativos ou Aleatórios O contrato é comutativo (ou pré-estimado) quando as prestações de ambas as partes são conhecidas e guardam relação de equivalência. Ex: compra e venda (como regra). Já o contrato aleatório é aquele em que a prestação de uma das partes (ou de ambas) não e conhecida com exatidão no momento da celebração do contrato. Depende de uma alea (incerteza, risco). O contrato depende de um risco futuro e incerto, capaz de provocar uma variação e consequentemente um desequilíbrio entre as prestações, não se podendo antecipar exatamente o seu montante. 10.7.4 Contratos Nominados ou Inominados Os contratos nominados (ou típicos) são os contratos que têm previsão e denominação prevista na lei (Código Civil ou Leis especiais). Ex: compra e venda, locação, comodato, etc. 22 Já os inominados (ou atípicos) são os contratos criados pelas partes, dentro do princípio da liberdade contratual e que não correspondem a nenhum tipo contratual previsto na lei; não têm tipificação; não têm um nome com previsão legal. Ex: cessão de clientela, factoring, etc. O art. 425 do CC permite às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas no Código Civil. 10.7.5 Contratos Paritários ou de Adesão Paritários são aqueles em que ambos os interessados são colocados em pé de igualdade e podem discutir as cláusulas contratuais, uma a uma, eliminando os pontos divergentes mediante transigência mútua. De adesão (ou por adesão) são aqueles em que a manifestação de vontade de uma das partes se reduz a mera anuência a uma proposta da outra. Uma das partes elabora o contrato e a outra parte apenas adere às cláusulas já estabelecidas, não sendo possível a discussão ou modificação dessas cláusulas. Ex: contratos bancários, contrato de transporte, convênio médico, seguro de vida ou de veículos, sistema financeiro de habitação, etc. O contrato de adesão deve ser sempre escrito com letras grandes e legíveis. Ele não pode ser impresso com redação confusa, utilizando terminologia vaga e ambígua, nem com cláusulas desvantajosas para um dos contratantes. A cláusula que implicar limitação ao direito do consumidor deverá ser redigida com destaque (letras maiores), permitindo sua imediata e fácil compreensão. Na dúvida vigora a interpretação mais favorável ao aderente. Segundo o art. 424, CC são nulas as cláusulas que estipulam a renúncia antecipada do aderente a algum direito resultante da natureza do negócio (ex: “caso o objeto adquirido esteja com algum problema, o aderente abre mão de pedir a substituição do produto”). 23 10.7.6 Contratos Consensuais ou Formais Consensuais ou não solenes são os contratos que independem de uma forma especial; em geral se perfazem pelo simples acordo ou consenso das partes. Podem ser celebrados inclusive de forma verbal. Solenes ou formais são os contratos em que a lei exige uma forma especial. A falta desta formalidade levará à nulidade do negócio. Ex: a compra e venda de bens imóveis exige escritura pública e registro. 10.7.7 Contratos Reais São os que se aperfeiçoam com a entrega da coisa. O depósito somente será concretizado quando a coisa for realmente entregue, depositada. Outros exemplos: comodato, mútuo, penhor, etc. Antes da entrega da coisa, tem-se apenas uma promessa de contratar e não um contrato perfeito e acabado. 10.7.8 Contratos Principais ou Acessórios Principais são os contratos que existem por si, exercendo sua função e finalidade independente de outro. Ex: contrato de compra e venda, de locação, etc. Acessórios são aqueles contratos cuja existência supõe a do principal, pois visam assegurar sua execução. Ex: fiança. 10.7.9 Contratos Pessoais ou Impessoais Contratos Pessoais (personalíssimos ou intuitu personae) são aqueles em que a pessoa do contratante é considerada pelo outro como elemento determinante de sua conclusão. Ex: Desejo que o advogado “Y” me defenda no Tribunal do Júri. Quero que o cirurgião “X”me opere. Quero comprar um quadro do famoso pintor “Z”. Contratos Impessoais são os que a pessoa do contratante é juridicamente indiferente para a conclusão do negócio. Ex: Contrato uma empresa para pintar minha casa. Tanto faz se o serviço for realizado pelo pintor “A” ou “B”. 24 10.8 Efeitos do Contrato O contrato válido estabelece um vínculo jurídico entre as partes, sendo que, em princípio, é irretratável unilateralmente. Ou seja, depois de celebrado, como regra, uma das partes não pode simplesmente desistir do cumprimento do contrato. Trata-se da aplicação do Pacta Sunt Servanda. Formado um contrato, assumidas as obrigações, passamos ao cumprimento do seu conteúdo. Porém, um contrato pode produzir diversos efeitos. 10.8.1 Exceção de Contrato Não Cumprido Também é chamado de exceptio non adimpleti contractus. Nos contratos bilaterais (ou sinalagmáticos) a regra é que nenhum dos contratantes poderá, antes de cumprir a sua obrigação, exigir a do outro (art. 476, CC). Isso porque há uma dependência recíproca das prestações que, por serem simultâneas, são exigíveis ao mesmo tempo. Excepcionalmente será permitido, a quem incumbe cumprir a prestação em primeiro lugar, recusar-se ao seu cumprimento, até que a outra parte satisfaça a prestação que lhe compete ou dê alguma garantia de que ela será cumprida. No entanto, isso somente é admissível quando, depois de concluído o contrato, sobrevier diminuição em seu patrimônio que comprometa ou torne duvidosa a prestação a que se obrigou. Em caso de rescisão, a parte lesada pelo inadimplemento (não cumprimento) da obrigação pela outra parte pode pedir rescisão do contrato, acrescido de perdas e danos. 10.8.2 Direito de Retenção É a permissão concedida pela norma ao credor de conservar em seu poder coisa alheia, já que detém legitimamente, além do momento em que deveria restituir, até o pagamento do que lhe é devido. Digamos que uma pessoa foi possuidora de boa-fé de uma casa, durante quatro anos. Nesse tempo realizou benfeitorias necessárias. No entanto o verdadeiro proprietário moveu uma ação de reintegração de posse e acabou ganhando a ação. O possuidor, embora 25 estivesse de boa-fé, perdeu a ação; deve sair do imóvel. No entanto, tem o direito de ser indenizado pelas benfeitorias necessárias que realizou no imóvel. E se a pessoa que ganhou a ação não quiser indenizar? Ora, enquanto o possuidor não for indenizado pela benfeitoria necessária que realizou, ele tem o direito de reter o imóvel até que seja ressarcido ou até o tempo calculado sobre o valor da benfeitoria. Devem estar presentes os seguintes requisitos: Detenção da coisa alheia; Conservação dessa detenção; Crédito líquido, certo e exigível do retentor, em relação de conexidade com a coisa retida. Esse direito está assegurado a todo possuidor de boa-fé que tem direito à indenização por benfeitorias necessárias ou úteis (art. 1.219, CC). Segundo o STJ (Súm. 619), “A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias”. 10.8.3 Revisão dos Contratos Em princípio, os contratos devem ser cumpridos exatamente como foram estipulados (pacta sunt servanda). No entanto, a obrigatoriedade das convenções não é absoluta. Admite- se, excepcionalmente, a revisão judicial dos contratos de cumprimento a prazo ou em prestações sucessivas, quando uma das partes vem a ser prejudicada sensivelmente por uma alteração imprevista da conjuntura econômica. A finalidade é restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro entre os contratantes, lastreada na chamada Teoria da Imprevisão. Segundo ela, somente permanece o vínculo obrigatório gerado pelo contrato enquanto ficar inalterado o estado de fato vigente à época da estipulação. Se for alterado o estado de fato, permite-se também a alteração do contrato, 26 ficando a parte liberada dos encargos originários, sendo que o contrato pode ser revisto ou rescindido. Esta cláusula implícita é conhecida pela expressão rebus sic stantibus (tentando fazer uma tradução literal teríamos: “o mesmo estado das coisas”; “as coisas ficam como estão”; “pelas coisas como se acham”). Para se tornar viável a extinção (ou revisão) do contrato por onerosidade excessiva, o Juiz, em cada caso, sempre deve verificar a ocorrência dos seguintes elementos: Vigência de um contrato comutativo (as prestações são conhecidas e equivalentes entre si). Ocorrência de alteração das condições econômicas após a celebração do contrato. A alteração da situação foi imprevisível e extraordinária. Onerosidade excessiva para uma das partes na execução do contrato nas condições originalmente estabelecidas. Como regra, a resolução por onerosidade excessiva cabe nos contratos bilaterais (ou sinalagmáticos), como na compra e venda. Porém o art. 480, CC dispõe que se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva. 10.8.4 Estipulação em Favor de Terceiro Um dos princípios do contrato é que ele não pode prejudicar nem beneficiar a terceiros, atingindo apenas as partes que nele intervieram (princípio da relatividade). No entanto esse princípio não é absoluto, podendo favorecer terceiros (nunca criando obrigações ou prejudicando). Ex: A (estipulante) compra uma casa de B (promitente) para que este a entregue para C (beneficiário). C não é parte do contrato, no entanto é o favorecido pelo mesmo. Neste caso, tanto o que estipula a cláusula (estipulante) como o terceiro (beneficiário) tem o direito de exigir do promitente o cumprimento da obrigação. 27 10.8.5 Vício Redibitório Nos contratos bilaterais em que há a transferência da posse, uma parte deve garantir a outra que essa possa usufruir o bem conforme sua natureza e destinação (contratos de compra e venda, locação, comodato, doação com encargos etc.). Por seu turno, vícios redibitórios4 são falhas ou defeitos ocultos existentes na coisa alienada, objeto de contrato comutativo, que a tornam imprópria ao uso a que se destinam ou lhe diminuem sensivelmente o valor, de tal modo que o ato negocial não se realizaria se esses defeitos fossem conhecidos, dando ao adquirente direito para redibir (devolver a coisa defeituosa) ou para obter abatimento no preço. O alienante (o vendedor) é o responsável, mesmo alegando que não conhecia o defeito, trata-se da responsabilidade objetiva (respondendo independente de culpa), exceto se o contrário estiver previsto no contrato. Há responsabilidade do alienante mesmo que a coisa pereça apenas na posse do adquirente, mas o vício oculto já existia antes da tradição (art. 444, CC). Por outro lado, não há responsabilidade do alienante se o adquirente sabia que a coisa era defeituosa e mesmo assim quis recebê-la. Também não há responsabilidade se o vício se deu por causa posterior à entrega. O bem adquirido em hasta pública não se pode redibir, nem pedir abatimento do preço. No entanto, se a aquisição do bem aconteceu em um leilão de arte ou em uma exposição de animais, a responsabilidade subsiste. Os contratos objeto do vício redibitório são os comutativos (ex.: compra e venda) e os de doação com encargo (doações em que o beneficiário, para receber o bem doado, assume algum ônus). Decadência 4 Vide questão 5 28 Nos negócios regulados pelo Código Civil, o art. 445 do mesmo código estabelece que o prazo de reclamação e propositura das ações acima citadas, contado da entrega efetiva (tradição), são de: PRAZO HIPÓTESES 30 (trinta) dias Bens móveis 01 (um) ano Bens imóveis 15 (quinze) dias ou para imóveis Se o comprador já estava na posse do bem móvel quando foi realizada a venda06 (seis) meses Se o comprador já estava na posse do bem imóvel quando foi realizada a venda Quando o vício só puder ser conhecido mais tarde, o prazo conta-se a partir do instante em que dele tiver ciência, até o máximo de 180 (cento e oitenta) dias, se tratar de móveis, ou de 01 (um) ano, se tratar de imóveis. Código de Defesa do Consumidor A Lei no 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC) possui normas de ordem pública e de interesse social, atendendo disposições constitucionais que atribuem ao Estado à defesa do consumidor. A responsabilidade prevista no CDC é objetiva (independente de culpa) e solidária (entre o fabricante e o comerciante). Vejam a diferença: se uma pessoa adquire um bem de um particular, a reclamação rege-se pelo Código Civil; mas, se ela adquiriu de um comerciante, rege-se pelo Código de Defesa do Consumidor. Lembre-se que o CDC tem uma abrangência maior: considera como vícios tanto os defeitos ocultos na coisa como também os aparentes ou de fácil constatação. Além disso, o 29 defeito pode estar na coisa ou no serviço prestado. Há também uma diferença na nomenclatura: no CC chamamos de vícios redibitórios (arts. 441/446); no CDC (arts. 18 a 26) chamamos de vícios do produto. No entanto, a doutrina costuma afirmar que existe um “diálogo das fontes” entre o CC e o CDC, pois há uma conexão entre ambos, sendo que um sistema complementa o outro, especialmente no que diz respeito aos princípios contratuais, possibilitando maiores benefícios e mecanismos de defesa para o consumidor. Os prazos são decadenciais, contados a partir da data da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços. Observem que também são diferentes dos prazos estabelecidos no Código Civil. Há uma crítica da doutrina quanto aos prazos, pois eles são menores do que no CC: Prazo Hipóteses 30 (trinta) dias Produtos não-duráveis: desaparece facilmente com o consumo (ex.: gêneros alimentícios) 90 (noventa) dias Produtos duráveis: não desaparece facilmente com o consumo, possuindo um ciclo de vida ou de utilização mais longo (ex.: eletrodomésticos, automóveis etc.) O CDC também estabelece que fornecedores, quando efetuada a reclamação direta, têm prazo máximo de trinta dias para sanar o vício. Não o fazendo pode o consumidor exigir alternativamente: Substituição do produto. Resolução do contrato: restituição da quantia paga (e, dependendo do caso, acrescido de perdas e danos); não há necessidade de se provar a má-fé do alienante, pois presume-se a boa-fé do consumidor. Abatimento proporcional do preço. 30 10.8.6 Evicção Como vimos, o alienante tem o dever de garantir ao adquirente a posse justa da coisa transmitida, defendendo-a de eventuais pretensões de terceiros. Por isso, a lei a protege de eventual evicção. Evicção é a perda da propriedade de uma coisa para terceiro, em razão de ato jurídico anterior e em virtude de uma sentença judicial (evincere = ser vencido). A evicção supõe a perda total ou parcial da coisa, em mão do adquirente, por ordem do Juiz, que a defere a outrem. Exemplo clássico: A vende para B uma fazenda. Quando B toma posse do imóvel percebe que uma terceira pessoa (C) já detém a posse daquele imóvel há muitos anos. B Tenta tirar C do imóvel. Mas este além de não sair ainda ingressa com uma ação de usucapião. Caso C obtenha a sentença judicial de usucapião, B perderá o imóvel. Vejam: B pagou pelo imóvel e o perdeu em uma ação judicial. Isto é a evicção. Na hipótese concreta, A fica obrigado a indenizar B. Observem neste exemplo que: A → é o alienante, aquele que transferiu a coisa viciada, de forma onerosa. Em regra, ele não tem conhecimento de que coisa era litigiosa. B → é o evicto (adquirente ou evencido), aquele que perdeu a coisa adquirida, em virtude da sentença judicial. C → é o evictor (ou evencente), aquele que adquiriu a coisa porque ganhou a ação judicial. Toda pessoa, ao transferir o domínio, a posse, ou o uso a terceiro, nos contratos onerosos, deve resguardar o adquirente contra os riscos de evicção. Trata-se de uma obrigação de fazer, a cargo do alienante, que nasce com o próprio contrato. Se ocorrer a evicção estamos diante de uma inexecução contratual, pois eu paguei pela coisa e não a recebi; ou a recebi, mas perdi logo a seguir por determinação judicial. Direitos do Evicto Restituição integral do preço pago. Restituição das despesas com o contrato. 31 Todos os prejuízos decorrentes da evicção (o evicto deve provar quais foram as perdas e danos). Indenização dos frutos que for obrigado a restituir. Obter o valor das benfeitorias necessárias e úteis que não lhe forem pagas pelo evictor. Custas judiciais, honorários advocatícios e demais despesas processuais. A evicção pode ser total ou parcial. A parcial ocorre quando a perda é inferior a 100% do valor da coisa. Já o art. 455, CC fala em evicção parcial considerável e não-considerável. Mas não estabelece porcentagem para cada caso. Portanto, tudo vai depender do bom senso do Juiz em um caso concreto. O adquirente deve, assim que for instaurado contra si o processo judicial, chamar o alienante para integrar o processo (art. 456, CC). Trata-se de um instituto de Direito Processual Civil. É a chamada denunciação a lide. Ela é obrigatória para que o evicto (adquirente) possa ao menos ser reembolsado daquilo que pagou pela propriedade, sem receber a coisa. Se assim não proceder (não denunciar a lide) perderá os direitos decorrentes da evicção, não mais dispondo de ação direta para exercitá-los. A denunciação se justifica posto que o alienante precisa saber da pretensão do terceiro reivindicante, uma vez que irá suportar as consequências da decisão judicial. 10.9 Extinção da Relação Contratual Há uma grande divergência doutrinária sobre as terminologias referentes aos modos extintivos dos contratos, pois não há sistematização legal. Adotamos o sistema da Professora Maria Helena Diniz, pois é o que vem caindo nos concursos. O adimplemento (também chamado de execução, cumprimento ou satisfação obrigacional) do contrato é o modo normal de extinção do mesmo. O devedor executa a prestação e o credor atesta o cumprimento através da quitação (prova de que houve o pagamento). Se a quitação não lhe for entregue ou se lhe for oferecida de forma irregular, o devedor poderá reter o pagamento (sem que se configure a mora) ou efetuar a consignação em pagamento. 32 No entanto, um contrato pode ser extinto antes de seu cumprimento, ou no decurso deste. São as chamadas causas anteriores ou contemporâneas ao nascimento do contrato ou supervenientes à sua formação. Costuma-se dizer então que Rescisão é o gênero. As demais nomenclaturas seriam as espécies. Vejamos: 10.9.1 Causas Anteriores ou Contemporâneas As causas anteriores são divididas em duas: Nulidades: trata-se da não-observância de normas jurídicas atinentes a seus requisitos subjetivos, objetivos e formais (capacidade, objeto, consentimento, forma, etc.). Ex: se uma pessoa menor de 16 anos realiza um contrato, ou este tem por objeto algo ilícito, temos a nulidade do contrato (arts. 166 e 167, CC). Arrependimento: previsto no próprio contrato, quando os contraentes estipulam que o mesmo será rescindido, mediante declaração unilateral de vontade, se qualquer deles se arrepender. 10.9.2 Causas Supervenientes As causas supervenientes são divididas em seis: Resolução por inexecução voluntária: a prestação não é cumprida por culpa do devedor. Sujeita o inadimplente ao ressarcimento por todas as perdas e danos materiais e morais. Resolução por inexecução involuntária: a prestação não é cumprida, sem que haja culpa do devedor, nos casos de força maior ou caso fortuito. Não há indenização por perdas e danos; tudo volta como era antes; se houve qualquer tipode pagamento, a quantia deve ser devolvida. Resolução por onerosidade excessiva: evento extraordinário e imprevisível, que impossibilita ou dificulta extremamente o adimplemento do contrato. Trata-se da aplicação da Teoria da Imprevisão (cláusula rebus sic stantibus). Provadas as condições pode haver a rescisão contratual ou a revisão das prestações. Têm-se 33 entendido que, em atenção ao princípio da conservação dos negócios jurídicos, deve-se conduzir, sempre que possível, à revisão dos contratos e não à resolução. Resilição bilateral ou distrato: trata-se de um novo contrato em que ambas as partes, de forma consensual, acordam pôr fim ao contrato anterior que firmaram. O distrato submete-se às mesmas normas e formas relativas ao contrato, conforme o art. 472, CC. Resilição unilateral: há contratos que admitem dissolução pela simples declaração de vontade de uma das partes (também chamada de denúncia vazia). Só ocorre excepcionalmente. Os exemplos clássicos ocorrem no mandato, no comodato e no depósito. Assume a feição de resgate, renúncia ou revogação. Quem revoga é o mandante, comodante ou depositante. Quem renuncia é o mandatário, comodatário ou depositário. Morte de um dos contraentes: como regra, morrendo um dos contratantes, a obrigação se transmite aos seus herdeiros, até o limite das forças da herança. No entanto, nas obrigações personalíssimas (intuitu personae) a morte é causa extintiva do vínculo. 34 11. Contratos em Espécie O tema “contratos em espécie” é um tema com bastante incidência no exame da ordem e, portanto, deve ser estudado com bastante atenção. 11.1 Compra e Venda Um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe o preço em dinheiro. O contrato não transfere a propriedade da coisa. A propriedade é transferida pela tradição ou registro. O contrato somente cria a obrigação de uma transferência da coisa5. A compra e venda é contrato translativo, em que a parte se compromete a transferir o bem. Logo, o contrato de compra e venda, por si só, não transmite a propriedade, que se dará com o registro ou tradição. A fixação do preço poderá ser deixada ao arbítrio de terceiro, que os contratantes logo designarem ou prometerem designar. Se o terceiro não aceitar a incumbência, ficará sem efeito o contrato, salvo quando acordarem os contratantes em designar outra pessoa. É nulo o contrato de compra e venda quando se deixar o arbítrio do preço a apenas uma das partes. Não sendo a venda a crédito, não é obrigado o credor a entregar a coisa antes de receber o preço. 11.1.1 Elementos Os elementos do contrato de compra e venda são a coisa, o preço e o consenso. Não se transfere o domínio. Este é transferido pela tradição (bens móveis) ou pelo registro do título aquisitivo no Cartório de Registro de Imóveis (bens imóveis). Coisa (res): é o bem corpóreo, material. 5 Vide questão 6 35 A coisa deve ser lícita, possível, determinada ou determinável, sob pena de nulidade absoluta. Ainda, a compra e venda pode ter como objeto coisa atual ou futura (venda sob encomenda). Se a coisa vier a não existir, a compra e venda será ineficaz, não ser que se trate de contrato aleatório (emptio spei, art. 483), que é exceção. A lei proíbe que os ascendentes vendam aos descendentes quaisquer bens, sem que haja o consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante, salvo se casado sob o regime de separação obrigatória (art. 496, CC), sob pena de anulação do ato. Essa venda poderia simular uma doação em prejuízo dos demais herdeiros, que poderá ser pleiteada no prazo de dois anos, a contar da data do ato. Consenso (consesus): as partes devem ser capazes, sob pena de invalidade da compra e venda, devendo ser observadas as regras de legitimação para a compra e venda. Outorga uxória: para a venda de imóvel, salvo no caso de separação absoluta de bens (a convencional). A falta de outorga gera anulabilidade da compra e venda, com prazo decadencial de 2 anos contados da dissolução da sociedade conjugal. Venda de ascendente para descendente: há necessidade de autorização dos demais descendentes e do cônjuge do vendedor. Preço (pretium): é a remuneração da compra e venda, devendo ser expressa em moeda nacional corrente (reais) pelo valor nominal, em razão do princípio do nominalismo, sob pena de nulidade. Preço injusto: indício de fraude; Preço fictício: descaracteriza o contrato para doação; Preço por cotação (art. 486 e 487): fixado conforme índices e parâmetros, inclusive por taxa de mercado ou de bolsa, também se poderá deixar a fixação do preço à taxa de mercado ou de bolsa, em certo e determinado dia e lugar; Preço por arbitramento ou por avaliação: arbitrado por terceiro que tenha confiança das partes, porém não pode confiado exclusivamente a uma das partes; 36 Preço tabelado e preço médio: tem que seguir uma ordem, se não houver preço estipulado pelas partes: o Preço tabelado; o Vendas habituais; o Preço médio (juiz); Preço unilateral (art. 489): é nulo o contrato quando se deixa ao arbítrio exclusivo de uma das partes. 11.1.2 Venda de coisa comum ou venda de bem indivisível em condomínio Nesse caso, é um direito de preempção/preferência legal em favor do condômino, seja móvel ou imóvel, devendo haver igualdade de condições ‘tanto por tanto’. O condômino preterido pode entrar com ação adjudicatória ou anulatória, inclusive contra terceiros, sendo uma ação de preferência de natureza real, tem que depositar o preço, com prazo decadencial de 180 dias, a partir da ciência da venda. Assim, dispõe o art. 504: Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência. Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a parte vendida os coproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço. Havendo pluralidade de condôminos com preferência, a ordem de preferência será: Quem tem benfeitorias de maior valor. Quem tenha quinhão maior. Quem depositar primeiro. 37 11.1.3 Venda por medida ou por extensão – venda ad mensuram No caso de venda de imóveis, pode-se estabelecer que a área do imóvel não é meramente enunciativa (venda ad corpus - a metragem não é considerada), tratando-se, desta forma, de um fator determinante do negócio jurídico. VENDA AD CORPUS Dimensões são imprecisas, simplesmente enunciativas; Presunção enunciativa quando a diferença não exceder a 1/20 (5%); VENDA AD MENSURAM Trata-se venda especificada, detalhada por indicação de preço e medida de extensão. Proteção especial do comprador (artigo 500, caput): Ação ex empto – complemento da área. (Prioritária) Redibitória – Resolução do contrato. Estimatória – Abatimento no preço. Como a ação ex empto é prioritária, a ações redibitória e estimatória somente em caso de não ser possível a complementação da área. Na venda ad mensuram, se houver uma variação considerável na área, estará presente um vício redibitório especial. Por fim, o § 1o do artigo 500, traduz a ideia de que se a margem de erro é apenas de 5%, o comprador não poderá ingressar em juízo, salvo se provar que sem esse percentual não teria realizado a compra. Veja a integralidade do dispositivo legal: 38 Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão – ad mensuram –, ou se determinara respectiva área – ad corpus –, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento – ação ex rempto – da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução – ação redibitória – do contrato ou abatimento proporcional ao preço – ação estimatória. § 1o Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente enunciativa – ad mensuram –, quando a diferença encontrada não exceder de um vigésimo 1/20 (5%) da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio. § 2o Se em vez de falta houver excesso, e o vendedor provar que tinha motivos para ignorar a medida exata da área vendida, caberá ao comprador, à sua escolha, completar o valor correspondente ao preço ou devolver o excesso. § 3o Não haverá complemento de área, nem devolução de excesso, se o imóvel for vendido como coisa certa e discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus. Vejamos as situações que podem ocorrer: Faltar área: o comprador prejudicado poderá pleitear: Complementação da área: ação ex empto; Abatimento no preç: ação quanti minoris; Resolução + devolução das quantias, com perdas e danos, se houver má-fé: ação redibitória. Excesso de área: o vendedor comprovar que tinha motivos para ignorar a variação dessa área, podendo ingressar em juízo. Assim, ocomprador terá duas opções: Completar o preço; Devolver o excesso; De acordo com o art. 501 estabelece o prazo decadencial para todas essas ações, sendo de 1 ano a contar do registro do título, sendo o prazo de decadência é impedido ou suspenso se houver invasão do imóvel. Art. 501. Decai do direito de propor as ações previstas no artigo antecedente o vendedor ou o comprador que não o fizer no prazo de um ano, a contar do registro do título. 39 Parágrafo único. Se houver atraso na imissão de posse no imóvel, atribuível ao alienante, a partir dela fluirá o prazo de decadência. 11.1.4 Cláusulas especiais (pactos adjetos) Retrovenda: o vendedor de imóvel pode reservar-se o direito de recobra-la (propriedade resolúvel), no prazo decadencial máximo de 3 anos, restituindo o valor recebido, mais as despesas do comprador autorizadas por escrito pelo vendedor e as realizadas com as benfeitorias necessárias; Do direito de preferência: estipulada a cláusula de preferência, ao comprador compete oferecer ao vendedor a coisa, se decidir vendê-la, para que este, usando do se direito de preferência, decida se a quer. PRAZO: 180 dias, sendo a coisa móvel; dois anos, se imóvel. De acordo com o STJ, o direito de preferência previsto no artigo 504 do CC aplica-se ao contrato de compra e venda celebrado entre condômino e terceiro, e não àquele ajustado entre condôminos (Resp. 1.137.176 – PR). Neste sentido, se a coisa for oferecida à condômino, o outro não poderá exercer seu direito de preferência, pois este só é cabível se a venda é feita a terceiro. Venda a contento: o negócio somente se perfaz se o comprador se declarar satisfeito (condição suspensiva), ainda que a coisa lhe tenha sido entregue; e não se reputará perfeita, enquanto o adquirente não manifestar seu agrado. Venda a contento X Venda sujeita a prova: na venda a contento a coisa ainda não é conhecida, na venda sujeita à prova a coisa já é conhecida. Os efeitos são os mesmos (arts. 509, 510 e 511, CC). Antes da aprovação, o comprador equivale ao comodatário. A ação cabível para reaver o bem é Reintegração de posse. 40 Preempção: o comprador se obriga a oferecer ao vendedor a coisa móvel ou imóvel, caso for vendê-la a terceiro, para que se exerça o direito de prelação (preferência) em igualdade de condições. Não pode o condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranho, se o requerer no prazo de 180 dias, sob pena de decadência. Reserva de domínio6: o vendedor reserva para si a propriedade do bem até que se realize o pagamento integral do preço. 11.2 Doação 11.2.1 Conceito O doador transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o donatário, sem a presença de qualquer remuneração. Trata-se de ato de mera liberalidade, sendo um contrato benévolo, unilateral e gratuito (exceções: doação remuneratória e a contemplativa de casamento). Além de ser um contrato gratuito e unilateral, a doação possui as seguintes características: O contrato é consensual, pois tem aperfeiçoamento com a manifestação de vontade das partes. A doação é contrato comutativo, pois as partes sabem de imediato quais são as prestações. 6 Vide questão 8 41 O contrato de doação é formal, podendo ser por escritura pública ou instrumento particular, a depender do bem que for transferido. 11.2.2 Elementos São 4 os elementos da doação: sujeitos (doador e donatário), objeto, mútuo consentimento, forma. Sujeitos (doador e donatário): Sobre o tema, a doação feita a descendente importa adiantamento de herança, devendo este, no curso do inventário, colacionar o bem dado em doação, sob pena de caracterizar sonegação (artigo 2.002 do CC/02). Doação inoficiosa: doação de bens que atingem a legítima dos herdeiros necessários. Nestes casos, será nula a parte da doação que ultrapasse a metade dos bens do de cujos, sendo possível o ajuizamento de ação de redução, no prazo de 10 anos. Importante frisar que, de acordo com o STJ, a análise sobre o excesso da doação é apurada levando-se em conta o patrimônio do doador ao tempo da doação, e não na data da abertura da sucessão. 7 Enunciado 119, jornada de direito civil: 119 – Art. 2.004: para evitar o enriquecimento sem causa, a colação será efetuada com base no valor da época da doação, nos termos do caput do art. 2.004, exclusivamente na hipótese em que o bem doado não mais pertença ao patrimônio do donatário. Se, ao contrário, o bem ainda integrar seu patrimônio, a colação se fará com base no valor do bem na época da abertura da sucessão, nos termos do art. 1.014 7 STJ. AR 3.493 - PE 42 do CPC, de modo a preservar a quantia que efetivamente integrará a legítima quando esta se constituiu, ou seja, na data do óbito (resultado da interpretação sistemática do art. 2.004 e seus parágrafos, juntamente com os arts. 1.832 e 884 do Código Civil). Doação à concubina (art. 550, CC): é causa de anulabilidade, contando-se o prazo de 2 anos da data da dissolução do casamento, para o cônjuge ou os herdeiros necessários. Objeto: lícito, possível, determinado e determinável Mútuo consentimento: Além da intenção do doador, de ceder o bem a outro, é necessária a aceitação do donatário, podendo ser expressa ou tácita, no caso de doação pura, e expressa no caso de doação onerosa. Por ser negócio jurídico benéfico, nos termos do artigo 114 do CC, a interpretação do contrato é feita de forma restritiva. Forma: o ato será feito por meio de escrito público ou particular, mas será permitida a doação verbal, quando a coisa a ser doada se tratar de bem móvel de pequeno valor. 11.2.3 Natureza Jurídica Unilateral; Bilateral, no caso de doação modal, pois ocorre uma imposição para aquele que recebe bens ou vantagens de um ônus; Gratuito, em regra, pois, em caso de doação modal, será considerada onerosa; Consensual; Real, quando envolver bem de pequeno valor + tradição; Comutativo; Formal e solene quando a doação de bem imóvel for acima de 30 salários mínimos; Formal, mas não solene quando não for necessária a escritura pública.
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