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FH - UFG Thales Fernandes Prof. Dr. David Maciel FICHAMENTO: HOBSBAWM, Eric J. “A Revolução Francesa”. In: A Era das Revoluções (1789-1848). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p. 71-94. Obs: As páginas podem estar em desacordo com a obra original, pois o fichamento foi feito a partir de um PDF. ● Se a economia mundial do século XIX foi formada pela Revolução Industrial na Grã-Bretanha, a política mundial foi formada na França, com a Revolução Francesa. - Vocabulário e temas da política liberal e radical-democrática. - Conceito e vocabulário do nacionalismo. - Códigos legais, modelo de organização técnica e científica e o sistema métrico de medidas. ● São tantas as agitações políticas do século XVIII que alguns historiadores falaram de uma “era da revolução democrática”. A Revolução Francesa seria mais um exemplo, embora o mais repercutido e de maior alcance. ● A Revolução Russa de 1917 possui uma importância análoga à Revolução Francesa, não foram fenômenos isolados mas foram os mais fundamentais. ● A Revolução Francesa, em primeiro lugar, se deu no Estado mais populoso e poderoso da Europa (sem considerar a Rússia). Em segundo lugar, ela foi uma revolução social de massa, muito radical. Em terceiro lugar, entre todas as revoluções contemporâneas, a Revolução Francesa foi a única ecumênica. Ela é um marco para todos os países. ● A Revolução Frances tem influência direta nas libertações da América Latina depois de 1808; sua importância direta se espalhou até Bengala, com Ram Mohan Roy e o movimento de reforma hindu. A Revolução Francesa foi “o primeiro grande movimento de ideias da cristandade ocidental que teve qualquer efeito real sobre o mundo islâmico”. Sua influência direta é universal, pois ela forneceu o padrão para todos os movimentos revolucionários posteriores, suas lições tendo sido incorporadas ao socialismo e ao comunismo modernos. ● “Durante todo o século XVIII a França foi o maior rival econômico da Grã-Bretanha.” (p. 40) ● “Em outras palavras, o conflito entre a estrutura oficial e os interesses estabelecidos do velho regime e as novas forças sociais ascendentes era mais agudo na França do que em outras partes.” (p. 40) ● Na maioria dos países de “despotismo esclarecido” as reformas eram inaplicáveis, e portanto mera teoria, ou então improváveis de mudar o caráter geral de suas estruturas político-sociais; ou ainda fracassaram face à resistência das aristocracias locais e outros interesses; na França esses interesses estabelecidos eram mais efetivos nessa resistência. ● A chamada “reação feudal” forneceu a centelha que fez explodir o barril de pólvora na França. ● A nobreza, a “primeira linha”, gozava de consideráveis privilégios mas a monarquia absoluta tinha destituído os nobres de sua independência política e reduzido suas velhas instituições. A noblesse de roble, classe média governamental enobrecida expressava duplo descontentamento: com a burguesia e os aristocratas. ● A classe média e os cavalheiros provinciais mais pobres, tentaram neutralizar o declínio em suas rendas usando seus direitos feudais ao máximo para extorquir dinheiro (ou mais raramente, serviço) do campesinato. Consequentemente, a nobreza não só exasperava a classe média mas também o campesinato. ● “De fato os camponeses eram em geral livres e não raro proprietários de terras. Em quantidade efetiva, as propriedades nobres cobriam somente um-quinto da terra, as propriedades do clero talvez cobrissem outros 6%, com variações regionais. Assim é que na diocese de Montpellier os camponeses já possuíam de 38 a 40% da terra, a burguesia de 18 a 19%, os nobres de 15 a 16% e o clero de 3 a 4%, enquanto um-quinto era de terras comuns.” (p. 41) ● Na verdade a grande maioria não tinha terras ou tinha quantidade insuficiente. ● Nos 20 anos precedentes à Revolução, os camponeses estavam em situação cada vez pior, com os altos tributos e preços crescentes. Os problemas financeiros da monarquia agravaram esse quadro. ● A guerra e a dívida - a guerra americana e sua dívida - partiam a espinha da monarquia. ● A revolução começou como uma tentativa aristocrática de recapturar o Estado, mas foi mal calculada por subestimar as forças independentes e desprezar a profunda crise sócio-econômica no meio da qual lançava suas exigências políticas. ● A Revolução Francesa não possuía um movimento ou partido organizado na liderança, se deu por um incrível consenso de ideias gerais; A “burguesia” de tendência liberal clássica (está aí a importância dos “filósofos” e “economistas”) era esse grupo. A ideologia de 1789 era a maçônica; as exigências burguesas estão na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789. É um manifesto contra a sociedade hierárquica e os privilégios dos nobres, mas não a favor de uma sociedade democrática e igualitária. ● “A propriedade privada era um direito natural, sagrado, inalienável e inviolável.” (p. 42) ● Tinha o caráter meritocrático, representativo; uma monarquia constitucional baseada em uma oligarquia dona de terras era mais adequada à maioria dos liberais burgueses do que a república democrática. ● “Mas no geral, o burguês liberal clássico de 1789 (e o liberal de 1789-1848) não era um democrata mas sim um devoto do constitucionalismo, um Estado secular com liberdades civis e garantias para a empresa privada e um governo de contribuintes e proprietários.” (p.43) ● Oficialmente este seria o governo do “povo”, a “nação francesa”. A rivalidade nacional e a subordinação nacional (entre nações) estavam inplícitas no nacionalismo ao qual a burguesia de 1789 deu sua primeira expressão oficial. “O Povo” identificado como “A Nação” era um conceito revolucionário, mas uma faca de dois gumes. ● O Terceiro Estado queria transformar os Estados Gerais em uma assembleia de deputados votando individualmente, ao contrário do corpo feudal tradicional que deliberava e votava por “ordens” ou “estados”. Essa foi a primeira vitória revolucionária, pois acabou com a hegemonia do clero e da nobreza. ● Cerca de seis semanas após a abertura dos Estados Gerais, os Comuns criaram a Assembleia Nacional; “O Terceiro Estado obteve sucesso, contra a resistência unificada do rei e das ordens privilegiadas, porque representava não apenas as opiniões de uma minoria militante e instruída, mas também [...] trabalhadores pobres das cidades [...] também, o campesinato revolucionário” (p. 43-44). ● Essa agitação reformista foi transformada em revolução pela coincidência da Conclamação dos Estados Gerais com uma profunda crise econômica. ● As más safras faziam sofrer o campesinato, o pobre do interior e das cidades. ● “Mas em 1788 e 1789 uma convulsão de grandes proporções no reino e uma campanha de propaganda e eleição deram ao desespero do povo uma perspectiva política.” (p. 44). O resultado mais sensacional foi a queda da Bastilha, em tempos de revolução nada é mais poderoso do que a queda de símbolos. - Grande Medo, fins de julho e princípio de agosto de 1789. ● Três semanas após o 14 de julho, a estrutura social do feudalismo rural francês e a máquina estatal da França Real ruíam em pedaços. ● “Em contrapartida, o rei resistiu com sua costumeira estupidez, e setores revolucionários da classe média, amedrontados com as implicações sociais do levante de massa começaram a pensar que era chegada a hora do conservadorismo.” (p. 45) ● “[...] com repetições e variações do modelo resistência - mobilização de massa - inclinação para a esquerda - rompimento entre os moderados - inclinação para a direita - até que o grosso da classe média passe daí em diante para o campo conservador ou seja derrotado pela revolução social.” (p. 45) ● A peculiaridade da Revolução Francesa são os jacobinos, que veio a significar “revolução radical”, facção da classe média liberal que estava pronta para continuar revolucionária até e mesmo além do limiar da revolução anti-burguesa. ● “Por quê? Em parte, é claro, porque a burguesia francesa não tinha ainda para temer, como os liberais posteriores, a terrível memória da RevoluçãoFrancesa [...] Por outro lado, os jacobinos podiam sustentar o radicalismo porque em sua época não existia uma classe que pudesse fornecer uma solução social coerente como alternativa à deles.” (p. 45) ● Sansculottes: Única alternativa para o radicalismo burguês. “Mas o movimento dos sansculottes também não forneceu nenhuma alternativa real. O seu ideal, um passado dourado de aldeões e pequenos artesãos ou um futuro dourado de pequenos fazendeiros e artífices não perturbados por banqueiros e milionários, era irrealizável. A história se movia silenciosamente contra eles. O máximo que podiam fazer - e isto eles conseguiram em 1793-4 - era erguer obstáculos à sua passagem, os quais dificultaram o crescimento econô-mico francês daquela época até quase a atual. De fato, o sansculottismo foi um fenómeno tão desamparado que seu próprio nome está praticamente esquecido, ou só é lembrado como sinónimo do jacobinismo que lhe deu liderança no Ano II.” (p. 46) ● Entre 1789 e 1791 a burguesia vitoriosa tinha se transformado na Assembleia constituinte da França, que era seu objetivo. “A maioria dos empreendimentos institucionais duradouros da revolução datam deste período, assim como os seus mais extraordinários resultados internacionais, o sistema métrico e a emancipação pioneira dos judeus.” (p. 46) - Economicamente eram inteiramente liberais. ● A monarquia era apoiada por uma poderosa facção burguesa ex-revolucionária, mas ainda almejava uma retomada. O rei após fugir foi recapturado em Varennes (junho de 1791) e daí em diante o republicanismo tornou-se uma força de massa. ● “A eclosão da guerra agravou a situação; isto quer dizer que ela ocasionou uma segunda revolução em 1792, a República Jacobina do Ano II , e, consequentemente, Napoleão.” (p. 47) - Extrema direita e a esquerda moderada ● Era cada vez mais evidente pros nobres e governantes por direito divino de outros países que a ajuda à Luís XVI era importante para que não houvesse uma difusão das ideias perturbadoras vindas da França. ● “Todos os planos para a libertação europeia até 1848 giravam em torno de um levante conjunto dos povos, sob a liderança dos franceses, para derrubar a reação europeia; e, depois de 1830, outros movimentos de revolta nacional e liberal, corno o italiano e o polonês, também tenderam a ver suas nações em certo sentido como o Messias destinado por sua própria liberdade a iniciar os planos libertários de todos os outros povos.” (p. 47) ● A Guerra ajudaria também a solucionar numerosos problemas domésticos. A maioria da nova Assembleia Legislativa, exceto uma ala direitista e outra esquerdista, pregava a guerra. “Por estas razões também, quando a guerra chegou, as conquistas da revolução viriam a combinar a libertação, a exploração e a digressão política.” (p. 48). Foi declarada em abril de 1792. ● “A guerra foi declarada em abril de 1792. A derrota, que o povo (bem plausivelmente) atribuiu à sabotagem e à traição real, trouxe a radicalização. Em agosto-setembro, a monarquia foi derrubada, a República estabelecida e uma nova era da história humana proclamada, com a instituição do Ano I do calendário revolucionário, pela ação armada das massas sansculottes de Paris. A heróica idade de ferro da Revolução Francesa começou entre os massacres dos prisioneiros políticos, as eleições para a Convenção Nacional - provavelmente a mais notável assembleia na história do parlamentarismo - e a conclamação para a resistência total aos invasores. O rei foi feito prisioneiro é a invasão estrangeira sustada por um nada dramático duelo de artilharia em Valmy.” (p. 48) ● O partido dominante na nova Convenção era o dos girondinos. ● “No decorrer de sua crise, a jovem República Francesa descobriu ou inventou a guerra total: a total mobilização dos recursos de uma nação através do recrutamento, do racionamento e de uma economia de guerra rigidamente controlada, e da virtual abolição, em casa e no exterior, da distinção entre soldados e civis.” (p. 48) ● Os sansculottes saudaram um governo revolucionário de guerra; Os girondinos temiam as consequencias políticas da combinação de uma revolução de massa com a guerra que eles provocaram; A expansão da guerra, principalmente quando ela ía mal, fortaleceu a esquerda. - Revolta provinciana organizada contra Paris. ● “Um rápido golpe dos sansculottes derrubou-a em 2 de junho de 1793. Tinha chegado a República Jacobina.” (p. 49) ● “Em junho de 1793, 60 dos 80 departamentos franceses estavam em revolta contra Paris; os exércitos dos príncipes alemães estavam invadindo a França pelo norte e pelo leste; os britânicos atacavam pelo sul e pelo oeste: o país achava-se desamparado e falido. Quatorze meses mais tarde, toda a França estava sob firme controle, os invasores tinham sido expulsos, os exércitos franceses por sua vez ocupavam a Bélgica e estavam perto de começar um período de 20 anos de quase ininterrupto e fácil triunfo militar.” (pp. 49-50) ● “Para estes homens, como de fato para a maioria da Convenção Nacional que no fundo deteve o controle durante todo este período, a escolha era simples: ou o Terror, com todos os seus defeitos do ponto de vista da classe média, ou a destruição da Revolução, a desintegração do Estado nacional e provavelmente - já não havia o exemplo da Polónia? - o desaparecimento do país.” (p. 50) ● Tarefas do regime jacobino: mobilizar as massas contra a dissidência dos notáveis e girondinos provincianos e preservar o apoio dos sansculottes em Paris - recrutamento geral, terrorismo contra os “traidores” e controle geral dos preços. - Primeira constituição genuinamente democrática proclamada por um Estado moderno: Jacobinos. - Estimularam os negros de São Domingos (atual Haiti). ● “Tanto os grandes negócios quanto os movimentos trabalhistas foram longamente condenados a permanecer fenómenos minoritários na França, ilhas cercadas por um oceano de donos de mercearia vendedores de cereais, pequenos proprietários camponeses e donos de cafés.” (p. 51) ● O centro do novo governo, Jacobinos e Sansculottes, inclinou-se claramente para a esquerda. ● Para Maximilien Robespierre, a República Jacobina não era um instrumento para ganhar guerras, mas sim um ideal. Jean Jacques Rousseau e a cristalina convicção de justiça deram-lhe sua força. Era membro do Comitê de Salvação Pública, um subcomitê da Convenção. ● O regime era uma aliança entre a classe média e os trabalhadores, mas mais voltada para os primeiros. Além disso, ocorreu um processo semelhante ao da Guerra Civil Espanhola de1936-9, que fortaleceu os comunistas à custa dos anarquistas; fortaleceu os jacobinos do tipo Saint-Just à custa dos sansculottes do tipo de Hébert. ● “Por fim, as necessidades económicas da guerra afastaram o apoio popular.” (p. 51) ● “Por volta de abril de 1794, tanto a direita quanto a esquerda tinham ido para a guilhotina, e os seguidores de Robespierre estavam portanto politicamente isolados. Somente a crise da guerra os mantinha no poder. Quando, no final de junho de 1794, os novos exércitos da República demonstraram sua firmeza derrotando decididamente os austríacos em Fleurus e ocupando a Bélgica, o fim estava perto. No Nono Termidor pelo calendário revolucionário (27 de julho de 1794). a Convenção derrubou Robespierre. No dia seguinte, ele, Saint-Just e Couthon foram executados, e o mesmo ocorreu alguns dias depois com 87 membros da revolucionária Comuna de Paris.” (p. 52) ● As rápidas alternâncias de diversos regimes de 1795 à 1870 foram todas tentativas de se manter uma sociedade burguesa evitando o perigo da República Jacobina e do velho regime. ● Temidorianos: equilíbrio entre a esquerda e a direita, mas dependendo do exército para dispensar a oposição cada vez mais. ● Mistura bonapartista: reter as características da Revolução e adquirir as características do interesse estabelecido. A Revolução o deu uma superioridade militar sem precedentes. Napoleão venceu batalhas; seus marechais sozinhos tendiam a perdê-las. ● “Por outro lado, o exército era uma carreira comoqualquer outra das muitas abertas ao talento pela revolução burguesa, e os que nele obtiveram sucesso tinham um interesse investido na estabilidade interna como qualquer outro burguês.” (p. 54) ● Napoleão nascido em 1769 na Córsega, reconhecido por um comissário local como um soldado de dons esplêndidos e muito promissor. O Ano II fez dele um general. Agarrou sua chance na campanha italiana de 1796. Tornou-se primeiro cônsul, depois cônsul vitalício e Imperador. ● “Em poucos anos a França tinha um Código Civil, uma concordata com a Igreja e até mesmo o mais significativo símbolo da estabilidade burguesa - um Banco Nacional. E o mundo tinha o seu primeiro mito secular.” (p. 54) ● “Foi, sem sombra de dúvidas, um grande homem e -talvez com a exceção de Lênin - seu retrato é o que a maioria das pessoas razoavelmente instruídas, mesmo hoje, reconheceriam mais prontamente numa galeria de personagens da história, ainda que somente pela tripla marca registrada do tamanho pequeno, do cabelo escovado para a frente sobre a testa e da mão enfiada no colete entreaberto. Talvez não tenha sentido fazer uma comparação dele, em termos de grandeza, com candidatos a esse título no século XX.” (p. 54) ● “Os homens que se tornaram conhecidos por terem abalado o mundo de forma decisiva no passado tinham começado como reis, como Alexandre, ou patrícios, como Júlio César, mas Napoleão foi o "pequeno cabo" que galgou o comando de um continente pelo seu puro talento pessoal. (Isto não foi estritamente verdadeiro, mas sua ascensão foi suficientemente meteórica e alta para tornar razoável a descrição.)” (p. 55) ● “Para os franceses ele foi também algo bem mais simples: o mais bem-sucedido governante de sua longa história. Triunfou gloriosamente no exterior, mas, em termos nacionais, também estabeleceu ou restabeleceu o mecanismo das instituições francesas como existem até hoje.” (p. 55) ● “Ele destruíra apenas uma coisa: a Revolução Jacobina, o sonho de igualdade, liberdade e fraternidade, do povo se erguendo na sua grandiosidade para derrubar a opressão. Este foi um mito mais poderoso do que o dele, pois, após a sua queda, foi isto e não a sua memória que inspirou as revoluções do século XIX, inclusive em seu própric país.” (p. 55)
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