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ACADEMIA BRASILEIRA DE DIREITO CONSTITUCIONAL GUSTAVO PARIZOTTO MORAES O ARTIGO 142 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988: O OVO DA SERPENTE CURITIBA 2020 GUSTAVO PARIZOTTO MORAES O ARTIGO 142 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988: O OVO DA SERPENTE Monografia apresentada ao Curso de Pós- Graduação em Direito Constitucional da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst) como requisito parcial à obtenção do título de Especialista. Orientador: Prof. Me. Luis Henrique Braga Madalena CURITIBA 2020 RESUMO A presente pesquisa tem como objeto fundamental compreender a invocação do artigo 142 da Constituição Federal de 1988 como legitimadora de uma intervenção militar constitucional. Tal pedido surge em um contexto de polarização política e de incapacidade de articulação por parte do Poder Executivo, a solução seria a atuação das Forças Armadas como Poder Moderador. Essa ideia, entretanto, é incoerente com uma das bases do constitucionalismo: o afastamento de um poder absoluto e o consequente fracionamento de seu exercício. Apesar disso, a Constituinte de 1987 não expurgou totalmente a influência castrense de seus trabalhos, o percurso do futuro artigo 142 nos debates da Assembleia Nacional Constituinte demonstra como a limitação absoluta da atuação militar na segurança interna do país não era interessante a alguns deputados e senadores. Essa ruptura entre espaço de experiência e horizonte de expectativa é explicada pelo estudo do contexto histórico do período de redemocratização e compreensão da política como projeção de embates entre grupos sociais. Vale dizer: o fim da Ditadura Militar no Brasil se deu por uma reabertura política tutelada que pode explicar a contraditória permanência de dispositivos que garantam a atuação das Forças Armadas. Essa distensão mediada também pode elucidar o constante apelo de grupos sociais à uma intervenção militar constitucional. Compreender historicamente esse movimento não significa dar-lhe razão jurídica, ao final fica evidente a impossibilidade de utilização do artigo 142 a fim de reconhecer a existência de um Poder Moderador. Conclui-se que conflitos entre Executivo, Legislativo e Judiciário decorrem da natureza da Constituição e é a partir dela que devem ser solucionados sob pena de ofensa ao princípio de harmonia e independência dos Poderes Constitucionais. Palavras-chave: intervenção militar constitucional; Constituinte de 1987; artigo 142; separação de poderes SUMÁRIO INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 05 1 INTERVENÇÃO MILITAR CONSTITUCIONAL ............................................... 08 2 O PODER CONSTITUINTE ..................................................................................... 21 3 A CONSTITUINTE DE 1987 .................................................................................... 28 4 FORÇAS ARMADAS: ESPAÇO DE EXPERIÊNCIA E HORIZONTE DE EXPECTATIVA ........................................................................................................... 51 5 ANÁLISE JURÍDICA DO ARTIGO 142 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ...................................................................................................................................... 62 CONCLUSÃO.............................................................................................................. 77 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................ 82 5 INTRODUÇÃO O presente trabalho foi desenvolvido como requisito para a conclusão do curso de pós-graduação em Direito Constitucional da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pelas diversas abordagens possíveis da Constituição, um estudo estritamente legislativo acaba ignorando outros aspectos e interações possíveis entre disciplinas. O objetivo presente não é enfraquecer o Direito nem o deixar em segundo plano, busca-se enriquecer o debate trazendo elementos variados ainda que a resposta adequada aos problemas apresentados no trabalho seja alcançada no âmbito jurídico. As próprias aulas ministradas ao longo do curso de pós-graduação demonstraram a complexidade da Constituição e como é possível estudá-la sob diferentes enfoques: a abordagem econômica do Direito realizada pelos professores Bernardo Strobel e Ilton Norberto Robl Filho; os desafios sobre gestão pública e o conflito com leis levantados por Gustavo Fruet; as relações de trabalho na Constituição em apresentação do professor Cassio Colombo; a apresentação sobre a tecnologia e a inteligência artificial nos julgamentos do Supremo Tribunal Federal do professor Alexandre Morais da Rosa etc. Talvez um dos principais objetos do Direito Constitucional que possibilitem essa interdisciplinaridade seja o Poder Constituinte. Porém, esse é um tema muito amplo sobre o qual seria impossível um estudo coeso e satisfatório. A realidade política do país no ano de 2020 oportunizou a delimitação temática além de atribuir relevância e pertinência ao trabalho: as manifestações populares exigindo uma intervenção militar constitucional que foram proeminentes no primeiro semestre do ano ainda têm importância no debate político brasileiro. Assim, o projeto a seguir se insere no subtema Poder Constituinte dentro da disciplina do Direito Constitucional mas busca relacionar uma série de aspectos que compõe a análise do artigo 142 da Constituição Federal de 1988. Um dos objetivos centrais do trabalho é escapar da simples compilação de conceitos e institutos. Logicamente há a necessidade de ancorar o debate em doutrina jurídica mas sempre como instrumento para outras discussões, há 6 a tentativa de integração de disciplinas e ideias. Portanto, os capítulos a seguir são mais suscetíveis a críticas e a correções mas podem contribuir de alguma forma com a atual discussão sobre o artigo citado, ponto central do estudo. Ademais, esse é outro aspecto que se considera essencial: a importância de posicionamento e de manifestação da comunidade jurídica além da necessidade de um controle externo de decisões judiciais. Ou seja, parte-se de uma problemática inicial para, ao final, uma sugestão de resposta dentro dos limites do trabalho. A partir de pedidos por uma intervenção militar constitucional é possível levantar uma série de perguntas. Qual o contexto e os motivos dos pedidos pela referida intervenção? Por que há o apelo ao artigo 142 da Constituição Federal de 1988? Como foi a criação desse dispositivo? Quais os aspectos gerais de uma Constituinte? Como foi a Constituinte brasileira de 1987? Qual era o contexto histórico do período? Quais as respostas jurídicas possíveis para a interpretação do referido artigo? Em resumo: como foi criado o artigo 142 da Constituição Federal de 1988 e há possibilidade jurídica para o reconhecimento de uma intervenção militar constitucional? Para tentar responder às perguntas acima, o trabalho foi dividido em cinco capítulos. No primeiro capítulo, há a contextualização do debate. Busca- se entender o motivo pelo qual os pedidos pela intervenção militar constitucional ganharam força em 2020. Assume-se a separação de poderes como um tema importante e intimamente ligado ao conceito de Constituição dando sentido ao restante do projeto. Por isso, o segundo capítulo apresenta noções sobre a Constituição e o Poder Constituinte com atenção à ideia de desconcentração do poder. Com o direcionamento de tal debate para o contexto brasileiro, fica evidente a necessidade de estudo da Constituinte de 1987. O terceiro capítulo tem como objetivoretomar o processo constituinte com foco nos dispositivos que, futuramente, iriam se transformar no artigo 142 da atual Constituição. Enquanto essa parte do trabalho é em grande parte descritiva, no capítulo seguinte há a contextualização histórica da Constituinte de 1987. Por fim, tendo apresentado diversos pontos que auxiliam no entendimento do tema, no capítulo cinco há a abordagem jurídica do problema. As discussões anteriores se relacionam tornando possível a compreensão das 7 manifestações doutrinárias, da interpretação a partir da hermenêutica constitucional, dos debates entre juristas, das decisões judiciais e dos pareceres de diversas entidades. A conclusão faz um balanço do trabalho e sintetiza a resposta possível à questão principal: é possível uma intervenção constitucional militar? Para desenvolver os capítulos, pela atualidade do tema, foram utilizadas por diversas vezes reportagens jornalísticas de portais especializados e periódicos de reconhecimento nacional. Também foi imprescindível o embasamento em doutrina através de cursos, manuais e artigos específicos sobre temas como a relação entre poderes, o poder constituinte, a interpretação constitucional, o artigo 142 da Constituição Federal etc. No último capítulo, por conta dos objetivos já citados, há ainda a menção sobre a questão hermenêutica levantada por Lenio Streck. Também, foi necessária uma breve discussão sobre a Nova História Política e sobre o conceito de Tempo Histórico de Reinhart Koselleck no capítulo sobre a contextualização histórica da Constituinte. Principalmente nos capítulos dois e quatro obras de historiadores foram utilizadas. As fontes primárias se concentram no terceiro capítulo, nele foram analisadas atas e diversos textos oficiais disponibilizados pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados. 8 1. INTERVENÇÃO MILITAR CONSTITUCIONAL A opção constitucional brasileira de organização do Estado foi pelo fracionamento do exercício do poder como é possível ler no artigo 2º da Constituição Federal: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”1 Em linhas introdutórias, há momentos em que as atuações dos poderes acabam se tangenciando de maneira esperada e, até mesmo, desejada pelo ordenamento jurídico. O artigo 84 da Constituição Federal prevê que é competência privativa do Presidente da República a nomeação de Ministros de Estado. Em 2016, a então Presidente Dilma Rousseff desejou nomear o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva como Ministro Chefe da Casa Civil e foi impedida por decisão liminar do Supremo Tribunal Federal provocada em um mandado de segurança impetrado pelo Partido Popular Socialista (PPS) e pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Nesse exemplo, o exercício do Poder Executivo foi limitado pelo exercício do Poder Judiciário, o Ministro Gilmar Mendes em sua decisão fundamentou esse ponto afirmando que Apesar de ser atribuição privativa do Presidente da República a nomeação de Ministro de Estado (art. 84, inciso I, da CF), o ato que visa o preenchimento de tal cargo deve passar pelo crivo dos princípios constitucionais, mais notadamente os da moralidade e da impessoalidade (interpretação sistemática do art. 87 c/c art. 37, II, da CF). 2 Esse é apenas um dos variados casos de interação entre Poderes na vigência da atual Constituição Federal. Entretanto, para o recorte do presente trabalho, nos parece que o atual cenário político tornou quase permanente essa dinâmica. 1 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicao.htm. Acesso em: 10 out. 2020. 2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar em Mandado de Segurança n. 34.071. Impetrante: Partido da Social Democracia Brasileira. Impetrado: Presidente da República. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Brasília, 18 mar. 2016. 9 Em sua proposta de governo, o atual Presidente da República Jair Bolsonaro criticou a “forma perniciosa e corrupta de se fazer política nas últimas décadas, caracterizada pelo loteamento do Estado, o popular “toma lá- dá-cá”3”. Ou seja, sinalizou por uma articulação menos flexível com o Congresso Nacional para a aprovação de medidas de seu interesse. Ainda, em entrevista durante a campanha presidencial, o atual chefe do Executivo criticou a atuação do Supremo Tribunal Federal sugerindo a necessidade de aumentar o número de ministros: Da forma que eles têm discutido as questões nacionais, nós realmente não podemos sequer sonhar mudar o destino do Brasil. Eles têm poderes para muita coisa, inclusive estão decidindo se conseguem privatizar alguma coisa com a participação do parlamento ou não. O Supremo pode inclusive decidir algo que a prisão em segunda instância não seria mais possível, onde seriam todos os bandidos, já condenados em segunda instância, colocados em liberdade. 4 Vale dizer, para cumprir seus projetos de campanha, Jair Bolsonaro invariavelmente entraria em confronto com os outros poderes de forma muito direta. Independente de eventual derrota ou vitória governista, foi o que aconteceu nos últimos meses como é possível observar através das notícias e análises a seguir. Durante as discussões sobre a reforma da previdência, projeto de interesse do Executivo em março de 2020, Bolsonaro rechaçou o que costuma chamar de velha política. Havia no momento a necessidade de construção de base de apoio no Congresso Nacional para as votações que se seguiriam quanto ao tema.5 3 BOLSONARO, Jair Messias. Proposta de Governo. Brasil: Coligação Brasil acima de tudo, Deus acima de todos, 2018. Disponível em: https://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes- 2018/propostas-de-candidatos. Acesso em: 10 out. 2020. 4 Bolsonaro quer aumentar para 21 o número de ministros no STF. Zero Hora, Porto Alegre, 02 jul. 2018. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/politica/eleicoes/ noticia/2018/07/ bolsonaro-quer-aumentar-para-21-o-numero-de-ministros-no-stf- cjj4nrlen0iao01pabnwkqwy4.html. Acesso em: 10 out. 2020. 5 Ataques entre Bolsonaro e Maia têm de velha política a socorro à pandemia; relembre os embates. Folha de S. Paulo, São Paulo, 17 abr. 2020. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/04/ataques-entre-bolsonaro-e-maia-tem-de-velha- politica-a-socorro-a-pandemia-relembre-os-embates.shtml. Acesso em: 10 out. 2020. 10 Em abril desse ano, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de socorro da União aos Estados e Municípios devido à crise de saúde decorrente da pandemia da COVID19. Na ocasião, Jair Bolsonaro fez ataques ao presidente da casa legislativa, Rodrigo Maia6. Em maio, o presidente acabou sancionando o projeto de lei complementar com vetos. Também em abril, o Ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal suspendeu a nomeação de Alexandre Ramagem à diretoria-geral da Polícia Federal. Nome desejado pelo chefe do Executivo para assumir o cargo.7 Mais uma vez em abril de 2020, o Supremo Tribunal Federal entendeu que Estados e Municípios poderiam adotar medidas sanitárias no combate ao COVID19, possibilidade que não agradou ao Presidente da República já que os entes federativos não compartilham da mesma estratégia de atuação.8 Ainda, a política de combate à pandemia com a divulgação de campanhas pelo Executivo contrárias ao recomendado pelos órgãos e organizações competentes foi alvo de proibição pelo Ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal.9 Outra questão que gerou controvérsia foi a Medida Provisória que acabava com a cobrança do DPVAT. No final de 2019 ela foi suspensapelo Supremo Tribunal Federal sinalizando outra discordância entre os poderes.10 Também em duas tentativas por Medida Provisória o Presidente da República visou retirar a demarcação de terras indígenas do escopo da FUNAI e transferi-la ao Ministério da Agricultura. Não obteve êxito em nenhuma delas já que tanto o Congresso Nacional quanto o Supremo Tribunal Federal vetaram a manobra.11 Em decreto, Jair Bolsonaro extinguiu os Conselhos Federais de Administração Pública, novamente o Supremo Tribunal Federal impôs limites à 6 Idem. 7 Relembre cinco episódios em que o STF impôs limites a Bolsonaro. O Globo, Rio de Janeiro, 29 abr. 2020. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/relembre-cinco-episodios-em-que- stf-impos-limites-bolsonaro-1-24401562. Acesso em: 10 out. 2020. 8 Idem. 9 Idem. 10 Idem. 11 Idem. 11 atuação do Poder Executivo ao determinar que somente aqueles criados pela via administrativa poderiam ser extintos12. Outro ponto de conflito entre o Poder Judiciário e o Poder Executivo foi a divulgação de vídeo de uma reunião ministerial da qual participou o Presidente da República. Jair Bolsonaro chegou a insinuar, em um dos maiores embates entre os poderes, que o levantamento do sigilo por parte do Supremo Tribunal Federal seria abuso de autoridade13. Como último exemplo, o Supremo Tribunal Federal julgou pelo prosseguimento do “inquérito das fake news” gerando mais um desconforto ao Presidente da República já que os alvos da operação são pessoas a ele ligadas14. Dados também indicam um governo com dificuldades de relacionamento com outros poderes. Apesar de editar um número de medidas provisórias semelhante ao de outros presidentes em seu primeiro ano de mandato, Jair Bolsonaro teve apenas 23% delas aprovadas15. O Congresso Nacional também demonstrou desalinhamento ao derrubar praticamente um de cada três vetos presidenciais. Ainda, levantamento feito pelo Estadão16 revelou que leis e atos normativos de competência do Poder Executivo atual foram alvo de 45 ações diretas de inconstitucionalidade ou arguições de descumprimento de preceito fundamental até setembro de 2019, em período equivalente, o presidente anterior foi questionado 19 vezes. Por fim, o número de decretos também aumentou bastante: dos 244 editados por Dilma Rousseff no primeiro ano de seu segundo mandato (2015) para os 536 de 2019 em evidente necessidade de medidas que não dependam do Poder Legislativo. 12 Idem. 13 OLIVEIRA, Marcelo. Divulgação de vídeo presidencial não é abuso de autoridade, dizem juristas. UOL, São Paulo, 25 mai. 2020. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/05/25/divulgacao-de-video-presidencial- nao-e-abuso-de-autoridade-dizem-juristas.htm. Acesso em: 10 ou. 2020. 14 Inquérito das Fake News: STF decide continuar investigação que atinge aliados de Bolsonaro. BBC, São Paulo, 18 jun. 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53003097. Acesso em: 10 out. 2020. 15 CALEIRO, João Pedro. Fracasso em aprovar medidas provisórias marcou governo Bolsonaro. Exame, São Paulo, 21 dez. 2019. Disponível em: https://exame.com/brasil/fracasso- em-aprovar-medidas-provisorias-marcou-governo-bolsonaro/. Acesso em: 10 out. 2020. 16 Sem articulação, oposição investe em ações no STF contra Bolsonaro. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 22 set. 2019. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,sem-articulacao-oposicao-investe-em-acoes-no-stf- contra-bolsonaro,70003019596. Acesso em: 10 out. 2020. 12 Todos esses conflitos são exemplos da relação entre as esferas de poder e fomentam debates sobre a governabilidade do país quando ela se torna problemática. Por que então haveria a necessidade de dividir o poder estatal? Com o declínio do Antigo Regime a partir do final do século XVIII na Europa Ocidental, houve o surgimento de novas formas de organização política daquelas sociedades. O fortalecimento de um grupo economicamente poderoso afastou o protagonismo de antigas lideranças embasadas em atributos como a nobreza, a linhagem e a religião. Na França, o descontentamento de várias camadas sociais forjou uma aliança circunstancial para a derrubada da Monarquia Absolutista na Revolução Francesa. Destes, talvez o maior protagonista fora a burguesia, grupo que não necessariamente compartilhava os anseios do campesinato que compunha 80% dos franceses naquele período. Significa dizer que tinham um projeto próprio, Eric Hobsbawm demarca: Uma monarquia constitucional baseada em uma oligarquia possuidora de terras era mais adequada à maioria dos liberais burgueses do que a república democrática que poderia parecer uma expressão mais lógica de suas aspirações teóricas, embora alguns também advogassem esta causa. Mas, de modo geral, o burguês liberal clássico de 1789 (e o liberal de 1789-1848) não era um democrata mas sim um devoto do constitucionalismo, de um Estado secular com liberdades civis e garantias para a empresa privada e de um governo de contribuintes e proprietários. 17 O jurista Paulo Bonavides, no mesmo sentido, destaca que o movimento buscava a postulação de um ordenamento político impessoal mediante formas liberais e de contenção da autoridade.18 O que nos interessa, nesse momento, é destacar o caráter liberal daquela revolução em contraponto ao poder absoluto deposto. Entretanto, não se pode confundir a negação ao poder concentrado com a negação ao poder propriamente dito, o excerto acima deixa claro como a burguesia queria em 17 HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções. 9. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996. p. 77. 18 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. rev. e atual. São Paulo, Malheiros: 2001. p. 180. 13 verdade reorganizá-lo. A solução encontrada foi a cisão no exercício do poder nos moldes do defendido por Montesquieu, o artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão é enfática: “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição”19. Nas lições de Bonavides, a teoria do filósofo francês se baseou na repartição de atribuições entre o Poder Legislativo, o Poder Executivo das coisas que dependem do direito das gentes (Poder Executivo) e do Poder Executivo das coisas que dependem do direito civil (Poder Judiciário). O paralelo dessa divisão com aquelas futuramente feitas nos mais diversos Estados é complexa, o que se quer evidenciar aqui é o impacto20 da ideia de separar o poder em instâncias. Ainda mais, é importante destacar que essa separação não simplesmente isola os poderes mas cria uma interdependência através dos chamados checks and balances, freios e contrapesos: Assim, o princípio de Montesquieu, ratificado e adaptado por Hamilton, Madison e Jay, foi a essência da doutrina exposta no Federalist, de contenção do poder pelo poder, que os norte- americanos chamaram sistema de freios e contrapesos. 21 No Brasil, inaugurou-se a separação de poderes derivada da tradição de Montesquieu na Constituição de 1891. Antes disso, o Brasil serviu, nas palavras de Bonavides, de laboratório22 ao manter a influência real mascarada em um Poder Moderador além dos outros três poderes tradicionais. Com o surgimento de novas demandas e o arrefecimento de outras, a sociedade passou a exigir atuação maior ou menor de cada poder. Angela Cristina Pelicioli, opta por utilizar as palavras de Nuno Piçarra: A prática constitucional veio “revelar que o sistema de freios e contrapesos determinou, afinal, não um equilíbrio permanente entre 19 Ibidem. p. 182. 20 Paulo Bonavides cita Madison:“O oráculo que sempre se consulta e cita a esse respeito é o celebrado Montesquieu. Se não foi ele o autor deste valioso preceito da ciência política, teve ao menos o mérito de expô-lo e recomendá-lo do modo mais eficaz à atenção da humanidade.” 21 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 319. 22 BONAVIDES, Paulo. Op. Cit. p. 184. 14 os ‘poderes separados’, mas sim a predominância cíclica de cada um deles” (PIÇARRA, 1989, p. 184) 23 . A separação de poderes ganhou nova leitura no período pós-guerras em que a necessidade de concretização de direitos fundamentais se torna crescente. Retomando a ideia da predominância cíclica, o Poder Judiciário parece ser a função mais destacada no constitucionalismo contemporâneo. Se a ideia revolucionária era superar o absolutismo inaugurando um liberalismo burguês, o fracionamento atual escancara o Judiciário como instrumento viabilizador das conquistas constitucionais.24 As novas demandas sociais acabam por judicializar a política25, atuação que não deve ser confundida com o ativismo judicial26, Lenio Streck e José Luis Bolzan de Morais citam Ferrajoli na definição do Judiciário como poder de garantia: [...] a atuação jurisdicional acabou sendo redimensionada, o que se tornou ainda mais evidente nos países da América Latina, que tiveram a realização dos direitos sociais previstos em suas constituições prejudicada pela eclosão de regimes ditatoriais. 27 Outros autores também entendem que o contexto recente fez com que o Poder Judiciário seja evidenciado, Manoel Gonçalves Ferreira Filho disserta: O Judiciário, em todas as suas instâncias, tem-se substituído ao Executivo na determinação de políticas públicas, ou na orientação destas. Sob o acicate principalmente do Ministério Público, tornado plenamente autônomo pela Constituição em vigor, em resposta a ações civis públicas, às vezes em mandados de segurança coletivos, 23 PELICIOLI, Angela Cristina. A atualidade da reflexão sobre a separação de poderes. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 43, n. 169, p. 21-30, jan./mar. 2006. 24 FREIRE JÚNIOR, Américo Bedê. A Separação dos Poderes (Funções) nos dias atuais. Revista Direito Administrativo. Rio de Janeiro, n. 238, p. 37-41, out./dez. 2004. 25 Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “O destaque atual do Judiciário vem das funções políticas que vem assumindo. Isto certamente é ensejado por instrumentos previstos na Constituição e pelas particulares desta, entretanto, já foi muito além do que os constituintes ou os exegetas do texto de 1988 imaginaram. Ocorre uma “judicialização da política” que leva a uma “politização”, em mais de um sentido, do próprio Poder Judiciário.” (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A Separação dos Poderes: a doutrina e sua concretização constitucional. Cadernos Jurídicos. São Paulo, ano 16, n. 40, p. 67-81, abr./jun. 2015.) 26 STRECK, Lenio Luiz & MORAIS, José Luiz Bolzan de. Ciência Política e Teoria Geral do Estado, 8. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014. p. 177. 27 Idem. 15 etc., vem ele obrigando o Executivo a desencadear políticas públicas. 28 Ainda assim é necessário ressaltar sempre que esse destaque não pode se confundir com o domínio do Judiciário em detrimento de outros poderes. Mesmo que o holofote esteja em um deles, todos constituem um poder uno e indissociável. Américo Bedê Freire Junior explica que: É certo que uma postura mais ativa do Judiciário implica em possíveis zonas de tensões com as demais funções do Poder, todavia não se defende uma supremacia de qualquer das funções, mas sim a supremacia da Constituição, que implica que o Judiciário não é um mero carimbador de decisões políticas das demais funções. 29 Enquanto o Judiciário cada vez mais vincula sua atuação ao resguardo da Constituição Federal, o Poder Executivo e o Poder Legislativo se relacionam no que Sérgio Abranches30 chamou de presidencialismo de coalização31. O sistema presidencialista unido ao multipartidarismo e à proporcionalidade na eleição de legisladores faz com que haja uma interdependência entre esses poderes para a governabilidade do país. Ou seja, as pautas políticas que por vezes são objeto de disputa judicial, antes foram tensionadas pelo Executivo e Legislativo. Mariana Batista faz interessante análise exemplificando essa disputa em estudo sobre como o Presidente da República julga a necessidade de nomear Ministros de Estado com representantes de partidos dos quais deseja apoio. Pode distribuir os cargos em um acordo justamente para aumentar sua influência no Poder Legislativo ou pode o chefe do Poder Executivo considerar essa manobra desnecessária e centralizar as pastas em seu partido ou até mesmo em sua própria pessoa.32 No período estudado (1995-2010), a autora revela que 28 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Op. Cit. 29 FREIRE JÚNIOR, Américo Bedê. Op. Cit. 30 ABRANCHES, Sérgio Henrique de. Presidencialismo de Coalizão: o dilema institucional brasileiro. Revista Dados, v. 31, n. 1, p. 5-34, 1988. 31 Há autores como Fernando Limongi que questionam a ideia de que o presidencialismo de coalizão seria exclusividade brasileira. Ver: LIMONGI, Fernando. Presidencialismo, coalizão partidária e processo decisório. Novos Estudos, n. 76, p. 17-41, nov. 2006. 32 BATISTA, Mariana. O Poder no Executivo: uma análise do papel da Presidência e dos Ministérios no presidencialismo de coalizão brasileiro (1995-2010). Opinião Pública, v. 19, n. 2, p. 449-473, nov. 2013. 16 Governos de coalizão são frequentes no Brasil desde o processo de redemocratização. O “presidencialismo de coalizão” brasileiro, resultado do sistema presidencialista e do multipartidarismo, manteve sua estabilidade e gerou altas taxas de sucesso para a agenda legislativa do Presidente. 33 O que poderia ser apenas uma divisão harmônica entre poderes no âmbito político também está presente na legislação. Não só no segundo artigo da Constituição Federal, como também em vários momentos do ordenamento jurídico brasileiro é possível identificar a manifestação prática desse mecanismo. O parágrafo único do artigo 101 da Constituição Federal determina que a nomeação dos Ministros do Supremo Tribunal Federal será feita pelo Presidente da República após a sabatina no Senado Federal. Exemplo em que fica evidente a influência do Poder Executivo e do Poder Legislativo sobre o Poder Judiciário. Como atribuição típica, ao Legislativo cabe a elaboração de leis. Entretanto, o Presidente da República pode editar medidas provisórias que terão força de lei e serão apreciadas pelo Congresso Nacional como prevê o artigo 62 da Constituição Federal. Nesse ponto, é possível identificar a porosidade das competências de cada poder e ainda, mais uma vez, como a própria Carta Magna deliberadamente traça rotas de colisão entre Legislativo e Executivo. Outra forma de controle do poder pelo poder é aquele realizado pelo Legislativo, com auxílio do Tribunal de Contas da União, no Executivo quando da apreciação das contas prestadas anualmente pelo Presidente da República. É o que assegura o artigo 71 da Constituição Federal. No momento em que a Constituição Federal escolhe o Supremo Tribunal Federal como sua guardiã, acaba por dar ao Poder Judiciário a possibilidade de controle de constitucionalidade de leis e atos de outros poderes conforme o artigo 102 do texto maior. 33 Idem. 17 A elaboração legislativa sofre ainda o controle do Executivo quando o artigo 66 da Constituição Federal confere ao Presidente da República a tarefa de sanção ou veto dos projetos de lei. A negativa presidencial, por sua vez, não é absolutae pode ser rejeitada pelo Congresso Nacional em votação nos moldes previstos no mesmo artigo citado. Em um processo de impeachment, a Constituição Federal continua a lógica de articulação entre poderes ao exigir a admissão da acusação contra o Presidente da República por dois terços da Câmara dos Deputados e o julgamento pelo Senado Federal. O Poder Judiciário pode intervir na administração pública quando a Constituição Federal dá ao Supremo Tribunal Federal a prerrogativa de aprovar súmulas com efeitos vinculantes. Torna-se claro, portanto, que além do jogo político e a troca de influências daí decorrente, há na própria legislação a previsão de momentos em que a divisão entre poderes é relativizada e, por vezes, há a criação mecanismos de dependência entre eles. Há um controle, fiscalização e coordenação para que nenhum Poder possa se tornar absoluto. Para Bonavides, a separação de poderes vale unicamente por técnica distributiva de funções distintas entre órgãos relativamente separados, nunca porém valerá em termos de incomunicabilidade, antes sim de íntima cooperação, harmonia e equilíbrio, sem nenhuma linha que marque separação absoluta ou intransponível. 34 Apesar disso, teorias acerca da necessidade de um Poder Moderador ganharam força com o governo atual pela dificuldade que o Executivo vem enfrentando para implementar as ideias do Presidente Jair Bolsonaro. Como foi visto, o conflito de interesses acaba por exigir a manifestação do Poder Judiciário e como as decisões não são as desejadas pelo chefe do Executivo e de seus apoiadores, cria-se um ambiente de irresignação. Evoca-se um quarto poder que possa atuar no conflito dos outros, o Poder Moderador que 34 BONAVIDES, Paulo. Op. Cit. p. 187. 18 Benjamim Constant acreditava ser o do rei é, modernamente, atribuído às Forças Armadas.35 O Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes chegou a dizer, analisando o inconformismo do Poder Executivo, que “o sistema de freios e contrapesos estabelecidos pela Constituição está mais ativo agora no governo Bolsonaro porque há "provocações', incluindo ameaças para desativá-los.”36 Com essa tensão entre poderes, derivada da aparente inabilidade de articulação pelo Poder Executivo, vários apoiadores da situação têm defendido a tese de que há forças que impossibilitam o Presidente da República de governar satisfatoriamente. Embora existam mecanismos constitucionais que impeçam uma atuação completamente livre de qualquer um dos poderes, partidários do atual chefe do Executivo julgam que as amarras institucionais estão sendo violadas. Assim, surgiu um movimento que defende uma intervenção militar constitucional que seria juridicamente embasada no artigo 142 da Constituição Federal. Para essa parcela da população, as Forças Armadas seriam invocadas como meio de superar o excesso de intromissão dos Poderes Judiciário e Legislativo no Executivo. Embora tenham ressurgido com mais força em 2020, os pedidos de intervenção militar foram constantes em manifestações populares de protesto contra o governo da então presidente Dilma Rousseff. As Jornadas de Junho, ocorridas no Brasil em 2013, tiveram motivações variadas. Em alguns daqueles eventos, a população, naquele momento contrária ao Executivo Federal, clamava por uma intervenção militar. Esses grupos eram formados em sua maioria de conservadores, religiosos e apoiadores das Forças Armadas37. 35 Entendem alguns que o Poder Moderador, embora houvesse formalmente desaparecido com as Constituições republicanas, continuou em verdade a existir, de 1891 a 1964, tendo por titular não um rei mas as Forças Armadas. (BONAVIDES, Paulo. Op. Cit. p. 185.) 36 GRAGNANI, Juliana. Tensão nos três poderes: como funciona ‘sistema de freios’ entre Congresso, Supremo Tribunal Federal e Bolsonaro. BBC, São Paulo, 17 jun. 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53071440. Acesso em: 10 out. 2020. 37 SP: em meio a protestos, grupo pede volta de militares ao poder. Terra, São Paulo, 26 jun. 2013. Disponível em: https://www.terra.com.br/noticias/brasil/cidades/sp-em-meio-a-protestos- grupo-pede-volta-de-militares-ao- poder,59e34972bc28f310VgnVCM5000009ccceb0aRCRD.html. Acesso em: 10 out. 2020. 19 Durante os pedidos de impeachment de Dilma Rousseff, também foi possível identificar a defesa de pautas pela intervenção militar. Ainda em 2015, parte da população brasileira encontrava nas Forças Armadas um meio de correção dos rumos do país. Pessoas de bem seriam a favor do regime militar, disse uma manifestante ao Estadão38. Em setembro de 2017, o atual Vice-Presidente Antonio Hamilton Mourão chegou a afirmar, quando indagado em uma palestra, sobre uma eventual intervenção constitucional com o emprego das Forças Armadas que: [...]. Até chegar o momento em que ou as instituições solucionam o problema político, pela ação do Judiciário, retirando da vida pública esses elementos envolvidos em todos os ilícitos, ou então nós teremos que impor isso. [...]. Então no presente momento, o que nós vislumbramos, os Poderes terão que buscar a solução. Se não conseguirem, né, chegará a hora que nós teremos que impor uma solução. E essa imposição ela não será fácil, ele trará problemas, podem ter certeza disso aí. 39 Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército à época, também em palestra no mesmo mês, foi no mesmo sentido dando invólucro legalista à tese ao garantir que “Poderemos, eventualmente, ser empregados, mas sempre condicionados por princípios legais e como reza o artigo 142 [da Constituição Federal], por iniciativa de um dos Poderes.”40 Portanto, é inegável que tais ideias estejam nos debates políticos há pelo menos sete anos. Uma das novidades é que a invocação da atuação militar parte da base aliada ao Poder Executivo. Não há o descontentamento com o poder de forma genérica, seria possível indicar aqueles que estariam 38 PERON, Isadora. & SOUZA, Nivaldo. Manifestante pedem intervenção militar com base em regra que não existe na Constituição. Estado de S. Paulo, São Paulo, 12 abr. 2015. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,manifestantes-pedem-intervencao-militar-com- base-em-regra-que-nao-existe-na-constituicao,1668381. Acesso em: 10 out. 2020. 39 General fala em intervenção se Justiça não agir contra corrupção. Folha de S. Paulo, São Paulo, 17 set. 2017. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/09/1919322- general-do-exercito-ameaca-impor-solucao-para-crise-politica-no-pais.shtml. Acesso em: 10 out. 2020. 40 Intervenção só ocorreria a pedido deum dos Poderes, disse comandante do Exército. Folha de S. Paulo, São Paulo, 20 set. 2017. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ poder/2017/09/ 1920115-comandante-do-exercito-disse-que-intervencao-so-ocorreria-com- legalidade.shtml. Acesso em: 10 out. 2020. 20 ultrapassando os limites constitucionais e impedindo a agenda política do Presidente da República. Em 2020, o cenário criado por todos os embates institucionais citados no início do capítulo deu mais peso aos pedidos pela atuação das Forças Armadas. As manifestações puderam contar até mesmo com a presença do próprio Presidente da República. Essa sinalização transformou o assunto em um dos pontos mais atuais da política nacional com defensores e opositores da possibilidade de uma intervenção militar baseada no artigo 142 da Constituição Federal conforme será abordado oportunamente.41 A Constituição Federal de 1988 foi forjada justamente em um momento de superação da atuação dos militares nos destinos civis do país. Argumentos pela volta da influência castrense depois de um período tão curto de governo democráticogeram dúvida sobre a eficácia na contenção do papel das Forças Armadas no momento de elaboração da Constituição Federal. Dessa forma, é importante entender como foi o processo de elaboração da Carta Magna brasileira. 41 O último capítulo do trabalho abordará a questão com a posição de diversos juristas e entidades políticas. 21 2. O PODER CONSTITUINTE No capítulo anterior foi possível entender como a separação de poderes foi elemento essencial no período de superação do Antigo Regime e como um dos maiores objetivos foi a criação de limites a um poder absoluto. Saltando temporal e geograficamente, no Brasil contemporâneo cresce um movimento que alega a ruptura dessa harmonia idealizada entre os poderes do Estado. Uma vez rompido esse sistema, surge a necessidade de intervenção por um elemento externo, nesse caso identificado pelos apoiadores do chefe do Executivo como sendo as Forças Armadas. As justificativas jurídicas têm como foco o artigo 142 da Constituição Federal e fazem surgir questionamentos acerca da construção do referido dispositivo e do papel das Forças Armadas para a Constituinte de 1987. Para posteriormente compreender o contexto de materialização da Constituição Federal de 1988, optou-se em um primeiro momento por compartilhar os questionamentos que Ingo Wolfgang Sarlet utiliza em um de seus trabalhos.42 O que é o poder constituinte? Quem é o titular (o sujeito) desse poder? Qual o procedimento e forma do seu exercício? Existem limites jurídicos quanto ao exercício desse poder? Assim como Montesquieu em relação à separação de poderes e sua influência contemporânea, parte majoritária da doutrina retorna à Revolução Francesa para o estudo do Poder Constituinte. Isso não quer dizer que antes disso as sociedades não tivessem, das mais variadas formas, estipulado regras proibitivas e permissivas. Entretanto, foi com o abade francês Emmanuel Joseph Sieyès (1748-1836) que a ideia de uma manifestação escrita constituindo um Estado foi modelada. Essa ressalva é feita, por exemplo, por Paulo Bonavides43 e Zulmar Fachin44. 42 MARINONI, L. G..; MITIDIERO, Daniel.; SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de Direito Constitucional. 8. ed. rev., atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2019. 43 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15 ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 141 44 Aula proferida no Curso de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Curitiba, 11 mai. 2018. 22 A teoria do poder constituinte é antes de tudo uma teoria da legitimidade do poder, é a racionalização de seu exercício segundo paradigmas de determinada sociedade ou grupo político que a controla. Assim, a negação da fonte de poder utilizada como legitimadora no período pré-Revolução Francesa faz surgir a necessidade de um novo alicerce. A vontade popular, base do poder, se manifestará em um documento escrito que será o núcleo constitutivo do Estado45. Para Juliana Diniz Campos: “Tem-se um conceito instrumental de constituição, na medida em que sua elaboração está vinculada ao atendimento de determinados fins, em especial o dever de obediência dos governos à vontade da Nação.”46 Sieyès foi bastante influenciado pelas ideias iluministas e tentou, a partir disso, formular um projeto de poder adequado a sua contemporaneidade. Uma sociedade de comerciantes burgueses estaria melhor adaptada a um sistema representativo e não a uma ideia de soberania popular radical.47 Representatividade que não se confundia com a deliberação através do voto estratificado, o abade “vai sustentar a legitimidade do sistema de votação por cabeça e não por classe social, ponto estruturante do modelo representativo concebido na primeira constituição republicana.”48 Sieyès identifica ainda um antagonismo das atividades públicas e privadas, o burguês liberal não teria disponibilidade para deliberar acerca dos assuntos públicos e assim seria preciso que fosse representado naquela seara.49 Portanto, assim como a crítica ao poder absoluto deveria ser em seguida transformada em uma teoria de separação de poderes conforme o anseio liberal, a legitimidade desse poder seria transportada, por sua vez, de uma tradição nobiliárquica ou espiritual para o próprio povo e sua vontade. A grande questão seria isolar essa vontade já que os interesses da população francesa do período não eram uniformes. 45 BONAVIDES, Paulo. Op. Cit. p. 143. 46 CAMPOS, Juliana Diniz. As Origens da Teoria do Poder Constituinte: um resgate da obra de Siéyes e suas múltiplas releituras pela doutrina publicista continental. Revista da Faculdade de Direito da UERJ – RFD, v. 1, n. 25, 2014. p. 165. 47 Ibidem. p. 159. 48 Ibidem. p. 161. 49 Ibidem. p. 163. 23 Em resumo, a partir dessa manifestação original de vontade surgiria a base para o estabelecimento de um governo: o poder constituinte do qual decorre o poder constituído. Nesse ponto diferencia Sieyès o conceito de poder constituído – limitado, restringido pelas precauções políticas previstas na constituição – daquele de poder constituinte – originário, cujo exercício representa a positivação da vontade da Nação. A constituição – enquanto obra fundamental – é, no dizer do francês, a obra de um poder constituinte, um poder voltado à organização do governo. Um poder prévio, portanto. 50 Para o abade, o modelo proposto pelo terceiro estado, camada social francesa composta pelos não pertencentes à nobreza ou ao alto clero, através do poder constituinte, originaria um governo finalmente garantidor da liberdade.51 As linhas gerais dessa ideia persistem até hoje, voltamos assim aos questionamentos de Sarlet que revelam a multiplicidade de análises e classificações do Poder Constituinte. Pode-se afirmar que o Poder Constituinte, por inaugurar uma ordem jurídica, ocorre em um momento pré-jurídico tendo natureza política52. É a potência prestes a ser exercida, é o poder autoconsciente. Ao contrário das normas infraconstitucionais, tem seu fundamento nas forças determinantes que já existem em uma sociedade.53 De um ponto de vista jurídico posteriormente estabelecido, o poder constituinte tem como relevância ser a expressão de uma vontade democrática, em regra, que será a legitimadora da Constituição por ele criada.54 Ainda que tenha essa relevância jurídica, como manifestação da soberania, o poder constituinte é decorrente de fatores históricos e não poder ser entendido como uma manifestação pura do Direito.55 Paulo Gustavo Gonet Branco expõe a natureza política do poder constituinte ao afirmar que “Se o poder constituinte é a expressão da vontade política da nação, não pode ser 50 CAMPOS, Juliana Diniz. Op. Cit. p. 166. 51 Idem. 52 MARINONI, L. G..; MITIDIERO, D..; SARLET, I. W. Op. Cit. p. 129. 53 BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 153. 54 MARINONI, L. G..; MITIDIERO, D..; SARLET, I. W. Op. Cit. p. 131. 55 Ibidem. p. 132. 24 entendido sem a referência aos valores éticos, religiosos, culturais que informam essa mesma nação e que motivam as suas ações.”56 O poder constituinte guarda bastante relação com a Constituição dele derivada, assim os conceitos de Constituição em seu sentido formal e material também se refletem no momento de sua idealização. É possível identificar o aspecto material do poder constituinte como a autoconformação do Estado e a criação das ideias de Direito. Enquanto o seu aspecto formal revela-se por ser a edição de normas no âmbito interno, acriação das regras jurídicas e sua inserção formal na Constituição. Enfim, é a inauguração de um novo ordenamento jurídico. As características do poder constituinte variam entre os diversos autores que estudam o tema. Entretanto, há uma série delas que se repete perfazendo um núcleo essencial. Assim, o poder constituinte é um poder inicial, autônomo, ilimitado e permanente. Inicial, anterior ou originário pois é expressão que causa uma ruptura social, cria um momento de transição para que uma (nova) ordem jurídica surja. A partir das Guerras Mundiais, é cada vez mais rara uma ruptura extrema como ocorreu com a Revolução Francesa do século XVIII. Autônomo ou exclusivo pois não concebe a existência de dois poderes constituintes simultâneos visto que a soberania de uma sociedade é una. É um poder superior, ilimitado e incondicionado pois o constituinte tudo pode (nas palavras de Sieyès, o terceiro estado pode ser qualquer coisa) e está limitado apenas pelos limites por ele impostos. É o poder supremo àquele grupo social atingido e a partir disso decorre a consequente supremacia da Constituição Federal. Permanente e inalienável pois, embora o exercício do poder constituinte possa terminar formalmente, sua potência não é exaurida. O povo é responsável pela manutenção da Constituição vigente e pode optar por sua alteração. 56 BRANCO, P. G.; MENDES, G. F. Op. Cit. p. 156. 25 O povo é figura central pois, no final do século XVIII, essa noção estava intimamente ligada à questão da soberania, ainda que não fossem conceitos equivalentes. A ideia de decidir os próprios rumos frente a outros grupos políticos também implicava na legitimidade interna de autodeterminação e de imposição de uma Constituição.57 O poder torna-se exercível pelo povo, mais uma vez, na Revolução Francesa, confundido com o liberal burguês. Logo, analisar a titularidade do poder constituinte exige a consideração do contexto histórico. É necessário lembrar que a legitimidade não se confunde com legalidade, é legítimo se atrelado ao procedimento escolhido para a formalização do poder constituinte e à observância de valores que justifiquem a autoridade no âmbito da coletividade política.58 Nesse sentido a nação opera por representantes, delega-se o exercício do poder como Sieyès imaginou: tem-se o “povo agindo como representante do povo, dele obtendo reconhecimento.59 Assim, o titular e o legítimo detentor do poder constituinte é o próprio povo que pode optar por ver-se representado quando de seu efetivo exercício. Essa delegação pode apresentar problemas, mas Gonet Branco explica: um grupo que se arrogue a condição de representante do poder constituinte originário, se se dispuser a redigir uma Constituição que hostilize esses valores dominantes, não haverá de obter o acolhimento de suas regras pela população, não terá êxito no seu empreendimento revolucionário e não será reconhecido como poder constituinte originário. Afinal, só é dado falar em atuação do poder constituinte originário se o grupo que diz representá-lo colher a anuência do povo, ou seja, se vir ratificada a sua invocada representação popular. 60 Continua o autor: 57 MARINONI, L. G..; MITIDIERO, D..; SARLET, I. W. Op. Cit. p. 136. 58 MARINONI, L. G..; MITIDIERO, D..; SARLET, I. W. Op. Cit. p.138. 59 BRANCO, P. G.; MENDES, G. F. Op. Cit. p. 155. 60 Ibidem. p. 156. 26 Não é quem quer ou pensa estar legitimado para tanto que será poder constituinte originário, mas quem está em condições de produzir uma decisão eficaz sobre a natureza da ordem. 61 Tendo como titular do poder constituinte o povo, é possível distinguir suas formas de manifestação. Sarlet entende que as formas democráticas de exercício do poder constituinte podem ser classificadas quanto à soberania de uma assembleia constituinte e quanto a sua exclusividade. Na assembleia soberana, “cuida-se de um órgão eleito com a finalidade de elaborar e aprovar a constituição, excluída qualquer participação adicional do povo, seja por meio de plebiscito, seja por meio de referendo.”62 Já uma assembleia não soberana ”é eleita apenas com a finalidade de elaborar e discutir o projeto de constituição, mas a entrada em vigor do texto constitucional se dá apenas após a sua aprovação pelo povo, mediante referendo”63 Por sua vez, a exclusividade de um poder constituinte depende da finalidade de quem o exerce: uma assembleia pode ser criada com o objetivo específico de elaboração de uma constituição ou pode tal competência ser acumulada por aqueles que já detêm atribuições legislativas. Cabe ressaltar que a forma democrática de exercício do poder constituinte se opõe à outorga de uma constituição por um ditador sendo, nesse cenário, a Revolução uma situação extrema de exercício de poder constituinte contra tal poder absoluto.64 A doutrina geralmente fala da ausência de limites, sendo inclusive uma das características citadas anteriormente. Entretanto, o poder constituinte não pode ser exercido longe da realidade da sociedade interessada, Sarlet cita ainda como possíveis condicionantes os valores civilizatórios, os direitos humanos e a noção de justiça.65 Aqui o aspecto jurídico do poder constituinte cede à ideia mais ampla de manifestação social em um documento regrador: 61 Ibidem. p. 157. 62 MARINONI, L. G..; MITIDIERO, D..; SARLET, I. W. Op. Cit. p. 142. 63 Ibidem. p. 142. 64 Ibidem. p. 145. 65 Ibidem. p. 150. 27 quando se fala em limites jurídicos do poder constituinte, há que reconduzir tais limites à noção mais ampliada de limites historicamente construídos, que incluem limitações de ordem religiosa, moral, econômica, dentre outros que poderiam ser referidos 66 Se “A constituição, ao contrário do que ocorre com as normas infraconstitucionais, não extrai o seu fundamento de validade de uma ordem jurídica (formal) superior, mas se estabelece e alcança autoridade jurídica superior.”67, talvez o estudo meramente jurídico de dispositivos constitucionais pode deixar escapar uma análise mais coesa e completa. Por isso o presente trabalho busca abordar temas da Ciência Política, do Direito e da História. Tendo respondido brevemente às perguntas lançadas no início do capítulo e estabelecido uma noção introdutória de poder constituinte, vale estabelecer uma classificação básica sobre o objeto central da pesquisa: a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Novamente Sarlet: No que diz com a sua inserção no esquema classificatório das constituições, a Constituição Federal pode ser integrada, como já referido, ao grupo das constituições escritas, democráticas, analíticas e rígidas. 68 No mesmo sentido, Alexandre de Moraes categoriza: “Nossa atual Constituição Federal apresenta a seguinte classificação: formal, escrita, legal, dogmática, promulgada (democrática, popular), rígida, analítica.”69 Vale dizer, o processo do poder constituinte originário que será analisado no capítulo seguinte criou uma constituição formal e sistematizada em um documento único, realizado por uma assembleia constituinte, de forma democrática, cuja alteração demanda um processo legislativo mais exigente e que abarcou diversos assuntos que foram julgados como imprescindíveis. 66 Ibidem. p. 151. 67 Ibidem. p. 129. 68 MARINONI, L. G..; MITIDIERO, D..; SARLET, I. W. Op. Cit. p. 327. 69 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 33. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2017. p. 31. 28 3. A CONSTITUINTE DE 1987 Formalmente, o primeiro passo para a criação da Constituinte ocorreu com mensagens dirigidaspelo então Presidente da República José Sarney ao Congresso Nacional e com o envio de um projeto de emenda constitucional (PEC43/85) convocando uma Assembleia Nacional Constituinte (ANC) com início dos trabalhos em 31/01/1987. Esse projeto foi recebido pelo Congresso Nacional transformando-o em Emenda Constitucional alterando a data prevista para 01/02/1987 e estabelecendo a unicameralidade da Assembleia Nacional Constituinte.70 Ainda em 1985, José Sarney editou decreto convocando uma Comissão Provisória de Estudos Constitucionais que tinha por objetivo inspirar a ANC. A obra elaborada, conhecida como Anteprojeto Afonso Arinos, foi concluída em 26/09/1986. Ainda que em vários debates houvesse a menção pelos constituintes dos dispositivos do referido anteprojeto, o diploma não foi formalmente adotado pela ANC. Havia a vontade de criação de uma nova constituição a partir dos anseios populares, não pela simples adoção de concepções elaboradas por intelectuais. Ademais, alguns juristas se recusaram a participar do Anteprojeto Afonso Arinos por considerarem intromissão indevida em um momento de exclusiva expressão popular.71 Para a Constituinte brasileira, não houve a eleição de representantes exclusivos para a elaboração do novo texto constitucional. A tarefa coube aos 487 deputados federais e 49 senadores eleitos no pleito de 1986 somados aos 23 senadores que já atuavam na casa desde 1982. Em 01/02/1987 foi instalada a ANC e em 02/02/1987 houve a eleição de seu presidente. Foi escolhido o Deputado Federal Ulysses Guimarães do 70 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Emenda Constitucional n. 26 de 27 de nov. de 1985. Convoca Assembleia Nacional Constituinte e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc_anterior1988/ emc26-85.htm. Acesso em: 10 out. 2020. 71 TROIANO, Mariele. Entre o Passado e o Futuro: o Processo Constituinte de 1987-1988. Revista Direito Mackenzie, v. 9, n. 2, p. 197-217, 2015. 29 PMDB-SP após vitória sobre o Deputado Federal Lysâneas Maciel do PDT-RJ por 425 votos a 69 votos além de 28 votos em branco. Do dia 09/02/1987 ao dia 20/03/1987 houve a elaboração do Regimento Interno com sua promulgação em 24/03/1987. Substituiu-se, assim, o Regimento Interno provisório e nos dias seguintes houve a eleição da mesa e a indicação dos líderes. A efetiva elaboração dos textos aconteceu durante os meses de abril e junho do referido ano tendo a ANC sido dividida em oito comissões temáticas: 1) Da Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher, 2) Da Organização do Estado, 3) Da Organização dos Poderes e Sistemas de Governo, 4) Da Organização Eleitoral, Partidária e Garantia das Instituições, 5) Do Sistema Tributário, Orçamento e Finanças, 6) Da Ordem Econômica, 7) Da Ordem Social e 8) Da Família, da Educação, Da Cultura e Esportes, da Ciência, Tecnologia e da Comunicação. Por sua vez, cada comissão foi fracionada em três subcomissões. A primeira comissão foi subdividida em: a) Da Nacionalidade, da Soberania e das Relações Internacionais, b) Dos Direitos Políticos, dos Direitos Coletivos e das Garantias e c) Dos Direitos e das Garantias Individuais. A segunda comissão foi subdividida em: a) Da União, Distrito Federal e Territórios, b) Dos Estados e c) Dos Municípios e Regiões. A terceira comissão foi subdividida em: a) Do Poder Legislativo, b) Do Poder Executivo e c) Do Poder Judiciário e do Ministério Público. A quarta comissão foi subdividida em: a) Do Sistema Eleitoral e Partidos Políticos, b) De Defesa do Estado, da Sociedade e de sua Segurança e c) De Garantia da Constituição, Reformas e Emendas. A quinta comissão foi subdividida em: a) De Tributos, Participação e Distribuição das Receitas, b) De Orçamento e Fiscalização Financeira e c) Do Sistema Financeiro. A sexta comissão foi subdividida em: a) De Princípios Gerais, Intervenção do Estado, Regime da Propriedade do Subsolo e da Atividade Econômica, b) Da Questão Urbana e Transporte e c) Da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária. A sétima comissão foi subdividida em: a) Dos Direitos dos Trabalhadores e Servidores Públicos, b) De Saúde, Seguridade e do Meio Ambiente e c) Dos Negros, Populações Indígenas, Pessoas 30 Deficientes e Minorias. A última comissão foi subdividida em: a) Da Educação, Cultura e Esportes, b) Da Ciência e Tecnologia e da Comunicação e c) Da Família, do Menor e do Idoso. Em cada subcomissão, um constituinte relator apresentaria um anteprojeto que seria emendado por seus colegas. O consequente substitutivo era votado e refinado até que fosse criado um anteprojeto da subcomissão. Durante esses trabalhos, várias reuniões eram feitas com debates e audiências públicas com representantes da sociedade. Nas comissões, os anteprojetos de cada subcomissão receberam emendas. Posteriormente, o relator de cada comissão apresentava um anteprojeto que, novamente, seria passível de alterações. Por fim, tinha-se o anteprojeto da comissão. Paralelamente, funcionava na ANC a comissão de sistematização que durou de abril até novembro de 1987. Sua atribuição era, como o próprio nome sugere, reunir todos os anteprojetos das comissões em um sistema lógico. O procedimento previa emendas ao anteprojeto do relator da comissão de sistematização resultando no primeiro projeto de Constituição Federal. Em seguida, esse projeto recebia emendas dos constituintes em duas oportunidades até que se chegasse ao segundo substitutivo do relator e ao Projeto de Constituição. De novembro de 1987 a janeiro de 1988, houve a reforma do Regimento Interno: No decorrer dos trabalhos da Comissão de Sistematização, foram se consolidando manifestações político-ideológicas divergentes de grande vulto, as quais trouxeram transtornos à condução dos trabalhos nos prazos previstos inicialmente, que tinha o 15 de novembro de 1987 reservado para a promulgação do texto. Diante das evidências, tentou-se encontrar soluções emergenciais como a de reduzir de dois para um turno no Plenário a votação final e, ainda, a de fazer funcionarem, simultaneamente, os trabalhos da Sistematização e do Plenário, tudo sem sucesso. A principal consequência desses conflitos foi a emenda ao Regimento da ANC, apresentada pelo Centrão, em 11-11-87, que, votada e aprovada, em globo, em 3 de dezembro, mudou o Regimento, até então em vigor, em dois pontos: tornou possível, para a maioria absoluta (metade da soma de 487 e 72, mais um = 280), apresentar emendas modificativas, substitutivas e supressivas para títulos, capítulos e seções; e inverter a necessidade da maioria: os antes exigidos 280 31 votos para mudar o que viesse da Sistematização passaram a ser necessários para incluir, modificar ou manter qualquer parte do projeto. Assim, todo e qualquer dispositivo passou a demandar maioria absoluta. 72 Após essa discussão sobre o Regimento Interno, a Constituinte encaminhava para o seu passo definitivo. A fase do Plenário e da Comissão de Redação Final aconteceu de janeiro a setembro de 1988. O segundo substitutivo do relator da Comissão de Sistematização, chamado de Projeto A, seria o primeiro documento a ser emendado por todos os constituintes no plenário do Congresso Nacional. Um novo turno de emendas resultou no Projeto C, que foi remetido à Comissão de Redação Final. Na Comissão de Redação Final, o Projeto D, a redação final da Constituição, foi elaborado após a última rodada de emendas. A promulgação da Constituição Federal ocorreu em 05/10/1988. Seguindo os objetivos do presente trabalho e reconhecendo a vasta produção documental do período, tem-se como tarefa complexa a análise de todos os dispositivos que tratem da atuação das forças armadas. Assim, optou- se pela delimitação do estudo aoque parece ser o núcleo do atual artigo 142 da Constituição Federal. Foram analisados: o Anteprojeto Afonso Arinos e documentos produzidos desde a Subcomissão De Defesa do Estado, da Sociedade e de sua Segurança até a aprovação da versão final da Constituição. Novamente, tendo em vista o volume imenso de fontes, em vários momentos não foi possível realizar a análise vertical dos documentos limitando- se o trabalho à identificação de mudanças no texto legislativo. A subcomissão De Defesa do Estado, da Sociedade e de sua Segurança teve como Presidente José Tavares (PMDB-PR) e Relator Ricardo Fiuza (PFL- PE). De maneira geral, a Subcomissão abordou os seguintes temas: conceitos como nação, Estado e pátria; a diferença entre segurança interna, segurança externa e segurança pública; a manutenção do Conselho de Segurança Nacional (e da Lei de Segurança Nacional); a concentração de atribuições no Poder Executivo; os limites da atuação das Forças Armadas; os objetivos do 72 OLIVEIRA, Mauro Márcio. Fontes de informações sobre a Assembleia Nacional Constituinte de 1987: quais são, onde buscá-las e como usá-las. Brasília: Senado Federal, 1993. p. 13. 32 Estado; a necessidade de criação do Ministério da Defesa; o papel das polícias e vários outros. Cabe destacar as palestras proferidas por autoridades convidadas, compareceram à subcomissão: Ubiratan Borges de Macedo, Pedro de Oliveira Figueiredo, Paulo César Milani Guimarães e Roberto Cavalcanti de Albuquerque (representantes da Escola Superior de Guerra); Marcio Thomaz Bastos (presidente do Conselho Federal da OAB à época); Geraldo Cavagnari Filho (Diretor Adjunto do Núcleo de Estudos Estratégicos da UNICAMP); Cyro Vidal (Presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil); Mario Nazareno Lopes Rocha, Silvio Ferreira, Waltervan Luiz Vieira, Nelson Freire Terra, José Braga Júnior e Paulo José Martins dos Santos (representantes da Polícia Militar de diversos Estados); Luiz Antonio Rodrigues M. Ribeiro (representante da Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional); Euler Bentes Monteiro, Antonio Carlos de Andrada Serpa, Oswaldo Pereira Gomes, Roberto Pacífico Barbosa, Sérgio Tasso Vasquez de Aquino, José Elislande Bayer de Barros e Sidney Obino Azambuja (representantes do Estado Maior das Forças Armadas) e Romeu Tuma, Wilson Alfredo Perpétuo e Vicente Chelotti (representantes dos delegados e dos servidores dos departamentos da polícia federal). Através da leitura da ata, é possível identificar o grande cuidado tomado pelos constituintes na identificação das funções das Forças Armadas na segurança interna do país. Ainda assim, como grande parte dos convidados foi de pessoas ligadas direta ou indiretamente aos militares, as palestras foram no sentido de defesa da intervenção castrense no âmbito civil. Como exemplo, apesar de reconhecer a harmonia entre poderes e a existência de mecanismos de controle, para os representantes da Escola Superior de Guerra o conceito de segurança nacional visa à proteção dos objetivos da nação: As ações específicas de segurança, as medidas específicas de defesa, propriamente, na verdade é cabem tradicionalmente ao Poder Executivo – mas um Poder Executivo – é esta a doutrina da Escola – sob a fiscalização dos mecanismos democráticos de controle. 73 73 BRASIL. Assembleia Nacional Constituinte. Subcomissão de Defesa do Estado, da Sociedade e de sua Segurança. Ata da Subcomissão De Defesa do Estado, da Sociedade e 33 A observação de Ottomar Pinto demonstra a preocupação por parte dos constituintes: Isso é que eu acho muito importante se considerar; não depende simplesmente de elucubração mental do Executivo, é preciso que esteja tipificado na Constituição como fato gerador dessa intervenção. 74 O reforço parte do constituinte Arnaldo Martins quando questiona sobre o artigo 91 da Constituição vigente no período que prevê a atuação das Forças Armadas75: Parece-nos uma conceituação meio abstrata e difícil de mensurar, até quando nós estamos diante de uma grave crise. Não seria, talvez, a solução que o Poder Judiciário fosse consultado nessas atividades de segurança interna? 76 O convidado Márcio Thomaz Bastos também se mostra preocupado com a questão da limitação da atuação das Forças Armadas, em sua palestra há um forte ataque à política de segurança nacional com a proposta de extinção do Conselho de Segurança Nacional. O representante da Ordem dos Advogados do Brasil concorda com o artigo 414 do Anteprojeto Afonsino77, reconhece que conflitos fazem parte de uma sociedade democrática mas assevera que isso não autoriza uma intervenção militar: [...] em relação à participação das Forças Armadas na segurança interna do Brasil; penso que isso deve ficar extremamente claro de que elas participam, chamadas pelos seus superiores constitucionais de sua Segurança. Brasília, 1987-1988. p. 38. Disponível em: http://www.senado.leg.br/ publicacoes/anais/constituinte/4b_Subcomissao_Da_Defesa_Do_Estado,_Da_Sociedade_E_D e_Sua_Seguranca.pdf. Acesso em: 10 out. 2020. 74 Idem. 75 O artigo 91 da Constituição 1967, modificado pela Emenda Constitucional 1 de 1969 rege: "As Forças Armadas, essenciais à execução da política de segurança nacional, destinam-se à defesa da Pátria e a garantia dos poderes constituídos, da lei e da ordem.” 76 Ibidem. p. 40. 77 No Anteprojeto Afonso Arinos, o artigo 414 estabelece: “As Forças Armadas destinam-se a assegurar a independência e a soberania do País, a integridade do seu território, os poderes constitucionais e, por iniciativa expressa destes, nos casos estritos da lei, a ordem constitucional.” 34 e que as Forças Armadas, no Brasil, não têm, assim, a liberdade, o livre arbítrio de intervir. 78 A participação do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil também é importante pois permite a visualização da posição de Ricardo Fiuza. O Relator, ao final da palestra, reconhece a polêmica envolvendo o assunto e, aparentemente, assume uma postura mais equilibrada invocando algumas ressalvas: Todos nós temos um certo receio, e parece uma posição política, é natural, temos saído de um estado de exceção, e tudo que puder parecer menos democrático, principalmente ainda um maniqueísmo que se ferra às pessoas, se criam rótulos, quem for de extrema esquerda, comunista, é progressista, quem não for comunista é reacionário, radical de direita, então, há certas coisas hoje que dão até receio de serem tocadas. Entendo, que o eminente conferencista como eu, também, achamos que o papel das Forças Armadas não deva se restringir exclusivamente às questões externas e sim também internas, desde que amparadas no texto legal bastante refletido, e que seja acionado sempre e exclusivamente dentro da legitimidade da lei e da ordem. 79 Em posição parecida à de Marcio Thomaz Bastos, Geraldo Cavagnari Filho se aprofunda nas questões ao sugerir o controle político sobre as Forças Armadas a fim de se evitar nova intervenção futura. O palestrante da UNICAMP é direto e questiona se as forças militares aceitarão e se submeterão a um poder civil legítimo, mas considerado não confiável. O essencial, para ele, é limitar a influência militar apenas à esfera técnica. Surge, portanto, o cerne da questão: a segurança interna do país poderia ser de competência das Forças Armadas? A manutenção dos objetivos da nação e da segurança nacional poderiam servir de justificativa para a intervenção das Forças Armadas? Haveria a necessidade de convocação pelo Poder Executivo? A lei teria o condão limitadorde eventual interferência? Ainda que não haja menção expressa ao conflito entre os diversos Poderes Constitucionais exemplificados no primeiro capítulo do trabalho, esse é um ponto de partida para o futuro artigo 142 da Constituição Federal de 1988. 78 Ibidem. p. 55. 79 Ibidem. p. 62. 35 Embora anteriormente tenha se manifestado pela tipificação da intervenção, o constituinte Ottomar Pinto ilustra o pensamento de alguns de seus colegas. Há na Subcomissão aqueles que entenderam como necessário o golpe militar de 1964, revelando como a construção da nova Constituição estaria marcada pelo passado recente do país: Esse problema de comunismo ou não, direta ou não, é um problema conjuntural. Em 1964, ele aflorou porque representava uma ameaça não só potencial, como iminente à sobrevivência do Estado do Brasil. Justamente por isso foi colocado no cerne das reflexões dos militares. Mas, hoje, os partidos de esquerda estão integrados na comunhão política brasileira, defendendo no Parlamento, na Imprensa e até nos púlpitos das igrejas os seus pontos de vista. Não há uma ameaça iminente, súbita e violenta à ordem constituída. 80 Com o fim das audiências públicas e dos debates introdutórios, deu-se início à atividade legislativa típica. O Anteprojeto do Relator foi elaborado a partir das treze primeiras reuniões e levou em consideração os eventos realizados pela Constituinte, as audiências públicas organizadas e as sugestões protocoladas pelos constituintes. No documento é possível identificar os primeiros dispositivos semelhantes ao futuro artigo 142 da Constituição Federal de 1988: Art. 12 As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República e dentro dos limites da lei. Parágrafo único. Lei Complementar, de iniciativa do poder executivo, estabelecerá as normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e no emprego das Forças Armadas. Art. 13 As Forças Armadas destinam-se à defesa da pátria e à garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem. Parágrafo único. Cabe ao Presidente da República a direção política da guerra e a escolha dos Comandantes-Chefes. 81 80 Ibidem. p. 82. 81 BRASIL. Assembleia Nacional Constituinte. Subcomissão de Defesa do Estado, da Sociedade e de sua Segurança. Anteprojeto do Relator da Subcomissão. v. 132. Brasília: Seção de Documentação Parlamentar, 1987-1988. p. 32. 36 Em sua justificativa, o Relator fez um estudo quantitativo e qualitativo das sugestões apresentadas na tentativa de alcançar a vontade harmônica da subcomissão. Nesse primeiro momento, superou-se a divergência acerca da atuação das Forças Armadas no âmbito interno: das 45 sugestões sobre o tema, 32 acenavam pela preservação da destinação vigente à época enquanto 13 desejavam a restrição da participação militar à segurança externa.82 O Relator ainda complementa a justificativa sobre a construção dos dispositivos: A expressão "sob a autoridade Suprema do Presidente da República e dentro dos limites da lei" tem por finalidade resguardar as Forças Armadas contra o seu emprego à revelia da Nação e da ordem jurídica por ela estabelecida e consignada nos textos legais. [...] A ingênua alusão de que a destinação constitucional das Forças Armadas é que tem propiciado, ao longo da nossa vida republicana, intervenções militares não admitidas pelos poderes constitucionais não procede, pois que as intervenções em qualquer época, sempre se fizeram, no Brasil, como em outros Estados, ao arrepio do ordenamento Jurídico vigente. 83 A partir do Anteprojeto do Relator da Subcomissão, foi aberto prazo para a apresentação de emendas. Nas reuniões seguintes as sugestões foram debatidas e surgiram questões sobre os referidos artigos. Recorta-se aqui, algumas observações feitas pelos constituintes que possibilitam entender o rumo das discussões a partir do primeiro texto do Relator. Para José Genoíno: “[...] a expressão dos poderes constitucionais e principalmente da lei e da ordem, é uma legitimação excessiva para o julgamento próprio das Forças Armadas, no momento da intervenção”84 O constituinte Roberto Brant, por sua vez: Eu preferiria usar um pouco o que está no texto da Comissão Afonso Arinos eu sugeri a emenda, não tenho o número aqui, é que as Forças Armadas destinam-se à defesa da soberania, da independência e da integridade do País. A garantia dos poderes constitucionais e da lei e da ordem mas por iniciativa expressa deste. Porque, se as Forças Armadas puderem garantir a lei e a ordem mas por iniciativa própria, eu creio que ela teria um papel extremamente 82 Ibidem. p. 22. 83 Ibidem. p. 26. 84 BRASIL. Assembleia Nacional Constituinte. Ata da Subcomissão [...], p. 187. 37 demasiado, eu acho que só os poderes constitucionais seria o Executivo, o Legislativo e o Judiciário que expressamente poderão convocar as Forças Armadas para garantir a lei e a ordem 85 Vê-se, portanto, que alguns constituintes consideravam determinadas expressões do dispositivo como possíveis legitimadoras de uma atuação militar à revelia dos poderes constitucionais. Conceitos como “a garantia da lei e da ordem” não delimitariam as Forças Armadas, pelo contrário: seriam os grandes motivadores para uma intervenção. Outro ponto de debates era encontrar uma maneira de subordinar militares ao poder civil através de uma convocação. Houve ainda uma nova tentativa de extirpar completamente a segurança interna da competência das Forças Armadas em algumas propostas de emenda, o constituinte Haroldo Lima entendia que: “é preciso limitar o papel constitucional das Forças Armadas à defesa da Pátria contra as agressões externas, vedando-lhes o direito de intervir na vida política e de exercer o papel de polícia.”86 Porém, esse ponto já havia sido superado e, com os projetos de emendas formalizados e os debates nas reuniões, o Relator Ricardo Fiuza apresentou seu substitutivo no penúltimo encontro da subcomissão. Nele, os constituintes deveriam aprovar ou rejeitar as reformas feitas pelo Relator além de votar eventuais destaques. No projeto substitutivo, os artigos 12 e 13 ditavam: Art. 12 As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República. Parágrafo único. Lei Complementar, de iniciativa do Presidente da República, estabelecerá as normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e no emprego das Forças Armadas. Art. 13 As Forças Armadas destinam-se à defesa da pátria e à garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem. 85 Ibidem. p. 188. 86 BRASIL. Assembleia Nacional Constituinte. Subcomissão de Defesa do Estado, da Sociedade e de sua Segurança. Emendas ao Anteprojeto do Relator da Subcomissão. v. 133. Brasília: Seção de Documentação Parlamentar, 1987-1988. Projeto de emenda n. 4B0115-9. 38 Parágrafo único. Cabe ao Presidente da República a direção da política de guerra e a escolha dos Comandantes-Chefes 87 É possível identificar uma mudança entre o anteprojeto e o substitutivo, o próprio Relator explica suas motivações: Ao retirarmos a expressão "dentro dos limites da lei", acolhemos a emenda dos Constituintes José Genoíno, Haroldo Lima e outros, eliminando uma cláusula discutida desde 1891. As Forças Armadas, submetidas à autoridade do Presidente da República,
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