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Alves, Marco Antonio - O estudo da linguagem em Habermas

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Citar: 
ALVES, Marco Antônio Sousa. O estudo da linguagem em Habermas: observações sobre a 
teoria dos speech acts, a pragmática universal, a teoria do agir comunicativo e a teoria 
discursiva do direito. Trabalho apresentado na II Jornada Brasileira de Filosofia do Direito da 
ABRAFI, Faculdade de Direito Milton Campos, Nova Lima/MG, 2008. Disponível em 
http://ufmg.academia.edu/MarcoAntonioSousaAlves/Papers/898265/O_estudo_da_linguage
m_em_Habermas_observacoes_sobre_a_teoria_dos_speech_acts_a_pragmatica_universal_a_
teoria_do_agir_comunicativo_e_a_teoria_discursiva_do_direito. Acesso em: [data de acesso] 
Contato: marcofilosofia@ufmg.br 
http://ufmg.academia.edu/MarcoAntonioSousaAlves/Papers/898265/O_estudo_da_linguagem_em_Habermas_observacoes_sobre_a_teoria_dos_speech_acts_a_pragmatica_universal_a_teoria_do_agir_comunicativo_e_a_teoria_discursiva_do_direito
http://ufmg.academia.edu/MarcoAntonioSousaAlves/Papers/898265/O_estudo_da_linguagem_em_Habermas_observacoes_sobre_a_teoria_dos_speech_acts_a_pragmatica_universal_a_teoria_do_agir_comunicativo_e_a_teoria_discursiva_do_direito
http://ufmg.academia.edu/MarcoAntonioSousaAlves/Papers/898265/O_estudo_da_linguagem_em_Habermas_observacoes_sobre_a_teoria_dos_speech_acts_a_pragmatica_universal_a_teoria_do_agir_comunicativo_e_a_teoria_discursiva_do_direito
mailto:marcofilosofia@ufmg.br
 1 
O estudo da linguagem em Habermas: 
observações sobre a teoria dos speech acts, a pragmática universal, a teoria do agir comunicativo e 
a teoria discursiva do direito 
 
Marco Antônio Sousa Alves 
Bacharel em Direito e Mestre em Filosofia pela UFMG 
Professor das Faculdades Milton Campos e Promove 
 
 
O problema da linguagem assumiu um papel central na filosofia dos dias atuais. É comum 
escutarmos frases como “O mundo é linguagem”, “A linguagem é um médium intransponível”, “a 
racionalidade está essencialmente ligada à linguagem”, “a teoria discursiva do direito se assenta numa 
teoria pragmática da comunicação humana”, etc. Minha intenção aqui é tentar transformar esse conjunto 
de frases de efeito em algo consistente. É comum o meio acadêmico, sobretudo o brasileiro (parasitário 
das novas ondas vindas do exterior), tratar as teorias como se fossem modas que se sucedem 
rapidamente no tempo. Fala-se, assim, muito em Habermas e em liguagem, discurso, argumentação e 
pragmática. Palavras e nomes entram e saem da moda sem que se tenha uma boa compreensão das 
questões envolvidas e das conexões estabelecidas entre diferentes temas, pensadores e áreas do saber. 
Neste texto, gostaria de apresentar algumas notas de escopo bastante amplo, com a intenção de 
introduzir o assunto e torná-lo mais palpável. Trata-se de avaliar qual a relação que se pode estabelecer 
entre os estudos em filosofia da linguagem e o estudo do direito, ou, em outras palavras, em saber qual a 
importância que pode ter para o direito a compreensão de como funciona a nossa linguagem. Em razão 
da extensão do tema, terei de ser bastante breve e econômico em minhas exposições, de modo que me 
centrarei apenas em alguns pontos e pensadores fundamentais. A estratégia de apresentação será a 
seguinte: 
 
I. Primeiro, falarei brevemente da reviravolta ocorrida na filosofia, a chamada virada linguística e 
pragmática, procurando explicitar o que de fato mudou. 
II. Em segundo lugar, tratarei dos estudos em filosofia da linguagem empreendidos por Austin e 
Searle (a chamada teoria dos speech acts). 
 2 
III. Em terceiro lugar, indicarei como Habermas abraçou a teoria dos speech acts e apresentarei a sua 
proposta de uma pragmática universal. 
IV. Em quarto lugar, aprofundarei a problemática da linguagem em Habermas e relacionarei essa 
questão com seu projeto filosófico tomado em linhas mais gerais, apresentando sua proposta de 
uma teoria do agir comunicativo. 
V. Em quinto e último lugar, tentarei mostrar como essa problemática da linguagem se conecta com a 
questão jurídica na elaboração da teoria discursiva do direito de Habermas. 
 
I – Virada linguística e virada pragmática 
 
 Sobre o primeiro ponto, é preciso, antes de qualquer coisa, explicar o que se entende por 
“virada”, que nada mais é que uma mudança radical na pergunta filosófica sobre os elementos centrais 
de nossa experiência, que passa, assim, a ser articulada de outro modo. Mas qual mudança radical é essa 
que foi operada no início do século XX? Aqui, devemos separar a virada linguística da virada 
pragmática, que se deu posteriormente no seio dos estudos da linguagem. 
 A virada linguística (linguistic turn) constitui uma superação do método introspectivo ou 
especulativo típico da filosofia moderna, que era centrada na problemática da consciência, pela análise 
proposicional. O primeiro passo da virada lingüística consistiu em priorizar a lógica das proposições 
(uma rigorosa análise sintático-semântica), acreditando ser esse um passo prévio indispensável a 
qualquer estudo filosófico. Um dos pilares dessa mudança está nas críticas feitas ao psicologismo, dentre 
as quais destaco o trabalho empreendido por Gottlob Frege, que assentará as bases da filosofia da 
linguagem na separação entre representações (minhas ou tuas, sempre subjetivas) e pensamentos (que 
ultrapassam os limites da consciência individual e, apesar de serem sempre apreendidos por sujeitos 
diferentes, continuam sendo os mesmos). Ao arremessar o pensamento para além dos limites das 
torrentes de vivências dos sujeitos pensantes e mostrar sua estrutura proposicional invariável (que 
permite que expressões lingüísticas possam manter o mesmo significado para diversas pessoas em 
situações diversas), Frege abriu um vasto caminho para a filosofia da linguagem. Ele mostra que os 
pensamentos se articulam através de proposições e aponta para a necessidade de se revelar sua estrutura 
a partir da análise de proposições predicativas simples. Em suma, a filosofia se dá conta de que nossa 
relação com o mundo não será devidamente explicitada a partir da especulação de um pensador solitário 
(a problemática da consciência, que tanto preocupava Descartes), mas apenas se levarmos em 
consideração o médium linguístico, uma vez que os estados de coisa e fatos no mundo não se deixam 
 3 
captar diretamente pela consciência, sendo preciso explicitar como nos referimos ao mundo e quais 
proposições são passíveis de sentido e verdade. 
 Com o desenvolvimento das análises lingüísticas realizadas, dentre outros, por Russell (a teoria 
das descrições), foi-se aprimorando o estudo sintático (a relação dos signos entre si, a questão 
proposicional) e semântico (a relação entre os signos e o mundo, a questão da referência). No Tractatus, 
por exemplo, Wittgenstein ratifica a virada lingüística de Frege ao atribuir à linguagem um caráter 
formador de mundo, ressaltando também a dimensão da representação (ou figuração do mundo - 
Bildung). 
 É verdade que essa virada lingüística não se operou apenas no seio da tradição analítica. Também 
houve uma versão hermenêutica dela, encabeçada por Martin Heidegger (que, sobretudo depois de Sein 
und Zeit, percebeu a importância da linguagem como “morada do ser” e “abertura do mundo” - 
Welterschlieung)1. 
Influenciado pelos estudos de seu colega Karl-Otto Apel (1973), que mostrou as convergências 
entre a hermenêutica e a analítica da linguagem (entre as posições de Heidegger e Wittgenstein), 
Habermas se dá conta da complementaridade das duas versões da virada lingüística. Seu interesse pelos 
estudos analíticos surgiu quando ele percebeu um déficit no conceito hermenêutico de linguagem, a 
saber, a ausência de uma teoria da significação (theory of meaning) mais elaborada. Como observa 
Habermas (1998:74): “a ausência de uma análise convincente da função representativa da linguagem, e 
portanto das condições de referência e verdade dos enunciados, permanece sendo o calcanhar de Aquiles 
de toda tradição hermenêutica”. 
Meu interesse, nesse texto,é tratar da influência que a análise analítica da linguagem teve sobre o 
pensamento de Habermas, de forma que negligenciarei aqui a importância que pensadores como 
Humboldt
2
 e Bühler
3
 tiveram na formação de sua teoria. Essa minha opção se justifica pelo fato de o 
 
1 Heidegger investiga a estrutura prévia do compreender, ou seja, a articulação lingüística da compreensão prévia do mundo 
à luz dos projetos, expectativas e antecipações cotidianas, em cujo horizonte alguma coisa começa a se tornar compreensível 
para nós como alguma coisa. Ele subordina o “como predicativo” ao “como hermenêutico”, de modo que só podemos atribuir 
ou negar determinadas propriedades a determinados objetos depois que eles se tornam acessíveis nas coordenadas categoriais 
de um mundo aberto pela linguagem, ou seja, depois que são dados como objetos já interpretados. A pertinência de um 
predicado a um objeto é um fenômeno derivado que depende da “possibilitação de verdade”, no sentido de uma prévia 
abertura ao mundo. Assim, na hermenêutica filosófica, os falantes estão “presos na casa de sua língua”, sem possibilidade de 
contato direito com o mundo que não seja sempre já mediado pela linguagem (cf. Habermas, 1998:79-82). Nessa imagem, é a 
identidade do significado que garante a identidade da referência ou, em outras palavras, é o “modo de ser dado o designado” 
que é visto como condição de possibilidade de acesso ao referente, ou seja, o referente é mediado pelo sentido a partir do qual 
ele é compreendido (cf. Lafont, 1993:16). Como conseqüência, a linguagem se torna a instância determinante de toda 
experiência intramundana possível. 
2 Segundo a teoria de Humboldt, a língua é um médium intransponível que não pode ser considerada apenas um meio de 
representação de objetos ou fatos. A linguagem possuiria três funções: a cognitiva ou designativa (que representa fatos, 
 4 
próprio Habermas ter indicado esse déficit na hermenêutica filosófica e ter conduzido seu estudo da 
pragmática universal nas bases da teoria dos speech acts, que se insere no quadro dos estudos analíticos 
da linguagem. 
 Quanto à virada pragmática, que ocorreu posteriormente, no interior da virada lingüística, 
podemos dizer que ela se deu em função de um esgotamento da mera análise proposicional da 
linguagem. Observou-se que esse conceito sintático-semântico da linguagem, que recorre a uma relação 
ontológica entre linguagem e mundo, proposição e fato (como na teoria da figuração exposta por 
Wittgenstein no Tractatus), não focaliza os demais aspectos da utilização da linguagem, centrando-se 
apenas nas asserções ou proposições passíveis de verdade (ela abstrai as regras de uso das proposições e 
reconduz todos os significados a conteúdos proposicionais que são avaliados quanto às suas condições 
de verdade)
4
. Habermas (1976:329) chegará a dizer, inclusive, que a análise das orações veritativas (que 
refletem experiências ou fatos) é uma parte menos importante para uma teoria da comunicação (que se 
centrará nas relações interpessoais, e não na relação com o mundo). Em outras palavras, a virada 
linguística precisava ser completada por uma nova mudança, que iria ampliar a análise linguística e 
incluir diversas performances. Aqui, podemos citar os estudos empreendidos por pensadores como: 
a) Peirce, que alterou a visão bipolar (linguagem versus mundo) por uma relação tripolar, que 
inclui o possível intérprete
5
; 
b) pelo próprio Wittgenstein nas Investigações Filosóficas, com a inserção do conceito de jogos 
de linguagem, de “seguir uma regra” e da significação como uma questão de regras de uso; 
c) e, posteriormente, pela teoria dos speech acts, desenvolvida por Austin e Searle, objeto da 
próxima parte deste texto. 
A grande conquista da virada pragmática, ocorrida no seio da filosofia da linguagem, está na 
importância atribuída à praxis comunicativa e não somente à representação da realidade, levando-se em 
 
apresenta estados de coisas), a expressiva (que exprime sentimentos e vivências) e a comunicativa (que comunica algo e 
estabelece relações com os ouvintes, criticando ou concordando). 
3 Karl Bühler parte do modelo semiótico de um signo lingüístico que é utilizado pelo emissor com a finalidade de entender-
se com um receptor sobre objetos ou estados de coisas, ou seja, ele entende a comunicação como uma relação triádica entre o 
falante, o ouvinte e o mundo. Ele distingue três funções lingüísticas (de uso do signo): a cognitiva ou de apresentação 
(verdade), a apelativa ou de interpelação (correção) e a expressiva (veracidade). 
4 Na semântica de Frege, nós compreendemos uma proposição assertórica quando sabemos o que é o caso, se ele for 
verdadeiro. Uma vez que o significado de uma proposição é o estado de coisas que ela reproduz, então nós compreendemos a 
proposição na medida em que conhecemos as condições sob as quais ela é verdadeira (o modelo aqui é a proposição 
assertórica, e não o ato de fala, estando a problemática da validez restrita à relação linguagem/mundo – não se adota um 
ponto de vista pragmático). 
5 Para Peirce, “não é possível pensar sem sinais”, ou seja, todo pensamento é sinal e participa essencialmente da natureza da 
linguagem. Nas situações de comunicação, Peirce distingue três termos (o sinal, o objeto assinalado e o intérprete), o que 
evidencia o aspecto pragmático da significação. 
 5 
conta o caráter intersubjetivo da linguagem (as interações comunicativas, os usos que se fazem dos 
sinais lingüísticos, em suma, o seu caráter pragmático). Se no domínio sintático-semântico o sentido das 
palavras é apreendido em razão de sua contribuição às condições de verdade de uma proposição, no 
plano pragmático apreende-se o sentido de um termo quando se sabe usá-lo, sendo o sentido pensado em 
função de regras de uso. Segundo Apel (1973), a análise lógica da linguagem (que se limita às 
propriedades sintáticas e semânticas) tendeu a deixar a dimensão pragmática da linguagem entregue a 
um mero estudo empírico, como se não pudesse ser submetida a uma análise formal. Ainda que seja 
legítimo estabelecer um corte entre a linguagem como estrutura e a fala como processo, tal separação 
incorre em uma falácia abstrativa quando abandona a dimensão pragmática à mera análise empírica da 
lingüística. É justamente a tentativa da elaboração de uma pragmática formal que será analisada aqui. 
Habermas (1976:304-306), na elaboração de sua pragmática universal, cita vários estudos 
contemporâneos vindos da lógica, da lingüística e da filosofia analítica da linguagem que vão no sentido 
de uma análise formal da dimensão pragmática
6
 e conclui que o desenvolvimento mais promissor está na 
teoria dos atos de fala, que será exposta a seguir. 
 
II – A teoria dos speech acts 
 
 A teoria dos Speech Acts enfatizou o caráter performativo dos proferimentos lingüísticos, sem, 
contudo, prescindir da relação entre linguagem e estado de coisas. A análise lógica da linguagem, que 
estava restrita ao estudo semântico das proposições (as frases, sentenças ou orações, entendidas como 
unidades elementares da linguagem), amplia-se, incluindo também a análise lógica das unidades 
elementares da fala ou da comunicação, que são os proferimentos ou emissões. A meta dessa teoria é 
realizar uma descrição explícita das regras que um falante competente tem de dominar para formar 
orações gramaticalmente corretas e emitir-las de forma aceitável. Segundo o pressuposto dessa teoria, a 
 
6 Como a semiótica de Charles Morris, a ampliação da semântica lógica proposta por Bar-Hillel, os projetos de lógica 
deôntica de Hare, Wright e Rescher, as tentativas de formalização de atos de fala feitaspor Apostel, a teoria da argumentação 
de Toulmin, o estudo dos postulados conversacionais de Grice, as dificuldades das teorias semânticas de Katz e Lyons, a 
discussão proveniente de Frege e Russell acerca da lógica do emprego de expressões denotativas em Strawson, a teoria 
analítica da ação de Danto e Hampshire, a discussão sobre a lógica da explicação da ação intencional em Winch e Taylor, a 
teoria do significado como uso introduzida por Wittgenstein e desenvolvida por Alston, as tentativas de derivar a significação 
das intenções do falante em Grice e Bennet, etc. Segundo Habermas (1976:306-307), essas teorias pecam por vários motivos 
diferentes: ou porque suas colocações não são suficientemente generalizadas (como a maioria dos estudos lingüísticos), ou 
porque se limitam aos instrumentos da lógica e da gramática (insuficientes para as relações pragmáticas), ou porque realizam 
uma formalização apressada e insuficiente (como as lógicas deônticas que reduzem normas de ação a imperativos), ou ainda 
porque partem do modelo de um ator solitário e não levam em conta a importância das relações intersubjetivas (como Grice e 
Lewis). 
 6 
competência comunicativa implica a habilidade de empregar orações em atos de fala, o que respeita um 
sistema fundamental de regras. A teoria geral dos atos de fala visa exatamente descrever essas regras, o 
que não se confunde com a mera descrição empírica de uma língua particular ou de contextos 
contingentes de emissões. 
 A primeira tese que será abandonada será a idéia de que o valor-verdade é determinante para o 
significado de uma proposição (nas teorias das condições de verdade, o significado de uma sentença é 
analisado apenas no nível proposicional, de modo que uma proposição tem sentido quando sabemos o 
que a faz verdadeira – a sua condição de verdade). Esse fetiche do verdadeiro-falso (true-false fetish), 
segundo Austin, nos faz desconhecer outros tipos de empregos lingüísticos (performances) e suas 
condições de satisfação (e a variedade dos possíveis defeitos - infelicities). Austin (1946:38) acredita 
que essas teorias do significado centradas nas condições de verdade cometem uma falácia descritiva, já 
que a linguagem não é puramente descritiva (mesmo quando se diz eu sei). Segundo ele, há 
circunstâncias nas quais não descrevemos a ação, mas a praticamos. A performatividade adquire, então, 
um estatuto único ao ser analisada no interior dos estudos da linguagem, sendo a preocupação central de 
Austin a relação da fala com seu uso por um sujeito. Resumindo, Austin substitui a semântica da 
verdade por uma teoria do uso do significado e a análise das proposições por uma análise dos usos das 
proposições em proferimentos. 
Na primeira versão da teoria, Austin ainda não tratava a asserção como um proferimento 
performativo, distinguindo os enunciados constatativos (proposições assertóricas, voltadas para o 
mundo objetivo, podendo ser verdadeiras ou falsas) e os enunciados performativos (diversas forças 
ilocucionárias que permitem o estabelecimento de relações intersubjetivas, podendo ser bem ou mal 
sucedidos). Depois, Austin (1946) irá abandonar essa distinção, elaborando um paralelo entre dizer “eu 
sei” e “eu prometo”, integrando os enunciados constatativos na formulação performativa e 
transformando a asserção em mais uma força ilocucionária. Assim, Austin mostra que a linguagem não é 
apenas descritiva, mas é ação, de modo que dizer alguma coisa é sempre fazer ou realizar (perform) 
alguma coisa (cf. How to do things with words, 1962:12). Para Austin o ato de fala é composto de três 
partes, três atos simultâneos: 
a) um ato locucionário, que produz tanto os sons (phonetic act) pertencentes a um 
vocabulário ou palavra (phatic act) quanto a articulação entre a sintaxe e a semântica, 
lugar em que se dá a significação no sentido tradicional (rhetic act). Todo ato de fala é, 
primeiro, um ato de dizer, de proferir um enunciado com uma certa significação, e a 
esse aspecto ele chama de realização de um ato locucionário. 
 7 
b) um ato ilocucionário, que é o ato de realização de uma ação através de um enunciado. 
Assim, Austin introduz uma segunda dimensão, que diz respeito ao uso particular que é 
feito do enunciado, entendido como a realização de um ato ilocucionário. Ou seja, ao 
dizer algo, realizamos um ato que tem uma força, por exemplo, de promessa ou 
ameaça. Podemos ilustrar a diferença entre o ato locucionário e o ilocucionário com o 
seguinte caso: o proferimento “eu vou fazer isso” pode ter a força de uma promessa, de 
uma predição, de uma ameaça, de um aviso, etc. Assim, temos diversos usos (atos 
ilocucionários) de uma sentença que tem um significado literal comum (o mesmo ato 
locucionário) (cf. Searle, 1968:406). 
c) um ato perlocucionário, que é o ato que produz efeito sobre o interlocutor. Essa 
terceira dimensão diz respeito às conseqüências ou efeitos particulares, os chamados 
efeitos perlocucionários. Enquanto os atos ilocucionários são convencionais, os 
perlocucionários não o são. O efeito ilocucionário é atingido quando, por exemplo, “ao 
dizer isso, eu o estava avisando”, ou seja, quando a intenção ao falante é compartilhada 
tal qual, já o efeito perlocucionário é atingido quando o resultado não decorre da força 
ilocucionária, por exemplo, quando “pelo fato de dizer isso, eu o surpreendi”. 
Partindo das idéias de Austin, John Searle leva adiante a teoria com algumas alterações. 
Primeiro, Searle considerará dispensável a noção de ato locucionário, uma vez que ao proferir uma 
sentença com um certo significado não se realizam dois atos diferentes, mas um mesmo ato com duas 
faces. Não há como pensar o ato locucionário sem associar a ele um ato ilocucionário, ao seja, com essa 
abstração se perde também o significado da sentença. Segundo Searle (1968:408), a tentativa de abstrair 
o significado locucionário da força ilocucionária seria como tentar abstrair os homens não-casados dos 
solteiros. Em outras palavras, Searle percebe que o rhetic act (onde se dá o sentido e a referência da 
sentença) não pode ser abstraído da força ilocucionária, o que descaracteriza a noção de Austin de ato 
locucionário, que se limitaria ao nível dos ruídos e sons (phonetic act) e da formação de vocábulos e 
palavras (phatic act), o que não é de interesse para uma teoria da significação. Searle (1965:44) se 
pergunta sobre qual a diferença entre simplesmente emitir sons ou fazer marcas e realizar um ato de fala. 
A diferença está no fato de a realização de um ato de fala ser um comportamento governado por regras, 
que fazem ele ter significado. 
O ato ilocucionário é, assim, a unidade mínima da comunicação lingüística e é ele que será o 
foco dos estudos de Searle (cf. What is speech act, 1965:39). Searle produzirá uma descrição lógica do 
ato de fala com uma dupla estrutura (criando a fórmula F(p)), composta pelo conteúdo proposicional (p) 
 8 
e a sua força ilocucionária (F). O elemento ilocucionário, implicado em todo ato de fala, determina o 
modo pelo qual o conteúdo proposicional é utilizado, ou seja, o ato de expressar a proposição. A própria 
asserção (ou ato de fala constatativo) é pensada performativamente, estabelecendo, portanto, relações 
intersubjetivas que podem ser bem ou mal sucedidas. Para exemplificar, vejamos a asserção: “isto é uma 
cadeira”. Pode-se perceber que além do conteúdo proposicional, temos o componente performativo ou 
ilocucionário implícito que pode ser expresso como “eu afirmo que isto é uma cadeira”. Assim, o 
elemento performativo estabelece o tipo de relação intersubjetiva que se pretende com a proposição “isto 
é uma cadeira”. Noutros termos, o elemento performativo exibe o modo pelo qual os sujeitos devem 
compreender o conteúdo proposicional, vale dizer, como afirmação, ordem, promessa e assim por 
diante. Assim, o ato de linguagem é bem sucedido quando não só o ouvinte compreende o significado dafrase, mas aceita a oferta do falante e se realiza a relação interpessoal visada por este. Exemplificando, o 
sucesso ilocucionário ocorre quando o ouvinte aceita a asserção, acreditando nela e comportando-se de 
acordo com ela, quando aceita uma ordem, sentindo-se obrigado a executá-la, ou quando faz uma 
promessa, sentindo-se no dever de cumpri-la. 
Quanto à distinção entre o ato ilocucionário e o perlocucionário, Searle observa que eles são dois 
tipos diferentes de efeitos relacionados com a noção de significação (meaning). Searle (1965:45-46) 
apresenta um exemplo que, segundo ele, é capaz de mostrar a diferença entre o que o falante tem a 
intenção de significar e o que as palavras que ele utiliza significam por si mesmas
7
. O exemplo dado é o 
do soldado americano que, durante a segunda guerra mundial, foi capturado pelos italianos. Para se 
livrar dessa situação, o soldado queria fazer os italianos acreditarem que ele era alemão, mas não sabia 
falar alemão nem italiano. Esperando que os italianos não soubessem falar alemão, o soldado americano 
recitou um verso em alemão que se lembrava de ter aprendido na escola, pois, dessa maneira, poderia 
atingir o efeito desejado. O soldado quer significar "eu sou um soldado alemão" dizendo em alemão 
"Kennst du das Land wo die Zitronen blühlen?", que em português significa algo como "Você conhece o 
país onde florecem os limoeiros?". Ainda que o soldado venha a obter o efeito esperado, ele não passará 
de um efeito perlocucionário (apesar de sua intenção coincidir com a interpretação do ouvinte). Para 
Searle, dizer algo querendo efetivamente significar o que se diz é ter a intenção de realizar um ato 
ilocucionário. Dessa forma, o efeito buscado na significação é a compreensão, e ela não é um efeito 
perlocucionário. A passagem do lado do locutor para o lado do ouvinte se faz pela língua que eles têm 
em comum. Searle explica como funciona essa passagem por quatro pontos. 
 
7 A compreensão de um ato de fala resulta daquilo que é dito, e não da intenção do falante (em oposição a uma teoria 
intencionalista como a de Grice). 
 9 
a) Primeiro, compreender uma frase é conhecer a sua significação. 
b) Segundo, tal significação é determinada por regras. 
c) Em terceiro lugar, proferir uma frase querendo significá-la implica a intenção do falante e o 
reconhecimento dessa intenção pelo ouvinte em virtude do conhecimento das regras que se 
aplicam a frase proferida. 
d) Em quarto lugar, a frase fornece um meio convencional de realizar a intenção de produzir no 
ouvinte um certo efeito ilocucionário. 
Segundo o princípio de expressabilidade proposto por Searle, o significado literal das orações 
emitidas coincide com o que o falante quer dizer com seu ato de fala, ou seja, há de ser possível, em 
princípio, que todo ato de fala seja univocamente determinado por uma oração, supondo que o falante 
expressa sua intenção de forma literal, explícita e com exatidão. Nesse sentido, Searle analisou as 
condições de aceitabilidade de diferentes atos de linguagem, expondo as regras preliminares, essenciais 
e de sinceridade de todo proferimento sério e literal que tornam o ato ilocucionário inteligível
8
 (o que 
exclui a interpretação teatral, o ensino, a recitação de poemas e o sentido metafórico, sarcástico, etc.). 
Após essa breve exposição da teoria dos atos de fala, convém relacionarmos esses estudos com a 
proposta habermasiana de uma pragmática universal, que será o objeto da próxima parte. 
 
III – A pragmática universal de Habermas 
 
Durante a década de 70, Habermas desenvolveu vários estudos em filosofia da linguagem
9
. Em 
1976, em um estudo prévio à elaboração da Teoria do Agir Comunicativo (O que significa pragmática 
 
8 Como exemplo, Searle (1965:46-53) analisa o ato ilocucionário da promessa, expondo suas condições e regras. Vejamos: 
dado que o falante F profere a sentença S na presença do ouvinte O, então, no proferimento de S, F sinceramente promete que 
p para O, se e somente se: 
Regra do conteúdo proposicional: 
F expressa p no proferimento de S e, ao expressar p, S predica um ato futuro A para F. 
Condições preliminares ou preparatórias – preparatory rules (condições sine quibus non da promessa): 
O deve preferir que F faça A (um ato futuro) do que que não o faça, e F acredita que O prefere que ele faça A do que que não 
o faça. 
É óbvio tanto para F quanto para O que F não faria A no curso normal dos eventos. 
Condição de sinceridade – sincerity rule: 
F tem a intenção de fazer A. 
Condição essencial – essencial rule: 
F entende que o proferimento de S o colocou na obrigação (assumiu o compromisso) de fazer A. 
9 Já em 1970 e 1971, Habermas (1971) demonstra seu interesse pela filosofia da linguagem em suas Lições sobre uma 
fundamentação da sociologia em termos de teoria da linguagem (“Christian Gauss Lectures”, pronunciadas na Princeton 
University), texto no qual fica ainda evidente seu arsenal teórico vindo da sociologia, mas já com elementos da filosofia 
analítica da linguagem, como a teoria dos atos de fala e, sobretudo, Wittgenstein. 
 10 
universal?) Habermas (1976:306) diz que o ponto de partida mais promissor para uma pragmática 
universal está na teoria dos speech acts de Austin e Searle. Em 1981, em um capítulo da Teoria do Agir 
Comunicativo (cf. Habermas, 1981a:351-432), Habermas já se mostra familiarizado com a tradição 
analítica de problemas lingüísticos, remontando a Frege e Wittgenstein e discutindo, sobretudo, com 
Austin e Searle (ele voltará ainda a essas questões em 1988, em Pensamento pós-metafísico e, 
recentemente, em Verdade e Justificação
10
, 1999). Focalizarei minha apresentação no texto O que 
significa pragmática universal? (que foi a primeira apresentação mais sistemática da teoria pragmática 
formal de Habermas) e procurarei ressaltar aqui a influência da teoria dos atos de fala em sua 
elaboração. 
Logo na primeira frase do texto de 1976, Habermas deixa claro seu projeto: ele tem como tarefa 
identificar e reconstruir as condições universais de possibilidade do entendimento possível
11
. Pretendo 
mostrar aqui como Habermas irá buscar na teoria dos atos de fala os elementos para desenvolver sua 
teoria da significação e do entendimento. Podemos resumir o projeto habermasiano nos seguintes 
pontos: o estudo das condições universais do entendimento possível é compreendido como o estudo dos 
pressupostos universais da comunicação ou, mais especificamente, os pressupostos da ação 
comunicativa (que é entendida como a ação orientada ao entendimento, que tem um caráter fundamental 
em relação às demais formas de ação social). Quanto à conexão entre o estudo das condições da 
comunicação com a teoria dos atos de fala, ela se encontra no próximo passo dado por Habermas, que 
consiste em entender as ações comunicativas (ou aquelas que se orientam ao entendimento) em termos 
de atos de fala explícitos. A teoria pragmática da significação se empenha exatamente em explicar o que 
significa compreender um ato de fala. Em termos mais técnicos, Habermas (1976:340) circunscreve 
assim o seu objeto de estudo: dentre as ações sociais
12
, sua teoria estudará: 
 
10 Sobretudo no artigo “Racionalidade do entendimento mútuo: explanações sobre o conceito de racionalidade comunicativa 
segundo a teoria dos atos de fala”, que veio a público pela primeira vez em 1996. 
11 O primeiro aspecto que devemos observar no projeto de uma pragmática universal diz respeito às suas dificuldades 
metodológicas. Por um lado, a questão se coloca em função da pretensão de um alcance universal da teoria. A pragmática 
universal de Habermas (1976:312) não se confunde com um estudo empírico, pois trata de reconstruir uma capacidade 
universal, e não competências particulares deste ou daquele grupo (a reconstruçãose refere a um saber pré-teórico dos 
falantes competentes, ou seja, o sistema de regras que subjazem a capacidade de um sujeito emitir orações em qualquer 
situação). Ela é uma ciência reconstrutiva e não empírico-analítica, como a lingüística assentada nas línguas naturais. Por 
outro lado, é preciso marcar a diferença entre um estudo reconstrutivo (sempre hipotético) e uma análise transcendental (que 
assinala as condições a priori de possibilidade). O forte apriorismo cede lugar a uma versão mais fraca (como a recepção 
analítica que Strawson fez do programa kantiano). A ciência reconstrutiva se assenta em estruturas que se repetem em todas 
as experiências coerentes, e não na afirmação de sua necessidade (essa mesma peculiar conexão entre análise formal a priori 
e análise empírica a posteriori ocorre, por exemplo, em Piaget e Chomsky). 
12 Habermas (1976:339-340) divide as ações em ações instrumentais e sociais, que se subdividem em ações comunicativas 
(orientadas ao entendimento), estratégicas (que respondem ao padrão utilitarista de ação racional com relação aos fins) e 
 11 
a) as ações comunicativas (orientadas ao entendimento); 
b) proposicionalmente diferenciadas (não analisando ações não lingüísticas ou ações lingüísticas 
abreviadas); 
c) lingüísticas (em oposição a ações proposicionalmente diferenciadas porém não lingüísticas, 
como a linguagem dos surdo-mudos); 
d) não ligadas institucionalmente (pois se referem aos aspectos gerais das normas de ação, que 
não vem definidas institucionalmente, como o batismo e o casamento); 
e) explícitas (que adotam uma forma verbal standard, ao contrário das emissões implícitas, que 
são completadas extra-verbalmente e dependem de condições contextuais). 
Para Habermas (1976:341), se observamos a estrutura de um ato de fala (conteúdo proposicional 
e força ilocucionária), vemos de um lado o aspecto cognitivo e de outro o aspecto comunicativo. 
Enquanto a semântica formal estuda o conteúdo proposicional de um enunciado, a pragmática formal, tal 
como a desenvolvida pela teoria dos speech acts e por Habermas, investiga a força ilocucionária (ou 
seus pressupostos). A pragmática formal parte da questão acerca do que significa entender uma oração 
ou sentença empregada comunicativamente (uma emissão ou proferimento) e responde dizendo que 
entendemos um ato de fala quando sabemos o que o faz aceitável, tomando a aceitabilidade a partir da 
ação performativa de um participante na comunicação (cf. Habermas, 1976:325-326; 1981a:381-382). 
Como qualquer ação, a ação ou ato de fala pode ser bem ou mal sucedida: o seu sucesso depende do 
estabelecimento de uma relação interpessoal
13
. 
Assim como Searle, Habermas (1976:343-345) acredita que a distinção proposta por Austin entre 
atos locucionários (onde se dá o significado - o sentido e a referência) e ilocucionários (onde está a força 
ou o reconhecimento entre os interlocutores) é insatisfatória, pois não devemos limitar a significação 
(meaning) aos componentes proposicionais (oracionais) do ato de fala. Ele vai defender a importância da 
força ilocucionária, dizendo que constitui uma falácia descritiva reduzir o processo comunicativo à 
simples transmissão de conteúdos ou informações. Segundo Habermas (1988:77), não é possível isolar, 
 
simbólicas (que são formas de ação ligadas a sistemas não proposicionais de expressão simbólica, como, por exemplo, um 
baile – o que já é observado nos primatas). 
13 Habermas (1976:342) chega a relacionar a noção de força ilocucionária com a noção heideggeriana de “como 
hermenêutico”, uma vez que ela determina algo “como algo”, o que dá sentido ao elemento proposicional (o “como 
predicativo”). Nessa base, Habermas (1976:342) diferencia a compreensão ilocucionária e a compreensão predicativa (que 
significa o entendimento do conteúdo proposicional, ou seja, a existência de um objeto em comum para falante e ouvinte). 
Em ambos os casos o ouvinte chega a entender algo, mas o tipo de entendimento é diferente: a compreensão predicativa é 
uma compreensão acerca de algo no mundo e a compreensão ilocucionária produz uma aceitação de uma relação 
interpessoal. Segundo Habermas (1988:67), o sentido performativo de um ato de fala só é captado por um ouvinte potencial 
que abandona a perspectiva de observador e adota a do participante, sendo preciso falar a mesma linguagem e compartilhar o 
mesmo mundo da vida. 
 12 
de um lado, a questão do significado (isto é, o que significa compreender o significado de uma 
expressão lingüística) e, de outro lado, a questão referente ao contexto em que essa expressão pode ser 
aceita como válida
14
. 
Porém, Habermas se afastará de Searle ao associar o componente ilocucionário à questão das 
pretensões de validez, dizendo que as questões de significado se associam intimamente às questões de 
validez ou aceitação racional. A tese de Habermas (1976:300) é assim expressa: todo agente que atua 
comunicativamente tem de estabelecer, na execução de qualquer ato de fala, pretensões universais de 
validez. Isso ocorre porque, ao emitir uma oração, o falante tem de cumprir pressupostos universais da 
comunicação (baseados nas estruturas universais da fala). Segundo Habermas (1976:357), é preciso 
distinguir as classes de ato de fala padronizadas em uma língua particular (as condições gerais de 
contexto implicitamente pressupostas e o sentido específico da relação interpessoal estabelecida) e os 
modos de comunicação universais, inscritos na própria fala (a pretensão universal de validez 
implicitamente estabelecida). Essas pretensões universais são quatro e são estabelecidas sempre 
simultaneamente (ainda que não possam ser tematizadas todas ao mesmo tempo): 
a) de inteligibilidade (o que digo é inteligível), 
b) de verdade (o conteúdo proposicional é verdadeiro – estou dando a entender algo – relação 
com a realidade externa: objetividade): modo de comunicação cognitivo, ato de fala 
constatativo, tematiza o conteúdo proposicional; 
c) de correção, adequação ou retidão – Richtigkeit (estou justificado quando o digo – eu me 
entendo com os demais quanto às normas e valores – relação com a realidade social: 
normatividade): modo de comunicação interativo, ato de fala regulativo, tematiza a relação 
interpessoal; 
 
14 Habermas (1976:345-349) associará à distinção de Austin entre meaning (dimensão locucionária) e force (dimensão 
ilocucionária) com uma distinção entre o significado de uma oração (no sentido lingüístico – o uso cognitivo da linguagem – 
tematizados com a ajuda de atos de fala constatativos) e o significado de uma emissão (no sentido pragmático – o uso 
interativo da linguagem – tematizados com a ajuda de atos de fala regulativos). Enquanto o significado de uma oração é 
apreendido ao se reproduzir experiências com o mundo (centrado no conteúdo proposicional), o significado de uma emissão, 
ou ilocucionário, nós o aprendemos quando entramos no plano da intersubjetividade e estabelecemos relações interpessoais. 
Contudo, apesar de dar algum valor explicativo à distinção entre meaning e force, Habermas (1976:350-352,355) não aceitará 
a interpretação dessa distinção em termos de atos constatativos (locucionários, que podem ser verdadeiros ou falsos) e atos 
performativos (ilocucionários, que podem se bem sucedidos ou mal sucedidos), como sustentou Austin em seus primeiros 
escritos. O que distingue o ato constatativo dos demais é o fato de implicar uma pretensão de validez específica, a saber, a 
pretensão de verdade. Apesar de ser a mais evidente e chamativa, a verdade não é a única pretensão de validez refletida nas 
estruturas formais da fala (cf. Habermas, 1976:354). 
 13 
d) e de veracidade (falo sinceramente – eu expressominhas intenções de forma veraz – relação 
com a realidade interna: subjetividade): modo de comunicação expressivo, ato de fala 
representativo, tematiza a intenção do falante. 
A oração gramaticalmente correta satisfaz apenas à primeira pretensão universal (de 
inteligibilidade ou compreensibilidade), mas para uma emissão ser bem sucedida ela precisa satisfazer 
também as outras três pretensões de validez. Para Habermas (1996:108), o êxito ilocucionário depende 
da realização de duas metas: primeiro, que o ato seja compreendido pelo ouvinte, segundo, que seja 
aceito. O sentido ilocucionário de um proferimento não se esgota no conhecimento do ouvinte da 
intenção ou da opinião do falante, mas no fato de levar a sério e aceitar as pretensões de validez do 
falante. E o que torna aceitável a oferta do ato de fala são as razões que o falante poderia apresentar para 
a validez do dito. Observa-se, assim, que o conceito chave da teoria pragmática da significação não é 
verdade, mas o conceito de validez, no sentido de aceitabilidade racional (de modo que o que deve ser 
estudado não são as condições de verdade de uma proposição, mas as condições de validez ou de 
aceitabilidade de um proferimento). 
Essa análise pragmática da capacidade de comunicação serve de complemento ao estudo de 
como gerar frases gramaticalmente bem formadas (a capacidade lingüística). Enquanto a competência 
lingüística se satisfaz com a pretensão de inteligibilidade ou compreensibilidade, a competência 
comunicativa insere as frases em geral nas funções pragmáticas universais de: 
a) apresentação ou constatação (a capacidade de escolher o conteúdo do enunciado de 
forma que reproduza uma experiência ou fato real de modo que o ouvinte possa 
compartilhar esse saber); 
b) de expressão (a capacidade de proferir intenções de modo que o ouvinte possa confiar 
nele); 
c) de co-participação ou regulação (a capacidade de realizar o proferimento de modo que 
possa contar com o acordo do ouvinte quanto aos valores) (cf. Habermas, 1976:328). 
Em suma, a análise das estruturas universais da fala só se dirige às propriedades formais da 
oração para avaliar a possibilidade de se empregar orações como elemento da fala (para as funções de 
constatação, expressão e participação) (cf. Habermas, 1976:330). 
A Pragmática Universal de Habermas se apóia na teoria dos Speech Acts, mas conduz a uma 
interpretação diferente. A teoria dos speech acts desenvolvida por Austin e Searle foi o primeiro passo 
em relação a uma pragmática formal, mas, na opinião de Habermas (1981a:357), ela permaneceu 
 14 
atrelada aos estreitos pressupostos ontológicos da semântica veritativa
15
. Em outras palavras, é preciso 
generalizar o conceito de validez para além da validez veritativa das proposições, de modo a identificar 
as condições de validez também no plano pragmático das emissões. Embora parta da teoria dos Speech 
Acts, Habermas critica Searle por ter perdido de vista a dinâmica da negociação e do reconhecimento 
intersubjetivo das pretensões de validez para a formação do consenso. Habermas (1976:301) diz 
claramente que a meta do entendimento é a produção de um acordo. Realmente, para Searle, a 
perspectiva intersubjetivista pressupõe a intencionalista, não sendo possível analisar a significação, 
comunicação e os speech acts em termos de obtenção de consenso (ele irá inclusive radicalizar sua 
versão intencionalista ao defender que a teoria dos atos de fala é parte de uma teoria mais geral da 
intencionalidade, inscrita num estudo de filosofia da mente). Habermas (1988:145) ressalta a 
insuficiência do modelo intencionalista, que condena o ouvinte a uma situação passiva, roubando-lhe a 
possibilidade de levar a sério o proferimento do falante (ou seja, aceitar como válido) ou não 
(recusando-o como inválido). É claro, e Habermas reconhece isso, que o proferimento válido (o 
significado de uma expressão lingüística) não é mesma coisa que o proferimento tido como válido (a 
aceitação da validez). Apesar disso, não é possível isolar a questão do significado da questão da validez, 
pois não saberíamos o que significa entender o significado de uma expressão lingüística, caso não 
soubéssemos como nos servir dela. Assim, o próprio processo de compreensão da linguagem envolve a 
orientação através da possível validez do proferimento. Em suma, Habermas quer dar uma interpretação 
intersubjetiva da linguagem, destacando o fato de que falantes e ouvintes levantam em seus atos 
ilocucionários pretensões de validez e exigem seu reconhecimento. 
Para ilustrar essa divergência, podemos observar o descontentamento de Habermas (1976:361) 
quanto à análise que Searle fez das condições e regras para a aceitação de uma promessa. Seus estudos 
seriam insatisfatórios, pois não deixam claro em que consiste o compromisso do falante, ou seja, de que 
depende especificamente a aceitabilidade de sua emissão (em outras palavras, ele não conectou esse 
estudo com a questão das pretensões de validez). Para Habermas (1976:332), o estabelecimento de 
relações interpessoais é o aspecto mais central para a elaboração de uma teoria da comunicação (em 
 
15 Austin e Searle não perceberam a conexão dos atos de fala com as pretensões de validez. Para Austin, o significado se 
dava no nível locucionário ou proposicional, sendo a força ilocucionária um componente irracional da fala, e mesmo após 
abandonar a distinção entre atos constatativos e performativos, e perceber a performatividade presente na asserção, ele 
continua interpretando a verdade proposicional nos termos da teoria da correspondência e a considerava a única pretensão 
universal de razão ou validez. Searle, apesar de aprofundar o estudo das felicity-conditions de um ato de fala, acaba 
retornando a Frege quando utiliza na classificação dos atos de linguagem um critério semântico (as directions of fit, ou as 
formas de encaixe entre linguagem e mundo). Segundo Habermas (1988:122-123), Searle gasta em vão suas energias nisso e 
oferece uma base extremamente estreita para o estudo dos proferimentos, fazendo a pragmática regredir ao nível da 
semântica da verdade. 
 15 
detrimento das questões semânticas ou da intencionalidade). Em suma, para Habermas (1976:362-363), 
o falante pode agir ilocucionariamente sobre o ouvinte e este de novo sobre o falante porque as 
obrigações típicas dos atos de fala estão ligadas às pretensões de validez que têm uma base racional (elas 
vem conectadas internamente com razões e são, portanto, susceptíveis de um exame cognitivo). Há, 
assim, uma obrigação de fundamentação imanente ao ato de fala (cf. Habermas, 1976:363), daí a 
importância de se desenvolver uma teoria da argumentação, que irá mostrar como fundamentamos (uso 
cognitivo da linguagem), justificamos (uso interativo da linguagem) ou damos credibilidade (uso 
expressivo da linguagem) aos nossos atos de fala no plano do discurso. 
Outra questão que ajuda a entender a divergência entre Habermas e os primeiros teóricos da 
teoria dos speech acts diz respeito à tentativa de classificar os atos de fala. Austin (1962:151) propôs 
uma tipologia provisória distinguindo cinco tipos diferentes, os atos de fala: 
a) judicativos ou avaliativos (veridictives): consiste em encontrar uma evidência ou razão 
para algo, como analisar, estimar e sustentar; 
b) exercitivos ou declarativos (exercitives): a expressão de decisões dotadas de 
autoridade, como ordenar, recomendar e advertir; 
c) comissivos (commissives): de compromisso, como as promessas e ameaças, na qual se 
obriga a realizar uma ação futura; 
d) comportativos (behabitives): a reação ao comportamento de outras pessoas, como 
protestar, queixar-se, felicitar, desculpar e agradecer; 
e) expositivos (expositives): que apresentam um estado de coisas, como uma constatação 
ou uma pergunta. 
Searle (1979:1-29) considera a classificação de Austin confusa (poismistura a taxonomia dos 
atos ilocucionários com a dos verbos ilocucionários) e propõe uma classificação baseada nos usos da 
linguagem (uma pragmática empírica) e observa cinco categorias de atos ilocucionários (baseados em 
cinco tipos de propósitos - illocutionary point,- e também nas diferentes direções de ajuste – direction of 
fit): 
a) os assertivos ou representativos (assertives): que diz como as coisas são; 
b) diretivos (directives): que tentam nos levar a fazer algo; 
c) expressivos (expressives): que expressam nossos sentimentos; 
d) declarativos (declarations): realizam uma mudança no mundo através de seu 
pronunciamento. 
 16 
Habermas (1981a:413-419), por sua vez, critica a classificação de Searle por se limitar à 
perspectiva do falante (sem levar em consideração a dinâmica da discussão e o reconhecimento 
intersubjetivo das pretensões de validez). Ele pretende classificar os tipos ilocucionários tomando como 
fio condutor as pretensões de validez. O pressuposto ontológico de Searle (as direções de ajuste com o 
mundo) mostra como ele não deixa espaço para a relação intersubjetiva. Habermas primeiro distingue os 
atos de fala comunicativos dos meros imperativos (que são pretensões de poder, avaliados em função 
das condições de êxito), e distingue três atos de fala comunicativos (que visam ao entendimento e 
levantam pretensões de validez): 
a) ato de fala constatativo: o falante se refere a algo no mundo objetivo (levanta a 
pretensão de verdade); 
b) ato de fala regulativo: o falante se refere a algo no mundo social comum (ação 
regulada por normas, levanta a pretensão de correção); 
c) ato de fala expressivo: o falante se refere a algo pertencente a seu mundo subjetivo 
(ação dramatúrgica, levanta a pretensão de sinceridade). 
Após essa apresentação da teoria pragmática universal de Habermas, e de como ela foi 
influenciada pela teoria dos atos de fala, convém agora mostrar a repercussão dessas teorias para o 
desenvolvimento da teoria do agir comunicativo. 
 
IV – A teoria do agir comunicativo de Habermas 
 
Posteriormente, na Teoria do Agir Comunicativo, Habermas (1981a:351-433) irá integrar o seu 
estudo da pragmática universal com um quadro teórico mais amplo e ambicioso. Habermas (1981b:139) 
buscou na filosofia da linguagem de molde analítico (sobretudo na teoria dos atos de fala) os elementos 
para a elaboração de uma teoria crítica da sociedade que consiga, a partir do desenvolvimento de um 
estudo das condições das ações comunicativas (a pragmática universal), realizar, dentre outras, uma 
grande façanha: encontrar as bases que permitam identificar as patologias sociais em termos de 
comunicações sistematicamente distorcidas (ou pseudo-comunicações). Uma pragmática formal 
conseguiria mostrar as condições universais da ação comunicativa e, desta forma, reconstruir o padrão 
“normal” ou não distorcido da comunicação (essas patologias são resultado de uma confusão entre ações 
 17 
orientados ao êxito e ações orientadas ao entendimento, uma vez que ocorrem quando o falante faz o 
ouvinte crer que ele cumpre os requisitos de uma ação comunicativa)
16
; 
Habermas associará o estudo da racionalidade da ação (a partir de Weber) com a teoria dos atos 
de fala. Ao contrário da razão prática (centrada na consciência), a razão comunicativa não se prende a 
nenhum ator singular e ocorre através do médium linguístico e está inscrita no telos do entendimento, 
que, por sua vez, implica a visada, por parte dos participantes, de fins ilocucionários. Não que a 
linguagem seja racional per se, mas Habermas (1996:107) mostra que há uma racionalidade inerente à 
aplicação comunicativa de expressões lingüísticas (a racionalidade comunicativa). Ao associar a 
racionalidade à competência de uso da linguagem, ao “seguir regras” (como diz Wittgenstein), fica claro 
o molde pragmático da reflexão habermasiana acerca da racionalidade. Habermas mostra que a distinção 
traçada por Austin e Searle entre atos perlocucionários e ilocucionários pode ser pensada em termos de 
ações que visam ao sucesso (racionalidade orientada para um fim - Zweckrationalität) e ações 
orientadas para o entendimento (racionalidade orientada para o entendimento - 
Verständigungsrationalität). É claro que, em um sentido bem geral, todas as ações, lingüísticas ou não, 
podem ser apreendidas como atividades orientadas para fins. Mas Habermas (1981a:367-378) pretende 
mostrar que em um caso faz-se um uso estratégico da linguagem (orientado ao êxito) e, no outro, um 
uso não-estratégico (orientado ao entendimento): 
a) as ações orientadas ao êxito são aquelas que visam a execução de regras de escolha 
racional: a ação estratégica (avaliada sob o ponto de vista da eficiência). Esse modelo 
teleológico de ação recorre à linguagem como um meio entre outros, através do qual 
se pode influenciar o auditório na formação das opiniões ou interações desejadas com 
a finalidade de obter o próprio interesse. Neste caso, trata-se de um entendimento 
indireto, cuja única meta dos participantes é a realização de seus fins. Trata-se, aqui, 
de atos perlocucionários, nos quais o falante busca causar um efeito sobre o ouvinte, 
sendo seus efeitos externos ao dito e dependentes de contextos contingentes (ele 
constitui uma subclasse das ações teleológicas, um tipo especial de interação 
estratégica). O fim perlocucionário é algo que o falante, se quiser ter êxito, deve 
manter escondido do ouvinte. 
 
16 Habermas (1981a:426) divide as ações sociais em ação comunicativa e ação estratégica, esta última, por sua vez, se divide 
em ação abertamente estratégica e ação estratégica encoberta, na qual ocorre ou um engano consciente (a manipulação do 
ouvinte pelo falante) ou um engano inconsciente (a comunicação sistematicamente distorcida). 
 18 
b) as ações orientadas ao entendimento são aquelas interações sociais coordenadas não 
através de cálculos egocêntricos de êxito, mas através de atos cooperativos de 
entendimento mútuo dos participantes. Trata-se, aqui, de atos ilocucionários, nos 
quais o falante realiza uma ação dizendo algo, guardando seu êxito uma relação 
interna ou regulada por convenção com o ato de fala. Os fins ilocucionários não 
podem ser atingidos sem que haja cooperação, intercompreensão, entendimento, ou 
seja, ele tem de estar sempre expresso, explícito, sendo aceito abertamente. Assim, a 
racionalidade comunicativa tem como fio condutor o entendimento lingüístico e o 
levantamento de pretensões de validez, o que remete a um acordo motivado 
racionalmente. 
Baseado na tese de que o entendimento é o telos imanente da linguagem humana, uma vez que 
linguagem e entendimento não se comportam entre si como meio e fim, Habermas (1981a:369-370) 
sustentará que o uso da linguagem orientado ao entendimento (a ação comunicativa) constitui o modo 
original de uso da linguagem, enquanto o uso da linguagem orientado ao êxito é uma forma parasitária 
(um entendimento indireto). Ela é indireta e parasitária pois seus efeitos só surgem quando o falante não 
declara ao ouvinte seus fins, ou seja, sob a condição de que o falante simule a intenção de perseguir fins 
ilocucionários, enquanto na verdade está ferindo os pressupostos do agir orientado ao entendimento e 
está ocultando esse fato do ouvinte. Assim, o uso estratégico da linguagem só funciona quando uma das 
partes parte do pressuposto que a linguagem está sendo utilizada com o fim do entendimento. Habermas 
distingue, assim, entre um uso mais originário da linguagem (intercompreensivo, argumentativo, 
ilocucionário, integrado ao mundo da vida e à racionalidade comunicativa) e um uso derivado (retórico, 
perlocucionário, orientado ao êxito, integrado à racionalidade sistêmica). (cf. Habermas, 1981a:122-
136,351-432; 1983:63). 
Em razão de algumas críticas recebidas após a publicação da Teoria do Agir Comunicativo, 
Habermas (1988:132n)irá reconhecer que uniu de modo apressado a distinção entre atos ilocucionários 
e perlocucionários (feita no nível de uma teoria do significado) e a distinção entre agir orientado ao 
entendimento e agir orientado ao sucesso (feita no nível de uma teoria da ação). Ele perceberá que os 
efeitos perlocucionários podem ser descritos de várias formas na teoria da ação: seja como efeitos 
passíveis de consenso, seja como efeitos intencionados estrategicamente e que não podem ser 
declarados. Recentemente, Habermas (1996:121) distinguiu três classes de sucessos perlocucionários: 
 19 
a) os efeitos perlocucionários1, que resultam do conteúdo de um ato ilocucionário bem 
sucedido (por exemplo, quando se executa uma ordem ou se cumpre uma promessa), 
de modo que aqui as metas ilocucionárias regem as perlocucionárias; 
b) os efeitos perlocucionários2, que são as conseqüências contingentes de um ato de fala, 
mas que se dão em virtude de um sucesso ilocucionário (como a notícia que, segundo o 
contexto, alegra ou assunta seu receptor); 
c) os efeitos perlocucionários3, que só podem ser alcançados se ocultados do destinatário, 
mas também nesse caso o sucesso estratégico depende do sucesso de um ato 
ilocucionário. 
O valor desses estudos da linguagem para uma teoria da sociedade fica mais claro quando 
Habermas mostra o papel das ações comunicativas como mecanismo de coordenação de ação. Segundo 
Habermas (1996:117), a racionalidade comunicativa corporificada em atos ilocucionários também se 
estende, para além de proferimentos verbais, a ações ou interações sociais. A ação comunicativa tem três 
funções na reprodução do mundo da vida: de uso e renovação do saber cultural, de formação de 
identidades pessoais (através da socialização) e, por fim, o que será de grande importância para entender 
seu valor para o estudo do direito, o papel de coordenador da ação, gerando integração social e 
solidariedade. A integração social garante a coordenação das ações através de relações interpessoais 
legitimamente reguladas. As ações comunicativas (realizadas através de atos ilocucionários), guardam 
uma relação interna com razões (capazes de mover o ouvinte à aceitação), levantando uma pretensão de 
validez susceptível de crítica e fundamentação, o que difere de outras formas de coordenação de ação, 
calcadas em pretensões de poder, que não se associam a razões, mas vêm respaldadas por sanções e se 
exprimem na forma de imperativos simples ou ordens advindas de uma autoridade normativa (cf. 
Habermas, 1981a:389-390). No primeiro caso, Habermas (1988:71) diz que a coordenação da ação se 
deu pela força consensual do entendimento lingüístico (as energias de ligação da própria linguagem), ao 
passo que no segundo caso o efeito de coordenação depende da influência dos atores uns sobre os outros 
(que atuam estrategicamente). Em resumo, temos dois mecanismos distintos de interação social: o do 
entendimento motivador da convicção e o da influenciação. 
 
V – A teoria discursiva do direito em Habermas 
 
Essas questões filosóficas ganham em importância para a reflexão jurídica uma vez que serviram 
de pano de fundo para a elaboração da teoria discursiva do direito, proposta por Jürgen Habermas de 
 20 
maneira mais sistemática em Faticidade e Validez (Faktizität und Geltung), publicada originalmente em 
1992. A conexão entre o estudo da linguagem e o estudo do direito fica evidente quando, a partir da 
teoria do agir comunicativo, Habermas ressalta o papel da linguagem como meio de integração social, 
mostrando como as ações comunicativas são capazes de coordenar ações, seja no plano da ação (das 
práticas cotidianas do mundo da vida), seja no plano do discurso (onde os conflitos são resolvidos na 
prática da argumentação, pois podemos chegar a um acordo racionalmente motivado). Aliás, a 
linguagem é o único meio apto para coordenar, de maneira estável e legítima, os planos individuais de 
ação, sendo, assim, a fonte primária dessa coordenação. 
Uma vez que os falantes buscam entender-se na comunicação (nos processos de entendimento, 
na busca de fins ilocucionários), Habermas (1992:36) acredita que essa “energia de ligação da 
linguagem” pode ser mobilizada para a coordenação de planos de ação. Ao assumir o papel de 
coordenação da ação, as forças ilocucionárias dos atos de fala passam a ser exploradas como fonte 
primária de integração social (e nisso consiste o agir comunicativo). Uma teoria procedimental do 
direito, e em especial a teoria discursiva do direito, só é possível sobre a base de um estudo das 
condições pragmáticas para a realização de discursos jurídicos de justificação e de aplicação das normas 
jurídicas. 
A teoria discursiva do direito privilegia a questão da comunicação como mecanismo da 
integração social, associando a questão jurídica à questão das ações comunicativas e, mais precisamente, 
com uma ética do discurso, entendida enquanto um conjunto de regras inscritas no uso da linguagem 
orientado ao entendimento (e nas pressuposições idealizadas do discurso – a situação ideal de fala). Ao 
tentar construir uma teoria de fundamentação do direito, Habermas afasta a idéia de que o direito seria 
uma forma de agir puramente estratégica e salienta sua importância na tarefa de promoção da integração 
social. 
Apesar de indicar a proximidade entre a razão comunicativa e a interação humana, Habermas 
entende que ela não é uma fonte de normas do agir, como era a razão prática. Ou seja, a razão 
comunicativa (situada no âmbito de uma teoria reconstrutiva da sociedade) não funciona como 
orientação direta para uma teoria normativa do direito e da moral. Em outras palavras, não se retira dela 
uma norma material, um “ter que” prescritivo de uma regra de ação. Adotando uma estratégia diferente 
da de Kant na introdução da Metafísica dos Costumes, que parte do conceito fundamental da lei da 
liberdade moral e extrai dela as leis jurídicas (a moral fornece os conceitos superiores, a legislação 
moral reflete-se na jurídica, a moralidade na legalidade e os deveres éticos nos deveres jurídicos), 
Habermas acredita que a idéia de que existe uma hierarquia de normas (que nos leva a subordinar o 
 21 
direito à moral) faz parte do mundo pré-moderno do direito. Tanto o direito quanto a moral buscam 
solucionar conflitos de ação na base de regras e princípios normativos reconhecidos intersubjetivamente. 
Mas, apesar de se referirem ao mesmo problema, elas se valem de meios diferentes. Habermas 
(1992:141-142) sustenta que houve um processo de autonomização no decorrer da evolução social no 
qual as normas de ação se ramificaram em regras morais e jurídicas, de modo que as normas jurídicas 
não podem mais ser vistas como simples cópias das normas morais. 
Uma vez que direito e moral buscam coordenar legitimamente ações, elas se valem de um 
mesmo princípio comum, que está na origem do discurso (da prática de justificação). O princípio do 
discurso se caracteriza por ser uma fundamentação pós-convencional (no qual a eticidade substancial se 
dissolve) e que, apesar de ter conteúdo normativo (uma vez que explicita o sentido da imparcialidade de 
juízos práticos), ele está em um nível de abstração tão elevado que ainda é neutro em relação ao direito e 
à moral, dizendo respeito às normas de ação em geral. Ele é assim expresso por Habermas: “são válidas 
as normas de ação às quais todos os possíveis atingidos poderiam dar o seu assentimento, na qualidade 
de participantes de discursos racionais” 
No direito, esse princípio é especificado e assume a forma de um princípio da democracia, que 
garante o “direito à participação, em igualdade de chances, em processos de formação da opinião e da 
vontade através dos quais eles criam direito legítimo”. Para Habermas (1992:158), a idéia básica é a 
seguinte: o princípio da democracia resulta da interligação que existe entre o princípio do discurso e a 
forma jurídica. A forma jurídicatorna-se necessária a fim de compensar déficits que resultam da 
decomposição da eticidade tradicional (também a moral racional se desliga da prática tradicional 
enquanto ethos e se posiciona criticamente em relação a todas as orientações da ação, porém o faz não 
pela via da forma jurídica, mas pela luz da universalização). A aplicação do princípio do discurso ao 
médium do direito dá origem aos direitos fundamentais: 
a) direitos fundamentais que garantem a autonomia privada de sujeitos jurídicos no papel de 
destinatários de leis: 
a. direito à maior medida possível de iguais liberdades subjetivas de ação; 
b. status de membro numa associação voluntária de parceiros do direito; 
c. possibilidade de postulação judicial e de proteção jurídica individual; 
b) direitos fundamentais que garantem a autonomia política, de sujeitos jurídicos no papel de 
autores de sua ordem jurídica: 
a. direito à participação, em igualdade de chances, em processos de formação da opinião 
e da vontade através dos quais eles criam direito legítimo. 
 22 
c) esses direitos fundamentais implicam para o seu aproveitamento: 
a. direito a condições de vida garantidas social, técnica e ecologicamente. 
Em suma, o princípio da democracia destina-se a amarrar um procedimento de normatização 
legítima do direito, no qual somente podem pretender validade as normas jurídicas capazes de encontrar 
o assentimento de todos os parceiros do direito, num processo jurídico de normatização discursiva. O 
princípio da democracia explica o sentido performativo da prática de autodeterminação de membros do 
direito, não estando no mesmo nível que o princípio moral. O princípio da democracia refere-se ao nível 
da institucionalização externa e eficaz da participação simétrica numa formação discursiva da opinião e 
da vontade, a qual se realiza em formas de comunicação garantidas pelo direito (enquanto a moral opera 
no nível da constituição interna de um determinado jogo de argumentação). 
Além disso, no direito, as orientações axiológicas estão interligadas a um sistema de ação, 
possuindo eficácia. As normas jurídicas não necessitam de consenso, podendo ser fruto de um acordo 
negociado ou barganha, que são permitidas uma vez que bens coletivos entram em jogo (e não apenas a 
justiça e a moral). Assim, o direito tem relação de complementaridade tanto com a moral, quanto com a 
política, uma vez que busca se justificar normativamente, mas também visa realizar projetos plurais na 
sociedade (assumindo, assim, um aspecto instrumental típico da política). Mas o direito não se dissolve 
na política, pois mantém a pretensão de fundamentar a legitimidade do poder (a partir da teoria da ação 
comunicativa e, mais especificamente, da ética do discurso). O que torna o direito legítimo é o chamado 
poder comunicativo, entendido como a potencial vontade geral formada em uma comunicação sem 
coerção, que se realiza no direito através dos instrumentos da política, transformando-se em um poder 
administrativo legítimo (o que leva Habermas a pesquisar a política deliberativa, que leva a sério a 
opinião pública no exercício do poder). 
 
Considerações finais 
 
 A questão da linguagem perpassa todo o pensamento de Jürgen Habermas, com inúmeras e 
profundas repercussões filosóficas. Espero ter conseguido jogar alguma luz em determinadas questões 
que estão no fundo do pensamento habermasiano e que nos levam a intrincados problemas de filosofia 
da linguagem e a uma série de pensadores da tradição analítica. Espero ainda ter consiguido mostrar 
como a questão da linguagem conecta-se com questões sociológicas, na Teoria do Agir Comunicativo, e 
jurídicas, em Faticidade e Validez, além de serem associadas a questões políticas (sobretudo em A 
inclusão do outro, 1996) e morais (na ética do discurso desenvolvida, sobretudo, em Consciência moral 
 23 
e agir comunicativo, 1983), temas que não foram tratados nesse texto. Aliás, como tudo que fazemos e 
escrevemos, no fim sempre parece que muito ainda tem para ser feito, e o pouco que se fez, poderia ser 
melhor. 
 
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