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Documentos História Medieval

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Interpretação de Documentos Históricos
O INGRESSO NA ORDEM DA CAVALARIA
A cavalaria como uma ordem, conferindo dignidade e nobreza a quem nela ingressava, parece ter-se constituído a partir dos fins do século VIII, ou seja, no decorrer do reinado de Carlos Magno. Surgiu como consequência da formação de uma classe guerreira privilegiada e subsistiu enquanto essa classe manteve uma posição de chefia. O período áureo da cavalaria foi o dos séculos XI e XII durante o qual a Igreja lhe conferiu um caráter quase religioso, intervindo na cerimônia da entrega das armas e tentando sublimar os instintos bélicos do cavaleiro pelo estabelecimento de regras a cumprir e de ideais a atingir.
Raimundo Lúlio (1235-1315) no seu Livro sobre a Ordem da Cavalaria, sintetiza com muita clareza todo o cerimonial do armamento do cavaleiro. Transcrevemos aqui os momentos essenciais do ritual.
DO MODO COMO O ESCUDEIRO DEVE RECEBER A CAVALARIA
1 – Primeiramente o escudeiro, antes de entrar na Ordem da Cavalaria, deve confessar-se das faltas que cometeu contra Deus. [...]
2 – Para armar um cavaleiro convém destinar-se uma festa das que de preceito se celebram durante o ano. [...]
3 – Deve o escudeiro jejuar na vigília da festa. [...] E na noite antecedente ao dia em que há-de ser armado, deve ir à igreja velar, estar em oração e contemplação e ouvir palavras de Deus e da Ordem da Cavalaria. [...] 
4 – No dia da função convém que se cante missa solenemente. [...]
9 – Quando o sacerdote tenha feito o que toca ao seu ofício, convém então que o príncipe ou alto barão que quer fazer cavaleiro o escudeiro que pede cavalaria tenha em si mesmo a virtude e ordem da Cavalaria para com a graça de Deus poder dar a virtude e ordem da Cavalaria ao escudeiro que a quer receber. [...]
11 – Deve o escudeiro ajoelhar-se diante do altar e levantar a Deus os seus olhos corporais e espirituais e as suas mãos. E então o cavaleiro lhe cingirá a espada, no que se significa a castidade e a justiça. Deve dar-lhe um beijo em significação da caridade e dar-lhe uma bofetada para que se lembre do que promete, do grande cargo a que se obriga e da grande honra que recebe pela Ordem da Cavalaria.
12 – Depois que o cavaleiro espiritual e terrenal ter cumprido o seu ofício armando o novo cavaleiro, deve este montar a cavalo e manifestar-se assim à gente, para que todos saibam que é cavaleiro e obrigado a manter e defender a honra da Cavalaria. [...]
13 – Naquele dia se deve fazer grande festim, com convites, torneios e as demais coisas correspondentes à festa da Cavalaria. [...]
[Ramon Llull, Libro de la Orden de Caballería, parte IV, in Ramon Llull, Obras Literarias, ed. Miguel Batllori y Miguel Caldentey, Madrid, 1948, p. 126 a 128.]
Interpretação de Documentos Históricos
RENOVAÇÃO DE UM CONTRATO DE VASSALAGEM NO SÉC. XII (1127)
Neste documento, pelo qual alguns nobres flamengos prestaram vassalagem a um novo conde, Guilherme Clito, apresenta-se com muita clareza a sucessão das cerimônias da homenagem, juramento de fidelidade e investidura. A homenagem é aqui confirmada por um osculum, beijo, elemento não essencial mas frequente, sobretudo em terras francesas.
[...] Na sexta-feira [7 de abril] foram de novo prestadas homenagens ao conde, as quais eram feitas por esta ordem, em expressão de fidelidade e garantia. Primeiro prestaram homenagem desta maneira: o conde perguntou [ao vassalo] se ele desejava tornar-se o seu homem, sem reservas, e ele respondeu: “Quero.” Então, tendo junto as mãos, colocou-as entre as mãos do conde e aliaram-se por um beijo. Em segundo lugar, aquele que havia prestado homenagem jurou fidelidade ao porta-voz 1 do conde, com estas palavras: “Comprometo-me por minha fé a ser fiel daqui por diante ao conde Guilherme e a cumprir integralmente a minha homenagem, de boa fé e sem dolo, contra todos”; e em terceiro lugar jurou o mesmo sobre as relíquias dos santos. Finalmente, com uma varinha que segurava na mão, o conde deu a investidura a todos aqueles que por este fato tinham prestado lealdade, homenagem e juramento.
1 Prolocutor, em latim. Este porta-voz deveria servir de intérprete, por o conde não conhecer a língua flamenga.
[Galbertus Brugensis, Vita Karoli Comitis Flandriae, in Monumenta Germaniae Historica – Scriptores, t. XII, Hannover, 1856, p. 591.]
DEVERES DOS SENHORES E DOS VASSALOS NA INGLATERRA (SÉC. XI)
É permitido a qualquer, sem punição, auxiliar o seu senhor, se alguém o ataca, e obedecer-lhe em todos os casos legítimos, exceto no roubo, no assassinato e naquelas coisas que não são consentidas a ninguém, sendo reconhecidas como infames pelas leis.
	O senhor deve proceder da mesma maneira com o conselho e a ajuda; e deve ir em auxílio do seu homem em todas as vicissitudes, sem malícia.
	É permitido a todo o senhor convocar o seu homem que deve estar à sua direita no tribunal; e mesmo que [o vassalo] seja residente no mais distante casal 1 da honra 2 de quem o protege, deverá ir ao pleito se o seu senhor o convocar. Se o senhor possui diferentes feudos, o homem de uma honra não é obrigado por lei a ir a outro pleito, salvo se a causa pertencer àquele para o qual o senhor o convocar.
	Se um homem está ligado a vários senhores e honras, não obstante o muito que depende dos outros, deve mais e estará sujeito para a justiça àquele de quem é o homem lígio 3. [...]
1 Mansus em latim. 2 No século XI, a honra (honor) era um condado recebido como benefício. Em Inglaterra, no entanto, a honour era um conjunto de feudos possuído por um grande vassalo da coroa. Só estes detinham poderes jurisdicionais. 3 O sistema lígio nasceu possivelmente na Normandia no decorrer do século XI e pretendeu opor-se à desagregação consequente da vassalidade múltipla, definindo qual o senhor a quem era devida vassalidade “total”.
[Leges Henrici Prim, LXXXII, 3, 4, in Edward P. Cheyney. Readings in English History drawn from the original sources, Boston, 1922, p. 132.]
Interpretação de Documentos Históricos
NOÇÃO DE FIDELIDADE SEGUNDO UM ESCRITOR DO SÉCULO XI
Nesta carta enviada pelo bispo Fulbert de Chartres ao Duque da Aquitânia Guilherme V (1020), o autor analisa a noção de fidelidade vassálica focando dois aspectos: um negativo, possivelmente o mais importante, e outro positivo, que restringe à prestação de ajuda e conselho, o que sintomatiza o alto nível social dos contratantes.
	De Fulberto, Bispo, ao glorioso duque de Aquitânia, Guilherme.
	Convidado a escrever sobre a fórmula da fidelidade, anotei o que segue abreviadamente a partir dos livros autorizados.
	Aquele que jura fidelidade a seu senhor deve ter sempre em mente estes seis princípios: proteção, segurança, honra, interesse, liberdade, faculdade. Proteção, quer dizer que nada deve ser feito em prejuízo do senhor quanto ao seu corpo. Segurança, nada em prejuízo da residência onde ele habita ou de suas fortalezas nas quais ele possa se achar. Honra, quer dizer nada em detrimento de sua justiça ou do que possa sua honra depender. Interesse, quer dizer nada que possa prejudicar suas possessões. Liberdade e faculdade, quer dizer que o bem que o senhor possa fazer não lhe deva ser tornado difícil e o que ele esteja fazendo tornado impossível. É justo que o [vassalo] fiel mantenha vigilância sobre estes danos, mas isto não é suficiente para justificar a enfeudação,1 pois não basta ater-se às negativas, é preciso que ele cumpra suas obrigações quanto ao positivo.
	Resta então que nestas seis ordens de deveres, o vassalo preste conselho e ajuda2 fielmente a seu suserano, se ele quiser ser digno do feudo e em regra com a fé que ele jurou. O suserano deve também ao vassalo a contrapartida em todas as coisas.3 Se este não o faz, será a justo título incriminado de má fé, do mesmo modo que o vassalo, se é reconhecido a esse respeito seja de fato, seja de consentimento, culpado de fraqueza, de perfídia e de perjúrio. Eu vos escreveria mais extensamente, se não estivesse ocupado com outros afazeres múltiplos, notadamente com a restauração de nossa cidade e de nossa igreja, que foramvítimas recentemente de um horrível incêndio.
1 Mansus em latim, neste caso sinônimo de benefício ou feudo.
2 “Conselho e ajuda” – “consilium et auxilium” – O consilium era o dever de conselho e assistência na corte (curtis ou curia) do senhor. O auxilium tanto podia dizer respeito a obrigações militares como a uma ajuda pecuniária ou até a serviços puramente domésticos.
3 O senhor devia igualmente ao vassalo consilium (prestação de boa justiça e conselhos) e auxilium (defesa do vassalo e do seu feudo contra eventuais inimigos).
[Fulbert de Chartres, Epistoloe, LVIII, ann. 1020; H. F., X, p. 463, apud J. Calmette, Textes et documents d’Histoire II – Moyen Âge. Nouvelle édition refondue et augmenteé avec le concours de Charles Higounet, Paris, Presses Universitaires de France, 1953, p. 70-71.]
Interpretação de Documentos Históricos
O PROBLEMA DAS HOMENAGENS MÚLTIPLAS (SÉCULO XIII)
O sistema lígio surgiu em França no século XI e na centúria seguinte já se tornara habitual um mesmo indivíduo ser o “homem lígio” de vários senhores. Por esta razão, quando um vassalo fazia uma nova homenagem, indicava, por ordem de preferência, as “homenagens lígias” a que já estava ligado.
	Eu João de Toul faço saber que sou o homem lígio de Dona Beatriz, condessa de Troyes, e do seu filho o meu muito amado senhor, o conde Thibaud de Champagne, contra todas as pessoas, vivas ou mortas, exceto no que respeita a homenagem lígia que fiz ao senhor Enguerran de Coucy, ao senhor João de Arcis e ao conde de Grandpré. Se acontecer que o conde de Grandpré entre em guerra com a condessa e o conde de Champagne por agravos pessoais, irei pessoalmente prestar assistência ao conde de Grandpré e enviarei à condessa e ao conde de Champagne, se me intimarem a isso, os cavaleiros que devo pelo feudo que deles detenho. Mas se o conde de Grandpré fizer guerra à condessa e ao conde de Champagne a favor dos seus amigos e não por agravos pessoais, servirei em pessoa a condessa e o conde de Champagne e enviarei um cavaleiro ao conde de Grandpré para lhe prestar os serviços devidos pelo feudo que detenho dele. Mas não invadirei eu próprio o território do conde de Grandpré. [...]
[Du Cange, Glossarium Mediae at Infimae Latinitatis, ed. 1733, vol. IV, p. 203 (vocábulo ligius).]
ENCOMENDAÇÃO COM PERDA DA LIBERDADE (SÉCULO X)
A servidão é a forma estabilizada de uma posição intermediária entre a escravidão e a liberdade. O ritual de servidão, utilizado em certas regiões e durante o qual o servo traz uma corda no pescoço, parece indicar um cativeiro de que se é imperfeitamente resgatado pelo pagamento de uma obrigação.
	Eu, Bertério, coloquei a corda no pescoço e me entreguei sob o poder de Alariado e de sua esposa Ermengarda para que desde este dia façais de mim e de minha descendência o que quiserdes, os vossos herdeiros o mesmo que vós, podendo guardar-me, vender-me, dar-me a outros ou manumitir-me, e se eu quiser subtrair-me a vosso serviço podeis deter-me vós mesmo ou vossos enviados, do mesmo modo como o faríeis com vossos restantes escravos originais.
[Recueil des Chartes de l’abbaye de Cluny. Bernard, A., Bruel, A. (Ed.). Paris, 1876. t. I, p. 887.]
Interpretação de Documentos Históricos
SOBRE A CONDIÇÃO SOCIAL DOS SERVOS
O cronista Eginhardo (c. 770-840) construiu uma basílica junto da casa que mandou fazer na floresta que se estendia entre os rios Neckar e Main (em Odenwald). Para aí foram trasladadas em 827 as relíquias de S. Pedro e S. Marcelino, sob cuja invocação foi a basílica consagrada. Uma seleção de alguns casos referentes a servos que nesta igreja procuraram o perdão para as suas faltas elucida-nos acerca das obrigações que pesavam sobre essa classe.
I	Ao magnífico, honrado e ilustre homem, o gracioso Conde Poppon, Eginhardo saúda-o no Senhor.
	Dois pobres homens refugiaram-se na igreja dos bem-aventurados Marcelino e Pedro, mártires de Cristo, confessando que eram culpados e que tinham sido convictos de roubo em vossa presença, como tendo furtado caça grossa numa floresta senhorial.1
	Já pagaram uma parte da composição e deveriam pagar o resto, mas declaram que não têm com que o fazer, por causa da sua pobreza. Venho pois implorar a vossa benevolência, na esperança de que [...] vos digneis tratá-los com toda a indulgência possível. [...]
II	Ao nosso querido amigo, o glorioso vicedominus 2 Marchard, Eginhardo, saudação eterna no Senhor.
	Dois servos de S. Martinho, do domínio de Hedabach, de nome Williran e Otbert, refugiaram-se na igreja dos bem-aventurados mártires de Cristo, Marcelino e Pedro, por causa do assassinato cometido pelo seu irmão num companheiro.3 Pedem que lhes seja permitido pagar a composição pelo irmão, a fim de que lhes façam graça dos seus membros. Dirijo-me pois à vossa amizade, para que vos digneis, se isso for possível, poupar estes desgraçados pelo amor de Deus e dos santos Mártires junto dos quais vieram procurar um refúgio. Desejo que tenhais sempre boa saúde, com a graça do Senhor.
III	Ao nosso muito querido amigo, o glorioso Conde Hatton, Eginhardo, saudação eterna no Senhor.
	Um de vossos servos, de nome Huno, veio à igreja dos santos mártires Marcelino e Pedro pedir mercê pela falta que cometeu contraindo casamento, sem o vosso consentimento, com uma mulher da sua condição que é também vossa escrava.4 Vimos pois solicitar a vossa bondade para que em nosso favor useis de indulgência em relação a este homem, se julgais que a sua falta pode ser perdoada. Desejo-vos boa saúde com a graça do Senhor.
1 Este delito estava previsto na primeira capitular do ano 802.
2 O vicedominus ou vindame era um magistrado que administrava as propriedades eclesiásticas dotadas de imunidade.
3 A Lei Sálica responsabilizava toda a família pelo crime cometido por um dos seus membros, obrigando-a ao pagamento da composição. No século IX este princípio já tinha desaparecido das leis, mas continuava a ser posto em prática.
4 O servo deveria não só ter pedido o consentimento do senhor, como pago um imposto especial, o maritagium.
[A. Teulet, Œuvre Completes d’Eginhard, Société de l’Histoire de France, Paris, 1843, t. II, p. 13, 27 e 29.]

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