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FUNDAMENTOS E CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Carlos Odilon da Costa CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Copyright © UNIASSELVI 2011 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Reitor: Prof. Dr. Malcon Tafner Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Profa. Hiandra B. Götzinger Montibeller Profa. Izilene Conceição Amaro Ewald Profa. Jociane Stolf Revisão de Conteúdo: Profa. Iara de Oliveira Revisão Gramatical: Prof. Gilberto Poncio Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI 374 C837f Costa, Carlos Odilon da Fundamentos e currículo de educação de jovens e adultos. Carlos Odilon da Costa. Indaial : Uniasselvi, 2011. 88 p. : il. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7830-476-8 1. Educação – Jovens e Adultos. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. Carlos Odilon da Costa Mestre em Educação. Especialista em Ciências da Religião, Geografia e História. Graduado em Ciências da Religião e Geografia. Tem experiência em Educação de Jovens Adultos e Educação Escolar Indígena. Foi coordenador do projeto Adolescentes, de 2003 até 2004, na rede municipal de ensino de Blumenau. Atualmente, é professor da rede municipal de ensino de Blumenau nas disciplinas de Ensino Religioso e Geografia. Além disso, atua como professor na Especialização Educação e Interculturalidade e Bem Viver- FURB, na formação de professores indígenas. Participa do grupo de pesquisa Grupo Educogitans, PPGE Mestrado em Educação da FURB, linha Filosofia e Educação, nos projetos de Educação Escolar Indígenas: Revitalização da Cultura e Língua Laklânô/Xokleng CAPES/INEP/FURB e Tendências Filosóficas e Epistemológicas da América Latina. Sumário APRESENTAÇÃO ......................................................................7 CAPÍTULO 1 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil .................................................................9 CAPÍTULO 2 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos ...................................................................33 CAPÍTULO 3 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos ...............57 CAPÍTULO 4 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios Para o Século XXI .........................................73 APRESENTAÇÃO Caro(a) pós-graduando(a): Queremos apresentar-nos como interlocutores diante da nova disciplina que você passa a estudar a partir deste momento e desejar-lhe uma boa compreensão e interação no seu decorrer. Estudar os Fundamentos e Currículo na Educação de Jovens e Adultos (EJA) significa conhecer e desvendar a gênese, organização e desenvolvimento das bases constitutivas da Educação de uma maneira geral. Neste caderno de estudos pretendemos refletir sobre a educação de Jovens e Adultos, bem como discutir as temáticas que serão levantadas ao longo deste material, no sentido de apontar caminhos, soluções e subsídios para projetos e planejamentos pedagógicos voltados para a compreensão da realidade educacional da EJA por meio da contextualização histórica, social, cultural e pedagógica. No primeiro capítulo da disciplina, abordaremos uma breve história da EJA no país, com os seus principais períodos, fases e autores. Em seguida, refletiremos e analisaremos as principais concepções das teorias do conhecimento e aprendizagem. No terceiro capítulo, as Teorias Curriculares se farão presentes na discussão apresentada no caderno de estudos e, por último, veremos a EJA em um mundo multicultural e tendo como desafio viver e conhecer um contexto repleto de problemas, em particular, o ambiental. Desejamos a todos possibilidades de reflexões e análises dos assuntos destinados à disciplina que hoje iniciamos. Um abraço e bons estudos! Carlos Odilon da Costa CAPÍTULO 1 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer o contexto histórico de origem e desenvolvimento da Educação de Jovens e Adultos no Brasil. 3 Identificar e relacionar os fatores externos que influencia na constituição histó- rica e atual da EJA no Brasil, bem como dos sujeitos inseridos na modalidade. 10 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos 11 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 Contextualização Prezado pós-graduando, neste capítulo abordaremos a gênese e o desenvolvimento da Educação de Jovens a Adultos (EJA) no Brasil. Destacamos que a história da EJA não é o objetivo principal a ser demonstrado na disciplina, mas ela oferece certa visão do fenômeno estudado nesta apostila, que é a compreensão da construção dos fundamentos e currículos que permearam a EJA em nosso país. Para que isto ocorra, é necessário, em primeiro lugar, tentar conceituar Educação. Se você parar e refletir acerca desta palavra, começará a perceber que existem inúmeros, diversos conceitos referente a ela. Por isso, poderemos começar nossa conversa a respeito da EJA perguntando: Qual o significado de Educação que você carrega em sua vida? Dito de outra forma, o que você entende por Educação? Percebe como este exercício de tentar compreender Educação a partir de nós mesmos é importante para se compreender a realidade educacional que nos cerca, ou seja, entender os fundamentos do que se estuda e faz? Você entende que não é tão fácil assim de conceituar Educação. Educação: um Conceito a ser Explorado Antes de conversarmos sobre a EJA, é preciso ter uma clara compreensão sobre a Educação, pois ela não é algo natural, é um processo dinâmico, cultural. Nas palavras de Brandão (1992, p.10), Existe a educação de cada categoria de sujeitos de um povo; ela existe em cada povo, em pequenas sociedades tribais de povos caçadores, agricultores ou pastores nômades; em sociedades camponesas, em pa íses desenvolvidos e industrializados. Ela existe em cada povo ou entre povos que se encontram. Da família a comunidade, a educação existe difusa em todos os mundos sociais, entre as incontáveis práticas dos mistérios de aprender; primeiro sem classes de alunos, sem livros e sem professores especialistas. Existe a educação de cada categoria de sujeitos de um povo; ela existe em cada povo, em pequenas socie- dades tribais de povos caçadores, agricultores ou pastores nôma- des; em socieda- des camponesas, em países desenvolvidos e industrializados. 12 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos A Educação é, portanto, um processo cultural, importantíssimo para a formação humana, pois basicamente a cultura fundamenta o modo de ser e existir e, também, porque ela vive se transformando, é dinâmica e, por último ela, é ela que dá sentido a vida das pessoas. Assim, cada povo ou comunidade tem sua cultura própria, por sua vez, cada povo ou comunidade poderá ter sua Educação própria, que respeite sua identidade, que seja compatível com seu modo de vida. Isto implica conhecer seu ritmo, seu tempo, sua temporalidade. Existem modelos de Educação a Distância, que são diferentes do Modelo presencial. Igualmente, há uma educação voltada para a infância,que não é a mesma da de adultos. Assim sendo, vamos refletir a partir daquilo que não é um modelo de EJA. Se você respondeu que não vê nenhuma diferença entre a Educação dita regular e a EJA, demonstra uma mentalidade ou um conceito que perpassou por muitos anos, em diversos Sistemas de Ensino no país. Em muitas secretarias de municípios e estados brasileiros, a EJA não era pensada a partir dos alunos que, por diversos motivos, abandonaram o ensino regular presencial. A professora Moura (2008, p.17), ao tratar do currículo na EJA, afirma que, Alguns dos problemas enfrentados nas escolas e classes decorrem exatamente dessa organização curricular que separa a pessoa que vive e aprende no mundo daquela que deve aprender e apreender os conteúdos escolares. No caso da EJA outro agravante se interpõe e se relaciona com o fato de que a idade e vivências social e cultural dos educandos são ignoradas, mantendo-se nestas propostas a lógica infantil dos currículos destinados às crianças que frequentam a escola regular. Talvez seja este um dos principais problemas, não o único, que encontramos na EJA, ou seja, o da infantilização da proposta desta educação. Querer trabalhar a partir de uma ótica da infância com os trabalhadores, homens e mulheres adultos e, também, os jovens que merecem maior atenção do poder público e da própria escola, quase sempre demonstrou, no contexto histórico da EJA, o descaso por essas temporalidades. Olhares sobre a História Da EJA Ao final dos anos 40 do século passado foram implementadas as primeiras políticas públicas nacionais de educação escolar para adultos, que disseminaram pelo território brasileiro campanhas de alfabetização. A menção à necessidade de oferecer educação aos adultos já aparecia em textos normativos anteriores, como na pouco duradoura Constituição de 1934, mas foi na década seguinte que No caso da EJA outro agravante se interpõe e se relaciona com o fato de que a idade e vivências social e cultural dos educandos são ignoradas, mantendo-se nes- tas propostas a lógica infantil dos currículos desti- nados às crianças que frequentam a escola regular. 13 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 começou a tomar corpo em iniciativas concretas. Segundo Beisiegel (1974), a partir de 1946-1947 foi promovida a 1ª Campanha Nacional de Alfabetização de Adultos pelo Ministério da Educação. Esse é um momento de pós-guerra, de redemocratização do país depois da queda do Getúlio, da criação da UNESCO, órgão influenciador na criação desses movimentos no mundo inteiro. A primeira campanha oficial chamou-se Campanha Nacional de Alfabetização de Adolescentes e Adultos. (Não se usava a terminologia jovem, que é muito recente, em geral, se falava de adolescentes e adultos). Essa foi uma grande campanha organizada. Coordenada pelo Lourenço Filho, ela foi de 1947 até meados dos anos 50. Nasceu primeiro porque o Governo Federal arrecadou verba no fundo do ensino primário e, segundo, porque passou a encarar a alfabetização de adolescentes e adultos não atendidos na idade normal da escolarização, de 7 a 10 anos, como público que precisava de uma ação educativa. Não se propôs só uma restrição de alfabetização, o mote é a chamada educação de base. A educação de base, como é definida pela UNESCO, é uma reposição de todo o conteúdo da escola primária, até mais sofisticada que a atual escola primária ou ensino das séries iniciais porque é integralizada e pautada pela experiência dos países ricos desenvolvidos. Ela é proposta para adolescentes e para crianças que não foram escolarizados em idade normal, considerada normal, de 7 a 10 anos. A proposta apresentava alfabetização com leitura, com escrita, iniciação ao cálculo. Também havia aulas de higiene, moral e civismo, um pouco de extensão agrícola. A grande crítica que se faz é que ela se restringia à alfabetização. Ela até era acusada como fábrica de leitores, por conta de, no período de democratização, estar refazendo a base eleitoral. Essa crítica é um pouco injusta, pelo segundo motivo, ela estende a escolarização para além das grandes cidades, ela tem uma característica de uma penetração grande, não só no meio rural. Na verdade, é um esforço muito grande de expansão de educação para aqueles que não tiveram a escolarização. Claro que muitas crianças de menos de 10 anos aparecem nessas classes. Tem esse lado, chamado de ruralização. É muito mais um movimento de a escola chegar até os municípios, o que é importante em 1945, o índice de analfabetismo desse período era mais de 50%, na ordem de 60%. As grandes lições dessa campanha foram: primeiro, que ela é uma forma de se entender a escolaridade obrigatória como ensino supletivo. A educação de base, é uma reposição de todo o conteúdo da es- cola primária, até mais sofisticada que a atual escola primária ou ensino das séries iniciais porque é integra- lizada e pautada pela experiência dos países ricos desenvolvidos. 14 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Foi nesse momento que o Estado se antecipou à demanda da população. A outra lição dessa campanha, embora se critique que ela tenha restringido esse grande elenco de conteúdo educativo para alfabetização, demonstrada no final dos anos 50, é que só ação de alfabetização não resolve, tem que ter uma ação mais ampla junto às comunidades. Dentro dela vai gerar-se uma segunda campanha (Campanha de Educação Rural, iniciada em 1952). Tal campanha é curiosa, pouco estudada, ela também está no Ministério de Saúde, no Ministério da Agricultura. Trabalhará diretamente a partir de saúde, a partir de higiene com as populações. Conseguirá formar quadros médios, técnicos. Chamava-se, na época, Departamento Nacional das Crianças. Todo esse grupo que trabalhou com a extinção da malária, controle de endemias rurais, foi formado por esta perspectiva. Essa campanha ficou com Artur Rios e tinha um cunho mais sociológico; o forte estava no grupo de sanitaristas, grupo médico e um pouco com a introdução de algumas técnicas rurais, falando em cooperativismo. De acordo com a professora Souza (2007) a concepção de oferecer uma educação nesta modalidade tinha, sobretudo, o objetivo de possibilitar que o excluído do sistema oficial, “recebesse” do Estado a proteção e garantia de continuar seus estudos, não como direito, mas em uma mão de obra mais qualificada para o mundo do trabalho que exigia operários com um entendimento básico do que se estava fazendo (iniciava neste período o Brasil o processo de desenvolvimento industrial), ou seja, a partir da dimensão econômica era urgente que se erradicasse ou diminui-se o analfabetismo no país. Essa tendência se expressou em várias ações e programas governamentais, nos anos 40 e 50. Gadotti (2007, p.38) nos auxilia na compreensão da EJA neste período, Até os anos de 40 a educação de adultos era concebida como uma extensão da escola formal, na década de 50 duas tendências são as mais significativas a educação de adultos entendida como libertadora, como conscientização “Paulo Freire” e a educação funcional (profissional). Ainda de acordo com a professora Souza (2007), além de iniciativas nos níveis estadual e local, merecem ser citadas, em razão de sua amplitude nacional, a criação do Fundo Nacional de Ensino Primário em 1942; do Serviço de Educação de Adultos e da Campanha de Educação de Adultos, ambos em 1947; da Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo, em 1958. Até os anos de 40 a educação de adultos era concebida como uma extensão da escola formal, na década de 50 duas tendências são as mais sig- nificativas a edu- cação de adultos entendida como libertadora,como conscientização “Paulo Freire” e a educação funcio- nal (profissional). 15 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 MOURA, Tânia Maria de Melo. Educação de Jovens e Adultos: currículo, trabalho docente, práticas de alfabetização e letramento. Maceió: UFAL, 2008. SCOUGLIA, Afonso Celso. A Educação de Jovens e Adultos: histórias e memórias da década de 60. Brasília: Plano Editora, 2003. Beisiegel (1974) cita que a primeira Lei de Diretrizes e Bases foi de 1961. O Plano Nacional de Educação vem em seguida, na época em que Darcy Ribeiro estava na Chefia da Casa Civil e, depois, no Ministério da Educação. Começou- se a transferir para os estados e para os municípios algumas responsabilidades de educação, basicamente da educação fundamental, do ensino fundamental. Começam algumas experiências dentro de prefeituras, particularmente da Prefeitura de Recife, com Miguel Arraes, depois a Prefeitura de Natal, com Djalma Maranhão. A União Nacional dos Estudantes — UNE, que era muito forte naquele momento, e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil também participaram com propostas novas de alfabetização. Esse foi um período absolutamente diferente em termos de experiência, em termos de produção, em termos de perspectiva. Neste período surgiu Paulo Freire, com o Sistema de Alfabetização de Adultos. No início da década de 1960, movimentos de educação e cultura popular ligados a organizações sociais, à Igreja Católica e a governos desenvolveram experiências de alfabetização de adultos. Figura 1: Paulo Freire Fonte: Disponível em: <http://professorasoyanevargas.blogspot.com/2011/09/ sabio-paulo-freire-wise-paulo-freire.html>. Acesso em: 01jun.2011. 16 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Estas campanhas eram orientadas a conscientizar os participantes de seus direitos, analisar criticamente a realidade e nela intervir para transformar as estruturas sociais injustas. Diretriz totalmente contrária teve o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL). Ele tinha independência institucional e financeira face aos sistemas regulares de ensino e aos demais programas de educação de adultos; articulação de uma organização operacional descentralizada e havia a gerencia pedagógica central, que promovia e apoiava, cuidava da organização e efetivação dos trabalhos. A professora Di Rocco (1979) escreve que o MOBRAL surgiu como um prosseguimento das campanhas de alfabetização de adultos, iniciadas com Lourenço Filho, só que com um cunho ideológico totalmente diferenciado do que vinha sendo feito até então. A primordial preocupação do MOBRAL era tão somente fazer com que os seus alunos aprendessem a ler e a escrever, sem uma preocupação maior com a formação do homem. Foi criado pela Lei no 5.379, de 15 de dezembro de 1967, propondo a alfabetização funcional de jovens e adultos, visando a “conduzir a pessoa humana (sic) a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a sua comunidade, permitindo melhores condições de vida”. O objetivo do MOBRAL relaciona a ascensão escolar a uma condição melhor de vida, deixando à margem a análise das contradições sociais inerentes ao sistema capitalista. Nas palavras de Corrêa (1979, p.52), o programa era assim estruturado, 1. desenvolver nos alunos as habilidades de leitura, escrita e contagem; 2. desenvolver um vocabulário que permita o enriquecimento de seus alunos; 3. desenvolver o raciocínio, visando facilitar a resolução de seus problemas e os de sua comunidade; 4. formar hábitos e atitudes positivas, em relação ao trabalho; 5. desenvolver a criatividade, a fim de melhorar as condições de vida, aproveitando os recursos disponível; 6. levar os alunos: - a conhecerem seus direitos e deveres e as melhores formas de participação comunitária; - a se empenharem na conservação da saúde e melhoria das condições de higiene pessoal, familiar e da comunidade; - a se certificarem da responsabilidade de cada um, na manutenção e melhoria dos serviços públicos de sua comunidade e na conservação dos bens e instituições; - a participarem do desenvolvimento da comunidade, tendo em vista o bem-estar das pessoas. Como é possível notar, a preocupação nos objetivos específicos é a de fazer constante relação do indivíduo com o seu meio próximo, numa tentativa de repasse de responsabilidades e enquadramento O MOBRAL surgiu como um pros- seguimento das campanhas de alfabetização de adultos, iniciadas com Lourenço Filho, só que com um cunho ideo- lógico totalmente diferenciado do que vinha sendo feito até então. O MOBRAL teve seu fim em 1985, no Governo José Sarney. Uma das principais causas foi que o Estado estava com uma grande dívida pública e todos os programas, proje- tos voltados para a questão social foram cancelados. 17 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 do indivíduo numa verdade que não faz parte de seus interesses imediatos. O MOBRAL teve seu fim em 1985, no Governo José Sarney. Uma das principais causas foi que o Estado estava com uma grande dívida pública e todos os programas, projetos voltados para a questão social foram cancelados. Na década de 1970, houve uma inserção do ensino supletivo no sistema regular de ensino. Os Centros de Estudo Supletivos completavam a atuação do MOBRAL. Em 1985, a Fundação Educar foi criada no lugar do MOBRAL. Esta fundação era vinculada ao MEC e mantida pelas prefeituras ou sociedade civil organizada. Em 1990, no governo Collor, foi criado o Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), oriundo das discussões ocorridas na Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada na Tailândia. Em 1996 é aprovada a Lei no 9.394/96, na qual existem dois artigos tratando da EJA e, em 2000, foram aprovadas as Diretrizes Nacionais para Educação de Jovens e Adultos. A partir de 1999 até hoje são realizados encontros da EJA em todo o país, demonstrando a organização da sociedade civil no debate em torno da educação (SCOUGLIA, 2003). Após esta breve introdução, centralizaremos nossos estudos referentes à história da Educação de Jovens e Adultos no Brasil em alguns temas e autores, considerados de grande importância para se entender a configuração da fundamentação e do currículo da EJA no país. Os assuntos serão: SIREPA (Sistema Rádio Educativo da Paraíba), Cruzada ABC(Ação Básica Cristã), Sistema Paulo Freire e o próprio Paulo Freire, Mova (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos), Alfabetização Solidária (SCOUGLIA, 2003). a) O SIREPA (Sistema Rádio Educativo da Paraíba) Segundo o professor Scouglia (2003), na Paraíba ocorreram três importantes movimentos de alfabetização popular, cada um pioneiro ao seu modo: alfabetização-educação de adultos pelo rádio (SIREPA - Sistema Rádio Educativo da Paraíba - 1959/69); aplicação em larga escala do Método Paulo Freire e do movimento de cultura popular adjacente (CEPLAR - Campanha de Educação Popular - 1961/64) e aplicação do maior programa de reação (pós-abril de 1964), liderado por missionários protestantes e técnicos norte-americanos (Cruzada ABC - Cruzada de Ação Básica Cristã - 1964-1966/70). No início de 1964, no auge dos conflitos sociais, atuavam simultaneamente: o SIREPA, com centenas de escolas radiofônicas; a CEPLAR, com cento e trinta A Fundação Edu- car era vinculada ao MEC e mantida pelas prefeituras ou sociedade civil organizada. Na Paraíba ocor- reram três impor- tantes movimentos de alfabetização popular, cada um pioneiro ao seu modo. 18 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos e cinco“círculos de cultura”, e o que seria o embrião da Cruzada ABC preparava setecentos monitores para combater a CEPLAR e seu método político-pedagógico. O SIREPA é resultado do Sistema Rádio-Educativo Nacional (SIRENA), criado em 1958, como reforço à Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos, por sua vez, criada em 1947. A tecnologia principal do SIRENA era a Rádio Nacional, no Rio de Janeiro, que se encarregava de radiofonizar e transmitir os programas educativos produzidos por uma equipe pedagógica do Serviço de Educação de Adultos do Ministério da Educação e Cultural MEC. (SCOUGLIA, 2003). Os programas eram gravados em LP de 12 polegadas, para serem reproduzidos pelas emissoras conveniadas. Além desses discos, o único material didático editado pelo SIRENA é a Radiocartilha para alfabetização. São poucas as referências sobre os sistemas radioeducativos, embora seja registrada a existência de dezenas deles, implantados do final dos anos 50 até meados dos anos 60, em convênios com o SIRENA. Muitos funcionaram em dioceses católicas, que dispunham de emissoras. Os situados nas Regiões Norte e Nordeste, assim como nos estados de Minas e Mato Grosso, foram absorvidos pelo Movimento de Educação de Base (MEB), criado em 1961 pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, com o apoio da Presidência da República. O SIREPA, em seu itinerário, é paralelo ao dos sistemas do MEB e sua experiência revela traços comuns a eles: montagem efetiva da recepção organizada, com supervisão regular, abandono dos programas educativos produzidos e gravados no Rio de Janeiro e elaboração de programas e material didático próprios. O SIREPA encerrou suas atividades em 1969, sendo, nos últimos anos, progressivamente substituído pela Cruzada ABC. A causa do desaparecimento do SIREPA foi o fato de ser um organismo estatal, estando, assim, sujeito às oscilações de natureza política. SOUZA, Maria Antônia de. Educação de Jovens e Adultos. Curitiba: IBPEX, 2007. A tecnologia princi- pal do SIRENA era a Rádio Nacional, que se encarrega- va de radiofonizar e transmitir os pro- gramas educativos produzidos por uma equipe peda- gógica do Serviço de Educação de Adultos do Minis- tério da Educação e Cultural MEC. O SIREPA encer- rou suas ativi- dades em 1969, sendo, nos últimos anos, progressi- vamente substitu- ído pela Cruzada ABC. A causa do desaparecimento do SIREPA foi o fato de ser um organismo estatal, estando, assim, sujeito às oscila- ções de natureza política. 19 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 Atividade de Estudos: 1) Descreva pelo menos duas vantagens e desvantagens do SIREPA para a Educação de Jovens e Adultos, lembrando que é necessário se reportar à década de 60. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ b) A Cruzada ABC Quanto à Cruzada ABC (Ação Básica Cristã), Scouglia (2003) descreve que as missões protestantes se estabeleceram, no Brasil, principalmente após a II Guerra Mundial, destacando-se, entre outras, a Metodista Episcopal, a Batista, as Presbiterianas (do Norte e do Sul), as Congregacionais, todas com sede nos Estados Unidos. Em 1965, como parte do trabalho dos protestantes, oficializou-se a Cruzada de Ação Básica Cristã como um movimento de educação de jovens e adultos, sustentada por um acordo entre a USAID (United States Agency for Devellopment), o Colégio Agnes Erskine (Recife) e a SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste). A capital pernambucana era o centro das ações que se irradiavam para o Nordeste. Esse trabalho foi apoiado pela Diretoria das Missões para o Mundo, através do Subcomitê para a América Latina. No entanto, o trabalho na área de alfabetização de adultos havia começado três anos antes da sua oficialização, com a distribuição das cartilhas “LER”, “SABER” e da “Cartilha ABC”. Elas foram confeccionadas a pedido do governo federal, durante o Plano de Emergência, por uma equipe da “Promoção Agnes”, em convênio com o governo Cid Sampaio (1959/63), de Pernambuco (SCOUGLIA, 2003). A “Promoção Agnes”, embrião da ABC, foi um programa de educação primária, liderado pelo Departamento de Extensão Cultural do Colégio No entanto, o trabalho na área de alfabetização de adultos havia começado três anos antes da sua oficialização, com a distribuição das cartilhas “LER”, “SABER” e da “Cartilha ABC”. 20 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Evangélico Agnes Erskine. O programa experimental durou cinco meses. A alfabetização estava associada ao projeto político de vigilância e de combate aos grupos “de esquerda” que atuavam antes de abril de 1964. O conteúdo da ação seria o mesmo, mas em direção oposta: formar cidadãos eleitores integrados à sociedade e à nova ordem e com outra consciência da “realidade nacional”. Apesar de, em diversos documentos, a ABC referir-se à democracia, sua proximidade com os governos militares era notória e aberta. De acordo com Beisiegel (1974), através dos instrumentos de cooperação internacional e com base nas intenções (alfabetizar para integrar os adultos na sociedade do pós-golpe), a Cruzada pretendia atingir um milhão de analfabetos (numa primeira fase) e escolarizar pelo menos 25% num curso básico/primário. Empalmando a bandeira da USAID de “cooperação para o desenvolvimento econômico” – inatingível sem um mínimo de instrução e profissionalização, ou seja, sem um mínimo de educação sistemática – a Cruzada ABC encaixou- se nos propósitos do Estado militar para a educação brasileira. Estes foram embasados nos doze acordos entre o MEC e a USAID, alicerçados em princípios econômicos que determinavam o investimento educacional, conforme o retorno prático/pragmático desse investimento. Mas a Cruzada ia além: queria formar uma consciência “democrática e cristã”, que combatesse a “exploração política dos grupos extremistas” e colaborasse para concretizar os objetivos da “Revolução de 1964”. Entre estes destacava-se a eliminação dos grupos “de esquerda” que atuavam no campo educacional e a ocupação dos seus espaços de atuação. No caso específico da Paraíba, a convite do próprio Secretário de Educação e Cultura do Estado, a ABC preocupou- se em combater o “Sistema Paulo Freire”, utilizado pela CEPLAR, e substituir o projeto político-pedagógico até então desenvolvido. c) Sistema Paulo Freire e o Mova De acordo Di Rocco (1979), para alguns o “Método Paulo Freire” foi um instrumento político dos progressistas (“de esquerda”). A CEPLAR (Campanha de Educação Popular da Paraíba) foi uma das pioneiras na aplicação em larga escala do “Método Paulo Freire” em nível de Brasil. Dirigentes da Campanha colaboraram efetivamente na consolidação e na discussão do “Método”, enquanto as salas de aulas da CEPLAR serviam de campo experimental. Nesse trabalho, foi fundamental a constatação de que as “40 horas” (Paulo Freire sistematizou a alfabetização de adultos no Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife e, em 1963, realizou a experiência de Angicos, no Rio Grande do Norte. A Cruzada queria formar uma cons- ciência “demo- crática e cristã”, que combatesse a “exploração política dos grupos extremistas” e colaborasse para concretizar os objetivos da “Re- volução de 1964”. 21 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultosno Brasil Capítulo 1 O sucesso dessa experiência, alfabetizando 300 pessoas em 40 horas, e a vitalidade dos movimentos sociais no período, especialmente estudantil, provocou a escalada do sistema em todo o país. Em fins de 1963, foi elaborado o Plano Nacional de Alfabetização, visando a alfabetizar cinco milhões de jovens e adultos em dois anos. O PNA teve início no Estado do Rio de Janeiro, mas foi interrompido logo após o golpe militar de 1964), só poderiam cumprir uma parte da proposta alfabetizadora e de que a pós-alfabetização era condição básica para a não regressão aos estágios do pré- letramento. A tentativa de solução desse problema crucial do “Método” fez da CEPLAR contribuinte do próprio desenvolvimento do “Sistema Paulo Freire”, que incorporou a ideia de sequência necessária na alfabetização (das “40 horas”) através do que foi chamado “educação primária rápida” (dois anos). As contribuições da CEPLAR foram destacadas pelo próprio Freire e por membros da equipe do Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife (SEC-UR). Entretanto, a utilização do “Método Paulo Freire” mostrou sua precariedade. Enquanto experimento, devem ser registradas as dificuldades de sua aplicação, muitas vezes, o insucesso das (velozes) “40 horas” para alunos cansados que estudavam à noite. Ademais, o crescimento da politização em detrimento de um processo alfabetizador mais consistente, mais demorado e mais qualificado, era uma das questões centrais a serem resolvidas. Embora inseparáveis, a politização foi muito mais produtiva do que a alfabetização no uso do “Método Paulo Freire” pela CEPLAR. Após o golpe, sobreviveram alguns programas de alfabetização de adultos que usaram o “Método”, sob o manto da Igreja Católica e de seus membros “progressistas”. GADOTTI, Moacir. O MOVA SP: estado e movimentos populares. São Paulo: Cortez, 2007. Quanto ao “Método” Paulo Freire, que pode ser visto como fundamentos epistemológicos e como teorias de aprendizagem (veremos essas concepções em um capítulo adiante), este é caracterizado da seguinte forma, de acordo com Brandão (1992): pesquisar o universo vocabular, partindo da ideia de que há um universo cultural da fala da gente local que deve ser pesquisado, investigado, levantado e descoberto; levantamento das palavras geradoras das inúmeras frases que caracterizam a vida do lugar, proposição dos temas geradores, tomando-se como referência que as palavras geradoras guardam aspectos da vida do educando e o círculo de cultura pois todos ensinam e todos aprendem. Em 1963, foi elaborado o Plano Nacional de Alfa- betização, visando a alfabetizar cinco milhões de jovens e adultos em dois anos. 22 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Nesse sentido, pelo seu trabalho incansável em favor da educação, Paulo Freire tornou-se referencial para a educação na América Latina, fundamentando sua ação no debate, na problematização e na conscientização. Para ele, o professor é o animador do processo e a alfabetização de adultos não se apóia no autoritarismo, e sim na interlocução e na construção de significados. Para ele, ninguém é analfabeto porque quer, as condições socioeconômicas, as desigualdades sociais, a fome, a miséria são as causas deste mal que, por longas décadas, o Brasil não conseguiu superar. Como afirma Gadotti (2007, p. 28), ao explicitar o pensamento: “o analfabetismo é a expressão da pobreza, consequência inevitável de uma estrutura social injusta. Seria ingênuo combatê-lo sem combater suas causas”. CONHECENDO PAULO FREIRE Paulo Freire dá início a trabalhos com iniciativas populares, quando decide organizar, com paróquias católicas, projetos que abrangem desde o jardim de infância até a educação de adultos, objetivando o desenvolvimento do currículo e a formação de professores. O resultado desse trabalho foi partilhado com outros grupos: técnicas como, estudo em grupo, ação em grupo, mesas redondas, debates e distribuição de fichas temáticas eram praticados nesse tipo de trabalho. Foi a partir do desenvolvimento desse projeto que se começou a falar de um sistema de técnicas educacionais, o “Sistema Paulo Freire”, que podia ser aplicado em todos os graus da educação formal e da não-formal. Mais tarde, nas décadas de 70 e 80, no seu trabalho em alfabetização, um elemento do sistema foi interpretado sob a denominação “Método Paulo Freire” e “conscientização” para a revolução. Por essa razão, Paulo Freire parou de usar essas expressões, enfatizando o caráter político da educação e sua necessária “reinvenção” em circunstâncias históricas diferentes. O professor é o animador do processo e a alfabetização de adultos não se apóia no auto- ritarismo, e sim na interlocução e na construção de significados. “O analfabetismo é a expressão da pobreza, conse- quência inevitável de uma estrutura social injusta. Seria ingênuo combatê-lo sem combater suas causas” Gadotti (2007, p.28). 23 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 Segundo Gerhardt (2010), em 1960, Paulo Freire trabalhando como coordenador dos projetos de educação de adultos, apoia a criação do Movimento de Cultura Popular (MCP), mas, infelizmente, militantes católicos, protestantes e comunistas interpretam suas tarefas educativas de modo diferente e criam uma cartilha de alfabetização de adultos, escolhendo uma diretriz política de abordagem. Paulo Freire foi contra essa prática, pois consistia no ensino de mensagens prontas aos analfabetos, a fim de manipulá- los. Ele estava convencido da capacidade inata das pessoas, pois já fizera experiências nos domínios visual e auditivo enquanto elas aprendiam a ler e escrever. Contudo, ainda assim faltava o estímulo com que Freire poderia evocar o interesse pelas palavras e sílabas em pessoas analfabetas. Faltava a “consciência” dos termos individuais. A experiência mostrou para ele que não era suficiente começar com uma discussão intensa da realidade. Analfabetos são fortemente influenciados por suas falhas na escola e em outros ambientes de aprendizagem. A fim de reduzir esses obstáculos e provocar um impulso motivador, Freire experimentou verificar a distinção entre as habilidades de seres humanos e de animais em seus ambientes particulares. Somente após 1970, a teoria e a prática pedagógicas de Paulo Freire tornaram-se reconhecidas no Mundo. No Brasil, antes de 1964, Freire estava ciente das dificuldades e dos custos políticos envolvidos em seu programa pedagógico. Entretanto, em seus conhecimentos epistemológicos conduziram- no a interpretar tais resistências como algo acidental e destinado a ser removido por meio de oposição tática a uma dada ditadura e seus respectivos interesses. Com a adoção explícita de uma perspectiva política nova, seus postulados teóricos relativos à ideologia e ao conhecimento mudaram. Paralelamente a essa mudança do pensamento de Freire, em direção ao radicalismo revolucionário, outro deslocamento também teve lugar em relação ao significado e implicações de um verdadeiro conceito de conscientização. A prática educativa tornou-se uma práxis mais revolucionária e uma maior ênfase foi colocada no tema do compromisso para com o oprimido. O “Sistema de Alfabetização Paulo Freire” tem sido o grande referencial nos últimos 30 anos. Para ele, o educando adulto é tratado como sujeito do próprio conhecimento e não como objeto. Entende que o jovem e o adulto são portadores de um conhecimento que se fundamenta na sua cultura, nas suas experiências. Palavras 24 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos geradoras são extraídas do seu universo vocabular e são temas de discussãonos círculos de cultura. Fonte: Site Integrar. Disponível em< http://www.integrar.org.br/ paginas/ver_textos.asp?39>. Acesso em: 30 jun.2011. Segundo a professora Souza (2007), O MOVA surgiu em 1989, durante a gestão de Paulo Freire na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, com uma proposta que reunia Estado e organizações da Sociedade Civil para combater o analfabetismo, oferecendo o acesso à educação de forma adaptada às necessidades e às condições dos alunos jovens e adultos. O MOVA-SP, criado em 1989, é um marco dos Movimentos de Alfabetização de Jovens e Adultos implementados em Administrações Populares, após o processo de abertura política, cuja iniciativa foi seguida por outros municipios brasileiros: Porto Alegre, Alvorada, Cachoeirinha e Caxias do Sul (RS); São Paulo, Diadema, Embú, Mauá, Guarulhos, São Carlos, Araraquara, Ribeirão Pires e Santo André (SP); Angra dos Reis (RJ), Belém e Cametá (PA); Chapecó, Rio do Sul e Blumenau (SC); Ipatinga (MG); o Ler-Rio Claro e, em Goiânia, o AJA-Expansão, entre outros. Também há projetos como o MOVA-Brasil, uma parceria do IPF/FUP/Petrobrás, como parte do Programa Fome Zero; bem como municípios empreendendo o Programa Brasil Alfabetizado, com princípios da educação popular. Ainda, em âmbito estadual, mencionamos os estados do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Acre. Nesse contexto nacional, uma das grandes ações implementadas foi a parceria entre os Movimentos Sociais e as Administrações Populares municipais e estaduais na construção dos Movimentos de Alfabetização de Jovens e Adultos – MOVA. Tal perspectiva vem promovendo uma ação alfabetizadora popular que extrapola a visão da alfabetização apenas como decodificação da escrita, pautando-a nos princípios da formação cidadã, envolvendo toda a sociedade civil em parcerias com os poderes públicos para a garantia da alfabetização como ação política e cultural, rompendo com as práticas das antigas campanhas com vieses assistencialistas, descomprometidas com a continuidade da escolarização e com a transformação da sociedade brasileira. d) Alfabetização Solidária O MOVA surgiu em 1989, durante a gestão de Paulo Freire na Secre- taria Municipal de Educação de São Paulo, com uma proposta que reunia Estado e organizações da Sociedade Civil para combater o analfabetis- mo, oferecendo o acesso à educação de forma adaptada às necessidades e às condições dos alunos jovens e adultos. 25 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 Segundo a professora Esteves (2002), Alfabetização Solidária é o Programa desenvolvido pelo Conselho da Comunidade Solidária do Governo Federal, criado em 1997, que alfabetiza jovens e adultos nas cidades com maior índice de analfabetismo, segundo o IBGE. Tem o status de organização não governamental, com atuação reconhecida pela Unesco a qual, em 1999, concedeu-lhe o prêmio de “Iniciativas Bem-Sucedidas” na área da Educação. O programa procura consolidar o modelo solidário, unindo cinco parceiros: Governo Federal, por meio do Ministério da Educação (MEC), o Conselho da Comunidade Solidária, empresas, universidades e prefeituras. O custo por aluno é dividido ao meio pelo MEC e pelos parceiros do programa, empresas, instituições e pessoas físicas. Os alfabetizadores do programa são jovens do próprio município que cursam o ensino médio, magistério ou a 8ª série do ensino fundamental e que recebem bolsas. As universidades parceiras coordenam as atividades de alfabetização desenvolvidas, trabalhando na avaliação, capacitação e acompanhamento dos alfabetizadores, selecionados entre os moradores do município ou área onde serão montadas as salas de aula. Segundo a coordenação do programa, é desenvolvido por meio de módulos que têm duração de seis meses: um mês, em média, para a capacitação dos alfabetizadores nas universidades e cinco para o curso de alfabetização nas comunidades. A infraestrutura para a realização das aulas é fornecida pelas prefeituras locais, que fornecem materiais como quadro e giz. O Conselho da Comunidade Solidária ainda mantém os programas Capacitação Solidária e Universidade Solidária. De acordo com Bocayuva (1999), a comunidade Solidária representa um novo elemento do sistema institucional das reorientações políticas e das mudanças estruturais da economia brasileira de cunho neoliberal, que também implica a definição de um novo marco legal para as entidades sem fins lucrativos. Para este autor, o termo parceria parece criar um novo sentido de controle e fiscalização com duas faces, a do controle estatal, embora mais flexibilizado, e o da limitação pelo sistema de representação constitucional através dos conselhos, que exigirá uma mudança cultural e novos instrumentos. Um aspecto importante é a busca da democratização da cidadania e do movimento popular. Em síntese, o Programa Alfabetização Solidária não é uma Organização Não Governamental (ONG), embora os recursos por ele captados sejam gerenciados por uma organização não governamental, sem fins lucrativos, Associação de Apoio ao Programa Alfabetização Solidária. Não estando vinculado ao MEC, é controlado pelo Conselho da Comunidade Solidária cuja Secretaria Executiva foi criada em 1985, fazendo parte da Casa Civil. Os principais fundamentos Programa, é desenvolvido por meio de módulos que têm duração de seis meses: um mês, em média, para a capacita- ção dos alfabe- tizadores nas universidades e cinco para o curso de alfabetização nas comunidades. 26 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos do programa seriam do Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável, que é um modo de promover o desenvolvimento o qual possibilita o surgimento de comunidades mais sustentáveis, capazes de suprir suas necessidades imediatas e de descobrir ou despertar suas vocações locais, bem como desenvolver suas potencialidades específicas e fomentar o intercâmbio externo, aproveitando-se de suas vantagens locais. Para finalizar nossa primeira conversa (capítulo), alertamos que iremos refletir, nos outros capítulos deste caderno, sobre estes temas apresentados e outros que não discutimos ainda, relacionados à História da EJA no país. Acrescentamos, também, que após a promulgação, em 1996, da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação no 9.394, a cultura escolar brasileira encontra- se impregnada pela concepção compensatória de educação de jovens e adultos que inspirou o ensino supletivo, visto como instrumento de reposição de estudos não realizados na infância ou adolescência. Ao focalizar a escolaridade não realizada ou interrompida no passado, o paradigma compensatório acabou por enclausurar a escola para jovens e adultos nas rígidas referências curriculares, metodológicas, de tempo e espaço da escola de crianças e adolescentes, interpondo obstáculos à flexibilização da organização escolar necessária ao atendimento das especificidades desse grupo sociocultural. Ao dirigir o olhar para a falta de experiência e conhecimento escolar dos jovens e adultos, a concepção compensatória nutre visões preconceituosas que subestimam os alunos, dificulta que os professores valorizem a cultura popular e reconheçam os conhecimentos adquiridos pelos educandos no convívio social e no trabalho. Não se pode, porém, atribuir apenas à estreiteza pedagógica do paradigma compensatório os escassos resultados qualitativos alcançados pelo ensino supletivo, para os quais também contribuíram a crônica escassez de recursos financeiros e a falta de preparo específico dos professores, mazelas que atingiram o conjunto do ensino público em expansão naquele período, mas que afetaram de modo mais agudo as modalidades de menor prestígio, comoa EJA. Quando, em 1997, a V Conferência Internacional de Educação de Adultos, realizada em Hamburgo, proclamou o direito de todos à educação continuada ao longo da vida, ainda não havia, no Brasil, consenso em torno desse paradigma. Ainda que lentamente, porém, a transição de referências vem sendo impulsionada pelo resgate da contribuição da educação popular, ao lado de um conjunto de mudanças no pensamento pedagógico e nas relações entre educação e trabalho na sociedade contemporânea. Frente ao mundo inter-relacionado, desigual e inseguro do presente, o novo paradigma da EJA sugere que a aprendizagem ao longo da vida não só é um fator de desenvolvimento pessoal e um direito de cidadania (e, portanto, uma responsabilidade coletiva), mas também uma condição de participação dos indivíduos na construção de sociedades mais tolerantes, solidárias, justas, democráticas, pacíficas, prósperas e sustentáveis. 27 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 Caro(a) pós-graduando(a), fizemos neste primeiro capítulo uma viagem curta e rápida sobre a história da educação de jovens e adultos no Brasil. É importante que você aprofunde o seu conhecimento sobre essa temática, então, a seguir, apresentamos uma relação de sites em que poderá encontrar outros textos sobre o que discutimos neste capítulo. Além disso, há alguns vídeos que são interessantes de serem assistidos. Caro pós graduando, vamos aprofundar as nossas leituras sobre essa temática, então acesse os Links apresentados a seguir, e boas leituras!!! http://www.oei.es/quipu/brasil/educ_adultos.pdf http://educador.brasilescola.com/trabalho-docente/a-educacao- jovens-adultos.htm http://br.monografias.com/trabalhos3/educacao-jovens/educacao- jovens.shtml http://www.scielo.org/cgi-bin/wxis.exe/applications/scielo-org/ iah/?IsisScript=iah/iah.xis&org&nextAction=lnk&lang=p&indexSe- arch=&exprSearch=EDUCACAO%20DE%20JOVENS%20E%20 ADULTOS http://www.youtube.com/watch?v=ByD6nfUAWh0 http://www.youtube.com/watch?v=88e-ymOc1sY&feature=related http://www.youtube.com/watch?v=UzdqtDj9TeI&feature=related http://www.youtube.com/watch?v=tfYE7T6yDh4&feature=related Além desses vídeos do Youtube, é interessante você assistir aos filmes: “Central do Brasil” e “Pro dia Nascer Feliz”. Ambos irão abordar situações comuns do dia a dia. Vale à pena conferir e agregar valores a sua formação acadêmica, lembrando que esses filmes poderão ser utilizados nas suas aulas da EJA e promover seminários com os alunos. 28 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Sinopse do filme Central do Brasil: Mulher que escreve cartas para analfabetos na estação Central do Brasil, no Rio de Janeiro, ajuda menino, após sua mãe ser atropelada, a tentar encontrar o pai que nunca conheceu, no interior do Nordeste. SALLES, Walter. Central do Brasil. São Paulo : Consorcio Europa, c1998. 1 DVD (112min), color, SP. Pro Dia Nascer Feliz: É o segundo longa- metragem do diretor João Jardim, diretor do cultuado documentário “Janela da Alma” que, em 2002, bateu recordes de público no gênero. Através de uma investigação do relacionamento do adolescente com a escola - ambiente fundamental em sua formação - o diretor traz à tona, além de questões comuns a qualquer adolescente dentro do ambiente escolar, questões como a desigualdade social e o impacto da banalização da violência no desenvolvimento de muitos desses jovens. PRO dia nascer feliz. São Paulo : TV Cultura, 2005. 1 DVD (88min.), color, SP. Atividade de Estudos: Vamos fazer um feedback do que foi estudado neste primeiro capítulo? Responda às questões abaixo. 1) Como a Educação de Jovens e Adultos era concebida até a década de 1940? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 29 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Por quem o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) foi conduzido? Justifique a sua resposta. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 3) Na Paraíba, no período entre 1960 e 1970, ocorreram três importantes movimentos de alfabetização popular. Quais foram eles? Explique a diferença entre eles. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Algumas Considerações Neste capítulo, foi possível compreender que no final dos anos 40, do século passado, implementaram-se as primeiras políticas públicas nacionais de educação escolar para adultos. Estas foram disseminadas pelo território brasileiro através das campanhas de alfabetização. Além disso, foi possível observar que a necessidade de oferecer educação aos adultos já aparecia em textos normativos anteriores, como na pouco duradoura Constituição de 1934, mas foi na década seguinte que começaria a tomar corpo, em iniciativas concretas, a preocupação em oferecer os benefícios da escolarização a amplas camadas da população até então excluídas da escola. Houve a criação do Fundo Nacional de Ensino Primário, em 1942, do Serviço de Educação de Adultos e da Campanha de Educação de Adultos, 30 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos ambos em 1947, da Campanha de Educação Rural, iniciada em 1952, e da Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo, em 1958. Porém, no início da década de 1960, movimentos de educação e cultura popular ligados a organizações sociais, à Igreja Católica e a governos desenvolveram experiências de alfabetização de adultos orientadas a conscientizar os participantes de seus direitos, analisarem criticamente a realidade e nela intervir para transformar as estruturas sociais injustas. Diretriz totalmente contrária teve o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) da década de 1970 e A cruzada ABC, a vertente religiosa na Educação de Jovens e Adultos Além disso, na Paraíba, ocorreram três importantes movimentos de alfabetização popular, cada um ao seu modo pioneiros: da alfabetização- educação de adultos pelo rádio (SIREPA - Sistema Rádio Educativo da Paraíba - 1959/69); da aplicação em larga escala do Método Paulo Freire e do movimento de cultura popular adjacente (CEPLAR - Campanha de Educação Popular - 1961/64) e da aplicação do maior programa de reação (pós-abril de 1964), liderado por missionários protestantes e técnicos norte-americanos (Cruzada ABC - Cruzada de Ação Básica Cristã - 1964-1966/70 ). No início de 1964, no auge dos conflitos sociais, atuavam simultaneamente: o SIREPA, com centenas de escolas radiofônicas; a CEPLAR, com cento e trinta e cinco “círculos de cultura”, e o que seria o embrião da Cruzada ABC preparava setecentos monitores para combater a CEPLAR e seu método político-pedagógico. Já a Cruzada ABC, mediante projetos específicos de alfabetização, atuou também na Bahia,Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Espírito Santo e Distrito Federal, captando recursos de instituições diversas. A Cruzada ABC, com forte influência americana, por meio dos missionários protestantes e dos quadros da Aliança para o Progresso, além de proselitista em sua maneira de ser, contrapunha-se frontalmente ao sistema Paulo Freire, tido como expressão maior da metodologia de alfabetização do início dos anos 60. Com essas características, fez regredir a concepção de educação de adultos aos anos 40 e 50. No início da década de 1960, os movimentos de educação e cultura popular, como o MOBRAL, surgiram como um prosseguimento das campanhas de alfabetização de adultos iniciadas com Lourenço Filho. Só que com um cunho ideológico totalmente diferenciado do que vinha sendo feito até então. Apesar dos textos oficiais negarem, soube-se que a primordial preocupação do MOBRAL era tão somente fazer com que os seus alunos aprendessem a ler e a escrever, sem uma preocupação maior com a formação do homem. Pelo seu trabalho incansável em favor da educação, Paulo Freire tornou- 31 A Constituição Histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil Capítulo 1 se referencial para a educação na América Latina, fundamentando sua ação no debate, na problematização e na conscientização. Para ele, o professor é o animador do processo e a alfabetização de adultos não se apoia no autoritarismo, e sim na interlocução e na construção de significados. Segundo Freire, ninguém é analfabeto porque quer; as condições socioeconômicas, as desigualdades sociais, a fome, a miséria são as causas deste mal que, por longas décadas, o Brasil não conseguiu superar. O MOVA surgiu em 1989, durante a gestão de Paulo Freire na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, com uma proposta que reunia Estado e organizações da Sociedade Civil para combater o analfabetismo, oferecendo o acesso à educação de forma adaptada às necessidades e às condições dos alunos jovens e adultos. O MOVA-SP, criado em 1989, é um marco dos Movimentos de Alfabetização de Jovens e Adultos implementados em Administrações Populares, após o processo de abertura política, cuja iniciativa foi seguida por outros municipios. O Programa Alfabetização Solidária não é uma ONG, embora os recursos por ele captados sejam gerenciados por uma organização não governamental, sem fins lucrativos (Associação de Apoio ao Programa Alfabetização Solidária). Não estando vinculado ao Ministério da Educação e Cultura, é controlado pelo Conselho da Comunidade Solidária cuja Secretaria Executiva foi criada em 1985, fazendo parte da Casa Civil. Os principais fundamentos desse programa seriam o Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável, que é um novo modo de promover o desenvolvimento o qual possibilita o surgimento de comunidades mais sustentáveis, capazes de suprir suas necessidades imediatas, descobrir ou despertar suas vocações locais e desenvolver suas potencialidades específicas, bem como fomentar o intercâmbio externo, aproveitando-se de suas vantagens locais. Referencias BEISIEGEL. Celso de Rui. Estado e Educação Popular. São Paulo: Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais, 1974. BOCAYUVA, Pedro. ONGs, um campo institucional com novos significados. Rio de Janeiro: Fase, 1999. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é Educação. São Paulo: Circulo do Livro, 1992. 32 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos CORRÊA, Arlindo Lopes. Educação de massa e ação comunitária. Rio de Janeiro: AGGS, 1979. DI ROCCO, Gaetana Maria Jovino. Educação de Adultos: uma contribuição para seu estudo no Brasil. São Paulo: Loyola, 1979. ESTEVES, Regina Célia. Alfabetização Solidária: uma estratégia de sucesso. Lisboa: CLAD, 2002. GADOTTI, Moacir. O MOVA SP: estado e movimentos populares. São Paulo: Cortez, 2007. MOURA, Tânia Maria de Melo. Educação de Jovens e Adultos: currículo, trabalho docente, práticas de alfabetização e letramento. Maceió: UFAL, 2008. SCOUGLIA, Afonso Celso. A Educação de Jovens e Adultos: histórias e memórias da década de 60. Brasília: Plano Editora, 2003. SOUZA, Maria Antônia de. Educação de Jovens e Adultos. Curitiba: IBPEX, 2007. CAPÍTULO 2 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer os fundamentos teóricos e práticos nas diversas concepções de EJA no Brasil. 3 Reconhecer e analisar os elementos constituidores da fundamentação teórica e prática da Educação e EJA.Contextualização 34 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos 35 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 Contextualização No senso comum, o fundamento é a base que sustenta algo ou alguma coisa. Na educação não poderia ser diferente. Aquilo que fundamenta, de certo modo, sustenta o restante ou o todo. Fundamento e Educação são duas palavras dependentes uma da outra, ou seja, precisa de fundamentos para que o processo educacional ocorra e, por outro lado, a construção dos fundamentos se faz por meio de um processo existencial e educacional. Pense em sua vida profissional, como professor, quais os processos educacionais que, de certa forma, contribuíram para sua formação e fundamentação do professor que você está sendo na atualidade? Um item que merece destaque nesta reflexão é que os fundamentos da educação, de forma direta e ou indireta, passam pela formação do professor. As pessoas que coordenam os projetos, os movimentos em torno da educação e que estão relacionados com os fundamentos dela, bem como as pessoas que participam do processo enquanto sujeitos que promovem e fazem acontecer esses projetos ou movimentos, no caso os professores de sala de aula, todos eles foram formados ou estão em formação. Nesse sentido, convém destacar os elementos constituidores da fundamentação, encontrados, em geral, na Educação. A professora Romanowski (2008), cita que a base da fundamentação da educação se dá por meio de três categorias: A Epistemologia ou Teoria do Conhecimento, As Teorias Cognitivas da Aprendizagem e as Teorias Curriculares. Segundo o pesquisador Vasconcelos (2009), podemos entender Epistemologia como sendo a parte da Filosofia que estuda a questão do conhecimento, sua origem, sua estrutura, seus métodos e sua validade, bem como pensá-la a partir de uma reflexão filosófica sobre o conhecimento científico. Ou seja, para ser professor é necessário que o sujeito domine tudo aquilo que está relacionado com o conhecimento (Epistemologia) e, por sua vez, compreenda como o ser humano adquiri os conhecimentos (Teorias Cognitivas da Aprendizagem). De certa forma, os modelos de ensino aprendizagem, os projetos e movimentos da educação estão embasados nestas teorias e práticas. As duas primeiras serão estudadas neste capítulo e as Teorias Curriculares no terceiro capítulo. 36 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Fundamentos Teóricos e Práticos da Educaçâo O professor Silva (2007) escreve que, em nosso país (Brasil), três concepções de Fundamentos teóricos e práticos da Educação perpassaram os cursos de formação para professores. A primeira seria a Racionalidade Técnica Científica, a segunda a Racionalidade Prática e, por último, a Racionalidade Crítica. O modelo de racionalidade técnica científica, que preside a ciência moderna, constitui-se a partir da revolução científica do século XVI. Segundo o sociólogo Santos (2007), as consequências desse modelo de racionalidade para o campo das ciências sociais são bastante conhecidas: a cristalização da divisão do conhecimento em campos especializados; a fixaçãodos territórios disciplinares nos diferentes níveis de ensino; a justificação da hierarquização dos que pensam dos que executam; os produtores e os consumidores de saberes. Para o professor Contreras (2002, p. 90): A ideia básica do modelo da racionalidade técnica científica é que a prática profissional consiste na solução instrumental de problemas mediante a aplicação de um conhecimento teórico e técnico, previamente disponível, que procede da pesquisa científica. Neste modelo, o professor é visto como um técnico, um especialista que rigorosamente põe em prática as regras científicas ou pedagógicas. Assim, para preparar-se o profissional da Educação, o conteúdo científico ou pedagógico é necessário, o qual servirá de condutor de sua prática. Baseado na racionalidade técnica científica, predominaram três concepções na educação. De acordo com Pereira (2002) os modelos são: o modelo de treinamento de habilidades comportamentais, para os professores desenvolverem habilidades específicas e observáveis; o modelo de transmissão, no qual o conteúdo científico e ou pedagógico é transmitido ao professor, geralmente ignorando as habilidades da prática de ensino; o modelo acadêmico tradicional, o qual assume que o conhecimento disciplinar e/ou científico é suficiente para o ensino aprendizagem. Em quais momentos históricos da EJA você percebe que as diretrizes dos planos e movimentos; as ações e os cursos em âmbito nacional ou local estavam ligados a esta forma de conceber o ensino e a aprendizagem? A ideia básica do modelo da racio- nalidade técnica científica é que a prática profissional consiste na solu- ção instrumental de problemas me- diante a aplicação de um conheci- mento teórico e técnico, previa- mente disponível, que procede da pesquisa cientí- fica. 37 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 Diante das limitações, lacunas e problemas que os modelos advindos da racionalidade técnica e científica de filiação positivista suscitaram no dia a dia dos professores, várias críticas foram apresentadas pelo universo acadêmico, pelas associações e pelos movimentos sociais. As críticas evidenciaram que esses processos de formação não foram e não são capazes de preparar professores para lidar com questões imprevisíveis, singulares e complexas, inerentes ao processo de ensino-aprendizagem. Olhando a história da educação no Brasil, principalmente no período da Ditadura Militar, no qual o ideal nacionalista era o de formar pessoas capazes de produzir com qualidade e não ser críticas em relação ao sistema, fica evidente que os fundamentos para sustentar as concepções tecnicistas eram baseados nessa lógica racionalista técnica científica, independente da temporalidade que se estava trabalhando no cotidiano das escolas. De acordo com Gamboa (2002), o positivismo é uma corrente filosófica que surgiu no século XIX, tendo como principal característica a supervalorização do conhecimento científico. O autor mais representativo do positivismo é Augusto Comte, para qual o conhecimento se encontra em um contínuo processo de evolução, passando por três estágios: religioso, metafísico e científico. O ideal de cientificidade, em Comte, identifica-se com o método empírico, baseado na observação e experimentação, com o intuito de descobrir leis gerais da natureza e/ou comportamento humano. De acordo com este autor, as leis permitiriam a previsão de fenômenos futuros e essa previsão, por sua vez, nortearia a ação humana. Vamos refletir: Pense na EJA, no quanto ela foi influenciada por essa concepção filosófica e epistemológica, que ditou inúmeros cursos e projetos no Brasil e ainda está presente no cotidiano escolar. Dentre os modelos alternativos que foram contrários à racionalidade técnica científica, ganharam força no Brasil aqueles inspirados na racionalidade prática, que foram incorporados nos debates acadêmicos e nas formulações e ações políticas educacionais, nos diversos sistemas de ensino, ou seja, no âmbito municipal, estadual ou federal, até mesmo no ensino privado. Pereira (2002, p.27) afirma que: Existem, no mínimo, pelo menos [sic] três modelos de formação dentro do modelo da racionalidade prática: o modelo humanístico, no qual os professores são O positivismo é uma corrente filo- sófica que surgiu no século XIX, tendo como princi- pal característica a supervalorização do conhecimento científico. 38 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos os principais definidores de um conjunto particular de conhecimentos que eles devem conhecer a fundo; o modelo de ensino como ofício, na qual o conhecimento sobre o ensino é adquirido por tentativa e erro, por meio de uma análise cuidadosa da situação imediata; o modelo orientado pela pesquisa, cujo propósito é ajudar o professor a analisar e refletir sua prática e trabalhar na solução de ensino e aprendizagem em sala de aula. As críticas ao modelo da racionalidade técnica científica, provenientes da nova visão denominada racionalidade prática, recorrente no debate acadêmico e nas pesquisas acadêmicas sobre formação e fundamentos da educação e do professor, contagiaram os projetos e movimentos educacionais, os formuladores e gestores de políticas públicas do Brasil. Dentro da EJA também não foi diferente, os movimentos originários nos grandes centros em que a educação era reivindicada como direito humano eram baseados, sobretudo, em uma abordagem mais humanista e prática. Podemos colocar que, em alguns momentos, a aplicação, por exemplo, do método Paulo Freire na EJA foi uma opção da racionalidade prática e, em outros, enquadrava-se na racionalidade crítica. Nesse contexto de contestação, é importante destacar aqueles inspirados na racionalidade crítica. De acordo com essa concepção, a pesquisa ganha centralidade no ensino. De uma perspectiva política, o professor é considerado um sujeito problematizador. As três principais vertentes dentro deste modelo, segundo Pereira (2002, p. 28), são: O modelo sócio-reconstrucionista, o qual concebe o ensino e a aprendizagem como veículos para promoção de maior igualdade, humanidade e justiça social na sala de aula, na escola e na sociedade; o modelo emancipatório ou transgressivo, o qual concebe a educação como expressão de um ativismo político e imagina a sala de aula como uma possibilidade, permitindo ao professor construir modos coletivos para ir além dos limites para transgredir; e o modelo ecológico critico, no qual a pesquisa ação é concebida como um meio para desnudar, interromper e interpretar desigualdades dentro da sociedade e, principalmente, para facilitar o processo de transformação social. Nesse sentido, a concepção crítica, na fundamentação educacional, não é apenas um modelo para melhor qualificar a formação e a prática docente, mas uma postura de produção de saberes, transgressão, emancipação e transformação social. Na sala de aula, seja no espaço acadêmico, seja na educação básica nas diversas modalidades de ensino, a pesquisa é estratégica para a formação crítica do sujeito. Podemos relacionar este modelo de fundamentação educacional, dentro da história da EJA, principalmente durante a Ditadura Militar e depois dela no país, continua forte em diversos programas e movimentos vinculados à EJA tendo como base a transformação social. Na racionalidade crítica o profes- sor é considerado um sujeito problematizador. O modelo sócio-reconstru- cionista, o qual concebe o ensino e a aprendizagem como veículos para promoção de maior igualdade, humanidade e jus- tiça social na sala de aula, na escola e na sociedade. 39 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e AdultosCapítulo 2 Dentro da abordagem epistemológica como elemento presente na fundamentação da Educação, destacamos outras duas concepções de ciência e ensino-aprendizagem que são as bases das racionalidades presentes nos projetos, cursos, movimentos, entre outros. De acordo com Vasconcelos (2009), além da teoria do conhecimento, baseada no pensamento positivista, encontramos presente na educação o materialismo dialético e o sistema filosófico denominado fenomenologia. O materialismo dialético é uma corrente filosófica baseada nas ideias de dois pensadores alemães do século XIX, Karl Marx e Friedrich Engels. Esses pensadores caracterizavam- se como socialistas ao buscarem soluções para os problemas sociais trazidos pelo desenvolvimento da sociedade industrial. Contudo, diferentemente dos socialistas utópicos, Marx e Engels insistiam que a superação do sistema capitalista e das desigualdades sociais decorrentes só se efetuaria a partir das lutas de classe. Do ponto de vista epistemológico, o conceito mais importante do materialismo dialético é o de ideologia. Trata-se, porém, de um termo ambíguo, pois tanto pode significar uma falsa consciência quanto uma visão de mundo que caracteriza uma determinada classe social, não colocando o termo como falso ou verdadeiro. O materialismo dialético é importante para a constituição da fundamentação teórica e prática da educação porque apresenta as condições materiais, a estrutura econômica da sociedade como determinantes de todos os aspectos da vida social. O já citado Vasconcelos (2009) comenta que a abordagem fenomenológica consiste em uma tradição filosófica inaugurada pelo pensador alemão Edmund Husserl, na primeira metade do século XIX, o qual afirmava que o ato do conhecimento é individual e subjetivo e o objeto do conhecimento não. Outro pensador que se vinculou à fenomenologia foi Jean Paul Sartre, que afirmava que a existência procede à essência humana, o que implica compreender o ser humano como alguém em sua relação com o mundo, que se faz a si mesmo por meio de suas escolhas. Os autores ligados à fenomenologia têm como foco de suas reflexões a noção de um sujeito que não pode ser entendido fora da relação com o mundo que o cerca, assim, o mundo no qual o sujeito se relaciona não é um mundo feito somente de coisas, mas também de outros sujeitos. A intersubjetividade implicada na relação com o mundo torna-se, assim, ponto de partida para interpretar as questões sociais tão caras à Educação. Paulo Freire incorporou, em diversas obras, essa concepção de ser no mundo, que possibilita sua liberdade a partir de suas escolhas conscientes. Propostas atuais da EJA em âmbitos locais - e até mesmo o federal - partem da liberdade, O materialis- mo dialético é importante para a constituição da fundamentação teórica e prática da educação porque apresenta as condições materiais, a estru- tura econômica da sociedade como determinantes de todos os aspectos da vida social. 40 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos da autonomia dos sujeitos envolvidos no processo educacional, que acarreta em educação promotora de desenvolvimento e como direito. Teorias Cognitivas de Aprendizagem Teorias de aprendizagem se relacionam a um conjunto de enfoques e perspectivas teóricas que procuram oferecer explicações gerais sobre os elementos e fatores envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Essas teorias, de certa maneira, permitem uma reflexão sobre a prática docente em sala de aula, de forma que o professor seja capaz de identificar e utilizar as técnicas e os conceitos mais adequados para estimular o processo de ensino-aprendizagem, tendo em vista cada situação. Pare e reflita, prezado(a) pós-graduando. Em que medida os gestores, coordenadores, em determinados períodos da história da EJA no Brasil, pensaram desta forma? Eles tinham esta clareza de que os elementos constituidores da fundamentação teórica e prática da EJA passavam necessariamente por concepções epistemológicas, teorias de aprendizagem, teorias curriculares? O conceito de aprendizagem é complexo porque envolve a interação de diversos fatores e processos através dos quais se compreendem conceitos de temas específicos. O ser humano está sempre aprendendo, intencionalmente ou não. Nas palavras de Fontana (1998, p.17): O aprendizado consiste em uma mudança relativamente persistente no comportamento do indivíduo devido à experiência. Esta abordagem, portanto, enfatiza de modo particular a maneira como o individuo interpreta e tenta entender o que acontece. O individuo não é um produto relativamente mecânico do ambiente, mas um agente ativo no processo de aprendizagem, que procura de forma deliberada processar e categorizar o fluxo de informação recebida no mundo exterior. A intersubjetivi- dade implicada na relação com o mundo torna-se, assim, ponto de partida para inter- pretar as questões sociais tão caras à Educação. O individuo não é um produto relati- vamente mecânico do ambiente, mas um agente ativo no processo de aprendizagem, que procura de forma delibera- da processar e categorizar o fluxo de informação re- cebida no mundo exterior. 41 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 Portanto, a aprendizagem não é simples passagem da ignorância ao saber, sem resistência ou conflitos, ela ocorre por meio de uma experiência, muda-se o conhecimento anterior sobre uma ideia, um comportamento ou um conceito. É importante entender que para a aprendizagem ocorrer, é necessário que haja uma interação ou troca de experiências do individuo com o seu meio ou comunidade educativa. De acordo com a pesquisadora Lakomy (2008), o processo de aprendizagem tem sido estudado, de modo direto ou indireto, por teóricos que se dividem em dois grupos: os comportamentais (behavioristas), cujo resultado da aprendizagem é uma mudança de comportamentos observáveis, causada por fatores externos ou estímulos ambientais ou reforços (punições ou recompensas) e os cognitivistas (interacionistas), que procuram explicar o processo de construção do conhecimento humano e desenvolvimento da inteligência e, consequentemente, geram informação que nos levam a conhecer como se processa interiormente a aprendizagem. Ainda segundo Lakomy (2008), para os estudiosos que apoiam as chamadas Teorias Comportamentais da Aprendizagem, uma teoria é considerada científica quando se sustenta em dados experimentais e pode ser comprovada por meio de experimentos. O resultado da aprendizagem é uma mudança ou aquisição de comportamentos observáveis, causada por estímulos externos ou ambientais, esses comportamentos observáveis são os resultados da aprendizagem. A modificação de um comportamento é entendida pelos comportamentalistas como resultado de um processo de condicionamento. Este pensamento tem como base os trabalhos realizados por Ivan Petrivich Pavlov, fisiologista russo, que estudou, em 1901, o reflexo condicionado a partir da observação do salivar de cães. Assim, conseguiu que os cães envolvidos em sua experiência apresentassem o reflexo salivar ao ouvir a campainha (algumas refeições eram precedidas do toque de uma campainha). A esse reflexo chamou de reflexo condicionante. Do mesmo modo como se estabelece uma resposta, pode-se extingui-la. Influenciado pelos trabalhos condicionantes, Skinner, o representante clássico do Behaviorismo, e seus seguidores enfatizam a importância do estudo do comportamento observável e os efeitos do meio ambiente na mudança desses comportamentos. A teoria behaviorista é baseada na relação estímulo-resposta. O indivíduo que aprende é visto como uma tábula rasa: ele aprende passivamenteenquanto processa as informações. A aprendizagem ocorre quando o comportamento é adquirido, o comportamento novo é reforçado por um estímulo, negativo ou positivo. A teoria beha- viorista é base- ada na relação estímulo-resposta. O indivíduo que aprende é visto como uma tábula rasa: ele aprende passivamente en- quanto processa as informações. A aprendizagem ocorre quando o comportamento é adquirido, o com- portamento novo é reforçado por um estímulo, negativo ou positivo. 42 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Segundo Skinner (2000), o melhor método de ensinar seria um método mecânico, isto é, o ensino programado em passos pequenos, diante dos quais o aluno envolvido com a aprendizagem deve responder constantemente, com o objetivo de receber os reforços necessários e, assim, reduzir os erros e, também, o uso de máquinas para corrigir de imediato as respostas “erradas” dos alunos. Estas máquinas devem apresentar sistematicamente o conteúdo de ensino, seguindo uma lógica e com dificuldades crescentes. Para que a aprendizagem ocorra, é preciso considerar os seguintes fatores: a- A capacidade de elaboração de associações condicionadas por meio de estímulos e respostas. b- A Constância do exercício e da prática com o objetivo de reforçar a aprendizagem. c- A importância da motivação relacionada com a recompensa. d- A relação dos problemas resolvidos com a repetição e a transferência da aprendizagem. De acordo com a pesquisadora Lakomy (2008), para os teóricos cognitivistas, a maturação biológica, o conhecimento prévio, o desenvolvimento da linguagem, o processo de interação social e a descoberta da afetividade são fatores de grande relevância no processo de desenvolvimento da inteligência e da aprendizagem. Os dois maiores expoentes desta teoria seriam o suíço Jean Piaget (1896-1980) e o russo Lev Semynovitc Vygotsky (1886-1934). Figura 02: Jean Piaget Fonte: Disponível em: <http://piaget.infoedu.zip.net/>. Acesso em: 10 jun.2011. 43 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 Figura 03: Lev Semynovitc Vygotsky Fonte: Disponível em: <http://www.euniverso.com.br/Psyche/Psicologia/ geral/aprendizagemvygotsky.htm>. Acesso em: 12 jun.2011. Piaget foi idealizador do construtivismo psicogenético, que tem um importante conceito dentro das teorias da aprendizagem. De acordo com Piaget (1997), se as estruturas disponíveis são suficientes para operar com novas situações, então ocorre a equilibração majorante. Esse processo envolve dois mecanismos intermediários para que ocorra a construção da inteligência do indivíduo. A assimilação e a incorporação de novos conhecimentos ou informações; a estrutura intelectual e a acomodação, que seria a reorganização da estrutura mental para que o sujeito possa incorporar os novos conhecimentos. Quando a assimilação e a acomodação ocorrem simultaneamente, é possível a adaptação a novas situações. O russo Vygotsky foi o criador da Teoria Sociointeracionista. Segundo o próprio Vygotsky (2002), o momento de maior significado no curso do desenvolvimento intelectual acontece quando a fala e a atividade prática, duas linhas completamente independentes de desenvolvimento, convergem. É extremamente importante que o indivíduo aprenda para que possa compreender e analisar o contexto histórico no qual está inserido. Segundo a pesquisadora Lima (2002), Vygotsky dizia que a escola é uma situação única na história do ser humano porque ela aloca tempo e espaço para a aquisição de instrumentos culturais que, de outra forma, não estariam acessíveis aos indivíduos e/ou não seriam adquiridos sem a mediação realizada por outro ser humano, ou seja, o indivíduo não adquire sozinho. Uma instituição social que viabilizasse a socialização de informações e de instrumentos culturais desde que seu métodos e organização promovessem o desenvolvimento biológico e cultural dos indivíduos em suas diversas fases de desenvolvimento. Piaget foi idealizador do construtivismo psicogenético, que tem um importante conceito dentro das teorias da aprendizagem. O russo Vygotsky foi o criador da Teoria Sociointera- cionista. 44 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Ainda de acordo com Lakomy (2008), os trabalhos de Piaget e Vygotsky têm sido de grande valia na busca pela compreensão do processo de aquisição do conhecimento e desenvolvimento da inteligência. Ambos apontam para um processo de conteúdos organizados, que são transmitidos por meio da interação social, e que tem por finalidade o desenvolvimento cognitivo, afetivo, cultural e social de uma pessoa, a qual se torna agente de transformação em sua comunidade. Influenciados por estes autores, vários estudiosos, entre eles Emilia Ferreiro, desenvolveram o chamado construtivismo. Figura 04: Emilia Ferreiro Fonte: Disponível em : < http://educarparacrescer.abril.com.br/pensadores- da-educacao/emilia-ferreiro.shtml>. Acesso em: 10 jun.2011. Segundo Emilia Ferreiro (1995), o indivíduo aprende quando consegue apreender um conteúdo e formular uma representação pessoal de um objeto da realidade. Esse objeto é determinado por experiências, interesses e conhecimentos prévios que possibilitam a compreensão da novidade. Desse modo, não se modifica o que já se tem, mas é interpretado o novo de forma peculiar e passa ser daquele que o interpreta. Assim sendo, o aprender não é resultado do desenvolvimento, mas é o desenvolvimento cognitivo ou aquisição de conhecimento. O desequilíbrio facilita a aprendizagem, ou seja, os erros precisam ser percebidos como resultados de concepções de sujeitos que querem aprender. O raciocínio abstrato é a força motora da aprendizagem e tem a comunicação como parceira entre os elementos do processo educativo estimulador do pensamento. Destacamos, ainda, a teoria da instrução de Jerome Bruner (1997), que defende a aprendizagem como um processo interno, mediado cognitivamente, e não um produto direto dos fatores externos. Esta teoria é baseada em quatro Emilia Ferreiro, o indivíduo aprende quando consegue apreender um conteúdo e formu- lar uma repre- sentação pessoal de um objeto da realidade. 45 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 princípios fundamentais: (motivação) todos possuem o desejo de aprender, uma motivação interna que predispõe à aprendizagem; (estrutura) qualquer conteúdo pode ser apreendido desde que esteja adequadamente estruturado e organizado cognitivamente; (sequência) um professor utiliza para apresentar o assunto e determinar o grau de dificuldade ou facilidade do aluno em compreender aquilo que lhe é apresentado; (reforçamento) o aluno necessita receber um retorno sobre a qualidade do seu trabalho ou desempenho, cabe ao professor fornecer informações no tempo certo, sobre os resultados obtidos. Figura 05: Jerome Bruner Fonte: Disponível em: <http://educacaodialogica.blogspot.com/2009/11/ jerome-bruner-pai-da-psicologia.html>. Acesso: 01 jun.2011. A teoria da instrução influenciou o autor a criar o método de aprendizagem por descoberta. De acordo com Bruner (1997), os alunos são estimulados pelo professor por meio de perguntas que geram estudos e pesquisas. Na busca por respostas, podem descobrir sozinhos alguma ideias ou princípios básicos relacionados à questão colocada. A aprendizagem por descoberta pode ser usada em qualquer área do conhecimento desde que o professor tenha conhecimento sobre o assunto; apresente o conteúdo sob forma de problema a ser resolvido de forma ativa pelos alunos; entenda que é um processo lento de aprendizagem; seja capaz de estruturara matéria; desenvolva e estimule uma atitude de investigação por parte dos alunos; reconstitua o caminho do raciocínio do aluno para encontrar o momento do erro; conheça a realidade da vida de seu aluno. A teoria da instrução defende a aprendizagem como um processo interno, mediado cognitivamente, e não um produto direto dos fatores externos. A aprendizagem significativa é um processo por meio do qual uma nova informação relaciona-se, de maneira substan- tiva (não-literal) e não-arbitrária, a um aspecto rele- vante da estrutura de conhecimento do indivíduo. 46 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Defensor das teorias cognitivas, David Ausubel apresenta, em 1985, a Teoria da Aprendizagem Significativa, que prioriza a organização cognitiva dos conteúdos de forma ordenada. De acordo com Moreira (1998, p.20), “a aprendizagem significativa é um processo por meio do qual uma nova informação relaciona-se, de maneira substantiva (não-literal) e não-arbitrária, a um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo”. Os novos conhecimentos adquiridos relacionam-se com o conhecimento prévio que o aluno possui. Figura 06: David Ausubel Fonte: Disponível em: < http://stefanyopina.blogspot.com/2011/04/david- ausubel-great-contribution-to.html>. Acesso em: 10 ago.2011. Para Ausubel (1990), a aprendizagem significativa esta intimamente ligada aos pontos de ancoragem que são formados com a incorporação, a estruturação cognitiva de conceitos, ideias ou informações que são relevantes para a aquisição de novos conhecimentos, ou seja, para que seja possivel aprender conceitos novos. De acordo com Wallon (1979), a Teoria da Afetividade refere-se à capacidade, à disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo externo/interno por sensações ligadas a tonalidades agradáveis e desagradáveis. A teoria aponta para três momentos: emoção, sentimento e paixão. Teoria da Afeti- vidade refere-se à capacidade, à disposição do ser humano de ser afetado pelo mun- do externo/interno por sensações ligadas a tonalida- des agradáveis e desagradáveis. 47 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 Figura 07: Wallon Fonte: Disponível: < http://gventapane.spaceblog.com.br/r14502/ Portfolio-Geral-IV/>. Acesso em: 01 ago.2011. Atividade de Estudos: 1) Que tal fazer um resumo para compreendermos essas teorias que estudamos até agora. Para isso, elabore uma tabela em que seja possível visualizar todas as teorias de aprendizagem apresentadas neste capítulo. Teoria Autor Ideia principal da teoria Na emoção predomina a ativação fisiológica, no sentimento a ativação representativa e na paixão a ativação do autocontrole. As situações afetivas são prazerosas porque o fluxo tônico se eleva e se escoa imediatamente com movimentos expressivos. Um estado de desequilíbrio ou crise emocional tem impacto direto sobre as ações. Sob o efeito de emoções descontroladas também se perde o comando das ações. As emoções têm um poder de contágio nas interações sociais, evidenciando o seu caráter coletivo, facilmente identificado nos jogos, danças, rituais, em que há simetria de gestos e atitudes, movimentos rítmicos, comunhão de sensibilidade, uma sintonia afetiva que 48 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos mergulha todos na mesma emoção, ou seja, para Wallon (1979), a construção da inteligência está intimamente ligada ao desenvolvimento da afetividade humana. Portanto, a escola deve considerar os níveis de desenvolvimento cognitivo do sujeito envolvido no processo de aprendizagem, procurando compreender os comportamentos e capacidades predominantes em cada etapa, a fim de melhor orientar a ação educativa. É preciso, pois, respeitar as capacidades cognitivas de cada um, bem como as suas necessidades afetivas para que os conhecimentos apresentados sejam assimilados e utilizados pelos alunos. No final década de 1980, Howard Gardner, psicólogo norte- americano, questiona a visão de inteligência (inteligência única, igual para todos) e propõe a Teoria das Inteligências Múltipas. Gardner (1987) afirma que o conceito de inteligência, como tradicionalmente definido em psicometria(QI), não é suficiente para descrever a grande variedade de habilidades cognitivas humanas. Baseado em estudos cognitivistas de Piaget e Vygotsky, afirmava que possuimos diferentes inteligências e que existem pelo menos oito: (linguística) competência de trabalhar palavras, frases e textos; (lógico-matemática) competência para raciocinar de maneira lógica-dedutiva e solucionar problemas; (musical) competência de pensar e reconhecer em termos musicais; (espacial) competência de relacionar padrões, perceber similaridades nas formas espaciais, relacioná- las e poder visualizá-las no espaço tridimensional; (corporal-cinestecica) competência que permite utilizar, controlar e manipular o corpo para resolver problemas ou produzir conceitos, ideias e objetos; (interpessoal) competência de compreender e relacionar-se com os outros; (intrapessoal) capacidade de se conhecer, de estar bem consigo, de conhecer seus limites, desejos, medos e saber administrar os sentimentos; (naturalista) capacidade relacionada à sensibilidade humana e ao entendimento frente ao meio ambiente. As inteligências podem se desenvolver mediante estimulação do contexto social e em particular da escola.Todos nascem com essas inteligências, mas a maneira como elas vão combinar-se ou desenvolver-se varia de pessoa para pessoa. Outro item importante é que as inteligências formam um conjunto de habilidades que interagem, ou seja, não podem ser medidas porque não existe uma inteligência única e, também, porque elas podem ser desenvolvidas ao longo da história de vida de cada pessoa. Portanto, o autor vislumbra uma educação escolar de desenvolvimento das Gardner (1987) afirma que o conceito de inteligência, como tradicionalmen- te definido em psicometria(QI), não é suficiente para descrever a grande variedade de habilidades cognitivas huma- nas. 49 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 várias inteligências, bem como auxilia o aluno a encontrar seu próprio equilibrio e potencialidades no aspecto de suas competências e, para que isso ocorra, é necessário que o professor faça trabalhos e atividades interdisciplinares. Vamos aprofundar as nossas leituras sobre a “Teoria da Aprendizagem”, a seguir, apresentamos vários livros que poderão aprofundar os seus estudos!!! LAKOMY, Ana Maria. Teorias cognitivas da aprendizagem. Curitiba: IBPEX, 2008. MOREIRA, Marco Antônio. Aprendizagem significativa. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. SANTOS, Boaventura Souza. Um discurso sobre a ciência. Porto: Afrontamentos, 2007. VYGOTSKY, L. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2002. VASCOCELOS, José Antônio. Fundamentos Epistemológicos da História. Curitiba: IBPEX 2009. Olá pós-graduandos, além das bibliografias apresentadas anteriormente e ao final deste capítulo, temos a internet uma excelente ferramenta de pesquisa, porém precisamos consultar sites confiáveis. http://www.scielo.br/pdf/ci/v33n3/a05v33n3.pdf http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n27/n27a01.pdf h t t p : / / w w w . s c i e l o . b r / s c i e l o . p h p ? p i d = S 0 1 0 0 - 15742002000300004&script=sci_arttext http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516- 44462004000300014&nrm=iso&tlng=pt 50 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos http://www.scielo.oces.mctes.pt/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1645-72502009000100012&nrm=iso&tlng=ptSinopse O filme aborda um dialogo de três pessoas que embora tenham estilos de vida e pensamentos diferentes, são abertas a novas ideias. O diálogo dos personagens acontece em um castelo medieval na França. Essas pessoas são americanas e fazem parte de núcleos sociais diferentes. O primeiro ator é um senador e ex-candidato à presidência da república (político). Ele se sente desmotivado com a política, argumenta não ter discurso próprio, tendo que repetir os discursos que seus assessores escrevem ou dizer o que as pessoas querem ouvir. O segundo ator é um professor de literatura e escritor (poeta) que se sente na crise de meia idade. Ele veio para a França para fugir da competitividade das grandes cidades. A terceira é uma cientista, especialista em Física, que vive uma crise existencial ao ver a intenção do uso militar de sua pesquisa. O político frustrado com a visão de política dos EUA, liga para o amigo (poeta) que mora na França e seu amigo acaba oferecendo uma estadia para ele, a fim de fazê-lo esquecer um pouco da sua rotina. Ao chegar à França, os dois amigos vão visitar um castelo medieval. Lá, eles encontram a cientista em uma sala onde se encontra um imenso relógio antigo, que se torna o ponto inicial de toda discussão. A cientista é convidada a entrar na conversa que o poeta e o político estão tendo sobre o relógio. Logo que ela entra na conversa, faz uma dura crítica sobre a maneira cartesiana com que os políticos, de modo geral, veem a natureza. Ela afirma que os políticos descrevem a natureza assim como Descartes descrevia, como um relógio que pode ser reduzido a um monte de peças e analisada cada parte, é possível entender o todo. Ela crítica, dizendo que essa ideia é antiga e ultrapassada e que devemos mudar essa visão de mundo. O mundo tem que ser visto 51 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 como um todo, através das relações existentes entre cada objeto que compõem a natureza e que fazemos parte dessas relações. A cientista afirma que se devem abrir os horizontes para modelos sistêmicos, escapando do conforto dos processos, dos quais temos o controle, mas muitas vezes, não a compreensão. Não se pode olhar separados os problemas globais, tentando entendê-los e resolvê- los separadamente. Devem-se entender as conexões para depois resolver os problemas. Com isso, consegue-se pensar em um mundo com crescimento sustentável, com melhores condições para todos. O político discute e até aceita algumas ideias da cientista, mas a grande questão que ele aponta é: como concretizar essas ideias na política, como fazer com que as pessoas (os eleitores) consigam entender. A resposta da cientista é simples: Mudando nossa maneira de ver o mundo. Nessa resposta se consegue percebe a transversalidade da educação ambiental e a importância de ser discutida em redes de ensino interdisciplinarmente, sendo trabalhada como uma grande teia ligada a diferentes disciplinas, a fim de analisar um fenômeno. Fonte: CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. [s. l.] : Lintschinger : CONHEN, [19--]. 1 video-cassete (106min), color, SP. Padrão de cor: NTSC Quem Somos Nós? Amanda (Marlee Matlin) está numa fantástica experiência ao estilo “Alice no País das Maravilhas” enquanto seu monótono cotidiano começa a se desmanchar. Esta situação revela o incerto mundo escondido por trás daquilo que se costuma considerar realidade. Amanda mergulha num turbilhão de ocorrências caóticas que revelam um profundo e oculto conhecimento do real. Ela entra em crise e questiona o sentido da existência humana. Fonte: ARNTZ, William; CHASSE, Betsy; VICENTE, Mark. Quem somos nós: uma nova evolução = What the bleep do we know?. [s.l.] : Playarte Home Vídeo, 2006. 1 DVD (150min.), color, SP. 52 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Atividade de Estudos: 1) De acordo com o professor Contreras (2002), a ideia básica do modelo da racionalidade é que a prática profissional consiste na solução instrumental de problemas mediante a aplicação de um conhecimento teórico e técnico, esse conhecimento, segundo o autor é originário da: (A) Vida cotidiana. (B) Pesquisa científica. (C) Debates em sala de aula. (D) Nenhuma das alternativas. 2) O modelo o qual concebe o ensino e a aprendizagem como veículos para promoção de maior igualdade, humanidade e justiça social na sala de aula, na escola e na sociedade é denominado de: (A) Emancipatório. (B) Ecológico crítico. (C) Sócio-reconstrucionista. (D) Nenhuma das alternativas. 3) De acordo com a pesquisadora Lakomy (2008), o processo de aprendizagem tem sido estudado, de modo direto ou indireto, por teóricos que se dividem em dois grupos: (A) Comportamentais e cognitivistas. (B) Cognitivistas e interacionistas. (C) Behavioristas e comportamentais. (D) Nenhuma das alternativas. 4) Defensor das teorias cognitivas, David Ausubel apresenta, em 1985, a Teoria: (A) Instrução. (B) Afetividade. (C) Inteligências múltiplas. (D) Aprendizagem significativa. 53 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 Algumas Considerações O modelo de racionalidade técnica científica que preside a ciência moderna constitui-se a partir da revolução científica do século XVI. Segundo o sociólogo Santos (2007), as consequências desse modelo de racionalidade para o campo das ciências sociais são bastante conhecidas, a cristalização da divisão do conhecimento em campos especializados; a fixação dos territórios disciplinares nos diferentes níveis de ensino; a justificação da hierarquização dos que pensam e os que executam; os produtores e os consumidores de saberes. Neste modelo, o professor é visto como um técnico, um especialista que rigorosamente põe em prática as regras científicas ou pedagógicas, assim, para se preparar o profissional da Educação, o conteúdo científico ou pedagógico é necessário, o qual servirá de apoio para sua prática. Baseadas na racionalidade técnica científica predominaram três concepções na educação. De acordo com Pereira (2002), há o modelo de treinamento de habilidades comportamentais, para os professores desenvolverem habilidades específicas e observáveis; o modelo de transmissão, no qual o conteúdo científico e ou pedagógico é transmitido ao professor, geralmente ignorando as habilidades da prática de ensino; o modelo acadêmico tradicional, o qual assume que o conhecimento disciplinar e ou científico é suficiente para o ensino-aprendizagem. Dentre os modelos alternativos que foram contrários à racionalidade técnica científica ganhou força no Brasil aqueles inspirados na racionalidade prática, incorporados nos debates acadêmicos e nas formulações e ações políticas educacionais. As críticas ao modelo da racionalidade técnica científica proveniente da nova visão, denominada racionalidade prática, recorrente no debate acadêmico e nas pesquisas acadêmicas, sobre formação e fundamentos da educação e do professor, contagiaram os projetos e movimentos educacionais, os formuladores e gestores de políticas públicas do Brasil. Dentro da EJA também não foi diferente, os movimentos originários nos grandes centros em que a educação era reivindicada como direito humano, era baseada, sobretudo, em uma abordagem mais humanista e prática. Podemos colocar que alguns momentos da aplicação, por exemplo, do método Paulo Freire na EJA foi uma opção da racionalidade prática e, outros momentos, mais dentro da racionalidade crítica. Nesse contexto de contestação, dos modelos tradicionais é importante destacar aqueles inspirados na racionalidade crítica. Dentro da abordagem epistemológica como elemento presente na fundamentação da Educação, destacamos outras duasconcepções de ciência e ensino-aprendizagem que são as bases das racionalidades presentes nos projetos, cursos, movimentos, entre outros. De acordo com Vasconcelos (2009), 54 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos além da teoria do conhecimento baseada no pensamento positivista, encontramos presente na educação o materialismo dialético, o sistema filosófico denominado fenomenologia. O materialismo dialético é uma corrente filosófica baseada nas ideias de dois pensadores alemães do século XIX, Karl Marx e Friedrich Engels. Esses pensadores caracterizavam-se como socialistas ao buscarem soluções para os problemas sociais trazidos pelo desenvolvimento da sociedade industrial. Contudo, diferentemente dos socialistas utópicos, Marx e Engels insistiam que a superação do sistema capitalista e das desigualdades sociais decorrentes só se efetuaria a partir das lutas de classe. Do ponto de vista epistemológico, o conceito mais importante do materialismo dialético é o de ideologia. Trata-se, porém, de um termo ambíguo, pois tanto pode significar uma falsa consciência quanto uma visão de mundo que caracteriza uma determinada classe social, não colocando o termo como falso ou verdadeiro. O materialismo dialético é importante para a constituição da fundamentação teórica e prática da educação porque apresenta as condições materiais, a estrutura econômica da sociedade como determinante de todos os aspectos da vida social. Dentro das muitas propostas encontradas no Brasil referente à EJA, é forte a presença do materialismo dialético nas bases que fundam essas propostas. A teoria fenomenológica consiste em uma tradição filosófica inaugurada pelo pensador alemão Edmund Husserl. Na primeira metade do século XIX, afirmava que o ato do conhecimento é individual e subjetivo e o objeto do conhecimento não. Outro pensador que se vinculou a fenomenologia foi Jean Paul Sartre, que afirmava que a existência procede à essência humana, o que implica compreender o ser humano como alguém em sua relação com o mundo que se faz a si mesmo por meio de suas escolhas. Os autores ligados à fenomenologia têm como foco de suas reflexões a noção de um sujeito que não pode ser entendido fora da relação com o mundo que o cerca, assim, o mundo no qual o sujeito se relaciona não é um mundo feito somente de coisas, mas também de outros sujeitos. A intersubjetividade implicada na relação com o mundo torna-se, assim, ponto de partida para interpretar as questões sociais tão caras a Educação. Paulo Freire incorporou, em diversas obras, essa concepção de ser no mundo que possibilita sua liberdade a partir de suas escolhas conscientes. Teorias de aprendizagem se relacionam a um conjunto de enfoques e perspectivas teóricas que procuram oferecer explicações gerais sobre os elementos e fatores envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Essas teorias, de certa maneira, permitem uma reflexão sobre a prática docente em sala de aula, de forma que o professor seja capaz de identificar e utilizar as técnicas e os conceitos mais adequados para estimular o processo de ensino-aprendizagem, tendo em vista cada situação. 55 Fundamentos Teóricos e Práticos da Educação de Jovens e Adultos Capítulo 2 Segundo Skinner (2000), o melhor método de ensinar seria um método mecânico, isto é, o ensino programado em passos muitos pequenos, diante dos quais o aluno envolvido com a aprendizagem deve responder constantemente, com o objetivo de receber os reforços necessários e, assim, reduzir os erros e, também, o uso de máquinas para corrigir de imediato as respostas “erradas” dos alunos. Estas máquinas devem apresentar sistematicamente o conteúdo de ensino, seguindo uma lógica e apresentando dificuldades crescente. De acordo com a pesquisadora Lakomy (2008), para os teóricos cognitivistas, a maturação biológica, o conhecimento prévio, o desenvolvimento da linguagem, o processo de interação social e a descoberta da afetividade são fatores de grande relevância no processo de desenvolvimento da inteligência e aprendizagem. Os dois maiores expoentes desta teoria seriam o suíço Jean Piaget (1896- 1980) e o russo Lev Semynovitc Vygotsky (1886-1934). Piaget foi idealizador do construtivismo psicogenético, que tem um importante conceito dentro das teorias da aprendizagem. De acordo com Piaget (1997), se as estruturas disponíveis são suficientes para operar com novas situações, então, ocorre a equilibração majorante, esse processo envolve dois mecanismos intermediários para que ocorra a construção da inteligência do indivíduo. A assimilação e a incorporação de novos conhecimentos ou informações; a estrutura intelectual e a acomodação, que seria a reorganização da estrutura mental para que o sujeito possa incorporar os novos conhecimentos. Quando a assimilação e a acomodação ocorrem simultaneamente, é possível a adaptação a novas situações. Howard Gardner, psicólogo norte-americano, questiona a visão de inteligência (inteligência única, igual para todos) vigente e propõe a Teoria das Inteligências Múltiplas. Gardner (1987) afirma que o conceito de inteligência, como tradicionalmente definido em psicometria(QI), não é suficiente para descrever a grande variedade de habilidades cognitivas humanas. Baseado em estudos cognitivistas de Piaget e Vygotsky, afirmava que possuimos diferentes inteligências e que existem pelo menos oito. 56 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Referências Bibliográficas AUSUBEL, David P. Psicologia Educacional. Rio de Janeiro: Interamericana, 1990. BRUNNER, J. Atos de significação. Porto Alegre: Artmed, 1997. CONTRERAS, J. Autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002. FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. 24. ed. atual. São Paulo: Cortez, 1995. GAMBOA, Silvio Sanchez. Pesquisa em Educação: métodos e epistemologias. Chapecó: Argos, 2002. LAKOMY, Ana Maria. Teorias cognitivas da aprendizagem. Curitiba: IBPEX, 2008. MOREIRA, Marco Antônio. Aprendizagem significativa. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. PEREIRA, J.E.D. A pesquisa na formação e no Trabalho docente. Belo Horizonte: Autentica 2002. PIAGET, Jean; GRECO, Pierre. Aprendizagem e conhecimento. Rio de Janeiro : Freitas Bastos, 1997. 236 p. (Biblioteca universitária Freitas Bastos).SANTOS, Boaventura Souza. Um discurso sobre a ciência. Porto: Afrontamentos, 2007. SILVA, Marcos. Entre a formação básica e a pesquisa acadêmica. Campinas: Papirus, 2007. SKINNER, F. Sobre o behaviorismo. São Paulo: Cultrix, 2000. ROMANOWSKI, Joana Pauli. Formação e profissionalização docente. Curitiba: IBPEX, 2008. VYGOTSKY, L. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2002. VASCONCELOS, José Antônio. Fundamentos Epistemológicos da História. Curitiba: IBPEX 2009. WALLON, H. Do ato ao pensamento. Lisboa: Moraes, 1979. CAPÍTULO 3 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer e analisar as teorias curriculares que atuam na construção teórico-prática do currículo na Educação de Jovens e Adultos no Brasil. 3 Identificar as correntes teóricas que influenciam a construção do currículo e seus reflexos no processo ensino- aprendizagem e na relação com os sujeitos. 58 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos 59 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos Capítulo 3 Contextualização A discussão sobre o conhecimento (já abordada no capítulo anterior) implica uma tomada de posição em relação ao que se entende por Currículo (haja vista que ele é um dos três mais importantes elementos constituidores da fundamentação teórica e prática da educação)e, assim, há diferentes caminhos a serem seguidos. Podemos começar pela etimologia da palavra currículo. Encontramos em Goodson (1995) ou Tadeu da Silva (2002) as discussões sobre etimologia, epistemologia e o emergir do currículo, em que os autores citados observam que a palavra currículo vem da palavra latina scurrere-correr e se refere a curso ou carro de corrida. As implicações etimológicas são que o currículo é definido como um curso a ser seguido ou, mais especificamente, apresentado. De fato, a análise leva a concluir que ao associar currículo a pista de corrida, fica-se limitado a uma visão que o toma como rota, trajetória, um curso a ser realizado, etapas, padrões. Em certo sentido, ele está reduzido a um programa, uma proposta de conteúdos e metodologias. Essa visão, ainda muito presente na educação brasileira, apresenta a ideia de currículo com algo identificável, que tem existência própria, naturalizado, que tem a pretensão de formar os sujeitos em consonância direta com o que está proposto, mesmo considerando pertinente essa possibilidade de se entender currículo. Sacristán (1997) pensa que o currículo na educação pressupõe, então, viver seu cotidiano, que inclui, além do que é formal e tradicionalmente estudado, aprendido, ensinado, toda uma dinâmica de relações estabelecidas no cotidiano. Uma coisa é entender o currículo como uma intenção, um plano ou uma prescrição que desejaríamos que ocorresse nas escolas, na educação e outra é o que existem nelas, o que realmente ocorre em seu interior. Nesse sentido, é possível pensar o currículo como cultura real, que surge de uma série de processos, mais que como objeto delimitado e estático, que se pode planejar e depois implantar. Currículo seria, então, tudo aquilo que ocorre na escola ou que está em relação com ela. Passaremos a estudar, a partir de agora, para melhor compreensão da temática estudada, a gênese, organização e desenvolvimento das diversas Teorias do currículo existentes e suas relações com a EJA. 60 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Teorias do Currículo: tradicional Caro(a) pós-graduando(a), antes de iniciarmos a nossa caminhada pelas teorias do currículo, convidamos você a refletir sobre dois aspectos muito importantes: como eram as suas aulas na escola regular e como é a sua prática pedagógica. Atividade de Estudos: 1) Descreva com eram as aulas que você frequentou na escola básica no perído em que era aluno. Quanto maior for o detalhamento, melhor será a nossa reflexão. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Descreva uma aula em que você atua como professor, pode ser tanto da Educação de Jovens e Adultos como da escola Regular. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Você percebeu alguma selhança entre a sua vivência de aluno e a de professor? A partir de agora iremos conversar um pouco sobre a teoria do currículo e, ao final deste capítulo, convidamos você a reler suas respostas e verificar qual concepção de currículo está presente tanto na resposta da primeira questão como da segunda. De acordo Silva (2002), as normas metodológicas e as estratégias a serem privilegiadas na educação devem levar em consideração o incentivo ao estudo individualizado para a memorização de regras básicas e procedimentos técnicos do campo de estudo. Elas caracterizam aquela teoria conhecida como Teoria Tradicional de Currículo. As normas meto- dológicas e as es- tratégias a serem privilegiadas na educação devem levar em conside- ração o incentivo ao estudo indivi- dualizado para a memorização de regras básicas e procedimentos técnicos do campo de estudo. 61 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos Capítulo 3 Assim, a base de produção taylorista/fordista pode ser identificada também no contexto educacional, sobretudo, no domínio da teoria curricular tradicional. As propostas curriculares desta base correspondem às demandas educacionais por meio de uma ação pedagógica que atenda a divisão social e técnica do trabalho, delimitada pelas fronteiras entre as ações intelectuais e instrumentais presentes no sistema produtivo; que privilegie ora a racionalidade formal, ora a racionalidade técnica, centrando o trabalho educacional nos conteúdos e nas atividades; que esteja baseada em uma proposta curricular distribuída em disciplinas do conhecimento, com conteúdos organizados de forma sequencial. Dentre os vários aspectos que compõem a Teoria Curricular Tradicional, podemos dizer que a didática instrumental está interessada na racionalização do ensino, no uso de técnicas mais eficazes, em que o professor é um executor do planejamento (tecnicismo). Muito provavelmente, a palavra currículo aparece pela primeira vez como um objerto específico de estudo no livro de Bobbit, The Curriculum (1918), que representava as ideias de um grupo que pesquisava, nos Estados Unidos, as conexões existentes entre os processos de industrialização e migração, que intensificavam a massificação da escolarização. A partir dessa análise, foram feitos diversos esforços para racionalizar o processo de construção, desenvolvimento e testagem de currículo. Além dessa teoria, Bobbitt desenvolveu conceitos acerca do currículo. De acordo com Tadeu da Silva (2002), um desses conceitos foi o de que o currículo é simplesmente uma forma maquinaria ou mecânica de produzir conhecimentos. A atividade supostamente científica do especialista em currículo não passa de uma atividade burocrática. Nesse contexto, seja na educação, seja na indústria, estabelecem-se padrões, pois acaba com as variação de opiniões existentes e, além disso, as atividades ficam mais rápidas. Portanto, o currículo para Bobbitt (1918) é uma questão meramente técnica. Na obra de Tadeu da Silva (2002), o autor escreve que o currículo Tradicional se divide em partes. Entre elas estão o currículo tradicional: tecnocrático, progressista e clássico. O tecnocrático destacava a abstração e a suposta inutilidade das habilidades e conhecimentos cultivados pelo currículo clássico. O modelo progressista atacava o clássico por seu distanciamento dos interesses e das experiências das crianças e dos jovens. O currículo clássico só pôde sobreviver no contexto de uma escolarização secundária de acesso restrito à classe dominante. Porém, a partir da década de 1970, esses modelos começaram a ser questionados pelo movimento chamado “reconceptualização do currículo”. Teoria Curricu- lar Tradicional, podemos dizer que a didática instrumental está interessada na racionalização do ensino, no uso de técnicas mais eficazes, em que o professor é um executor do planejamento (tecnicismo). O currículo clássico só pôde sobreviver no contexto de uma escolarização secundária de acesso restrito à classe dominante. 62 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Na Teoria Tradicional, o currículo é aquilo que já afirmamos na introdução deste capítulo, algo escrito que deve ser posto em prática, com organização e método eficaz, puramente técnico, não importando a vida, os próprios sujeitos e suas relações com os outros envolvidos no processo e como essas teias de relações são significativas para que o ensino e a aprendizagemocorram. Figura 08 - Conceito chaves da Teoria Tradicional Fonte: Baseado em Silva (2002, p.17). Teorias do Currículo: crítica Como você percebeu, tradicionalmente, o conceito de Currículo limitava-se a nada mais do que uma lista de conteúdos que deveriam ser ministrados na escola. Só na década de 1960 é que foi possível compreender melhor a legitimidade desta lista ou porque ela se estabeleceu por tanto tempo para os educadores e educadoras como algo definido e estático que deveria ser seguido sem questionamentos. Hoje, sabe-se que o importante não é desenvolver técnicas de como fazer o Currículo, mas desenvolver conceitos que permitam compreender os efeitos que ele produz. De acordo com Apple (2000), o Currículo nunca é simplesmente uma montagem neutra de conhecimentos, que de alguma forma aparece nos livros e nas salas de aula de um país. Sempre parte de uma tradição seletiva, da seleção feita por alguém, da visão que algum grupo tem do seja o conhecimento legítimo, ou seja, ele é produzido pelos conflitos, tensões e compromissos culturais, políticos e econômicos que organizam e O Currículo sem- pre parte de uma tradição seletiva, da seleção feita por alguém, da visão que algum grupo tem do seja o conhecimento le- gítimo, ou seja, ele é produzido pelos conflitos, tensões e compromissos culturais, políticos e econômicos que organizam e desorganizam um povo, resultando na dinâmica da reprodução social que se dá por meio de diferen- tes processos culturais. 63 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos Capítulo 3 desorganizam um povo, resultando na dinâmica da reprodução social que se dá por meio de diferentes processos culturais. Segundo Bourdieu (1998), isto é explicado ao considerarmos que a cultura que tem prestígio e valor social é justamente a cultura das classes dominantes: seus valores, seus gostos, seus costumes, seus hábitos, na medida em que vale alguma coisa, ela se constitui como capital cultural. Essa ideia permite à classe dominante definir sua cultura como “a” cultura e, assim, através da imposição e ocultação, acaba por aparecer como algo natural, chamado de dupla violência do processo de dominação cultural. De certa forma, estes questionamentos vão permitir o surgimento da Teoria Crítica do Currículo, cujas premissas negam a neutralidade e afirmam os conceitos de ideologia e poder. De acordo com o professor Tadeu da Silva (2002), com as transformações e agitações geradas por diversos movimentos de raízes social e cultural, durante a década de 1960, a conceptualização do currículo tornou-se alvo de uma profunda revisão. As teorias críticas consideravam as teorias tradicionais como promotoras de aceitação, de desigualdade social, de reprodução social e de letargia intelectual. Em oposição, acreditavam num currículo que permitisse compreender o que este faz, que promovesse o pensamento crítico através do questionamento e outra transformação do indivíduo, diferente daquela que era imposta pelas teorias tradicionais. A partir de 1970, Althusser despertou uma nova forma de interpretar a realidade de então ao afirmar que a escola operava como um aparelho ideológico do Estado, no qual a ideologia acolhida pertencia à classe dominante, fazendo com que a escola se tornasse o alvo, mas também o local da luta de classes. Assim, o poder que a escola tem deve-se à sua capacidade de reprodução das relações de produção. Por exemplo, a escola educa segundo a ideologia do poder político que está governando, pois, desse modo, assegura que os seus cidadãos irão ao encontro das convicções políticas do Estado. No início da escolaridade, as crianças são submetidas a saberes práticos (matemática, história, ciências) e, com a ascensão escolar, grande parte dos alunos sai da escola para ocupar lugares de produção (operários), enquanto a outra parte vai evoluir até conseguir preencher os quadros médios e outros até os graus superiores, tornando-se agentes repressivos ou profissionais da ideologia. A escola tem como função garantir a incorporação psicológica ao estudante de certas atitudes que são requeridas aos trabalhadores capitalistas. Assim, para A escola tem como função garantir a incorporação psicológica ao estudante de cer- tas atitudes que são requeridas aos trabalhadores capitalistas. 64 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos os futuros trabalhadores considerados subordinados, as atitudes que deveriam perfilar seriam a obediência a ordens, pontualidade, assiduidade, confiabilidade, enquanto para os futuros trabalhadores dominantes, as atitudes admissíveis seriam a capacidade de comandar, de formular planos, de conduzir-se de forma autônoma. É preciso fazer uma distinção entre, de um lado, as teorizações críticas gerais e, de outro, aquelas mais localizadas em questões de currículo. A partir do quadro abaixo, refletiremos sobre essa distinção. Quadro 1 - Cronologia dos marcos fundamentais da Teoria Crítica. Ano Autor Obra 1970 Paulo Freire Pedagogia do Oprimido 1970 Louis Althusser A Ideologia e os Aparelhos Ideológicos do Estado 1970 Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron A Reprodução 1971 Baudelot e Establet Lécole capitalist em France 1971 Basil Bernstein Class, codes and control 1971 Michael Young Knowledge and control 1976 Samuel Bowles e Herbert Gints Schooling in capitalist America 1976 Willian Pinar e Medeline Grumet T oward a poor curriculum 1979 Michael Apple Ideologia e currículo Fonte: Silva (2002, p. 30). Considerado por muitos como um desencadeador da crítica neomarxista sobre o currículo de matriz tradicional, Tadeu da Silva (2002) cita que Michael Apple parte das críticas marxistas sobre a sociedade para desenvolver estudos que acabaram por colocar o currículo no centro das teorias curriculares críticas, focalizando a crítica ao currículo e ao conhecimento escolar, não vinculando a relação entre a dinâmica econômica e a dinâmica educacional e utilizando o conceito de hegemonia para direcionar a atenção para a dimensão social com a intenção de sustentar a ideia de que a classe dominante serve-se constantemente da sua supremacia sobre a classe dominada, visto que as estruturas econômicas são insuficientes para influenciar a sua consciência. Assim, o currículo não se reduz à forma como é organizado o conhecimento, mas à forma como este é escolhido e selecionado com base nos interesses particulares e nas relações de poder implícitas. A escola, para Apple (2000), tinha a função de produtora de conhecimento técnico com a finalidade de se aproximar às necessidades da sociedade capitalista e, assim, O currículo não se reduz à forma como é organi- zado o conhe- cimento, mas à forma como este é escolhido e sele- cionado com base nos interesses particulares e nas relações de poder implícitas. 65 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos Capítulo 3 perpetuar o processo de reprodução social e cultural. Segundo Tadeu da Silva (2002), Henry Giroux diverge amplamente de Michael Apple no modo como analisa o currículo. Aquele apresenta uma análise de caráter mais cultural do que educacional, alicerçada nos conceitos da Escola de Frankfurt no que respeita a emancipação e a libertação do Homem. Ao analisar as perspectivas apresentadas até então, percebeu algumas variáveis que não foram devidamente ponderadas, tais como, a falta de espaço para a ação e para a mediação do Homem no processo educacional e social e a ênfase no domínio das classes dominantes sobre a cultura. A emancipação para o pensamento crítico de Giroux pretendia conscientizar as pessoas para a existência de controle, desigualdades e poder inerentes ao currículo. Dessemodo, ele defendia que os professores deveriam assumir o papel de transformadores dos alunos através da participação ativa destes, cujos desejos, ambições e pensamentos, que outrora se pretendiam suprimidos, seriam considerados de modo a exercerem um comportamento verdadeiramente democrático. A visão de Giroux acerca do currículo é sustentada pelo que ele denominava de “política cultural”, na qual o currículo visava à produção de significados que eram disputados e contestados pelos intervenientes. Por sua vez, conforme cita Tadeu da Silva (2002), o currículo visto como a forma de construir a sociedade foi desenvolvido por Michael Young em sua “Nova Sociologia da Educação” (NSE), na qual a sua atenção se dirigia à forma como os alunos processavam o conhecimento e não como este era processado nos alunos. Numa perspectiva mais ampla, a NSE pretendia encontrar as relações entre a forma como estava organizado e selecionado o currículo em função do poder e da sua distribuição, através da busca das razões para os quais certas disciplinas são mais prestigiadas do que outras. A NSE de Young pretendia um currículo que espelhasse as tradições culturais e epistemológicas das classes dominadas, afrontando as formas estabelecidas de atribuição do prestígio no campo social e cultural. Dessa forma, o conhecimento inerente ao currículo pretendia centrar-se na ideologia da construção social. Para Basil Bernstein (apud SILVA, 2002), o currículo continha implicitamente um código (elaborado e restrito) que favorecia evidentemente os alunos das classes dominantes no processo de reprodução cultural, agravado pela pedagogia invisível e que remetia os alunos das classes dominadas ao insucesso. Assim, desafiava as escolas a refletirem sobre o seu papel no processo de reprodução social e cultural. As teorias críticas repudiavam a utilização do conhecimento, que deveria centrar-se na sua validade e natureza científica, como um instrumento que serve os poderes políticos e econômicos e que os processos de transformação 66 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos social, proporcionados pelo currículo, deveriam ser acompanhados de valores universais que visassem a um compromisso ético. De modo sucinto, as teorias críticas consideravam o currículo como sendo uma extensão de poder que possuía uma forte influência capitalista no processo de reprodução social e cultural, bem como servia de aparelho ideológico do Estado ao transmitir a ideologia dominante às classes dominadas com a finalidade de as convencer de que a organização social capitalista era a melhor e a mais desejada. Em seu conjunto, esses autores e seus textos formam a base da teoria educacional crítica, depois dele, a teoria curricular seria radicalmente modificada. A seguir, a Figura 2 apresenta os conceitos mais usados nesta teoria. Figura 2 - Conceito chaves da Teoria Crítica Fonte: Baseado em Silva (2002, p. 17). Teoria do Currículo: Pós- Crítica As teorias pós-críticas surgem após as teorias críticas, abordadas anteriormente, e estão centradas na multiculturalidade do currículo, na qual a cultura dominante reparte o predomínio e difunde-se em manifestações culturais oriundas dos meios de comunicação de massa, que se têm revelado “um dos mais poderosos instrumentos de homogeneização”. O multiculturalis- mo desencadeou diferentes visões sobre o currí- culo ao insurgir fortes críticas por parte dos grupos dominados, como os negros, os homossexuais e as mulheres que reivindicavam a participação da sua cultura no currículo. 67 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos Capítulo 3 De acordo com Tadeu da Silva (2002), o multiculturalismo desencadeou diferentes visões sobre o currículo ao insurgir fortes críticas por parte dos grupos dominados, como os negros, os homossexuais e as mulheres que reivindicavam a participação da sua cultura no currículo. Assim, numa perspectiva humanista, o currículo integrou ideias de tolerância, respeito e convivência harmoniosa entre as culturas, colocadas permanentemente em questão. Para harmonizar as relações entre os diversos grupos sociais e culturais, estas teorias pós-críticas sugeriram valores universais: que se valorizassem às diferentes culturas dos diferentes grupos sociais. Nesse seguimento, a igualdade ao acesso à educação é uma prioridade sem que seja esquecida a reflexão e o ajustamento do currículo hegemônico para uma autêntica igualdade. Ainda de acordo com o professor Tadeu da Silva (2002), outra visão sobre o currículo era a sustentada pela teoria “queer”: CONHECENDO A TEORIA QUEER Teve origem nos Estados Unidos, em meados da década de 1980, a partir das áreas de estudos gay, lésbicos e feministas, tendo alcançado notoriedade a partir de fins do século passado. Fortemente influenciada pela obra de Michel Foucault, a teoria queer aprofunda nas críticas feministas à ideia de que o gênero é parte essencial do ser individual e as investigações de estudos gays/lésbicos sobre o constructo social relativo à natureza dos actos sexuais e das identidades de gênero. Enquanto os estudos gays/lésbicos se centravam na análise das classificações de “natural” ou “contra- natura” em relação aos comportamentos homossexuais, expande o âmbito da análise para abranger todos os tipos de actividade sexual e de identidade classificados como “normativos” ou “desviantes”. O autor acrescenta ainda que surgiu com um currículo que pretendia pressionar ao limite os conhecimentos pertencentes ao currículo dominante, pois acreditava que desta forma seria possível explorar aquilo que ainda não foi construído fechado o ciclo da pedagogia crítica que dá lugar à pedagogia pós crítica, que desconfiava dos impulsos de emancipação, que na sua perspectiva continha o desejo de controle e domínio do conhecimento moderno, o pós- estruturalismo surge com a finalidade de criticar o currículo fazendo uma pergunta muito representativa daquilo que pretende tratar: “onde, quando, por quem foram eles inventados?” na qual pretendia provocar a reflexão das divisões curriculares para as diferentes áreas do conhecimento, bem como na forma como é visto o sujeito dito 68 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos autônomo, racional, centrado e unitário. Fonte: Disponível em: http://psicogenero.blogspot.com/2011/04/mais- definicoes-em-transito-teoria.html. Acesso em: 10 jun. 2011. As teorias pós-críticas pretendem produzir uma análise mais vasta sobre o currículo, que não se resume às meras relações econômicas do capitalismo e à centralização no Estado, mas que consiste na existência de vários centros de poder que o influenciam e que se encontram dispersos na sociedade. Exemplos disso são os meios de comunicação de massa que promovem a diversidade cultural, que integram os processos de dominação centrados na raça, na etnia, no gênero e na sexualidade. Estas teorias enaltecem o currículo como um importante meio formativo dos cidadãos que, apesar de não promover o seu processo de emancipação, molda a sua identidade e serve de caminho orientador na sua formação ao longo da vida, pois o currículo não é nem inocente nem neutro em relação aos diversos poderes. Apesar de possuírem perspectivas diferentes sobre o currículo, ambas as teorias tanto a crítica como a pós-crítica, mostram que é uma questão de saber, identidade e poder. Estas teorias passam uma forte mensagem de que os professores não devem ficar alheios a estas discussões curriculares, pois devem ser conhecedores das implicações inerentes a temática e, se possível, deverão, acima de tudo, assumir um compromisso ético para com os seus alunos e para com a sociedade. Abaixo, a Figura 3 mostra os conceitos mais usados nesta teoria. Figura 3 - TeoriaPós-Crítica Fonte: Baseado em Silva (2002, p. 17). Apesar de possu- írem perspectivas diferentes sobre o currículo, ambas as teorias tanto a crítica como a pós-crítica, mostram que é uma questão de saber, identidade e poder. 69 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos Capítulo 3 Os principais conceitos usados na Teoria Pós-Crítica serão aprofundados no último capítulo deste caderno de estudos. Se você quiser ampliar seus conhecimentos a cerca das teorias do Currículo, vale à pena conferir os livros indicados a seguir. Atividade de Estudos: 1) Dentre os vários aspectos que compõem a teoria curricular tradicional, podemos dizer que a didática instrumental está interessada na racionalização do ensino, no uso de técnicas mais eficazes. Como é definido o professor nesta teoria? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Na obra de Tadeu da Silva (2002), o autor escreve que o currículo tradicional se divide em algumas partes. Quais seriam elas e o que caracteriza cada uma delas? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 3) O que promoviam as teorias tradicionais de acordo com as teorias críticas? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 4) As teorias pós-críticas pretendem produzir uma análise mais vasta sobre o currículo, que não se resume às meras relações econômicas do capitalismo. Qual é(são) o(s) outro(s) aspecto(s) envolvido(s) nesta análise? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 70 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Vamos aprender mais sobre currículo? Então, busque essas obras apresentadas na sequencia e se inteire do assunto: GOODSON, I. Currículo: teoria e história. Petrópolis: Vozes, 1995. MOURA, Tânia Maria de Melo. Educação de Jovens e Adultos: currículo, trabalho docente, práticas de alfabetização e letramento. Maceió: UFAL, 2008. SACRISTAN, Gimeno. Currículo e Diversidade Cultural. Petrópolis: Vozes, 1997. TADEU DA SILVA, Tomaz. Documentos de Identidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2002 Além de livros, há vários textos teóricos na internet que discutem sobre o currículo, acesse, leia e aprofunde os seus conhecimentos: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73 302000000400004 http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-46982007000100011 &script=sci_arttext http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24 782005000100012 http://pt.scribd.com/doc/520266/TEORIAS-SOBRE-CURRICULO http://www.slideshare.net/lucilapesce/teorias-de-currculo-das- tradicionais-s-crticas 71 O Currículo na Educação de Jovens e Adultos Capítulo 3 Sinopse: É um filme classificado como gênero Drama. O filme é baseado em uma história real, estrelado pela atriz Hillary Swank, que vive a personagem da professora “Erin Gruwell”. A história se passa por volta do ano de 1992, no qual a cidade de Los Angeles vive uma verdadeira guerra nos seus bairros mais pobres, causada por gangues que são movidas pelas tensões raciais. Algumas Considerações As normas metodológicas e as estratégias a serem privilegiadas na educação devem levar em consideração o incentivo ao estudo individualizado para a memorização de regras básicas e procedimentos técnicos do campo de estudo. Esses elementos caracterizam aquela teoria conhecida como Teoria Tradicional de Currículo. Assim, a base de produção taylorista/fordista pode ser identificada também no contexto educacional, sobretudo, no domínio da teoria curricular tradicional. As propostas curriculares desta base correspondem às demandas educacionais por meio de uma ação pedagógica que atenda a divisão social e técnica do trabalho, delimitada pelas fronteiras entre as ações intelectuais e instrumentais presentes no sistema produtivo: privilegie ora a racionalidade formal, ora a racionalidade técnica, centrando o trabalho educacional nos conteúdos e nas atividades; esteja baseada em uma proposta curricular distribuída em disciplinas do conhecimento, com conteúdos organizados de forma sequencial. Dentre os vários aspectos que compõem a teoria curricular tradicional, podemos dizer que a didática instrumental está interessada na racionalização do ensino, no uso de técnicas mais eficazes, em o professor é um executor do planejamento (tecnicismo). As teorias críticas consideravam as teorias tradicionais como promotoras da aceitação, da desigualdade social, da reprodução social e da letargia intelectual. Em oposição, acreditavam num currículo que permitisse compreender o que este faz, que promovesse o pensamento crítico através do questionamento e outra transformação do indivíduo, diferente daquela que era imposta pelas teorias tradicionais. 72 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos As teorias pós-críticas surgem após as teorias críticas, abordadas anteriormente, e estão centradas na multiculturalidade do currículo, na qual a cultura dominante reparte o predomínio e difunde-se com manifestações culturais oriundas dos meios de comunicação de massa, que se têm revelado “um dos mais poderosos instrumentos de homogeneização”. De acordo com Tadeu da Silva (2002), o multiculturalismo desencadeou diferentes visões sobre o currículo ao insurgir fortes críticas por parte dos grupos dominados, como os negros, os homossexuais e as mulheres que reivindicavam a participação da sua cultura no currículo universitário. Assim, num perspectiva humanista, o currículo integrou ideias de tolerância, respeito e convivência harmoniosa entre as culturas, colocadas permanentemente em questão. Para harmonizar as relações entre os diversos grupos sociais e culturais, estas teorias pós-críticas sugeriram valores universais: que se valorizassem às diferentes culturas dos diferentes grupos sociais. Referências APPLE, Michael W. Política Cultural e Educação. São Paulo: Cortez, 2000. BOURDIEU, Pierre. A Reprodução. Petrópolis: Vozes, 1998. GOODSON, I. Currículo: teoria e história. Petrópolis: Vozes, 1995. MOURA, Tânia Maria de Melo. Educação de Jovens e Adultos: currículo, trabalho docente, práticas de alfabetização e letramento. Maceió: UFAL, 2008. SACRISTÁN, Gimeno. Currículo e Diversidade Cultural. Petrópolis: Vozes, 1997. SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de Identidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. CAPÍTULO 4 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Refletir acerca dos principais debates e políticas em torno da Educação de Jovens e Adultos. 3 Ampliar os conceitos e os temas referentes à temática Educação de Jovens e Adultos na atualidade, visando à construção de uma visão educacional crítica e participativa.Contextualização 74 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos 75 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI Capítulo 4 ContextualizaçãoAssisti-se com intensidade crescente a debates em torno da necessidade de reconhecimento das múltiplas etnias, culturas, preferências sexuais, linguagens e outros determinantes presentes nas sociedades contemporâneas. Acontecimentos de ordem mundial têm evidenciado tensões entre movimentos de globalização e aqueles de afirmação étnicos, religiosos e culturais, marginalizados pelo poder. Conferências mundiais têm mostrado a dura face de políticas neoliberais que concentram poderes econômicos e culturais plurais das populações do globo. Ao mesmo tempo, a radicalização de grupos étnicos e culturais, marginalizados economicamente, tem desembocado, não raro, em conflitos armados de proporções gigantescas. Em meio a essas tensões, ganha força o multiculturalismo, movimento teórico e político que busca respostas para os desafios da pluralidade cultural nos campos do saber, incluindo, não somente a educação, como outras áreas que podem contribuir para o sucesso organizacional mundial. Há, também, a questão ambiental em jogo, transformando-se em uma causa cidadã que convoca muitos grupos voluntários em nível local, nacional, regional e global, cuja força política conseguiu, por sua vez, interessar a outros atores sociais relevantes, tais como autoridades locais, parlamentares, camponeses, trabalhadores, industriais, jovens e mulheres, entre outros. No entanto, depois de algumas décadas de ativismo ambiental, percebeu-se que a prática teve pouca, ou muito pouca, relação com a teoria sustentada. Na contradição entre valores defendidos e cotidiano, separam-se a vida dos indivíduos e a das instituições. Não são somente os conhecimentos, as informações e as verdades transmitidas por meio dos discursos ou leis que dão sentido à vida das pessoas. O sentido se tece a partir de cada ser, a partir dos sucessivos contextos nos quais se vive. Nesse sentido, está esquecendo-se, talvez, de que o sentido de se fazer um meio ambiente sadio se constrói em um fazer diário e uma relação pessoal e grupal, por isso, a tomada da consciência ambiental só pode ser traduzida em uma ação efetiva quando segue acompanhada de uma população organizada e preparada para conhecer, entender e exigir seus direitos e exercer suas responsabilidades perante o planeta, que é nossa única morada. Estas discussões são aquelas que se apresentam com mais intensidade em qualquer esfera da sociedade humana. Os desafios étnicos e culturais, bem como as questões ambientais, são tópicos cada vez mais presentes nas agendas do mundo todo em diferentes setores da sociedade. Como já abordamos anteriormente, a Educação se torna um local por excelência para debater, refletir e, quem sabe, proporcionar espaços e atividades em que todos os envolvidos em seus processos possam agir na sociedade, para que estas tão importantes 76 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos questões sejam melhor trabalhadas, analisadas. Passaremos a descrever o desenvolvimento atual dessas temáticas que estão diariamente nas manchetes dos principais meios de comunicação social, na internet, no dia a dia da população e acabam influenciado os currículos escolares. Estudos Culturais Grandes agitações e transformações marcaram o início da década de 1960 como os movimentos de independência das antigas colônias europeias na África e Ásia; os protestos estudantis na França e em vários países do mundo; a luta pelos direitos civis e humanos; os protestos contra a guerra do Vietnã e outras; os movimentos feministas, de libertação sexual, as lutas contras as ditaduras. Não foi por coincidência que surgiram livros, ensaios, pesquisas, teorizações que colocavam em xeque o pensamento, a estrutura social e educacional dita tradicional. Do campo sociológico, essa crítica contra uma sociedade que explora e exclui pessoas e grupos, estendeu-se para outros campos da sociedade, inclusive a educação. Uma das ferramentas sociológicas e educacionais que analisam estes movimentos e reivindicações ficou conhecida como Estudos Culturais. De acordo com os professores Costa e Weiduschat (2008), o campo de teorização e investigação conhecido como Estudos Culturais tem sua origem em 1964, no Centro de Estudos Culturais Contemporâneos, da Universidade de Birmingham, Inglaterra. O impulso inicial do Centro partia de um questionamento de compreensão da cultura dominante ligada às grandes obras e às artes em geral. Essa visão elitista era privilégio de um grupo restrito de pessoas. A reação contra este pensamento surge de Willians (1969), o qual cita que a cultura deveria ser entendida como o modo de vida global de uma sociedade, como experiências humanas. Nesta abordagem, não há diferenças entre grandes obras produzidas pela humanidade ou entre as mais variadas formas pelas quais qualquer grupo humano resolve suas necessidades básicas de sobrevivência. Ainda de acordo com os professores Costa e Weiduschat (2008), os Estudos Culturais possuem em sua agenda temática as questões de gênero e sexualidade, identidade, pós-colonialismo, etnia, cultura popular, ecologia, meio ambiente, políticas de identidade, estética, discurso, textualidade, linguagem, pós-modernidade, multiculturalismo, interculturalidade, globalização, entre outros. Ou seja, aqueles pontos que singularizaram o mundo contemporâneo e que tornaram necessários novos referenciais teórico-metodológicos para a pesquisa sobre cultura. Caracterizam-se, ainda, por sua interdisciplinaridade e diversidade metodológica. Estudos Culturais possuem em sua agenda temática as questões de gênero e sexuali- dade, identidade, pós-colonialismo, etnia, cultura popular, ecologia, meio ambiente, políticas de iden- tidade, estética, discurso, textuali- dade, linguagem, pós-modernidade, multiculturalismo, interculturalidade, globalização, entre outros. 77 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI Capítulo 4 Outra característica seria de que é possível interagir com as práticas políticas, históricas, culturais, sociais, religiosas, educacionais e estão reconhecidos como ferramenta de análise de diferentes áreas, tais como: literatura, educação, história, ciências sociais, entre outras. Na educação latino-americana, os Estudos Culturais começaram a fazer parte somente nos anos 1990. Uma temática bastante debatida, pesquisada e que se encontra na agenda temática dos Estudos Culturais é o multiculturalismo, que será nosso próximo tópico neste capítulo. Atividade de Estudos: 1) Fale sobre a importância dos Estudos Culturais para a formação do currículo da Educação de Jovens e Adultos? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ A seguir, se você quiser conhecer um pouco mais sobre a identidade, e o que discutimos neste capítulo você poderá consultar essas bibliografias: COSTA, Carlos Odilon da; WEIDUSCHAT, Edith. Metodologia e Conteúdos Básicos de História e Geografia. Indaial: ASSELVI, 2008. HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2003. WILLIAMS, Raimond. Cultura e sociedade, 1780-1950. São Paulo: Comp. Ed. Nacional, 1969. 78 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Multiculturalismo O “multiculturalismo” é definido por regras que se estruturam nas lutas sociais através dos atores que experimentam a discriminação e o preconceito no bem-estar da sociedade. Para entendê-lo, é necessário compreender, analisar, contextualizar os contextos históricos associados a uma tomada de consciênciacoletiva, opositora a toda forma de “etnocentrismo”. Ou seja, o fenômeno do multiculturalismo ou diversidade cultural acontece com pessoas de espaços culturais diversos, que são, muitas vezes, obrigadas a relacionar-se e a conviver entre si. Segundo Costa e Weiduschat (2008, p.99), O Multiculturalismo é um movimento teórico e político que busca respostas para os desafios da pluralidade cultural nos campos do saber, incluindo não somente a educação, como também outras áreas que podem contribuir, para a questão do múltiplo, do plural, do diverso, bem como das discriminações e preconceitos a ela associados, que passam a exigir respostas, no caso da educação, que preparem as gerações atuais e as futuras para lidar com as sociedades cada vez mais plurais. As sociedades contemporâneas são heterogêneas, compostas por diferentes grupos humanos, interesses contrapostos, classes e identidades culturais em conflito. Vivemos em sociedades nas quais os diferentes estão quase que permanentemente em contato. Os diferentes são obrigados ao encontro e à convivência. E esta realidade também é encontrada nas escolas. Portanto, as ideias multiculturalistas discutem como podemos entender e até resolver os problemas gerados pela heterogeneidade cultural, política, religiosa, étnica, racial, comportamental, econômica. Stuart Hall (2003, p.56) identifica pelo menos seis concepções diferentes de multiculturalismo na atualidade: 1. Multiculturalismo conservador: os dominantes buscam assimilar as minorias diferentes às tradições e costumes da maioria; 2. Multiculturalismo liberal: os diferentes devem ser integrados como iguais na sociedade dominante. A cidadania deve ser universal e igualitária, mas no domínio privado os diferentes podem adotar suas práticas culturais específicas; 3. Multiculturalismo pluralista: os diferentes grupos devem viver separadamente, dentro de uma ordem política federativa; 4. Multiculturalismo comercial: a diferença entre os indivíduos e grupos deve ser resolvida nas relações de mercado e no consumo privado, sem que sejam questionadas as desigualdades de poder e riqueza; 5. Multiculturalismo corporativo (público ou privado): a diferença deve ser administrada, de modo a que os interesses culturais e econômicos das minorias subalternas não incomodem os interesses dos dominantes; O “multicultura- lismo” é definido por regras que se estruturam nas lutas sociais através dos atores que experimentam a discriminação e o preconceito no bem-estar da sociedade. O Multiculturalis- mo é um movi- mento teórico e político que busca respostas para os desafios da pluralidade cultural nos campos do saber, incluindo não somente a educação. 79 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI Capítulo 4 6. Multiculturalismo crítico: questiona a origem das diferenças, criticando a exclusão social, a exclusão política, as formas de privilégio e de hierarquia existentes nas sociedades contemporâneas. Apóia os movimentos de resistência e de rebelião dos dominados. De certa maneira, os multiculturalismos nos ensinam que respeitar a diferença é reconhecer que existem indivíduos e grupos que são diferentes entre si, mas que possuem direitos correlatos e que a convivência em uma sociedade democrática depende da aceitação da ideia de compormos uma totalidade social heterogênea na qual não poderá ocorrer a exclusão de nenhum elemento da totalidade; os conflitos de interesse e de valores deverão ser negociados pacificamente; a diferença deverá ser respeitada. A política do reconhecimento e as várias concepções de multiculturalismo nos ensinam, enfim, que é necessário que seja admitida a diferença na relação com o outro. Isto quer dizer, tolerar e conviver com aquele que não é como eu sou e não vive como eu vivo e o seu modo de ser não pode significar que o outro deva ter menos oportunidades, menos atenção e recursos. A democracia é uma forma de viver em negociação permanente, tendo como parâmetro a necessidade de convivência entre os diferentes, ou seja, o respeito mútuo. Mas para valorizar a tolerância entre os diferentes temos que reconhecer, também, o que nos une nesse sentido, o eixo conceitual em torno do qual se situam as questões e as reflexões emergentes nesse campo e que caracteriza os mais espinhosos problemas do nosso tempo: a possibilidade de respeitar as diferenças e de integrá-las em uma unidade que não as anule. O que, para muitos, o multiculturalismo não conseguiu e, assim, uma crítica à abordagem multicultural surge nos países da Europa Ocidental, denominada interculturalidade (interculturalismo). Atividade de Estudos: 1) Por que o Multiculturalismo e a Identidade, conceitos chaves dos estudos de Hall, são essências para a EJA? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ A democracia é uma forma de vi- ver em negociação permanente, tendo como parâmetro a necessidade de convivência entre os diferentes, ou seja, o respeito mútuo. 80 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Interculturalidade O termo multicultural tem sido utilizado como categoria descritiva, analítica, sociológica ou histórica para indicar uma realidade de convivência entre diferentes grupos culturais num mesmo contexto social. Por sua vez, o adjetivo intercultural tem sido utilizado para indicar realidades e perspectivas incongruentes entre si: há quem o reduza ao significado de relação entre grupos “folclóricos”; há quem amplie o conceito de interculturalidade de modo a compreender o “diferente” que caracteriza a singularidade e a irrepetibilidade de cada sujeito humano. A questão da desigualdade que é constitutiva da sociedade humana atinge por completo os grupos mais fragilizados socialmente, como é o caso dos negros, dos indígenas, dos homossexuais, das pessoas com deficiência, entre outros. Para eles, é preciso organizar um processo educativo que vise à superação desses estigmas. A desigualdade, muitas vezes, ocorre devido a esta visão fragmentada da sociedade, ou seja, de uma visão monocultural, na qual algumas pessoas ou grupos são apresentados como superiores. Nesse debate entre a visão de uma única cultura (monoculturalidade) e a visão de diferentes culturas (multiculturalidade), a multiculturalidade, ao enfatizar a historicidade e o relativismo inerentes à construção das identidades culturais, permite pensar alternativas para as minorias, mas, também, pode justificar a fragmentação ou criação de espaços exclusivos de culturas reprodutoras de desigualdades e descriminações. Para além da discussão monocultural e multicultural, construiu-se a perspectiva intercultural que, nas palavras de Fleuri (1998, p.23), seria: O interculturalismo propõe uma dimensão dinâmica de contato, interação, troca, na qual a diversidade conta como interlocutor ativo. O termo intercultura, aponta para um projeto que, no plano educacional, pretende intervir nas mudanças induzidas pelo contato com as diversidades, de modo a promover atitudes abertas ao confronto e conduzir os processos aculturadores a uma integração entre culturas que não colonializem as minorias. Também nesta via de pensamento, a professora Candau (2008, p.52) afirma que a corrente intercultural possui algumas características a serem ressaltadas: A perspectiva cultural que defendo quer promover uma educação para o reconhecimento do outro, para o diálogo entre os diferentes grupos sociais e culturais. A perspectiva intercultural está orientada à construção de uma sociedade democrática, plural,humana, que articule políticas de igualdade com políticas de identidade. O termo multi- cultural tem sido utilizado como ca- tegoria descritiva, analítica, socioló- gica ou histórica para indicar uma realidade de convivência entre diferentes grupos culturais num mesmo contexto social. O intercultura- lismo propõe uma dimensão dinâmica de contato, interação, troca, na qual a diversidade conta como interlocutor ativo. 81 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI Capítulo 4 Esse trecho traz uma síntese do pensamento da autora sobre a educação intercultural, o que facilita a compreensão do termo. Em primeiro lugar, nessa perspectiva, as diferenças devem aparecer no âmbito da educação, ou seja, não se trata de uma visão diferencialista, na qual estas se constroem em ambientes separados, sem que ocorra, com isso, o confronto. Defende, por sua vez, que esse encontro seja permeado pelo reconhecimento e o diálogo dos grupos culturais e sociais. Nesse sentido, a interculturalidade aponta para um projeto que, no plano educacional, propõe uma dimensão dinâmica de contato, interação, troca, na qual a diversidade conta como locutor ativo e que pretende intervir nas mudanças induzidas com as relações de aproximações das mais diversas culturas e modos de ser e existir do planeta e, assim, promover atitudes mais abertas ao confronto e conduzir os processos dominadores a uma integração entre culturas que não colonizem as minorias. Além da abordagem cultural, os Estudos Culturais têm em sua agenda temática outro tópico importante para as sociedades contemporâneas: a questão ambiental (Desenvolvimento Sustentável). Na internet, há vários artigos interessantes sobre o que discutimos nesse capítulo, a seguir há os links para que você possa consultá-los: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-24782008000300017&scr ipt=sci_arttext http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-970220 03000100009 http://www.scielo.org/cgi-bin/wxis.exe/applications/scielo-org/iah/?I- sisScript=iah/iah.xis&base=article%5Edart.g&nextAction=lnk&lan- g=p&indexSearch=&exprSearch=MULTICULTURALISMO http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-207020 04000100007 82 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos Desenvolvimetento Sustentável e Educação Observando o curso da história, percebemos, nesse processo de conquista do progresso, uma grande devastação da natureza. O desequilíbrio ecológico é evidente: grandes desmatamentos, poluições, enchentes, apesar das iniciativas e lutas ambientalistas, tanto em nível mundial como local. Na atualidade, cada vez mais é possível perceber o envolvimento dos ecologistas, ambientalistas, simpatizantes pela causa ambiental, defensores da natureza, professores e grupos organizados para lutarem em defesa do meio ambiente, buscando relações mais harmônicas com a natureza, bem como na busca de sociedades sustentáveis. De acordo com a professora Camargo (2008), o Desenvolvimento Sustentável é um conceito sistêmico, o qual se traduz num modelo de desenvolvimento global que incorpora os aspectos de desenvolvimento ambiental. Foi usado pela primeira vez em 1987, no Relatório Brundtland(nosso futuro comum), elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criado em 1983 pela Assembleia das Nações Unidas. Este relatório apresenta quatro parâmetros que o caracterizam: preservação da natureza; eliminação da pobreza; crescimento econômico; garantia da existência das gerações futuras e, ainda, podemos encontrar nele seis aspectos prioritários que podem ser entendidos como metas: necessidades básicas da população; solidariedade com as gerações futuras; participação da população; preservação dos recursos naturais; elaboração de um sistema social; efetivação dos programas educativos. Segundo a autora, a definição mais aceita para Desenvolvimento Sustentável é: capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as solicitações das futuras gerações, não esgotando os recursos para o futuro. Para outro autor, Pinheiro (2008), o campo do Desenvolvimento Sustentável pode ser conceitualmente dividido em três componentes: sustentabilidade ambiental, sustentabilidade econômica e sustentabilidade sociopolítica. A sustentabilidade ambiental consiste na manutenção das funções e componentes do ecossistema, de modo sustentável, podendo igualmente designar-se como a capacidade que o ambiente natural tem de manter as condições de vida para as pessoas e para os outros seres vivos, tendo em conta a habitabilidade, a beleza do ambiente e a sua função como fonte de energias renováveis. A sustentabilidade econômica, enquadrada no âmbito do desenvolvimento sustentável, é um conjunto de medidas e políticas que visam à incorporação de preocupações e de conceitos ambientais e sociais. Aos conceitos tradicionais de mais valia econômica são adicionados, como fatores a ter em conta, os O campo do Desenvolvimento Sustentável pode ser conceitual- mente dividido em três componentes: sustentabilida- de ambiental, sustentabilidade econômica e sustentabilidade sociopolítica. 83 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI Capítulo 4 parâmetros ambientais e socioeconômicos, criando, assim, uma interligação entre os vários setores. Desse modo, o lucro não é somente medido na sua vertente financeira, mas igualmente na vertente ambiental e social, ou seja, os investimentos devem ser priorizados também na área ambiental dos diversos governos. A sustentabilidade sociopolítica centra-se no equilíbrio social, tanto na sua vertente de desenvolvimento social como socioeconômica. É um veículo de humanização da economia e, ao mesmo tempo, pretende desenvolver o tecido social nos seus componentes humanos e culturais. Ainda segundo Pinheiro (2008), a partir desses três componentes, foram desenvolvidos dois grandes planos: a agenda 21 e as metas de desenvolvimento do milênio. A Agenda 21 é um plano global de ação a ser tomada em nível global, nacional e local, por organizações das Nações Unidas, governos e grupos locais, nas diversas áreas onde se verificam impactos significativos no ambiente. Em termos práticos, é a mais ambiciosa e abrangente tentativa de criação de um novo padrão para o desenvolvimento do século XXI, tendo por base os conceitos de desenvolvimento sustentável. As Metas de Desenvolvimento do Milênio (MDM) surgem da Declaração do Milênio das Nações Unidas, adotada pelos 191 estados membros, no dia 8 de Setembro de 2000. Criada em um esforço para sintetizar acordos internacionais alcançados em várias cúpulas mundiais ao longo dos anos 1990 relativos ao meio-ambiente e desenvolvimento, direitos das mulheres, desenvolvimento social, racismo, entre outras, a Declaração traz uma série de compromissos concretos que, se cumpridos nos prazos fixados, segundo os indicadores quantitativos que os acompanham, deverão melhorar o destino da humanidade neste século. Esta declaração menciona que os governos não economizariam esforços para libertar nossos homens, mulheres e crianças das condições objetivas e desumanas da pobreza extrema, tentando reduzir os níveis de pobreza e promovendo o bem-estar social. A professora Camargo (2008) escreve que para ser alcançado, o Desenvolvimento Sustentável depende do planejamento e do reconhecimento de que os recursos naturais são finitos. Esse conceito representou uma nova forma de desenvolvimento econômico, que leva em conta o meio ambiente. Muitas vezes, ele é confundido com crescimento econômico, que depende do consumo crescente de energia e recursosnaturais. Esse modelo tende a ser insustentável, pois leva ao esgotamento dos recursos naturais dos quais a humanidade depende. Abaixo, um artigo do filósofo e escritor Leonardo Boff que não compactua com o conceito de Desenvolvimento Sustentável que é apresentado no contexto mundial. Desenvolvimen- to Sustentável depende do planejamento e do reconhecimento de que os recur- sos naturais são finitos. 84 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos DESENVOLVIMENTO (IN)SUSTENTÁVEL? Leonardo Boff Teólogo da Libertação, escritor, professor e conferencista, doutor em Teologia e Filosofia pela Universidade de Munique (Alemanha), professor de Teologia e Espiritualidade em vários centros de estudo e universidades no Brasil e no exterior. Autor de mais de 60 livros nas áreas de Teologia, Espiritualidade, Filosofia, Antropologia e Mística. “Desenvolvimento sustentável”, fórmula mágica com a qual o sistema mundial de convivência e de produção pretende resolver os problemas que ele mesmo criou, por mais oficial que seja, representa uma contradição, um equívoco e uma ilusão. É uma contradição, pois, os dois termos se rejeitam mutuamente. A categoria “desenvolvimento” provém da área da economia dominante. Ela obedece à lógica férrea da maximalização dos benefícios com a minimalização dos custos e do tempo empregado. Em função deste propósito se agilizaram todas as forças produtivas para extrair da Terra literalmente tudo o que é consumível. Ela foi torturada pela tecno-ciência e submetida a um assalto sistemático de suas riquezas no solo, no subsolo, nos ares e nos mares. O resultado foi uma produção fantástica de bens materiais e serviços mas distribuídos sem justo equilíbrio. Essa falta de equilíbrio está destruindo a paz entre os povos e ameaçando a biosfera, submetida a estresse quase insuportável. A categoria “sustentabilidade” provém do âmbito da biologia e da ecologia, cuja lógica é contrária àquela deste tipo de “desenvolvimento”. Por ela se sinaliza a tendência dos ecossistemas ao equilíbrio dinâmico e se enfatizam as interdependências de todos, garantindo a inclusão de cada ser, até dos mais fracos. Como se depreende, unir esse conceito de sustentabilidade ao de desenvolvimento configura uma contradição nos próprios termos. Dizíamos ainda que o “desenvolvimento sustentável” representa um equívoco. Sim, pois, se alega como causa aquilo que é efeito. Diz-se que a pobreza é a causa da degradação ecológica. Portanto, quanto menos pobreza e mais desenvolvimento menos degradação. Analisando, porém, as causas reais da pobreza e da degradação vê- se que resultam exatamente do tipo de desenvolvimento praticado. 85 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI Capítulo 4 Ele explora as pessoas empobrecendo-as e dilapida os recursos da natureza degradando-a. Por isso, a utilização política da expressão “desenvolvimento sustentável” representa uma armadilha do sistema: assume os termos da ecologia (sustentabilidade) para esvaziá-los e assim mascara a verdadeira causa do problema social e ecológico (tipo de desenvolvimento) que ele mesmo é. Por fim, a fórmula “desenvolvimento sustentável” significa uma ilusão. Postula-se um desenvolvimento que se move entre dois infinitos: o infinito dos recursos da Terra e o infinito do futuro. A Terra seria inesgotável em seus recursos. E o futuro para frente, ilimitado. Ora, os dois infinitos são ilusórios: os recursos são finitos e o futuro é limitado, por não ser universalizável. Se a Índia quisesse ser como a Inglaterra, precisaria de duas Terras para explorar, como já dizia ironicamente Gandhi nos anos 50. O “desenvolvimento sustentável” não é uma panacéia, mas um placebo. Persistir em aplicá-lo, é enganar o paciente, talvez, matá-lo. É o que tememos com a biosfera. Entender tal equívoco é entender o porquê do impasse na Cúpula da Terra no Rio-92 e agora em Johnesburgo-2002. A categoria mestra é sustentabilidade e não desenvolvimento. Precisamos a Terra, a sociedade e a vida humana sustentáveis. Em seguida o desenvolvimento. É o que os senhores do “desenvolvimento (in)sustentável” não entendem. O Titanic está vazando água por todos os lados. Não temos tempo a perder. Importa despertar senão pode ser tarde demais. Isso não é ser apocalíptico, mas simplesmente realista. Fonte: Disponível em <www.leonardoboff.com>. Acesso em: 25 jun2011. O desafio que se coloca no umbral do século XXI é nada menos do que mudar o curso da civilização, deslocar o seu eixo da lógica dos meios a serviço da acumulação, num curto horizonte de tempo, para uma lógica dos fins em função do bem-estar social, do exercício da liberdade e da cooperação entre os povos. O problema de insustentabilidade não está apenas no desenvolvimento, é preciso reconhecer que o nosso modo de vida se tornou insustentável, e este é muito mais difícil de mudar, pois implica aperfeiçoamento individual e coletivo, simultaneamente, parece não haver saída: ou acreditamos que o ser humano, tal como é, pode construir um mundo melhor para si, para seus semelhantes, no O problema de insustentabilidade não está apenas no desenvolvi- mento, é preciso reconhecer que o nosso modo de vida se tornou in- sustentável, e este é muito mais difícil de mudar, pois implica aperfeiçoa- mento individual e coletivo. 86 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos presente e no futuro, ou cabe reconhecer o fracasso de nossa existência e admitir que a busca de um Desenvolvimento Sustentável seja ilusória, apenas uma forma de adiar o inevitável fim. É preciso iniciar um aprendizado individual e coletivo que nos leve a outras formas de manifestação concreta de nossa natureza e que possibilite uma perspectiva de mudança em nosso modo de viver. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-207020 04000100007 http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n23/n23a03.pdf http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-24782001000200014&scri pt=sci_arttext http://www.scielo.br/pdf/asoc/v7n1/23537.pdf http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-753X2 004000200016 Sinopse: A Terra sofre alterações climáticas que modificam drasticamente a vida da humanidade. Com o norte se resfriando cada vez mais e passando por uma nova era glacial, milhões de sobreviventes rumam para o sul. Porém o paleoclimatologista Jack Hall (Dennis Quaid) segue o caminho inverso e parte para Nova York, já que acredita que seu filho Sam (Jake Gyllenhaal) ainda está vivo. 87 A Educação de Jovens e Adultos: Perspectivas e os Desafios para o Século XXI Capítulo 4 Sinopse: O diretor Michael Moore investiga como os Estados Unidos se tornaram alvo de terroristas, a partir dos eventos ocorridos no atentado de 11 de setembro de 2001. Os paralelos entre as duas gerações da família Bush que já comandaram o país e ainda as relações entre o atual Presidente americano, George W. Bush e Osama Bin Laden. Atividade de Estudos: 1) Escolha um dos filmes apresentados na indicação anterior e faça uma analogia com os conceitos teóricos estudados neste capítulo. Lembre-se mobilizar a teoria na prática nos auxilia a compreendê-la. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Considerações Finais A EJA inicialmente foi pensada como educação de adultos no âmbitopopular. Com o crescente número de jovens e adultos analfabetos e sem escolaridade completa, bem como diante da preocupação internacional da educação para todos como direito humano que ela vai se constituído em um campo pedagógico. A identidade da EJA, expressa na constituição dessa modalidade como objeto de atenção das instâncias governamentais e movimentos populares, é vista como meio de desenvolvimento da consciência crítica, muito presente nas obras de Paulo Freire. 88 Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos A educação é um ato de conhecimento e aprendizagem, conhecer e aprender permite criar argumentos e agir de forma autônoma nos processos educativos. Este caderno foi pensado desta maneira: seu agir a partir deste estudo será de conhecer as legislações pertinentes a EJA, aprofundar-se na compreensão das diretrizes curriculares, das necessidades dos educandos que compõem esta modalidade de ensino, sempre dentro de uma visão maior, na qual o todo possa visualizar as partes e não as partes visualizarem o todo. Nesse sentido, o desafio atual, em termos de EJA, não é propor mais metas ou projetos para ela, e sim avaliar os impactos qualitativos das experiências existentes. Por isso, necessário foi possibilitar, neste estudo, a compreensão dos elementos constituidores da fundamentação teórica e prática, bem como as teorias curriculares da educação para que você possa fazer suas análises com mais segurança e confiabilidade. Referências CAMARGO, A. L. B. Desenvolvimento sustentável: dimensões e desafios. Campinas: Papirus, 2008. CANDAU, Vera. Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre desigualdades e diferenças. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 13, n. 37, jan/abr. 2008. COSTA, Carlos Odilon da; WEIDUSCHAT, Edith. Metodologia e Conteúdos Básicos de História e Geografia. Indaial: ASSELVI, 2008. FLEURI, Reinaldo Matias. Intercultura e movimentos sociais. [Florianopolis]: Mover : NUP, 1998. HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2003. WILLIAMS, Raimond. Cultura e sociedade, 1780-1950. São Paulo: Comp. Ed. Nacional, 1969.