Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Microbiologia e Imunologia (2020.1) Microbiologi� Ora� Resident�, Ec�sistem� Ora� � Biofilm� dentári� Microbiota Oral Microbiota é definido como um grupo de microrganismos que reside em um determinado ambiente. Do ponto de vista biológico, o corpo humano também pode ser considerado um “ambiente”, pois nele habitam diversos microrganismos, e na cavidade oral não é diferente. A microbiota oral residente, ou apenas microbioma oral, compreende um grupo bastante diversificado de microrganismos, incluindo bactérias, fungos, protozoários e provavelmente uma grande quantidade de vírus. Estes microrganismos vivem em harmonia nos diferentes locais da cavidade oral que possui uma grande variedade de habitats com diferentes condições ambientais, incluindo dentes, língua, mucosa jugal, região palatina e o sulco gengival. Além disso, as bactérias compreendem a maioria dos microrganismos residentes, estima-se que existam cerca de 500-700 espécies orais comuns. Todavia, apesar da enorme variedade e complexidade do microbioma oral, muitos microrganismos de outros ecossistemas adjacentes como intestino e a pele, não são encontrados na boca, o que indica uma ecologia única e seletiva em relação a colonização microbiana. As bactérias orais podem ser classificadas primariamente como microrganismos Gram-positivos e Gram-negativos, e secundariamente como anaeróbios e anaeróbios facultativos, de acordo com a necessidade de oxigênio. Uma parte desses microrganismos não é cultivável, e alguns deles são mais associados a doenças do que outros. Microrganism� d� cavidad� ora� Cocos Gram-positivos Gênero Streptococcus São Cocos Gram-positivos em cadeia; imóveis, e normalmente apresentam proteínas fibrilares de superfície; às vezes encapsulados; anaeróbios facultativos; hemólise variável, sendo a α-hemólise a mais comum. Grupo mutans → Principais espécies: Streptococcus mutans (sorotipos c, e, f e k); Streptococcus sobrinus (sorotipos d, g); Streptococcus criceti (sorotipo a); Streptococcus ratti (sorotipo b). → Características da cultura: colônias altas, convexas e pacas; produção abundante de polissacarídeo extracelular em meios contendo sacarose; meio seletivo: ágar mitis salivarius bacitracina sacarose. → Principais sítios e infecções intraorais: superfície dental, cárie dentária. Grupo salivarius → Principais espécies: Streptococcus salivarius; Streptococcus vestibularis. → Características da cultura: colônias grandes e mucóides em mitis salivarius devido a produção de frutanas extracelulares a partir da sacarose; produz urease e peróxido de hidrogênio, que diminui o pH e contribui para o sistema peroxidase salivar. → Principais sítios e infecções intraorais: dorso da língua e saliva; Streptococcus vestibularis habita principalmente a mucosa vestibular (daí o nome) obs.: não é considerado patógeno oral de importância. Vinícius Bandeira | @viniciusbdentista (2021) Microbiologia e Imunologia (2020.1) Além dos streptococcus, existem diversos outros, mas em menor quantidade, não os abordarei neste resumo. O Ambiente Oral A boca humana é revestida por epitélio pavimentoso estratificado, que varia de acordo com a função de áreas específicas, como, a língua por exemplo. Além disso, esse tecido pode ser interrompido por outras estruturas, como os dentes e os dutos alveolares. Por ser uma extensão de um sítio externo do organismo, a boca, como dito anteriormente, possui uma microbiota residente, que existe em harmonia com o hospedeiro. Em contrapartida, quando há um desequilíbrio nessa relação, surgem ocasiões para a doenças como a cárie e a doença periodontal, que são causadas dessa forma. Além da microbiota oral residente, existe a microbiota transitória, que não pode se estabelecer no ambiente oral devido à pressão ecológica (resistência à colonização exercida pela microbiota residente). Portanto, a microbiota residente é muito importante na defesa da porta de entrada do sistema digestório de microrganismos exógenos patogênicos. Fatores microbianos Os microrganismos do ambiente oral interagem entre si, favorecendo ou dificultando o crescimento de bactérias adjacentes. Dentre os mecanismos que atuam na interação microbiana incluem: • competição por receptores para adesão antes da ocupação de sítios de colonização e prevenir fixação de micro-organismos “recém-chegados”; • produção de toxinas, como bacteriocinas, que matam células da mesma espécies ou de outras espécies bacterianas; por exemplo, Streptococcus salivarius produz um inibidor (enocina) que inibe Streptococcus pyogenes; • formação de produtos finais metabólicos, como ácidos carboxílicos de cadeia curta, que diminuem o pH e atuam como agentes antagonistas para alguns micro-organismos • uso de produtos finais metabólicos de outras bactérias para fins nutricionais (p. ex., Vinícius Bandeira | @viniciusbdentista (2021) Microbiologia e Imunologia (2020.1) Veillonella spp. utiliza ácidos produzidos por Streptococcus mutans). Então, esses mecanismos, que permitem à microbiota comensal oral suprimir, inibir ou impedir o crescimento de organismos exógenos não orais e que os excluem de seu hábitat, são chamados de resistência à colonização. Nutrição de bactérias orais As bactérias orais obtêm seus nutrientes a partir de uma série de fontes. Geralmente, elas incluem os recursos do hospedeiro. • resíduos da dieta do hospedeiro sempre presentes na cavidade oral (p. ex., sacarose, amido); • constituintes da saliva (p. ex., glicoproteínas, minerais, vitaminas); • exsudato crevicular (p. ex., proteínas); • ambiente gasoso (embora a maioria necessite apenas de um nível de oxigênio muito baixo. e recursos microbianos: • produtos bacterianos extracelulares de bactérias adjacentes, sobretudo em comunidades densas em biofilmes; • grânulos de reserva de nutrientes intracelulares (glicogênio). Biofilme dentário O biofilme dentário é uma comunidade microbiana persistente, que se desenvolve nas superfícies de tecidos moles e duros da boca, compreendendo bactérias vivas, mortas, inviáveis e seus produtos extracelulares, em conjunto com compostos do hospedeiro derivados, principalmente, da saliva. Composição Os microrganismos do biofilme dental são envolvidos por uma matriz orgânica, que corresponde a cerca de 30% do seu volume total. Essa matriz é derivada de produtos do seu hospedeiro e dos constituintes do biofilme. Ela atua como reserva de nutrientes e como fator de aderência, ligando os microrganismos entre si e às várias superfícies. Contudo, a composição microbiana do biofilme pode variar bastante entre os indivíduos, além de existir uma grande variação na composição do biofilme no mesmo indivíduo, devido aos diferentes habitats orais (em diferentes sítios do mesmo dente; no mesmo sítio em dentes diferentes; em diferentes momentos no mesmo sítio do dente). O biofilme é encontrado nas superfícies do dente e de aparelhos ortodônticos, principalmente quando há uma má higiene oral. No geral, ele é encontrado em regiões anatômicas protegidas da defesa do hospedeiro, como por exemplo os sulcos oclusais, áreas interproximais, ou em torno do sulco gengival. Quanto a aderência, ela é fundamental para a colonização de um microrganismo à superfície oral, e quanto a sua formação, é um processo complexo que envolve uma série de etapas diferentes: 1. Formação da película adquirida. A adsorção de moléculas bacterianas e do hospedeiro forma a película salivar adquirida. Uma fina camada de glicoproteínas da saliva se deposita sobre a superfície de um dente em poucos minutos de exposição ao ambiente oral. As bactérias orais se fixam inicialmente na película e não diretamente no esmalte. Vinícius Bandeira | @viniciusbdentista (2021) Microbiologia e Imunologia (2020.1) 2. Transporte: as bactérias se aproximam da superfície do dente antes da fixação, por meio do fluxo salivar normal ou quimiotaxia. 3. Interações de longo alcance: envolvem interações físico-químicas entre a superfície da célula microbiana e o dente revestido com a película. A interação de forças devan der Waals e repulsão eletrostática produz uma fase reversível de uma rede de adesão. 4. Interações de curto alcance: consistem em reações estereoquímicas entre adesinas da superfície da célula microbiana e receptores na película adquirida. 5. Coagregação e coadesão: Novas bactérias se fixam à primeira geração de células já aderidas, podendo ser bactérias do mesmo gênero ou de diferentes gêneros, porém compatíveis. 6. Formação do biofilme: O processo anterior continua, resultando em crescimento confluente e na formação de um biofilme que sofre maturação à medida que o tempo passa. Define-se biofilme como uma comunidade complexa e funcional de uma ou mais espécies de micro-organismos, envolta em uma matriz polissacarídica e ligadas entre si ou a uma superfície sólida. Essa superfície pode ser inerte, como o esmalte do dente, próteses acrílicas ou cateteres plásticos e, alternativamente, uma superfície viva/orgânica, como uma válvula cardíaca. A arquitetura do biofilme não apresenta estrutura plana e compacta, semelhante a um pedaço de concreto. Desse modo, os agregados de organismos são dispostos em colunas ou em estruturas em forma de cogumelos, intercalados com canais de água que eliminam os metabólitos e trazem os nutrientes. Assim, a formação do biofilme é um processo de colonização complexo, competitivo, sequencial e dinâmico; em biofilmes dentais, essa complexidade é maior devido à participação de diferentes categorias de bactérias orais. Especificamente, o grupo pioneiro de organismos que colonizam seletivamente a película salivar durante a formação do biofilme é de cocos e bastonetes Gram-positivos. Estes são seguidos por cocos e bastonetes Gram-negativos e, finalmente, por bactérias filamentosas, fusobactérias, espirilos e espiroquetas. Um importante componente do biofilme é a matriz extracelular que compreende polissacarídeos microbianos e camadas adicionais de glicoproteínas da saliva (ou componentes do fluido crevicular, dependendo do sítio). Os produtos metabólicos dos colonizadores iniciais do biofilme podem alterar radicalmente o ambiente próximo, levando à colonização por novos habitantes, resultando em aumento gradual na complexidade, biomassa e densidade microbiana. Como consequência desse processo dinâmico, a massa do biofilme dentário atinge tamanho crítico em que se estabelece um equilíbrio entre a deposição e a perda de bactérias; essa comunidade é denominada comunidade clímax. As bactérias do biofilme parecem manter sua complexa estrutura por intermédio da secreção contínua de baixos níveis de moléculas chamadas moléculas quorum-sensing, que coordenam a expressão gênica. À medida que o número de microrganismos do biofilme aumenta, há aumento simultâneo e proporcional nos sinais de quorum-sensing. Esses sinais ativam genes que podem estar associados à produção adicional de polissacarídeos extracelulares, à redução do metabolismo (para bactérias do interior da matriz) ou à produção de fatores de virulência, incluindo genes que inativam antimicrobianos. Vinícius Bandeira | @viniciusbdentista (2021) Microbiologia e Imunologia (2020.1) Formação do cálculo Os íons cálcio e fosfato derivados da saliva podem se depositar em camadas mais profundas do biofilme dentário. Então, se o biofilme crescer livremente, as bactérias em degeneração em uma comunidade clímax podem atuar como agentes propagadores da mineralização. Esse processo é acelerado por fosfatases e proteases bacterianas que degradam alguns inibidores de calcificação na saliva, e são eles que levam à formação de cristais insolúveis de fosfato de cálcio que se unem para formar uma massa calcificada de biofilme, denominada cálculo. A microbiota predominante é composta por cocos, bacilos e bactérias filamentosas (especialmente nas camadas externas) e, ocasionalmente, organismos espiralados. O cálculo supragengival contém mais organismos Gram-positivos, enquanto o cálculo subgengival geralmente apresenta mais espécies Gram-negativas. O cálculo possui uma superfície áspera e é poroso, servindo como reservatório ideal para toxinas e endotoxinas bacterianas que são nocivas ao periodonto. Desse modo, a remoção do cálculo é essencial para a manutenção de uma boa saúde periodontal. Papel da microbiota oral em infecções sistêmicas Recentemente, foi reconhecido que doenças orais relacionadas ao biofilme, especialmente na periodontite, podem alterar o curso e a patogênese de uma série de doenças sistêmicas. São elas: • doença cardiovascular: - endocardite infecciosa; - doença cardíaca coronariana: aterosclerose e infecção do miocárdio; - acidente vascular cerebral. • pneumonia bacteriana; • diabetes melito; • recém-nascidos de baixo peso ao nascer. Referência: SAMARANAYAKE, Lakshman. Fundamentos de Microbiologia e Imunologia na Odontologia. Vinícius Bandeira | @viniciusbdentista (2021)
Compartilhar