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Bernardete Angelina Gatti A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO NO BRASIL Série Pesquisa v. 1 3ª Edição Brasília, 201 O Copyright© 201 O Liber Livro Editora Ltda. É proibida a reprodução total ou parcial desta publicação, por quaisquer meios, sem autorização prévia, por escri to, da editora. Conselho editorial Bemardete A. Gatti, Iria Brzezinski, Maria Celia de Abreu, Osmar Favero, Pedro Demo, Rogério de Andrade Córdova, Sofia Lerche Vieira. Coordenação da Série Bernardete Angelina Gatt i Revisor Jair Santana Moraes Revisão Marluce Moreira Salgado Normalização bibliográfi ca Regina Helena Azevedo de Mello Capa Patríca M. Garcia Im pressão e acabamento LGE Editora Ltda./Brasíl ia-DF Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CI P) Gatti, Bernardete Angelina G263c A construção da pesquisa em educação no Brasil. Bernardetc Angelina Gatti. - Bras ília : Liber Livro Editora, 201 O. 3ª ed. 87 p. (Série Pesquisa, 1) ISBN 85-85946-3 1-8 (Plano Editora) ISBN 978-85-98843-46-9 (Liber Livro Editora) 1. Pesquisa em educação. 2. Métodos de pesquisa. 1. Título. li. Série. CDU 301.175 Liber Livro Edi tora Lida. SHC /Norte· CL Qd. 315 · Bloco D· Sala 15 Asa Norte· CEP: 70774-520 · Brasília-DF Fone: (61) 3965-9667 · Fax: (61) 3965-9668 E-mai l: editora@lióerlivro.com.br www.liberlivro.com.br SUMÁRIO APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . .. .. . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 INTRODUÇÃO . .. . .. .. .. .. . . .. .. .. . .. . .. .. .. . .. .. .. .. . .. .. .. .. . .. . .. .. .. . .. . 9 Pesquisa ......... .... ... .. ....... .......... ......... ............. ...... 9 Pesquisa Educacional ............ ........... .............. ......... 12 CAPÍTULO 1 - A PRODUÇÃO DA P ESQUISA EM E DUCAÇÃO NO BRASIL E SUAS IMPLICAÇÕES ... ................... .. . 15 Teoria e método .. .. ..... ........... ........... ........... ....... 21 Dominâncias, pesquisa e ação .............. ..... ......... 22 As instituições .... ............. ... .................... .... ........ 24 Contrapontos importantes ..... ........... ......... ......... 25 Os procedimentos na investigação ....... ..... .......... 28 Pesquisa em educação e seu impacto social ........ 33 Há um papel social para a consistência metodológica? .. ................. .. .... .. ............. ....... 37 Referências bibliográficas .... ............................... 38 CAPÍTULO 2 - QUESTÕES DE MÉTODO NAS P ESQUISAS EM EDUCAÇÃO .... ...... 43 Ciência una, método uno? .... .................... .... ....... 45 As posições crític&s e seus problemas ....... ...... .... 49 Instrumentos e métodos .. ................... .... ..... ..... .. . 52 Teorizações e métodos ....... .... .. ... ....................... 53 Problematizações e formas de agir: limitações do conhecimento ............................ 57 O específico do campo de pesquisa na educação ...... .... .... ..... .. .. ..... .. ..... .... .......... 60 Condições das ações investigativas ...... ....... ........ 62 CAPÍTULO 3 P ESQUISA EM EDUCAÇÃO: UM TEMA EM DEBATE EM REVISTA CIENTÍFICA ..... .................... 67 Referências bibliográficas ......... .. ......................... 82 SOBRE A AUTORA . .... ... .... ... .... . ..... ... .... ... .. . .... ..... .. ... 87 6 APRESENTAÇÃO Este texto abre uma Série e injcia uma seqüência de trabalhos que tratarão de aspectos diferenciados relati vos ao desenvolvimento de pesquisas na área educacional. Este pri- meiro volume procma situar os contextos de desenvolvimento da pesquisa educacional no Brasil e trata de algumas questões metodológicas que têm se apresentado como desafios aos que pesquisam nesse campo. Seguir-se-á um segundo volume dedicado à iniciação de estudantes ao processo de pesquisa, abordando aspectos básicos para o desenvolvimento de qualquer investigação sistemática em tomo de um problema em relação ao qual se busca maior compreensão ou respostas. Outros textos segui- rão, de diversos autores, procmando trazer ao leitor questões ligadas ao emprego de entrevistas, de questionários, observa- ção, estudos de caso, análise de conteúdo, etnometodologia, grupos focais, e, assim por diante, procurando oferecer uma visão da gama de opções em coleta de dados para a pesquisa em educação e dar uma contribuição ao desenvolvimento de procedimentos de pesquisa em fonnas mais consistentes. As diferentes formas de obtenção de dados para uma investigação científica estão aliadas a perspectivas metodoló- gicas e teóricas que lhes dão sentido. Cuidados básicos nessa obtenção precisam ser garantidos pelo pesquisador no sentido de permitir discussões sobre a validade e âmbito de pertinência desses dados. Esta Série pretende contribuir nessa direção. Bernardete Angelina Gatti Organizadora INTRODUÇÃO Pesquisa A palavra ~guisa passou a ser utilizada no c~tidiano das pessoas e nas escolas com sentidos os mais cliferen~ Pesquisa é o ato pelo qual procuramos obter conhe- cimento sobre alguma coisa. Com essa definição assim tão ampla, podemos dizer que estamos sempre pesquisando em nossa vida de todo dia, toda vez que buscamos alguma informação ou nos debruçamos na solução de algum pro- blema, colhendo para isso os elementos que consideramos importantes para esclarecer nossas dúvidas, aumentar nosso conhecimento, ou fazer uma escolha. Assim, pode- mos falar em pesquisar o sentido exato de uma palavra no dicionário; ou em pesquisar a melhor maneira de temperar uma comida; ou em pesquisar os preços de certo produto em várias lojas. Contudo, num sentido mais estrito, visando à criação de um corpo de conhecimentos sobre um certo assunto, o ato de pesquisar dev~_fil2resentar _çertas características e.êpecíficas. ~-ªº buscamos, com ele, qualquer conhecirnent<1._ mas um conhecimento que ultrapasse nosso entendimento imediato na explicação ou na compreensão da realidade que observamos. Um conhecimento que_p.od~ é mesmo contrariar esse entendimento primeiro e negar as explica~ -----------"-------'- - --óbVIas a que chegapos com_ n_o_ssas_ obs~~ações S!JR(?rficiais e não-sistemáticas. Um conhecimento gue obtemos indo além d~ fato~ desvendando processos, explicando coosistente- mente fenômenos segundo algum referencial. este caso, estamos fazendo pesquisa para constmir o que entendemos por ciência, ou seja: tentando elaborar~. ~junto estruturado de conhecimentos que nos~rmita_ compreender em profunclidade aquilo que, àpcim~ir.a..vista, o mundo das coisas e dos homens nos revela nebulosa- mente ou sob uma aparência caótica. Vamos então p.erc_o.r: rendo aqueles caminhos que nos P.arecem se!!undo critérios " o ---- :, mais seguros para constrnir wna compr~ensãÜ ~p!:_q__ximaga_ - dos hQmens, d~_!latureza, das relações humanas .etc. A pesquisa, assim, reveste-se de algumas carac- terísticas peculiares para que possamos ter uma certa segu- rança quanto ao tipo de conhecimento gerado. Note-se que falamos em uma certa segurança e não segurança absoluta. Isto porque, na produção de conhecimentos, sempre temos uma margem de incerteza, mesmo que esta, em alguns casos, sej_a de fato extremamente pequena . .e_ara o pesquisa~ existem do~, verdades reveladas e absolutas, vale dizer não há conhecimento absoluto_e_de.f:inifu,Q. Os conhecimentos são ~empreArel~tivamente sintetizados sob certâs conclições_ ~@stanc1as_, dep.endendo das teorias, doJ, métodos, das ~ áticas que o PE>Quisador escolhe para trabalhar. Mas: · essas sínteses devem ter consistência e plausibilidade. Quell2.Pesguisa Qro~ra descrever, compreender ou ~xplicar alguma coisa. É uma das maneiras de que nos valemos, em última análise, em qualquer campo de conhe- cimento, para solucionar problemas. Para responder a algumas incógnitas, segundo alguns ciitérios. Por tanto, o conhecimento obtido pela pesquisa é um conhecimento vincuJado a critérios de escolha e interpretações de dados, qualquer queseja a natureza destes dados. 10 Estes critérios têm a ver com a temia que estamos trabalhando ao pesquisar, e/ou com a maneira pela qual selecionamos os dados que observamos e as infonnações que trabalhamos, e/ou com a lógica que empregamos em todo o desenvolvimento do trabalho. Esses critérios não são únicos nem universais e não há receita pronta para eles~ pesquisador com seu problema tem que criar seu referencial dese~. Não há um modelo de pesquisa científica, como não há "o" método científico para o desenvolvimento da ~uisa. Estaé uma falsa idéia, pois o conhecimento científico se fez e se faz por meio de uma grande variedade de procedi- mentos e a criatividade do pesquisador em inventar maneiras de bem realizar os seus estudos tem que ser muito grande. A pesquisa não é, de modo algum, na prática, uma reprodução fria das regras que vemos em alguns manuais. O próprio comportamento do pesquisador em seu trabalho é-lhe peculiar e característico. É claro que, no mundo da pesquisa, pela própria expeiiência vivida pelos pesquisadores, temos algumas pistas para não incon-errnos em excessivos viéses ou cairmos nas armadilhas de nossos desejos, que poderão tomar nossos resuJtados e conclusões inócuos ou inválidos. Mas daí a crer que há um só método para se fazer ciência a distância é grande demais. ~ pesquisa, muito importante são os dados com r ~e trabalhamos. E dado pode ser desde um conjunto de medidas bem precisas que tomamos até depoimen- tos, entrevistas, diálogos, discussões, observações, etc. de que nos servimos para a geração de algum conhe- cimento que acrescente alguma coisa à compreensão do problema que nos interessa. Conhecimentos são sempre relativamente de- terminados sob certas condições ou circunstâncias, 11 dependendo do momento histórico, de contextos, das teorias, dos métodos, das técnicas que o pesquisador escolhe para trabalhar ou de que dispõe. Portanto, o conhecimento obtido pela pesquisa é um conhecimento situado, vinculado a critérios de escolha e interpretação de dados, qualquer que seja à natureza destes dados. Pesquisa Educacional ~ão ~~ uisa se reveste de_ill&!!_mas ~aracterísticas es~cíficas. Porque pesquisar emeduc~ção s~ca trabalhar com algo relativo a seres humanos º:1 ~ com eles mesmos, em seu próprio processo de vidji. ~ irriento a ser g_erado a.9ui, raramente. - e bem ortodoxamente poderíamos afirmar nunca - pode ser 2.btido.po uma pesquisa estritamente experimental onde --- - . todos os fatores da situação podem ser controlados. Isto é possível para uma parte dos problemas em áreascomo a Física, a Biologia ou a Química, em que manipulações do objeto de estudo são possíveis. Não o é para as questões ligadas à educação humana, porque certos controles não podem ser aplicados aos seres humanos vivos e nem a situações sociais nas quais esta educação se processa. Muito do que estamos falando tem a ver com o que se pensa ser educação. Não estou pretendendo abordar aqui as discussões sobre isso, mas apenas lembrar que, concretamente, quando o vocabulário educação é usado o é em múltiplos sentidos. Sentidos estes que são as representações que as pessoas se fazem daquilo que concretamente vivenciam como sendo educação. Na prática, 12 a verdade é que, de qualquer maneira, ela envolve desde problemas de desenvolvimento bioneurológico implicados nas nossas possibilidades de aprendizagem, de relação e, portanto, na base das questões de ensino, até questões de ordem social mais amplas, dado que a educação processa-se dentro de um sistema de relações sociais e, neste, ela mesma institucionaliza-se em sistemas escolares. Este campo envolve, pois, a interação complexa de todos os fatores implicados na existência humana, desde o nosso corpo até as nossas ideologias, num conjunto único, porém, em constante processo simultâneo de consolidação, contradição e mudança. Com tal âmbito de preocupação, os pesquisadores em educação fazem escolhas entre um dos múltiplos caminhos que os aproximam da compreensão desse fenômeno, escolhendo, também, um ângulo de abordagem. A gesg~ sa educacionaL tal como ela vem sendo realizada, compreende, assim, uma vasta diversidade de ~estões. de diferentes conotaç_ões, embo_c_a todas relamnadas_çomplex~ ao desenvolvimento das,_ ~ soas e das sociedadei ~la tem abrangido questões. , ~m _.e_erspectivas filosóficas, ~ ciológiças, psicológicas, e9líticas1. biQ!ógi~ as, administrayvas1-etc. Se pensamos apenas em um de seus aspectos - o da educação escolar-, ela se refere aí a problemas de legislação, de cmrículo, de métodos e tecnologia de ensino, de formação de docentes, das relações professor-aluno, etc. Diz respeito a especialj- dades como a psicologia do escolar, a orientação educacional, a supervisão pedagógica, a administração escolar. Sem esgotar seus diferentes aspectos,já vemos que o campo da pesquisa em educação tem se apresentado de modo muito diversificado. Não só abrange uma gama 13 diferenciada de problemas corno os abrange em níveis diferenciados. Então, ç__omo podemos falar em pesquisa • educacional? Podemos, desde gue o ato de educar seE..Q__ p_QQ!o de partida e o ponto de chegada d~ pes~ ~ando a educação-.9ualquer que seja 8.J!!ªºeira.Jie..a concebermos - mostra-se corno o centro de referênci é!_ da pesquisa, é foco do conhecimento, o elerneQ!Q_ integrador e norteador da_u,istas ...9.ue percorremos nos- ei1toqu~ern que nos situamos. E percorremos para buscar - - - -uma maior compreensão dos atos de educar e ser educado, suas funções, seu contexto, suas conseqüências. A multi pi icidade de problemas que a pesquisa educa- cional tem abarcado é evidente. Ela está aí. A variedade de abordagens possíveis também. Urna variedade não só do ponto de vista das vias de acesso que escolhemos para desvelar esse elemento de nossa realidade de vida - a educação -, mas também das maneiras possíveis de percorrer estas vias. Aqui, refiro-me aos métodos de investigação. ~vida a educª-~é u~ -Q0!9Ue se dá. ..S,em dúvida. é um processo, porqu~stá _§_empre__s~ fazendo. Envohr_e.pe.s~oas.num contexto, El,? mesmo sendo C-2!!,texty__ada -~ e como se dá. ~uma aproximação desse ffil9-processo que '!.._Qesquisa educacional tenta _ ~1pre~·. _ 14 CAPÍTULOl / ' . A A P RODUÇÃO DA P ESQUISA EM EDUCAÇÃO NO B RASIL E SUAS IMPLICAÇÕES Trabalhos esparsos que são reveladores de urna certa P.reocupação científica com questões da área educacional são encontrados no Bras i I desde os 1imórdios do século 20. Mas é com a criação, no final dos anoj_,3.0, do Instituto Naci~nal ge Est\!_dos e Pesquisas Educacionais (ln~ qu~ estudos mais sistemáticos em educação no País come ama desenvolver-se. Mais tarde, :.i.:..:.:::;;;:., -- --- com o desdobramento do Inep no Centro Brasileiro de P~sas Educacionais e nos Centros Regionais do Rio Ckru1de do süi, São Paulo, Bahia e Min-ª-5 Gerais a cons- ~tmção do pensarnent~ eaucacional brasileiro, pela pesquisa. sistemática, encon~ou um_ esP.ª!º esP:cí~co de produção_ ~ação.., e_de estimul~o./A 1rnportancia desses centros no desenvolvimento de bases metodológicas, sobretudo quanto à pesquisa com fundamento empírico, no Brasil, pode ser dada pelo contraponto com as instituições de ensino superior e universidades da época nas quais a produção de pesquisa em educação ou era rarefeita, ou inexistente. O Inep e seus centros constituíram-se em focos produtores e irradiadores de pesquisas e de formação em métodos e técnicas de investigação científica em educação, inclusive as de natureza experimental. Pes- quisadores desses centros passaram a atuar, também, no ensino superior e professores de cursos superiores também vieram atuar nos centros, criando uma fecunda interface, especialmente com algumas universidades nas décadas de 40 e 50 dos anos 900. Com o desenvolvimento de pesquisas, com base em equipes fixas, com uma série de publicações regulares e o oferecimento de cursos paraformação de pesquisa- dores com a participação de docentes de diversas naciona- lidades, especialmente latino-americanos, esses centros contribuíram para uma certa institucionalização da pes- quisa, com a formação de fontes de dados e com a implan- tação de grupos voltados à pesquisa educacional em universidades. Mas, foi somente com a implementação de programas sistemáticos de pós-graduação, mestrados e doutorados, no final da década de 60, e com base na intensificação dos programas de formação no exterior e a reabsorção desse pessoal, que se acelerou o desenvol- vimento dessa área de pesquisa no País, transferindo seu fo~o d~ produção e de formação de quadros para as umvers1dades. Paralelamente os Centros Regionais de Pesquisa do Inep são fechados e começam investimentos dirigidos aos programas de pós-graduação nas instituições de ensino superior. No contexto dessa trajetória, e tendo durante al~as décadas uma produção bem pequena em grupos l~c!li~ados, a pesquisa em educação no Brasil passou por VIS1ve1s convergências temáticas e metodológicas. Segundo estudos_de Aparecida Jo!L_Gouveia (1271.J 1976)_ ~~isas em~ duca_ç! o no Brasil, tiverapi inicialm~ l.!f!! enfoque predominantemente p~gógico, em _que 16 a temática abrangia estudos do desenvolvime!)tQ -psicológico das crianças e adolescentes, pro_cesso_§_ de ~nsino e in_§trqmentos de medida de aprendizagem. Em meados da ~cada de 50, esse f~co desloc~-se para as _ condições culturais e tendências de desenvolvimento da _ _sociedade brasileira. Nesse período, o País vinha saindo de um ciclo ditatorial e tentava integrar processos democráticos nas práticas políticas. Vive-se um momento de uma certa efervescência sodal e cultural, inclusive com grande expansão da escolarização da população nas primeiras séries do nível fundamental, em função da grande ampliação de oportunidades em escolas públicas, comparativamente ao período anterior (Silva, Gatti, 1990). O objeto de aten~ão mais comum nas pesquisas educacionais passou a ser, nesse momento, a relação entre o,sistema escQlru:..e certos aspectos dasÜciedade-:--· - A paitir de meados da década de 60 começararrr_ a ganhar fôlego e destaque os estudos de natureza econômjca, com.trabalhos sobre a educação como in.: y_estimento, demanda profissional, formação de ~ecursos @!!12_ano~ técnicas pwgram_adauJe ensino, etc. É o período em que se instalou o governo militar., redire- cionando as perspectivas sociopolíticas do País. Passa- se a privilegiar os enfoqu~s de planejamento, dos custos, da eficiência e das técnicas e tecnologias no ensino e ensino profissionalizante. A política científica passa a i ser definida num contexto de macroplanejarnento, direcionando os esforços e financiamentos no conjunto da política desenvolvi mentista, não fugindo a pesquisa educacional em sua maior parte desse cenário e interesses. -- ~mbora a tônica nas pesquisas ~a_essa durante _ alguns anos, especialm~nte_as financiadas por órgãos 17 p.!;Íblicos, as instituições de ensino superior, ou outras ligadas_ à produção da pesquisa em educação, mantêm um_a formação diversificada de gl!_adros. Com a necessária ex- pansão do ensino superior e o trabalho em alguns cursos de mestrado e doutorado, que começam a se consolidar, em meados da década de 70, deparamo-nos não só C0..!!1 uma ampliação das temáticas de estudo, mas também com um aprimoramento metodológlco, especialmente _ ~ m algumas sY.b.áI:eas- Levantamentos disporyíveis nos mostram que os estudos começam a se distribuir mais eqilitati vamente entre diferentes problemáticas: currículos, caracte1izações de redes e recursos educativos, avaliação de programas, relações entre educação e profissionalização, caracte- rísticas de alunos, famílias e ambiente de que provêm, nutrição e aprendizagem, validação e crítica de instru- mentos de diagnóstico e avaliação, estratégias de ensino, entre outros. Não só houve aumento de trabalhos em t~nas divers~mbém q-~to aos modos ~-Passou-se a utilizar tanto métodos quan- titativos mais sofisticados de análise, como também, qualitativos e, no final da década, um referencial teórico mais crítico, cuja utilização estende-se a muitos estudos. Mas, nesse período, ainda, predominaram os enfoques tecnicistas, o apego a taxonomias e à operacionalização de variáveis e sua mensw-ação. Com algumas c1íticas aos~ ~e tipo de investigasão, com a propa~ão do emprego-- .935 metõdologias da pesquisa-ação e das teorias do conflito. ~ anos 70 e começo dos anos 8(2,_ao.lado de_um ç_ertg__descrédito de que soluções técnicas resolveriam moblemas de base na educação brasileira, o perfil da ~uisa ~ucacional se enriquece com essas novas pers~ ~do espaço a abordagens cdticas 18 Todo esse processo da década de 70 e início dos anos 80 se faz num contexto político e social em que, num primeiro momento a sociedade é cerceada em sua liberdade de manifestação, na vigência da censura, em que se impõe uma política econômica de acúmulo de capital para uma elite, e em que as tecnologias de diferentes naturezas passam a ser valorizadas com prioridade. Em um segundo momento, deparamo-nos com movimentos sociais diversos que começam a emergir, vêm num crescendo, c1iando espaços mais abertos para mani- festações socioculturais e a clitica social, inaugurando-se um período de transição, de lutas sociais e políticas, que constroem a lenta volta à dem9cracia. A pesquisa educacional, em boa parte, vai estar integrada a essa clitica social, e, na década de 80 encontramos nas 12ro.d.uções.. institucionais. es~ente nas disse@Çõ~ de mestrado _ e teses de doutorado - as quai_s passam a ser a grande fonte da produção da pesquisa educacional -, ~gro)Q.:. nia do tratamento.das questões educacionafa1s .o.m_b.as..e_ e-m teorias de inspiração marxista. Do ponto de vista metodológic9, no entanto, é um peliodo onde encontramos alguns problemas de base na construção das próprias pesquisas. Voltaremos a essa questão mais adiant~. Sendo a expansão intensa do ensino superior e da pós-graduação necessária e inevitável, a formação de qua- dros no exterior também é grandemente expandida na segunda metade dos anos 80 e início dos anos 90. O retor- no desses quadros traz para as universidades, no final da década de 80 e durante a década de 90, contribuições que começam a produzir grandes diversificações nos trabalhos, tanto em relação às temáticas como às foanas de abordagem. Ao lado disso, alguns pesquisadores experientes alimentam a comunidade acadêmica com 19 análises contundentes quanto à consistência e significado do que vem sendo produzido sob o rótulo de "pesquisa educacional". É também nesses ano que se consolidam grupos de pesquisa em algumas subáreas, quer por necessidades institucionais à luz das avaliações de órgãos de fomento à pesquisa, quer pela maturação própria de grupos que durante as duas décadas anteriores vinham desenvolvendo trabalhos integrados. Descortina-se, no final desse pe1íodo, grupos sólidos de investigação, por exemplo, em alfabetização e lingua- gem, aprendizagem escolar, formação de professores, ensino e currículos, educação infantil, fundamental e média, educação de jovens e adultos, ensino superior, gestão escolar, avaliação educacional, história da educação, políticas educacionais, trabalho e educação. Esse movimento pode ser acompanhado tanto pelas Conferências Brasileiras de Educação dos anos 80, como pelo desenvolvimento a -Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Grac:luação em Êducãção (ÃNPEd), por suas reuniões anuais:-&'tã associ~ teve, a partir do final da décadã de 70, papel marcado na integração e intercâmbio de pesquisadores e °!-diss~ção da pesq!,lisa educacionãl e questões a ela ~gad~ Contando com mais de 20 grupos de tra~alho, que se concentram em temas específicos dos estuc;los de questões educacionais, a ANPEd sinaliza bem a . expansão d~ pesquisa educacional nas instituições de ensino superior ou em centrosindependentes, públicos ou privados. Essa expansão se traduz em números expressivos. Em suas reuniões anuais tem contado com a participação de aproximadamente dois mil especialistas, entre pesquisadores e alunos dos mestrados e doutorados, com aumento sistemático de trabalhos que são submetidos à apreciação de suas comissões científicas. 20 No entanto, com essa expansão, também se evidenciaram problemas de fundo na própria produção das pesquisas, os quais merecem alguma consideração. Teoria e método As novas perspectivas com que se trabalhou na pesquisa educacional nas décadas de 80 até meados dos anos 90 a sentaram-se em críticas relativas a questões , -- de teoria e método, que não estão resolvidas, mas deram ~ulso aos trabalhos~ a~ mentaram alguns grupos de ponta na pesquisa. Assim, a qualidade da produção vai se revelar muito desigual quanto ao seu embasamento ou elaboração teórica e quanto à utilização de certos procedimentos de coleta de dados e de anáJi se. Estudos dão conta da clificuldade de se construir na ~_egorias teóricas mais consistentes, que não sejru11 a aplica ão ingênua de categorias usadas em outras áreas de es~do, e que abarque~mplexidade das questões educacionais em seu instituído contexto social._Preocupa a c.ensão das condições determinantes dos fatos educacionais, como também os mecanismos internos às escolas. Essa dificuldade fez com que a investigação em , educação mostrasse adesões a sgciologismos ou_ economicismos_de diferentes inspirações, de um lado, ; u a_psicologismos ou psicopedagogismos deoutro, esQ_ecialmente as chamadas teo1ias SQÇioconstruti.Yislas. A consciência do problema a enfrentar, ou seja o do entendimento mais claro da natureza do próprio fenômeno educacional, ou pelo menos das concepções . de educação que inspiram as práticas de pesquisa, não 21 foi suficiente para o enfrentamento dessas questões de base. A captação da estrutura desse fenômeno, bem como de sua dinâmica, não enquanto idéias que delas fazemos, mas sua captação em sua concretude histó1ico- social, como parece ser a exigência que se coloca para a pesquisa educacional, traz desafios teóricos e metodológicos que permanecem em aberto. Dominâncias, pesquisa e ação Se a pesquisa em educação tendeu a desenvolver- se com certas convergências históricas, ve1ifica-se também que ela refletiu, nas décadas assinaladas, modelos de investigação que vinham sendo propostos nos Estados Unidos, Inglaterra ou França, tendo impacto aqui com certo retardo, muitas vezes com uma apropriação simplificada quanto a seus fundamentos. Embora nem toda a produção assim se caracterize, boa parte dela reflete o que pode- ríamos chamar de modismos periódicos, provavelmente, reflexo da pouca institucionalização e da pequena tradição que tínhamos de produção científica nessa área de estudos. Isto pode estar associado também, a certas características de desenvolvimento de estruturas de poder na academia, e, portanto, das lutas por hegemonias, da aceitação por grupos e manutenção de posições nas instituições onde a pesquisa educacional tem seu curso. Além desses modismos, que evidentemente se associam a determinadas condições histórico-conjuntw-ais, outra tendência que parece clara em muitos dos trabalhos é_~ do imediatismo quanto à escolha dos problemas de pesquisa. Parece dominar a preocupação quanto à aplicabilidade direta e imediata das conclusões, que em 22 geral se completam nos trabalhos por "recomendações". Embora esta tendência tenha se atenuado nos últimos anos, ela é presença constante. O sentido pragmático e de um imediatismo específico, observável nos estudos feitos na área educacional reflete-se na escolha e na forma de tratamento dos problemas. Estes problemas, oriundos de práticas profissionais, são tratados, em geral, nos limites de um recoite acadernicista discutível em seus alcances. Além disso, a relação pesquisa-ação-mudança parece ser encarada de maneira um tanto simplista. Embora reconhecendo a necessária origem social dos temas e problemas na pesquisa em educação e a necessidade de trabalhos que estejam vinculados mais especificamente a questões que no imediato são carentes de análise e proposições, uma certa cautela quanto a essa tendência deveria ser tomada porque esse tipo de abordagem na maioria das vezes, na medida em que facilita a prevalência do aparente e do excessivamente limitado, acaba deixando de lado questões que são as realmente fundamentais. As perguntas mais de fundo e de espectro mais amplo deixam de ser trabalbadas. Esse imediatismo traz também consigo um ~ande empobrecimento teórico. Isso não quer dizer que riao devamos nos voltar para os problemas concretos que emergem no cotidiano da história vivida da educação por nós- é aí que os problemas tornam corpo- , mas a pesquisa não pode estar a serviço de solucionar pequenos impasses do cotidiano, porque ela, por sua natureza e processo de constrnção, parece não se prestar a isso, vez que o tempo da investigação científica, em geral, não se coaduna com as necessidades de decisões mais rápidas. A busca da pergunta adequada, da questão que não tem resposta evidente, é que constitui o ponto de origem de uma investigação científica. Nem sempre esse esforço de busca 23 de hipóteses mais consistentes, de colocação de perguntas mais densas, é encontrado na produçã.o das pesquisas na área educacional, e não só em nosso País. Nesse ponto, a relatividade do impacto dos res - tados de investigações;-C:ujas dimensões são sempre difíceis ~ ~ latar, é um aspecto que deve ser lembrado. Ac~ se ainda que o levantamento de questões mais de fundo e ãcãp~cidade de antecipar hoje problemas que estão se . aescortinando, mas cuk eclosão_não_está vjsiYel, são ponto~s na colocação de proplemas para_ ~sq~.J~é_possível à ~dida qué:h_a.ia uma certa constân~ e continuidade no trabalho de ,P-.esq.uisador..e..s.. ~ icados a temas preferenciais QOr períodos maislongos, carãcterizando uma certa especificidade em_sua contri- ~ção a um conhecimento mais sistematizado. Esta con- ~ ação de grupos em algumas especialidades-ou temas -é. uma das dificuldades que encontramos n a áre; da produção da _Qe$quisa~.rn~u~ª-º · As instituições Há que considerar que, de modo geral, nas uni- ~ rsidades onde a pesquisa veio a se desenvolver, nem ~ pre encontramos condições institucionais de apoio_. ~squisa educacional, e neste quadro a pesquisa na área veio revestida de características de iniciativa indi~i- Jual. E~ condições atingiram os programas de pós- graduação stricto.sensu, decorrendo em parte daí suas dificuldades em consolidar até recentemente, de modo-- fecundo, grupos de pesquisa, com produção continuada. Verificamos que, em alguns poucos programas de mestrado e doutorado, no final dos anos 80, se solidificam 24 tendências de trabalho- poderíamos dizer, começavam a formar tradição - enfrentando, todavia, condições institucionais internas ainda não tão favoráveis. As uni- versidades brasileiras, com raras exceções, não nasce- ram conjugando pesquisa e ensino; voltavam-se só para o ensino, para dar um diploma profissionalizante, tanto as de natureza confessional, como as leigas privadas e algumas das públicas. Elas não foram estruturadas para incorporar a produção de conhecimento de modo sistemático, como parte de sua função, sequer para a discussão do conhecimento. Elas mostravam-se volta- das para a reprodução de um conhecimento que não produziu, com o qual não trabalhou investigativamente, mas que absorveu e transfere. O espírito das "horas-aula" das instituições isola- das de ensino superior igualmente mostra-se nas univer- sidades, especialmente as recém-criadas. Muito pouco espaço abria-se para a pesquisa nessas instituições a não ser a partir de pouco tempo para cá, quando outras perspectivas sociopolíticas colocam novos referenciais para a constituição de universidades. O grande desen- volvimento no finalda década de 80 e nos anos 90 de programas de mestrado e doutorado , com estímulos específicos à pesquisa e com avaliações periódicas, a redefinição das exigências para as carreiras docentes universitárias, trazem mudanças substantivas, nesse quadro institucional. Contrapontos importantes Os anos 80 foram fecundos: palco de contrapontos importantes, decisivos mesmo para o cenário atual da 25 pesquisa em educação. Doís artigos publicados no final desse período tipificam essas discussões. Refletindo o embate quanto aos encaminhamentos das questões teórico-metodológicas entre os pesquisadores em educa- ção no período, Luna ( 1988) trabalha a idéia de um falso conflito entre tendências metodológicas e Franco ( 1988) contrapõe-se argumentando por que o conflito entre tendências metodológicas não é falso. A argumentação de Luna leva-o a afirmar que a questão das diferenças metodológicas tem sido formulada em termos imprecísos e que mesmo o sentido da palavra metodologia tem variado no tempo, ora aproximando-se do âmbito das técnicas estatísticas, ora filosofia ou socíologia da ciência. No entanto, para esse autor, se o pesquisador explicita sua pergunta/problema com clareza, elabora os passos que o levam a obter a informação necessária para respondê-la( o) e indica o grau de confiabilidade na resposta obtida, é possível avaliar seu produto dentro do referencial próprio desse pesquisador. Supõe-se, com isso que os conflitos metodo- lógicos seriam falsos, pois só poderiam se estabelecer no âmbito de crenças de confrarias restritas. Outros viéses sobre ~ questão adviriam da consideração das diferentes técnicas como explicitadoras de diferenças metodológicas, bem como pela teõ.tati va de "confrontar diferentes tendências teórico- metodológicas como se a verdade de cada uma pudesse ser atestada pela fragilidade de outra". A base de suas análises é dada pela sua concepção de que a "realidade empfrica é comp]exa, mas objetiva. Não traz nela mesma ambigüidades". Já o indivíduo é subjetivo, não sendo capaz de separar o objeto de sua representação. Daí o papel da teoria, que é por onde existe a possibílidade de se integrar os recortes que o homem faz dos fenômenos. 26 Ao discutir as idéias de Luna, Maria Laura Franco ( 1988) adota o ponto de vista de que não há como separar aquele que conhece do objeto a ser conhecido, ou seja, da parte da perspectiva de que o homem não é um ser meramente especulativo que precisa controlar sua subjetividade e "saír de si mesmo" para gerar conhecimento científico. O pensamento humano mantém uma relação dialética na ooi1strução das teorias vinculada à prática social de seus construtores e dos que as utilizam. Não ~e, pois, dicotomizar sujeito e objeto, nem teoria e prática. Considera essa autora que, a fonnalização dos requisitos que Luna coloca como básicos em qualquer pesqui a, qualquer que seja a metodologia, não é suficiente para expressar tendências metodológicas e nem explicitar a abordagem teórica, muito menos expor o fio condutor que dá significado aos procedimentos que adota, qu~squer que sejam, e mesmo à investigação como um todo. E nesse nível que os conflitos se instalam, ou seja, no processo em que homens concretos, historicizados, pesquisam uma realidade conct'eta, dinâmica. Enfoque do real, metodo- looia e teoria são interdetenninantes. Como há enfoques o . , conflitantes, há posturas metodológicas tarnbem conflitantes. Parte desses confrontos tem a ver com a chamada pesquisa qual itativa, cujo uso se expandiu pela busca de métodos alternativos aos modelos experimentais e aos estudos empiricistas, cujo poder explicativo sobre os fenômenos educacionais vinha sendo posto em questão, como se pôs em questão os conceitos de objetividade e neutralidade embutidos nesses rnodelos.t-s alternativas ,apresentadas pelas análises chamadas qualitativas compõem um universo heterogêneo de métodos e Jécnicas, que vão desde a análise de conteúdo com toda 27 s~ersidade de propostas, passando pelos estudos, Jk__caso, pesquisa participante, estudos etnográficos, antropológicos, etc. ~ O confronto salutar, explicitado em todos estes trabalhos, foi o caldo de cultura no qual se avançou nos anos 90, nas produções e preocupações com a pesquisa em educação. Conflitos entre posturas episte- mológicas, diferenciais de métodos e formas específicas de utilização de técnicas, avanços na explicitação do objeto, problemas de natureza institucional, fazem parte do vivido !:lªS lides dos que trabalham com a inves- tigação científica. Os procedimentos na investigação Alguns problemas ligados ao uso de certos méto- dos são comuns aqui como na produção de outros paí- ses, na área educacional, inclusive nos considerados como matriz dessa produção. Ques~ão que não se acha suficientemente discutida e trabalhada pelos pesquisadores é a tendência à não discussão em profundidade das implicações do uso de certas técnicas, e mesmo da prop1iedade e adequação desse uso e de sua apropriação de forma consistente. Observamos que, de pesquisas extremamente instrumentalizadas e de medidas aparentemente bem definidas, com o uso de modelos estatísticos mais ou menos sofisticados, nós saltamos para o lado oposto, onde passamos a fazer a crítica acirrada à inoperância desse modelo. Mas, devemos reconhecer que se caiu no absoluto de uma crítica que nem sempre explicitou seus princípios e ficou num discurso na maioria das vezes vago, porque 28 pouco fundamentado em conhecimentos consistentes sobre o outro modelo, no caso o quantitativo, e também, porque não ousar dizer, sobre as alternativas apresentadas como solução, tipo panacéia, para a pesquisa em educação. Mui se enquadra a questão das opções pelo uso de ~odelos quantitativos de coleta e análise de dados ou pelos chamados modelos qualitativos, ou seja, aquelas metodologias que não se apóiam em medidas operacionais cuja intensidade é traduzida em números. $ preciso considerar gue os conceitos de guantidade e.9ualida.9e_ não são totalmente dissociados, na medida em qu_e de - - -.um lãao a quantidade é uma interpretação, uma tradução, um significado que é atribuído à grandeza com que um fenômeno se manifesta (portanto é uma qua- lificação dessa grandeza), ~ de outro ela precisa ser interpretada qualitativamente pois, sem relação a algum referencial não tem significação em si. De qualquer forma,~ conjunto de procedimentos ~ pesquisa que envolve a quantif~ão strictu sensu e~ sua anál ise está atrelado às propriedades do conjunto numérico associado às variáveis em estudo, bortanto, à çlefinição destas e à garantia de que gozam de certas carac- terísticas. Isto impõe um tipo de lógica no tratamento do problema em exame e o uso de delineamentos específicos para a coleta e análise dos dados, que nem sempre os pesquisadores dominaram, nem dominam, para utilização adequada e enriquecedora. Críticas de diferentes naturezas foram feitas entre nós a esses modelos quantificadores, sem uma análise mais profunda das suas implicações e as análises com dados quantitativos foram praticamente banidas de nossos estudos.~ s últimos anos vimos proliferar em nosso meio, bem corno em muitos outros países, pesquisas em educação 29 ~ se revestem de caracteiisticas bem diferenciadas do 12_onto de vista dos procedimentos em face das desen.- _yolvidas com predominância em décadas aI}teriores. ,Yma dessas características é o uso de técnicas não quantitativas ~ obtenção de dados, tipo observação cursiva ou parti- cipante, análise de conteúdo, análise documental, histórias - -de vidª-, depQ_imentos, etc. Essas abordagens colocam-se como alternativas novas para o trato de problemas e pro- cessos escolares, mas, sobretudo, trazem uma salutar revisão dos parâmetros mais comumente utilizados para definir o que é fazer ciência. Seus fundamentos são outros e manifestam-se pelo questionamento da neutralidade do pesquisador e dos instrumentosde pesquisa, do conceito de causalidade determinística, da objetividade baseada na idéia da imutabilidade dos fenômenos em si, da repetição estática. T~azem também um grau de exigência alto para o trato com a realidade e a sua reconstrução, justamente por postularem o envolvimento historicizado do pesqui- sador, assim como em outros modelos, por exemplo, nos experimentais ou quase experimentais, coloca-se a neces- sidade de um domínio de técnicas de construção de instru- mentos sofisticadas e compreensão das análises estatísticas complexas em seus fundamentos. Os estudos de natureza ... dita "qualitativa" não podem significar uma banalização. A pergunta que nos colocamos ao examinarmos atentamente essas vertentes de pesquisa, a partir do que está produzido na pesquisa educacional no Brasil, é se há um domínio consistente de métodos e técnicas de investigação, qualquer que seja a abordagem em que o pesquisador se situa. No exame dos trabalhos, constatamos algumas fragilid,ades sob essa ótica que merecem ser apontadas. ~ fundamental o conhecimento dos meandros filo- s~ficos, teóricos, técnicos e metodológicos da abordagem 30 escolhida. Sob esse ponto há também alguns problemas nos trâOalhos de pesquisa na área educacional, tanto nos que usaram quantificação quanto nos que usaram metodologias alternativas. Nas abordagens quantitativas verificamos hipóteses mal-colocadas, variáveis pouEO operacionalizadas ou operacionalizadas de modo ina- .deq_uado, quase nenhuma preocupação com a validade e a fidedignidade dos instrumentos de medida, variáveis tomadas corno independentes sem o serem, modelos estatísticos a,elicados a medidas que não suportam sua~ exigências básicas, por exemplo, de continuidade, intervalaridade,. propor.cionaLidade, •forma <!_e distr!.=_ buiç!<? dos valores,_entre outros. Constata-se, ainda, ausência de consciência dos limites impostos pelos da- dos, pelo modo de coleta, às possíveis interpretações. E, ainda, interpretações empobrecidas pelo não-dotn0io dos fundamentos do método de análise empregado. De outro lado, encontra-se observações casuísticas, s~m parâmetros teóricos, a descrição do óbvio, a elaboração pobre de observações de campo conduzidas com ~ cariedade, análises de conteúdo realizadas sem meto- dolÕgia clara, incapacidade de reconstrução do dado e de percepção crítica de viéses situacionais, desconhecimento no trato da história e de estórias, precariedade na documentação e na análise documental. 'os problemas não são poucos, tanto de um lado como de outro, o que nos leva a pensar na precária formação que tivemos e ternos, para uso e crítica tanto dos métodos ditos quantitativos como dos qualitativos. Nessa direção, Warde (1990) S2!!1e.!!...ta, em estudo detalhado sobre dissertações e teses nâ área da educação, que, "muitas indicam Õmãnejo amadorístico dos complexos prõcedimentos nelas -- - -- / .. !ffiplicados com a derivação de resultados científicos e sociais .pouco relevantes". 31 _Erecisa-se considerar o alto grau de maturidade e !"efinamento subjetivo exigido pelas chamadas metodologias qualitativas (André, Ludke, 1986), e pQQemos concluir que ~s não estejam_ sendo adequada e oportunamente gianipuladas, não só, como em geral se quer fazer crer, pelas ~ ndições ac!_versas·em que se realizam as pesquisas, mas vorq_ue a formação que está sendo dada não é adequada qem suficienteejAcrescenta Warde (1990) que há de se destacar que da utilização crescente das novas metodologias exploratórias/ qualitativas decorre a composição de amostras intencionais ou arbitrárias, muito reduzidas e predominantemente constituídas de alguns sujeitos; no caso das descritivas- narr:ativas, a "amostra" é o próprio autor que expõe sua "experiência" ou "vivência". Mesmo utilizadas nas dissertações/teses que abordam diferentes assuntos ( educação popular, educação e movimentos sociais e outros), as novas metodologias preponderam entre os estudos relativos aos processos e práticas intra-escolares, com particular ênfase aos pedagógicos. Nestes estudos, são produzidos, em regra, propostas de ação (administrativas e/ ou pedagógicas) para instituições ou redes de ensino. Qual a real validade disso? É preciso reconhecer que não temos nos omitido no enfrentamento desses problemas, mas que, por outro lado, nem tudo o que se faz sob o rótulo de pesquisa educacional pode ser realmente considerado como fundado em princípios da investigação científica, traduzindo com suficiente clareza suas condições de oeneralidade e b ' simultaneamente, de especialização, de capacidade de teorização, de crítica e de geração de uma problemática própria, transcendendo pelo método não só o senso comum, como as racionalizações primárias. 32 Pesquisa em educação e seu impacto social Realizamos dois trabalhos cujos objetivos eram os mesmos: analisar como e em que magnitude pesquisas realizadas nas instituições de ensino superior contribuíram para o desenvolvimento das reformas e inovações realizadas ou em realização no sistema educacional, nos níveis fundamental e médio (1986 e 1994). Na medida em que entrevistamos tanto o pessoal das universidades como o pessoal das Secretarias de Educação, em diversos pontos do País, e em diferentes níveis da administração, é-nos possível fazer uma reflexão quanto a essa relação, a partir das falas dos entrevistados. Os fatores aos quais se atribui, no g~r~l, à insufi- ciente paiticiQª-ção das ins~ções de ensino superior nos _erojetos de desenvolvimento ou inovações do sist~~ educacional, bem como a pouca utilização das pesgmsas ~ucacionais são: desvinculação das universidades - - ---'-----:--:-:--:- ~ - brasileiras com os níveis básicos de ensino; distanciainento das universidades em relaçª9 aos problemas prático,§;_ visão idealizada e teórica da universidade sobr~o ensino; tãfta de maior procura por parte dos órgãos gover- namentais em rela ão a universidade· o cai·áter teórico • as pesquisas; a inexistência quase total de trabalhos ~onjuntos; ~a de comunica~ dos Lesultados ~ªL , gesquisas; as dificuldades d~s adrnirus~a_dor.es ~~nsmo_ ~m fazer a passagen:uia teroa,12ara a m:.<!!.~;.~1dez do_ sistema educacional na absorção d~propostas inovadoras; ~ oucaimportânc'íã atribuída_à pes_guisa em alguns ___ ..;,_____ _, segmentos governamentais- ~ pesquisadores entrevistados levantam problemas para essa colaboração, como: falta de hábito dos admi- nistradores escolares de recorrer a pesquisas para o 33 des~nvolvimento de seus projetos, falta de mecanismos eficien~es de integração ~ntre órgãos produtores e órgãos potencialmente consumidores de pesquisa educacional projetos de pesquisa excessivamente individualizados 00~ d~con_:inuidade na produção, problemas de comuni~ação edifusao. Todas essas considerações são extremamente rele- vantes e ,mere~em reflexão por parte dos pesquisadores. ~orém, e preciso lembr~r que, na visão do pessoal que tr ~balha nas redes ~e ensmo, bem como nas colocações feitas ~elos pesquisadores de universidades também entrevistados, observa-se uma perspectiva linear, reve- lando _uma co~~epção muito idealista quanto à relação pesqmsas-poht1cas-ações educacionais. Isto não condiz co~1 as perspecti ~as de produção histórica de relações, Seja quanto a Objetos da cultura, seja quanto a movi- mentos político-sociais. Há inegavelmente uma porosidade entre o que se pr?duz na~ instâncias acadêmicas e o que se passa nas gestoes e açoes nos sistemas de ensino ninh . ,mas os cru _os qu_emede1am essa inter-relação não são sim- p_les, nem imediatos. Fazem parte desse processo de poro- sidade tod~s a~ nuances e ruídos relativos aos processos d~ comumcaçao humana, de disseminação dos conhe- Cimen:os, de decodificação de informação e sua inter- retaçao: num ?ado co~texto de forças sociais em conflito. ~tas:ªº muitas. A leitura do produzido, como dizemos no jargao aca?êrnico, é polissêmica e feita no âmbito do pr?~esso de alienaçãohistórico-social a que todos estamos sujeitos. . Agreg~do a ~sto há o fator tempo. Os tempos dos c~nhos da mvesttgação científica e da disseminação de srnteses que, por meio e a partir dessas investioações se produzem, é bem diferente dos tempos do :xercício 34 "em tempo real" da docência e da gestão educacional. Os estudos, as pesquisas têm um tempo de maturação e o professor não pode suspender sua ação, nem os gestores de sistemas em seus diferentes níveis de responsabilidade. Respostas imediatas e continuadas são exigidas destes e não dos pesquisadores. Enquanto a pesquisa questiona e tenta compreender cada vez melhor as questões educa- cionais, os administradores, técnicos e professores estão atuando a partir dos conceitos e informações que lhes foram disponibilizados em outro espaço temporal. O que se produz enquanto conhecimento nas reflexões e pesquisas na academia socializa-se não de imediato, mas em uma temporalidade histórica, e essa história construída nas relàções sociais concretas seleciona aspectos dessa produção no seu processo peculiar de disseminação e apropriação. Exemplo disso foi o impacto dos estudos sobre fracasso escolar e qualidade do ensino em políticas nos anos 90, a partir de pesquisas e dis- cussões no final dos anos 70 e dos anos 80. É evidente que o enfoque que atualmente se dá nas políticas públicas e nas discussões de jornais e revistas, ou seminários de setores do trabalho em educação, assenta-se em uma construção lenta de conhecimento que se acumula em muitos anos. Mesmo quando se atualizam dados de demografia educacional, as perspectivas de análise fundam-se em outros dados e algumas reflexões consolidadas em um tempo anterior. Para os conhecedores da questão que · utilizamos como exemplo, esses problemas começaram a ser contundentemente revelados e abordados, com a conotação específica dada a ele hoje publicamente, justamente em pesquisas de po1te realizadas e publicadas no final dos anos 70 e começo dos anos 80. Depois 35 destes trabalhos o que se fez foi desenvolver a mesma trilha e mostrar que o problema só aumentava de mag- nitude. Entre lá e cá alguns reflexos existiram em ini- ciativas políticas, algumas mais locais, em instituições específicas, outras mais amplas em Estados ou muni- cípios, como por exemplo a implantação do ciclo básico no Estado de São Paulo, aí também, as "escolas pa- drão", as diferentes iniciativas de diversos governos para renovação dos processos de alfabetização, desenvol- vimento da leitura e escrita; os ciclos de ensino nos municípios de São Paulo e Belo Horizonte, as "classes de aceleração" em muitos Estados, entre outros. Esse impacto assume as características do possível historicamentedetenninado, portanto, não assume uma feição do idealizado nas reflexões e nos desejos dos pesquisadores, mas a feição do factível, no confronto dos interesses e poderes que atuam no social numa dada conjuntura. A porosidade entre pesquisa e suas aplicações possíveis nas políticas educacionais também é deter- minada pela formação dos quadros componentes dos sistemas de ensino. Estes quadros receberam sua for- mação básica em um determinado tempo e lugar, tendo acesso e lendo uma determinada bibliografia, ou sendo por estas orientados pelas exposições de seus profes- sores. Ensinou-se a eles alguma coisa em um certo pe- ríodo histórico no qual formaram idéias, ideais e valores. Estas aprendizagens, feitas pelas mediações de cada um, transformadas pois, terão ressonância nos lugares em que suas aç(>es profissionais irão se desenvolver. As idéias que se formulam pelas pesquisas, estudos, reflexões, ensaios, e que passam para as gerações em formação num dado tempo, bem como no contínuo de seu exercício profissional, são levadas de alguma forma 36 para dentro deste exercício, e suas marcas fazem-se sentir numa temporalidade diferente daquela em que se formou uma base de conhecimentos e formas de pensar deter- minadas. Por outro lado, não deixam de receber novas informações que se confrontam ou se integram às que já têm. Então, este processo tem aspectos de sucessividade e de simultaneidade, num contexto institucional que é. histórico, histórico pessoal e social. Alguns permanecem ;a escola ensinando, outros vão desempenhar outras funções, técnicas ou ádministrativas, ou n01mativas, mas ~01tando consigo a ba_se, mesmo que transforrna~a, com 3UIUal adentraram na seara da educação. Aí, m~1fest~ ~ -á em suas ações aquilo que construíram como conhecimento, a partir de seu próprio processo educativQ~ e de sua prática social e pro~ssio~al_: ---"',___ ---- -- Há um papel social para a consistência metodológica? Os resultados de pesquisa, na sua disseminação pelo social, parece também ter alguma relação com os métodos de trabalho dos pesquisadores em sua _possibilidade de gerar alguma credibilidade dentro e depois fora dos ambientes acadêmicos. Algo ligado à plausibilidade dos resultados e de sua generalização ou transformação em ações e práticas. Claro que esta disseminação é seletiva, desigual e dependente dos jogos de forças sociais em determinado momento. Este aspecto mereceria maiores estudos. É como se houvesse uma sensibilidade social ao que é mais rigoroso, ou confiável, ao menos frágil metodologicamente, não facilmente demoHvel pelos furos nas coletas de dados ou análises, não facilmente contra-argumentável. Há também, neste processo de 37 impacto social, os conseqüentes da aplicação de resul- tados da investigação científica nos sistemas escolares -efetivos, não-efetivos - que servem de avaliação para a consistência de seus resultados. Historicamente, além das associações com deter- minados tipos de poder e conjuntura, para ser tomado_ c~conhecimento ~ levante llenetrar..!!_o S<2fial,_o_ ~ nhecimento advindo dãs pesquisas parece necessita{_ também carregar em si um certo tipo de abrangênciâ , nível de consistência e foco de im_p_acto, aderência ao -real~ cãiido em ~ntos críticÕs con~re.!.0., fiá p;;_ _guisas "p.Q!i!_icamente interessantes" ante certos grupos, mas gue mostram fôlego curto ante o experimentad.9 s ocialmente. Suas inconsistências metodolóoicas dão- - - - o lhes fôlego curt9. Há muítos exemplos históricos distÕ em pesquisas de diferentes áreas. Como se vê, muitos são os fatores presentes nesta tensão e na porosidade entre as pesquisas e as políticas educacionais, entendidas estas tanto como expressas nos aspectos de sua gestão mais ampla, como também naquilo que se concretiza nos cotidianos das escolas. Referências bibliográficas ANDRÉ, Marli E. D. A. de. Texto, contexto e significados: algumas sugestões na análise de dados qualitativos. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 45, p. 66-70, maio 1983. ANDRÉ, Marli E. D. A.; LUDKE, M. Pesquisa em edu- cação: abordagens qualitativas. São Paulo: E.P.U., 1986. 99 p. 38 CAMPOS, Maria M. M. Pesquisa participante: possi- bilidades para o estudo da escola. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 49, p. 63-66, maio 1984. DEMO, Pedro. Qualidade e representati vidade de pesquisa em educação. Cademos de Pesquisa, São Paulo, n. 55, p. 76-80, nov. l 985. FRANCO, Maria Laura P. B. Porque o conflito entre tendência metodológica não é falso. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 66, p. 75-80, ago. 1988. GATII, Bernardete Angelina. Pós-graduação e pesquisa em educação no Brasil , 1978-1981. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 44, p. 3-17, fev. 1983. ____ Participação do pessoal da educação superior nas refonnas ou inovações do sistema educacional. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 59, 1986. ___ . 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Em geral, há uma certa confusão nas questões de método dado que a formação em pesquisa nas áreas das ciências sociais e humanas nas universidades bra- sileiras foi pouco incentivada, porque não tínhamos, na maioria de nossas instituições de ensino superior, tradição de pesquisa. Isto é mais acentuado em algumas áreas do que em outras. Podemos mesmo dizer que, nas áreas das Ciências Humanas e Sociais, até recen- temente não tínhamos massa crítica de investigadores de largo espectro, diferentemente do que ocorria nas áreas das ciências exatas e biológicas que têm uma outra tradição. J-la área da educação a tradição de pes~- tringiu-se a poucas iniciativas, até além demeãdos do século . ~- 20, e sua expansão, como área de investigação, é mais recente. 'ê._preciso reconhecer que na área educacional disiz.unh~ de pessoas com ampla e profunda fonnação cultural, mas que não tinham interesse, nem formação específi_f:a na área ~ investigas,ão empúica. Sua atuação passava mais por questões de natureza filosófica, de teoria sociológica, de reflexões mais gerais. Dominava o beletrismo, ou, o bachare- J.islll2ie base discursiva: E.Qreciso aeon~ ~m q~e as ~lí?c~ de finan~iament~ ~pesquisa,~ longo t~mpo, nã";"" _pnvileg,aram as areas sociais e humané!$, e em particular, a da educaç~ . A tradição de pesquisa nessa área veio se formando aos poucos, com apoio financeiro precário, e, enfrenta difi- culdades para firmar-se porque dispomos de um conjunto ainda reduzido de pessoas que mergulharam a fundo na construçãô do conhecimento a partir de investigações consis- tentes e sólidas, desenvolvidas com continuidade temática e teórica Temos problemas no domínio de teorias. Enfrentamos problemas de base nas abordagens metodológicas. Estes problemas variam de subárea para subárea, e de grupo para grupo, ressalvando que alguns grupos apresentam uma situação quase de excelência. ·, Quando falamos de método, estamos falando da fonna ~ construir o conhecirnentg, N~se~bito setores onde a pesquisa e a teoria levaram à constituição de referenciais específicos, mais claros e mais fortes, suportam o levantan1ento e a sustentação de novas idéias, questões, hipóteses de trabalho e os meios de investigá-las. . Qnde teorias mais consistentes foram elabor.(tçl.MJL partir da observação sistemática e da crítica pertinente_ e_ confrontadas d_en~o_dos limites de suas definições..,_pela. ~eza do prQPno referencial que Toes dá suporte, e dos ~ forços p_ara_ ~ua construção _ encontramos posicio;;.: [Ilentos mais §2!!..dos quanto às questões de pesqui~ 11Jétodos .d: trabalho t ª'2__ran~ncia e po_Jsíve~alidade de suas concl!J::. ~ Por exemplo, teorias como a abordagem piagetiana ou a psicanálise, na Psicologia, ou o weberianismo e O marxia- nismo, na Sociologia, quando trabalhadas com pertinência, 44 oferecem um balizamento forte, dentro de seus parâmetros, para investigações e pai-a a revisão de perspectivas e ?e teoria. Porém, isso não ocorre de modo geral nas diferentes subáreas em que se desdobra o campo da investigação em educação, onde os estudos mostrarn uma teorização ainda precária, e onde há, nas apropriações teórico-metodológicas de outras áreas, grandes distorções e arnbigüidades. Muitas vezes, pela falta de consistência, trabalha-se sobretudo no âmbito de ideologias idiossincráticas e monolf ticas, e a constmção teórica própria mostra-se bastante frágil, contra- ditória e/ou incipiente. É comum verificar-se o transporte de teorias e abordagens de tradições mais consistentes pai-a áreas onde isso não ocorreu ainda, sem haver uma análise crítica quanto ao seu nível de abrangência e adequação relativo a perspectivas, problemas e campo de trabalho, e, muitas vezes mesmo, sem o domínio acadêmico adequado das teorias trai1splantadas. Há, nesse sentido, uma apropriação super- ficial e empobrecedora, no mais das vezes, equivocada. Podemos dizer que se faz um uso acrítico de teorias críticas. Temias têm sentido no âmbito histórico de sua construção, que se dá no contexto de uma certa tradição de trabalho. Descontextualizadas e transplantadas sem raízes, as teorias descaracterizam-se ou viram dogmas. Perdem, portanto, sua condição de verdade aproxinlada e relativa, de síntese provisória, a ser revista, discutida e superada pela pesquisa consistente e crítica, dentro de uma apropriada tradição investigativa Ciência una, método uno? O modelo das ciências exatas e biológicas, que foram erigidos como sendo "a ciência" no século 19 e 45 início do século 20, começaram, nas primeiras décadas desse século, a ser apropriados pelas ciências humano- sociais, estas em sua procura de um espaço no âmbito da cientificídade. É interessante lembrar que nesse período, por exemplo, com a teoria da relatividade, a física já vinha fazendo uma mudança de perspectivas em seus modelos interpretativos, e, como ela, várias outras áreas também mudavam suas fonnas metodológicas e teorias sob o im- pacto de rupturas em estruturas de conhecimentos, na ?usca_de s:1peração de impasses revelados pelas próprias 111vest1gaçoes. Naquele momento histórico, começa-se nas ciências h_um~as, na_as~iração de um conhecimento dito objetivo- c1~nt1fico, a imitar aquilo que nas ciências experimentais veio sendo consagrado por vários séculos como sendo "o m~todo" ci:n~ífico. ?u seja, a imitar o modelo repre- se~tacional então ideologicamente valorizado e socialmente v~1culado d~ ciência, modelo esse que, de certa forma, amda pe1meia fortemente círculos acadêmicos. Devemos lembrar que esse modelo tem qualidades interessantes e não de~prezíveis para a produção de certo tipo de conhec_imento,_ nos limites de suas proposições e, para determmados tipos de questões. O grande momento de expansão das áreas humanas ~e estudo~ eng~anto "ciências" e, gessa concepção posi- ovada e, nao mrus como áreas especulativas foi no começo 90 século 20t sõbretudÜpós- 1930, que é quando mais - !?}te~en_t~ se dá a ~P.[opriação d~ certos modelos das pe_nc1as físicas e naturais peJac; ciências humanas e sociais~ A area : ducacional se incorpora a esse movimento. - E quando se buscam leis gera is de causa e efeito ou relações funcionais detenninísticas. Essa apropriaçã~ 46 traz vários problemas para as ciências humano-sociais. Não que a quantificação e a metodologia experimental não sejam, em caso algum, aplicáveis às áreas de estudossÕciÕÜmanâs ou sejam um mal em si ou dispensáveis. Ao-con~Sem as experimentações, nas ciências em geral, não se saberia muita coisa. Sem modelos matemáticos e quantificação há fenômenos que são absolutrunente inescrutáveis. Na educação elas podem ter o seu papel em pesquisas específicas (as demográficas, por exemplo). Mas é o ideário dentro do qual essa apropriação se fez, a perspectiva dogmática com que se passou a construir instrumentos de medida, acreditar nas medidas de forma absolutizada, a acreditar na neutralidade das intervenções de pesquisa e dos dados. A própria maneira como se passou a medir e descrever fenômenos, como se medidas fossem exatas e relações lineares de causa e efeito fossem diretamente detectáveis e pudessem tudo explicar dos fenômenos humanos, sociais ou educacionais, em maiores indagações sobre a natureza das medidas e a propriedade ou real validade dos conceitos que as fundamentam. Tudo isso corresponde a uma construção histó- rica, que se mostrou possível e talvez até necessária em certo contex to da civilização ocidental. Foi o cami- nho pelo qual construiu-se o estatuto de ciência para essas áreas que pretendiam basear seu conhecimento em pesquisa empírica e não mais em proposições idea- lizadas. Historicamente, essa concepção de ciência e método impôs-se na produção social da Ciência. Psicometria e sociometria expandem-se. Na Psicologia, por exemplo é o momento áureo dos testes de inte- ligência, escalas de atitudes, na Sociologia das escalas sociométricas de distância social, na educação, os tes- ' tes de prontidão para alfabetização, etc. Foi um 47 movimento para tirar estas áreas da égide da filosofia ou da especulação puramente beletrista ou subjetivista. Essa "objetivação" faz-se pois, sem os questiona- mentos da relatividade dos fenômenos, da contamina- ção valorativa do pesquisador na coleta e tratamento dos dados, dos viéses intrínsecos dos instrumentos de medida e de sua validade real, da própria discussão sobre as possibilidades concretas de controle das condições de levantamento dos dados, e sem questiona- mentos quanto às reais possibilidades de experimentos envolvendo questões sociais e humano-subjetivas - todas questões que irão balizar mais tarde as críticas a essa forma de investigação científica. Aquele tipo de busca de objetividade correspondeu a um momento social em que a crença na ciência e seu método - reti- ficados e endurecidos num modelo único - impunha-se como idéia hegernônica tanto no ambiente universitário como nos leigos. Tudo nesse modelo é inválido? É óbvio que não. Onde se localizam os problemas? Podem estar nos fundamentos dos instmmentos, nas formas e perspectivas associadas a seu uso e manipulação. Podem não se situar nos instmmentos em si, mas, em admitir-se que esses instmmentos são neutros e objetivos e, assim interpretá- los, em tomar-se as conclusões como verdades que são absolutizadas e generalizadas sem questionamentos sobre seus limites. Está em não se considerar erros e viéses. Os problemas situam-se na maneira como utilizam-se técnicas que se traduzem corno método. Está, pois, nas crenças, no julgamento de que se está medindo os fenômenos e respondendo a questões de modo definitivo e absoluto, sem mesmo considerar que qualquer medida é uma construção arbitrada. Ela não é o fenômeno. 48 Essa tradição objetivista, embora rela~ivizada e mudada pelas críticas internas e externas, e~ta presente em nosso cotidiano de pesquisas e tem ai seu papel. E sa presença coloca-se muitas vezes de uma forma ~ d bom senso crítico mas, outras vezes, cnva a por um ' . d não. Evidencia-se, entre gr_upos de pes_qu:sa, gran ~ desigualdade de consistência na apropnaç~~ e desen volvimento de métodos e técnicas de analise _nessa d. - No meio educacional podemos detectar, pelo ' tra 1çao._ ' - d . de acompanhamento histórico de produçoes e grupos > -.sa ue a maioria deles na verdade sequer pesqu1 , · t s apreendeu com consistência a lógica e os proce !fie~ d ,rtonto Houve uma apropriação não so acn IC<t___ esg_y.e~. ~~~~-~~==~~~ · w do modelo, como também feita sem..a12rofundame..u ~..e 'sem o domínio necessário gclo menos a seu bom us..o dentro de seus limites. Observa-se mesmo fa lt~ de domínio de princípios e conceitos elementares_ entI e os , ·os e também entre seus críticos. Ou sep, o que usuar1 , ' , b , 1 se constata é um uso sem base real. Isto e o s~rv~ve . , . s detectáveis em análises quantitativas em en-os pnrnano . . e instrumentos de medida, que estão descntos em tes~s, a.rtigos relatórios, etc. Acrescentamos, nas apropna- ções rn~todológicas nessa tradição, os problemas de uso inadequado de métodos analíticos, ~om emprego de técnicas não-sustentáveis para certo tipo de dados. As posições críticas e seus problemas , · erficial começou, Nessas condições de doffilruo Sup d 70 e (r dos anos e -em nosso meio, sobretudo a Pª~~~~,.,.,. ,_;.,nti'fir~ crítica 80, a crítica a esse modelQ..dej~~onhecedor - fl - deumc que nem sempre foi fruto dl_§!a!r~e!!e~x~a~o~~==------ 49 ~·ofundo e experiente ctas.J.idas.mu nvestiga~ão_cJ@tífica (mesmo porque esta profundidade era rarefeita entre nós~ mais em algumas subáreas do que noutras). E assim • • • t---,.,,, i ~c1ou-se Ul!!lflémpara a adesão pouco fundamentada aos ~Ímentos genericamente âenorninados de ~ti vos, corno se em qualquer condição de investigação ~tífica Íi-ª.Q se estLvesse lidando, sempre e sempre, com questões de qualidade, de qualificarão. , -- ,:i;-__ Nessa mudança não parece ter havido um processo de transformação, mas, sim, um movimento de adesão novamente acrítica, sem que as novas perspectivas tenh~ sido realm~nte dominadas, apropriadas com integração cornpreens1 va e abrangente dos seus princípios básicos estes muito complexos pela natureza mesma das rnetodo~ logias não-quantitativas e dos elementos novos com que se ~stá trabalhando. Nessa direção não espanta ao pes- qmsador experimentado o encontro com um O"rande , /:) numero de trabalhos meramente descritivos, verdadeiras ~st~rias para uma boa mesa de bar. Mas preocupa a ligerreza com que se caracteriza esta tradição investigativa em certos círculos. Ainda não se consegufo um domínio consistente de teonas e metodologias, inclusive nas auto-intituladas ten~ti_vas de desmistificação dos métodos qu·e objetivam o _,8 UJ~Ito, os f~tos, n_os questionamentos de que o objeto nao e observavel diretamente, que o instrumento está co?taminado por W:Uª série de viéses, etc. _6ssj m, aderi oda- ~ ~ as ~odahdades aceitas não parece haver co.ns- ciên_cia c~ara de ~lJ~ ~rguntas aberta~ os depo~~nto.â._ -é1stónas de vida, as anotações li_y_r~ de campo, tanto ~to as escalas, os instrumentos fechadÔs e os testes - ~bém estão sujeitos a distorções eim~isões oriundas,_ dos valores e atitudes do pesquis~c!_or, porque há um suj~ 50 falante que pergunta, que usa determina~palay~, q~ intervém e tem um refe~cial gessoal, v_alores, esco~has e _gllenessaco.nclição <Ealo~com seus_ mterlocuto1 es~ pesquisa. . ... Quem discute e analisa essas poss1b1hda~es de miscicrenação, de parti pris, nomeando-as, ou v1slum- brand~-as nos dados, em suas análises fazendo um verdadeiro processo hermenêutico com o processo e a trajetória da pesquisa na vertente chamada de estu~os qualitativos? O que, do que digo ser fruto da pesquisa, é fala minha, o que e como estou falando no lugar dos meus sujeitos, o que meus interlocutores na investigação de fato falam? Nada disso se analisa, contentando-se com a afirmação de que nada é neutr?, o ~ue ~o-~e nos levar a admitir que tudo na pesquisa e opmiao do próprio pesquisador e não fruto de uma depu~açã~ séria à luz de uma dada perspectiva, de uma teonzaç~o, ou dos confrontos de valores pesquisador-pesqmsado. Diz-se que o pesquisado diz, mas muitas vezes "di~" como quer o pesquisador. Assume-se a não n,:utrall - dade mas não se aprendeu a trabalhar com a nao-neu-' , . , . tralidadena direção de consensos sustenta veis teonca e metodologicamente. Por isso, torna-se evidente n~s trabalhos a mesmice e a evidência, desde a colocaçao do problema, do ponto de chegada. Saímos de uma forma de coleta de dados para outra e não percebemos que os problemas de fundo são os · - 'ct· sade mesmos e que qualitativo, em pesqmsa, nao e 1spen . rigor e consistência, nem sinônimo de Literatura ou poesia. A constatação desses problemas nesse tipo de trabalho mostra mais uma vez que as queSlÕes de método e de teoria não foram de fato ainda suficientemen,te aprofundadas. Não o foram, suficientemente, entre nos, 51 tanto n~ tradição lógico-empirista, como o foram a· d nas tr di - / · rn a a çoes cnticas. Enveredar por novos cami·nh . . . osque se considera mais a_iustados às necessidades da - com- preensao um pouco mais rigorosa do real ou se·ia, c - / , :i ompre- e?sao que vau_°: pouco além do senso comum, não quer dizer apenas u~zar outros tipos de instrumentos, mas sim transformar atitudes e perspectivas cog·no / . b d . · e: sc1veis, sem a an onar o eixo da consistência explicativa. Isso tem a ver com os métodos de trabalho empregados. ?e qualquer maneira, a crítica à neutralidade do pesquisador, dos instrumentos do e .. · . lu · . . , mpu 1c1smo abso- ~te: da mistificação da idéia de wn tipo de ob ·etiva ão que dificilmente se sustenta, foi sumamente un· rtan~ ç um · · po te para repos~cronarn:nto geral em várias tradições de trabalho na pesquisa nas areas educacionais Este e/ um · . · .processo que vunos v1ven~o no Brasil há aproximadamente 30 anos mas c~ecemos ainda de massa crítica mais densa de bon; d pesquisad~res. O campo é ainda rarefeito de pesquisa- ores expenentes es ·a1m ' pec1 ente em alguns setores Imitar este ou aquele n:1odelo não é suficiente. Corre-se~ risco de f3:_er-se cancatu~as. Há que se debruçar sobre as quest?es de base, ha que se manter a capacidade de questionamento viva e atuante há . teórica e d/ ·ct / . ' que se ter solidez uvi a metodica, há que se temer doo verdades fáceis e antecipadas. ºmas e Instrumentos e métodos As questões de método estão imbr1·cada q e d / s com as ues oes os conteudos das próprias c·~ . / . iencias das caracte1:sncas de seu campo de preocupação e das fo~mas valorat1vas e atitudinais com que se abo d r am essas 52 preocupações. Embora não se possa descuidar das boas características dos instrumentos de coleta de dados a serem empregados (questionários, fechados ou abertos, escalas, entrevistas, desta ou daquela natu- reza, jogos, simulações, memórias, etc.) estes são como 0 martelo para o marceneiro, ou a pá para um pedreiro, que podem utilizá-los de diferentes maneiras para propósitos e efeitos diferentes, em função de seus desígnios e na dependência, é claro, de suas habilidades para utilizá-los. Um bom martelo, uma boa pá são absolutamente necessários para um trabalho de qualidade mas, também, necessita-se de um artesão habilidoso e experiente em seu uso para a obtenção de resultados qualitativamente bons. Apenas uma boa pá nas mãos de quem não desenvolveu condições e não tem umª pê"rspecti va para seu uso não garante um bom resultado. Aí está a questão do método, que não é apenas uma qüeStão de rotina de passos e etapas, de receita, mas de @ência de um problema, com pertinência e consistência em termos de perspectivas e metas._ Teorizações e métodos Na prática da pesquisa entre nós muitas coisas confusas são encontradas. É comum os trabalhos reivin- dicarem estatuto de científico, com discrepâncias gritantes ~ tre teoria e método. Aponta-se e:sta ou aquela referên~ia teórica de fundo e descrevem-se procedimentos de. pesquisa numa estrutura que nada te~ a ve_r com a refe- rência declaradamente adotada. Isso porque não se ~senvolveu o domínio nem de meios e procedimentos de,. ~ vantamento empírico de coleta de dados e nem do que 53 ~gnifica urna abordagem ep.istêmiça esP.ecífica no olhar os fenômenos, os fatos a serem compreendidos. Estes ~ aspectos não se excluem mutuamente, e são determinantes no modo de transitru_.pelo levantamento de dados e pelo que é encontrado. J udo se liga a um modo de estru· na pesquisa, o que tem a ver com dadas fo.rm_as de concreôzar jptersubjetividades. ~ se integrou uma perspectiva histórico-dialética (ou ~ualquer outra) já se tem um parti prfL uw moda particular de ver os fenômenos e interpretá-los. Isto faz com que se olhe a realidade de determinada maneira e portanto, levá ao üso de um determinado instrurnent~ tarnb~m de determinada maneira. Claro que, para 0 pesqmsador, a constante vigilância quanto às suas formas de ver e interpretar fenômenos é absolutamente indispensável. Se criôcou-se que os métodos estatísticos deix~vrun de lado o singular, o diferente, o que não se encruxava no modelo, coerentemente tem-se que exercitar a ~esrna crítica com relação a qualquer perspectiva ~eónco-rnetod~lógica: O que estou deixando de lado como 1n:elevante? O que estou deixando de considerar? O que rrunh_a forma d~ analisar não abrange? Mas o que se ~bse1_v~ em mmtos trabalhos é a utilização mecânica, ntualísnca ou ~~rm~ de meios de invesôgação, no rnesmõ" esquema das c,~ncias experimentais em seus primórdios, . co~- pretensas_mterpretações à luz de uma abordagem teonca que nao se coaduna com os procedimentos - adotados e reali~c;. - . Os mé~odos nascem do embate de idéias, pers- pectivas, teonas, com a prática. Eles não são somente um conjunto de passos que ditam um caminho. São também ~m ~onjunto de crenças, valores e atitudes. Há que se considerar o aspecto interiorizado do méto~, seu lado 54 intersubjetivo, e, até em parte, personalizado pelas mediações do investigador. ~ª'. os mét?dos. para além da lógica, são vivências do própno pesquisador com ue é _eesquis~Não são externos, independentes de og . ' l quem lhe dá existência no a~o de prat1c~- O.:- _ No exercício da pesqmsa certas onentaçoes e regras existem e são úteis e necessá1ias· como referentes de validação e plausibilidade das análises. Mas, se não forem apropriadas e integradas pelo pesquisa~or e~ sua~ formas de pensar e agir, num certo conjunto lógico-v1venc1al, num estado de espírito que leva a um certo tipo de olhru·, de perspectiva ante os eventos, estas orientações e regras tomrun-seestéreis, porque mecânicas: levam tão-somente à repetição, à imitação e não à apreensão criativa e consistente do entrelaçamento de fatos e dados em seus significados; também não levaria à discussão e conscientização de seus limites. Isto só é possível pela apropriação transformadora, personalizada, das regras, formas de trabalho e orientações já formalizadas. Ou sejé!, os métodos de trabalho precisrun ser vivenciados em toda ~~tensão, pela experiência conti~uada, J?:las tr~, _lli?los n·opeços, pelas críticas, pela sua m~egraçao mediada _g_elo próprio modo de ser do pesquisador en~uanto_ pessoa. Sem isso, tem-se a rotina, o bom ~g_mdor de_ [eceitas que produz trabalhos cuja conclusão já se conhece antes de terminar. Sem as condições referidas acima, falta aquele toque que traz a marca de quem cria, e cria porque integra subjeti vrunente e cri ticrunente o que uma tradição em certa área de investigação produziu historicrunente. Como forma de clarear isso lembramos o dito que passa de boca em bÕca, seg\md~· o qual, na cozinha, seguir com perfeiçãQ_ .!!_ma receita não garante um bom bolo. No trabalho humano, 55 na rodução humana, há esta caractenstica do "al o mais" ueé soal, e de ndedo envolvimento da uilo ue se põe de si mesmo no tr ' teses essoais das formas de mediação e representações 9ue cada ui:!1.. fuz a partir de suas relações socioarnbientais, - Assim, em cada tradição de análise, seja a lógico- empirista ou a materialista histórica, ou a fenomenológica, ou outra ainda, para além da forma de :::ibordagem, há um conjunto de crenças, valores, atitudes, habilidades em relação ao modo
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