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Cultura e Memória Social Volume Único Jurema Luzia de Freitas Sampaio Ilu st ra çã o ca p a: A nd ré A m ar al Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Jurema Luzia de Freitas Sampaio Cultura e Memória Social Semestre 1 2018 Brasília, DF Rio de Janeiro Faculdade de Administração e Ciências Contábeis Departamento de Biblioteconomia Jurema Luzia de Freitas Sampaio Semestre Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância 1 Cultura e Memória Social Permite que outros remixem, adaptem e criem a partir do seu trabalho para fins não comerciais, desde que atribuam o devido crédito ao autor e que licenciem as novas criações sob termos idênticos. Presidência da República Ministério da Educação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) Diretoria de Educação a Distância (DED) Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Núcleo de Educação a Distância (NEAD) Faculdade de Administração e Ciências Contábeis (FACC) Departamento de Biblioteconomia Leitor Sidney de Moraes Sanches Comissão Técnica Célia Regina Simonetti Barbalho Helen Beatriz Frota Rozados Henriette Ferreira Gomes Marta Lígia Pomim Valentim Comissão de Gerenciamento Mariza Russo (in memoriam) Ana Maria Ferreira de Carvalho Maria José Veloso da Costa Santos Nadir Ferreira Alves Nysia Oliveira de Sá Equipe de apoio Eliana Taborda Garcia Santos José Antonio Gameiro Salles Maria Cristina Paiva Miriam Ferreira Freire Dias Rômulo Magnus de Melo Solange de Souza Alves da Silva Coordenação de Desenvolvimento Instrucional Cristine Costa Barreto Desenvolvimento instrucional Flavia Busnardo Diagramação Patricia Seabra Revisão da língua portuguesa Patrícia Sotello Projeto gráfico e capa André Guimarães de Souza Patricia Seabra Normalização Dox Gestão da Informação S192c Sampaio, Jurema Luzia de Freitas. Cultura e memória social / Jurema Luzia de Freitas Sampaio ; [leitor] Sidney de Moraes Sanches. – Brasília, DF : CAPES : UAB ; Rio de Janeiro, RJ : Departamento de Biblioteconomia, FACC/UFRJ, 2018. 82 p. : il. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-85229-52-8 (brochura) ISBN 978-85-85229-53-5 (e-book) 1. Cultura. 2. Inclusão social. I. Sanches, Sidney de Moraes. II. Título. CDD 021.2 CDU 316.72(=11/=8) Catalogação na publicação por: Miriam Dias CRB-7 / 6995 Caro Leitor, A licença CC-BY-NC-AS, adotada pela UAB para os materiais didá- ticos do Projeto BibEaD, permite que outros remixem, adaptem e criem a partir destes materiais para fins não comerciais, desde que atribuam o devido crédito e que licenciem as novas criações sob termos idênticos. No interesse da excelência dos materiais didáticos que compõe o Curso Na- cional de Biblioteconomia na modalidade a distância, foram empreendi- dos esforços de dezenas de autores de todas as regiões do Brasil, além de outros profissionais especialistas, no sentido de minimizar inconsistências e possíveis incorreções. Neste sentido asseguramos que serão bem recebi- das sugestões de ajustes, de correções e de atualizações, caso seja identi- ficada a necessidade destas pelos usuários do material hora apresentado. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Brasileiros do século XIX ......................................................... 24 Figura 2 – A atuação protagonista movimenta e transforma a cultura, promovendo sua expansão, como em uma espiral .................. 36 Figura 3 – Inclusão digital: solução para o acesso à informação ou um passo para a exclusão social? ....................................... 41 Figura 4 – A memória é o processo de adquirir, armazenar e recuperar informações que foram assimiladas pela mente. A memória social trata de reconstrução a cada vez que é contada ............ 45 Figura 5 – A feijoada é um prato típico brasileiro, mas no Rio de Janeiro, ela faz um grande sucesso! ................. 54 Figura 6 – O frevo pernambucano é um grande exemplo de Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil ............................... 56 Figura 7 – Escravos africanos no Brasil, oriundos de várias nações, como Benguela, Angola, Congo e Monjolo ............................ 69 Figura 8 – As baianas que vendem acarajé podem ser encontradas por muitas cidades da Bahia .......................... 73 Figura 9 – Representantes de tribos indígenas brasileiras: Assurini, Tapirajé, Kaiapó, Kapirapé, Rikbaktsa e Bororo-Boe................. 77 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA ................................................................... 9 1 UNIDADE 1: VOCÊ SABIA QUE EXISTE MAIS DE UM CONCEITO DE CULTURA? .................................................... 11 1.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................ 11 1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ..................................................................................... 11 1.3 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 13 1.4 HISTÓRIA DA CULTURA ...................................................................................... 16 1.4.1 Indústria Cultural ................................................................................................ 18 1.4.2 Atividade ............................................................................................................. 18 1.5 DISPOSITIVOS CULTURAIS ................................................................................... 19 1.5.1 Atividade ............................................................................................................. 22 1.6 AH... A CULTURA BRASILEIRA! SERÁ QUE CONHECEMOS COMO NOSSA ...... 22 1.6.1 Atividade ............................................................................................................. 28 1.7 RESUMO .............................................................................................................. 31 2 UNIDADE 2: PROTAGONISMO E INCLUSÃO SOCIAL ................................ 33 2.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................ 33 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ..................................................................................... 33 2.3 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 34 2.4 O QUE SERÁ PROTAGONISMO? VOCÊ SABE? ................................................... 35 2.5 ESSE TÃO FALADO CONCEITO DE INCLUSÃO SOCIAL... .................................... 38 2.6 RESUMO .............................................................................................................. 42 3 UNIDADE 3: DOIS TEMAS INTERESSANTES E INTERLIGADOS: MEMÓRIA SOCIAL E IDENTIDADE ............................ 43 3.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................ 43 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ..................................................................................... 43 3.3 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 44 3.4 DIVERSIDADE E PATRIMÔNIO CULTURAL: O QUE É AFINAL?........................... 45 3.5 SABE O QUE É PATRIMÔNIO MATERIAL? .......................................................... 48 3.5.1 Atividade ............................................................................................................. 49 3.6 E PATRIMÔNIO IMATERIAL, SABE QUAL A DIFERENÇA PARA O MATERIAL? .. 50 3.6.1 Atividade ............................................................................................................. 57 3.6.2 Atividade ............................................................................................................. 59 3.7 RESUMO ..............................................................................................................60 4. UNIDADE 4: A LEI 10.639/03 – CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA NAS ESCOLAS ............................................................................... 61 4.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................ 61 4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ..................................................................................... 61 4.3 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 63 4.4 A LEI 10.639/03: COMO SURGIU, PORQUE, COMO, ONDE... TANTAS QUESTÕES! ............................................................................................ 64 4.4.1 Atividade ............................................................................................................. 66 4.5 O QUE SABEMOS SOBRE A CULTURA AFRO-BRASILEIRA? PRINCIPAIS QUESTÕES NA ATUALIDADE ........................................................... 66 4.6 SERÁ QUE CONHECEMOS A CULTURA INDÍGENA COMO DEVERÍAMOS? ...... 76 4.6.1 Atividade ............................................................................................................. 75 4.7 RESUMO .............................................................................................................. 84 SUGESTÃO DE LEITURA .................................................................................. 84 REFERÊNCIAS .................................................................................................... 84 9Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA A disciplina Cultura e Memória Social tem duração de 30 horas e é composta por quatro unidades temáticas. Dessa maneira, não pretende- mos esgotar o assunto, mas fornecer um panorama de forma a esclarecer a ideia de que a cultura e a memória social são construções sociais dinâ- micas, flexíveis, abertas ao novo e, principalmente, vivas. Na primeira unidade conheceremos um pouco da história da cul- tura e seus dispositivos. Vamos discutir os conceitos de cultura nas suas variadas formas, buscando construir uma base para os desdobramentos dos demais temas da disciplina. Na segunda unidade trataremos de Protagonismo e Inclusão Social. buscando esclarecer seus conceitos e relacionando-os com a produção e organização de informação e conhecimento sob a visão da cultura. Na terceira unidade, buscaremos criar bases para a compreensão dos principais conceitos (patrimônio cultural, material e imaterial) que sustentam as discussões sobre a construção da identidade e da memória social. Por fim, a quarta e última unidade, trata da História e Cultura Afro- -Brasileira e Indígena, em especial sobre a lei 10.639/03, com destaque para os principais motivos de sua existência, sua abrangência, sua aplica- bilidade e impacto na área de ciência da informação. UNIDADE 1 VOCÊ SABIA QUE EXISTE MAIS DE UM CONCEITO DE CULTURA? 1.1 OBJETIVO GERAL Apresentar os conceitos de cultura nas suas variadas formas e sua história, buscando construir uma base para os desdobramentos dos demais temas da disciplina. 1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS a) identificar os autores, os princípios e as convenções das definições de Cultura ao longo da história, assim como a importância de cada abordagem, princípio ou convenção nas práticas culturais por meio da compreensão dos conceitos de História da Cultura e Indústria Cultural. b) debater acerca dos dispositivos culturais e formação da cultura brasileira. c) identificar os significados dos termos Multiculturalismo, Globalização e Hibridismo cultural. 13Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância 1.3 INTRODUÇÃO Vamos começar com algumas perguntas: O que é ter cultura? É ter educação, bons modos? É ter diplomas, ser formado em nível superior, faculdade? Ou é ter, ou aparentar ter, dinheiro ou outra forma de de- monstração de sucesso? Como saber se uma pessoa tem, ou não, cultu- ra? Muita gente considera que ter cultura signifi ca ter um ‘jeito educado’ para tratar as pessoas, ou seja, ter ou apresentar o que se convencionou chamar de ‘bons modos’. Outros consideram que ser culto é ser alguém formado e possuir diplomas. Outros, ainda, consideram que cultura está relacionada ao poder econômico, ou seja, ser rico ou, pelo menos, apa- rentar riqueza. E há várias outras opiniões, bastante diversifi cadas. Mas, como podemos perceber, quase todas essas afi rmações não con- sideram a hipótese de o signifi cado real de cultura estar ligado à classe trabalhadora. Ou seja, já assumem que cultura seja algo pertencente aos que possuem bens, aos “bem nascidos”, ou outro termo qualquer que separe “povo” e elites. Essa visão não é somente um preconceito sócio econômico, mas está equivocada também em relação ao que realmente seja cultura. Para a Antropologia, o sentido de cultura é muito diferente de tudo isso que foi dito, pois cultura é a capacidade de atribuir signifi cados às relações entre os seres humanos e não depende de questões econômicas para existir. Explicativo Cultura é “uma preocupação contem- porânea, bem vinda nos tempos atuais. [...] O desenvolvimento da humanidade está marcado por contatos e conflitos entre modos diferentes de organizar a vida social, de se apropriar dos recursos naturais e transformá-los, de conceber a realidade e expressá-la. A história regis- tra com abundância as transformações porque passam as culturas, seja movidas por suas próprias forças internas, seja em consequências desses contatos e conflitos, mais frequentemente por am- bos os motivos.” (SANTOS, 2005, p. 7)1 1 SANTOS, J.L. O que é Cultura? São Paulo: Brasiliense, 2005. 11ª reimpressão da 16ª edição, de 1996. Coleção Primeiros Passos. 14 Cultura e Memória Social Sabemos que todas as palavras carregam uma importância cultural, um contexto histórico em que surgiram ou em que seu uso se tornou comum. Como as demais, a palavra cultura carrega uma história de origem e evolução até chegar ao que compreendemos como cultura hoje em dia. Assim, antes de discutir cultura, primeiro precisamos entender o que é cultura, e qual o signifi cado dessa palavra e desse conceito ao longo do tempo. Compreender o conceito de cultura em toda a sua profundidade é reconhecer que cada pessoa, possui uma cultura que é o refl exo de seu país, sua região, sua família, e, faz parte da sua maneira particular de existir e se colocar no mundo. Atenção Compreender o que é cultura é de fundamental importância. Co- nhecer a cultura do outro colabora para saber como esse ser humano pode complementar a nossa cultura. É um círculo virtuoso que vive de forma dinâmica, alimentando, mutuamente a evolução humana. O conceito de cultura, segundo Alfredo Bosi em Dialética da Coloniza- ção (1987, p. 53), vem de colo (verbo). Colo, para os antigos romanos, signifi cava eu cultivo em particular, o solo. O sentido básico de colo é tomar conta de, cuidar. Cultus, particípio passado de colo, é aquilo que já foi trabalhado. De cultum deriva outro particípio o futuro culturus, cujo sentido é o que se vai trabalhar ou aquilo que se pretende cultivar. Definições de cultura foram realizadas por Ralph Lin- ton, Leslie White, Clifford Geertz, Franz Boas, Ma- linowski e outros cientistas sociais. Em um estudo aprofundado, Alfred Kroeber e Clyde Kluckhohn encontraram pelo menos 167 definições diferentes para o termo cultura. (MORAES, 2012, p. 4) Inicialmente, a palavra cultura, por ser um derivado de colo, signifi ca- va, rigorosamente, “aquilo que deve ser cultivado” (BOSI, 1987, p. 53). Ainda segundo Bosi, “esse signifi cado material da palavra, relacionado com a sociedade agrária, durou séculos” e, do ponto de vista histórico, a cultura se aproximou de colo e se distanciou de ‘cultus’. [...] o alimento, o vestuário, a relação homem-mulher, a habitação, os hábitos de limpeza, as práticas de cura, as relações de parentesco, a divisão das tarefas durantea jornada e, simultaneamente, as crenças, os cantos, as danças, os jogos, a caça, a pesca, o fumo, a bebida, os provérbios, os modos de cumprimentar, as palavras tabus, os eufemismos, o modo de olhar, o modo de sentar, o modo de andar, o modo de visitar e ser visitado, as romarias, as promessas, as festas de padroeiro, o modo de criar galinha e porco, os modos de plantar feijão, milho e mandioca, o conhecimento do tempo, o modo de rir e de chorar, de agredir e de consolar. (BOSI, 1987, p. 53) 15Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Curiosidade Nós, brasileiros, acostumados ao calor dos trópicos, nos refe- rimos à neve como neve, e ponto fi nal. Uma única palavra defi - ne, para nós, o que é neve. Para os esquimós, povos indígenas que habitam tradicionalmente as regiões em torno do Círculo Polar Ártico, no extremo norte do planeta Terra, há uma varieda- de maior de palavras, mais específi cas, para cada tipo de neve. Embora haja uma espécie de mito de que os esquimós têm ‘cen- tenas’ de palavras para neve, Anna Berge e Luciana Whitaker (2014) esclarecem, que “a diversidade de dialetos entre as etnias ajudou a difundir o mito”, mas que “para cada povo, são entre cinco e sete palavras” (BERGE, 2014; WHITAKER, 2008). Embora desfazendo o mito das centenas de palavras, podemos perceber que as “cinco a sete” palavras para neve já são bem mais do que a única que usamos. Fonte: Disponível em: <https://pt.Wikipédia.org/wiki/Esquim%C3%B3s#/media/ File:Eskimo_Family_NGM-v31-p564-2.jpg>. Acesso em: 14 out. 20182 No vocabulário inuit, é assim: TLAPA – Muito fi na, em pó TLAMO – Cai em fl ocos grandes TLATIM – Cai em fl ocos pequenos KRIPYA – Neve que derreteu e recongelou TLAYING – Misturada com barro KRIPLYANA – Neve dura e azulada. (BERGE, 2014; WHITAKER 2008, p.1) Por que isso acontece? Isso acontece porque, para os esquimós, a neve é uma realidade muito mais próxima de seu dia a dia e desconhecer suas variáveis pode interferir em sua segurança e co- locar em risco sua vida. Para nós, que vemos neve eventualmente, em viagens, esse conhecimento não se mostra muito necessário. A cultura esquimó, embora pouco conhecida, não se resume a ter palavras a mais para diferenciar os tipos de neve. É considerada, 2 KING, G. R. An eskimo family. National Geographic Magazine, v. 31, p. 564, 1917. 16 Cultura e Memória Social pelos estudiosos, uma das mais amplas e homogêneas do planeta. Não temos, na nossa cultura, uma homogeneidade tão marcada como os esquimós. Fonte: BERGE, A. “Como vivem os esquimós?.” Revista Mundo Estranho. ed. 128. Disponível em: <http://mundoestranho.abril.com.br/materia/como-vivem-os-esquimos>. Acesso em out. 2014. Agora que já conhecemos um pouco sobre a origem da palavra cultu- ra e seu conceito, vamos conhecer mais sobre a História da Cultura? 1.4 HISTÓRIA DA CULTURA Nos dias de hoje é bem tranquilo para nós entendermos que a cultura tem uma história. Mas nem sempre foi assim, Peter Burke nos esclarece que: A história cultural não é uma descoberta ou inven- ção nova. Já era praticada na Alemanha com esse nome (Kulturgeschichte) há mais de 200 anos. Antes disso havia histórias separadas da filosofia, pintura, literatura, química, linguagem e assim por diante. A partir de 1780, encontramos histórias da cultura hu- mana ou de determinadas regiões ou nações. (BUR- KE, 2008, p. 15) O antropólogo inglês Edward Burnett Tylor (1832-1917), defensor do pensamento do evolucionismo social, acreditava que as teorias evolucio- nistas do biólogo Charles Darwin poderiam ser aplicadas às sociedades, assim afi rmando que podem haver sociedades mais ou menos evoluídas. Tylor foi quem formulou a síntese do conceito, no sentido etnográfi co, contido na palavra culture, do inglês, que inclui conhecimentos, cren- ças, arte, moral, leis, costumes e demais hábitos assumidos pelo homem como membro de uma sociedade. Na defi nição de Tylor, uma única palavra abrangia todas as possibi- lidades das realizações humanas, com grande ênfase na ideia de que a aquisição de cultura é inata, e transmitida biologicamente. Não é exatamente isso que a antropologia nos dias atuais acredita, mas o esclarecimento da história contextualiza o nosso modo de ver a cultura. Ou seja, a cultura, como a vemos hoje, tem uma história, e essa história é, muitas vezes, também um modo de ver a cultura. Se observarmos como os europeus olham para o ‘resto do mundo’, considerando que sua cultura é superior e “anterior” a do que chamam de “povos primitivos”, podemos perceber que há, claramente, uma visão evolucionista e eurocêntrica, que considera a Europa o centro da “civiliza- ção”, que é o modo que os franceses se referem à cultura e sua história. Mas há outras formas de olhar a cultura e a história da cultura. Vamos conhecer? 17Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Segundo Santos (2005, p. 22-23), “há várias maneiras de enten- der o que é cultura”, que geram “duas concepções básicas.” Uma que se preocupa com os aspectos de uma realidade social, ou seja, que entende cultura como “tudo que caracteriza a existência social de um povo ou nação” (SANTOS, p. 24) e outra que se refere “ao conhecimento, às ideias e crenças e como elas existem na vida social” (SANTOS, p. 25). Alguns outros pesquisadores afi rmam que a divisão entre aspectos ‘materiais’ e ‘espirituais’ da vida humana determinaria as diversas con- cepções e o modo como se estuda a cultura. Esclarecendo que ‘espiritual’ não se relaciona à religião, mas sim à imaterialidade da cultura, como os aspectos das línguas, as relações sociais, as leis e costumes, como culinária, cantigas, festas etc. Segundo esses pesquisadores, os aspec- tos espirituais, junto com os aspectos físicos, como artefatos, utensílios, construções e outros é que formam a cultura. Laraia (2003), tendo como base os estudos do antropólogo norte americano Alfred Froeber, afi rma que é graças à cultura que os seres humanos se distanciam dos aspectos animais, biológica e socialmente. O que se opõe a essa ideia são as afi rmações de Humberto Ma- turana e Francisco Varela (2005), em seu A árvore do Conhecimento (1984). Nessa obra os autores trazem informações de estudos sobre a capacidade comunicacional dos animais, em especial dos “prima- tas superiores” (que se assemelham, geneticamente, aos humanos em 98% do código genético), onde esses 2% que diferenciam o código genético entre homens e primatas seriam os responsáveis pela lingua- gem e estilo de vida. No entanto, se entendermos cultura como “um sistema de ideias, conhecimentos, técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e atitudes que caracteriza uma determinada sociedade” (WILLEMS apud PELLEGRINI; SANTOS, 1989, p. 21), e um “conjunto de modos de ser, viver, pensar e falar de uma dada formação social” (BOSI, 1992, p. 319), percebemos que a cultura é um elemento vivo e em constante modifi ca- ção, ligado às situações de tempo e espaço e as vivências das pessoas. Para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO): A cultura tradicional e popular é um conjunto de criações que emanam de uma comunidade cultural fundada na tradição, expressas por um grupo ou por indivíduos e que reconhecidamente respondem às ex- pectativas da comunidade enquanto expressão de sua identidade cultural e social; as normas e os valores se transmitem oralmente, por imitação ou de outras maneiras. Suas formas compreendem, entre outras, as línguas, a literatura, a música, a dança, os jogos, a mitologia, os rituais, o artesanato, a arquitetura e outras artes. (UNESCO, 1989) Assim, ao nos aproximarmos dos aspectos mais populares da cultu- ra podemos compreender melhor a nossa própria cultura, seja como grupo, seja como indivíduos. Não é fascinante esse processo contínuo de trocas? 18 Cultura e Memória Social 1 .4.1 Indústria Cultural O termo indústria cultural (em alemão Kulturindustrie)foi criado pe- los fi lósofos e sociólogos alemães Theodor Adorno (1903-1969) e Max Horkheimer (1895-1973) como forma de identifi car a posição da arte em relação à sociedade capitalista industrial (ADORNO, T.; HORKHEIMER, M., 2002). Diante disso, nós nos remetemos à Indústria Cultural que desenvolve produtos sem história, sem memória, sem processo, e, por isso, não sig- nifi ca, não é signo. É a cultura de massa que, “entra na casa do caboclo e do trabalhador da periferia, ocupando-lhe as horas de lazer em que po- deria desenvolver alguma forma criativa de auto expressão” (BOSI, 1978, p. 65). A indústria cultural massifica produtos, arte e bens culturais sem respeitar seus significados e signos originais, num processo de im- posição que desvaloriza a cultura, ao invés de promovê-la, criando produções “fordistas” de bens de consumo, que estão longe de re- presentarem a cultura. É certo que a possibilidade de alcançar muitas pessoas é boa, é a possibilidade de levar cultura para um maior nú- mero de pessoas. No entanto, esse modo de fazer cultura, a partir da lógica da produção industrial, busca somente o lucro, e define qual tipo de objetos culturais podem ser consumidos, resultando em pro- duções com qualidade inferior e impostas ao público, quase sempre com ‘gosto’ inferior. 1.4.2 Atividade Vamos verifi car o que aprendemos? Sabemos que toda cultura carrega uma história e que cada re- gião ou país acaba desenvolvendo sua cultura de acordo com sua história, assim como cada um de nós desenvolve a própria história a partir do contexto em que está inserido. Deste modo, podemos afi rmar que: a) ( ) O comportamento e os costumes dos povos não são formas para garantir e eternizar a sua sobrevivência, o que nos leva a concluir que sua cultura irá desaparecer. b) ( ) Diferentes culturas podem produzir um mesmo objeto em momentos diferentes, de modos diferentes, porém esses ob- jetos, mesmo que se assemelhem, guardam características únicas dessa cultura. c) ( ) Os povos encontram soluções diferentes para resolver os problema e copiam as soluções de povos primitivos, assim, é possível encontrar um povo sem cultura própria. d) ( ) Para entendermos o que é cultura, cultura brasileira e cultura popular, não precisamos compreender o sistema, a malha e as tramas em que está inserida a cultura, somente saber a história do Brasil é suficiente. e) ( ) A televisão transforma tudo em produto, o que gera um es- clarecimento maior do que é o verdadeiro fazer cultural de um povo, em especial no Brasil onde a TV é muito forte. 19Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Resposta comentada A opção correta é a letra B. Cada povo desenvolve seus objetos e sua cultura dentro de contextos específicos que têm relação com as histórias individuais de vida dos componentes desses povos, e mesmo que haja semelhanças, esses objetos guardam características únicas dessa cultura. a) Errada, pois o comportamento e os costumes foram manei- ras encontradas para garantir e eternizar a sua sobrevivên- cia, o que nos leva a concluir que a cultura sempre irá existir. c) Errada, pois não é possível encontrar um povo sem cultura, pois os povos encontram soluções diferentes para resolver os problemas. E isso é que faz as diferenças culturais entre os povos. Vamos rever a aula? d) Errada. Para entendermos o que é cultura, cultura brasileira e arte popular, precisamos SIM compreender o sistema, a malha e as tramas em que está inserida a nossa cultura, além de conhecer a história do nosso país. Vamos rever a aula? e) Não é bem assim... A televisão transforma tudo em produto, sim, mas isso é justamente o que gera grandes confusões entre o que está sendo veiculado e o verdadeiro fazer cultu- ral. Vamos rever a aula? 1.5 DISPOSITIVOS CULTURAIS V ocê sabe o que são dispositivos culturais? Vários autores estudam e pesquisam sobre dispositivos culturais. A concepção do que seja um dispositivo cultural que vamos tomar como base nessa disciplina, foi desenvolvida por Ivete Pieruccini (2004, p. 44). Para a autora, dispositivos culturais são [...] todo e qualquer mecanismo (técnico e simbólico) capaz de promover a relação, organizar a realidade e fornecer um instrumento para o pensamento [...] (sendo) possível caracterizá-lo como um quadro se- miótico que produz significados, no interior do qual o sujeito opera. [...] Os dispositivos, enfim, não ape- nas expressam como também definem, por meio dos discursos implícitos em sua configuração, modos de relação entre os sujeitos e o universo simbólico [...]. (PIERUCCINI, 2004, p. 44) Ou seja Pieruccini (2007) nos apresenta a concepção de dispositivo como “um local social de interação e de cooperação”, um local de relações e de ação, não algo estático e congelado. Ao contrário, para 20 Cultura e Memória Social a autora, os dispositivos “ordenam, organizam, dizem, narram, interfe- rindo na apropriação da informação”, o que signifi ca que têm atuação constante ativa e direta na forma como nos relacionamos com as infor- mações e com a construção de conceitos e conteúdos culturais. Junto com Perrotti, Pieruccini (2007, p. 73) desenvolve ainda a noção de apropriação cultural, que é o que transforma o indivíduo em “prota- gonista cultural”, “produtor e criador de signifi cados e sentidos”, por “participação ativa e afi rmativa na vida cultural” (PERROTI; PIERUCCINI, 2007, p. 57). Ou seja, quando se apropria da cultura é que o indivíduo (seja você ou eu) assume papel ativo na vida cultural. O que nos esclarece que, para haver protagonismo cultural, é neces- sário haver envolvimento e apropriação da cultura; é necessário sentir-se membro, parte da cultura para, assim, transformá-la e produzir novos bens, objetos e dispositivos culturais. E como nos sentimos parte da cultura? Vivenciando-a e percebendo-a nas suas mais simples manifestações, como por exemplo, nossos hábitos e costumes, nossa alimentação, o modo como nos vestimos e nos com- portamos em sociedade. Atenção Os dispositivos culturais são um conjunto de práticas, propostas, políticas e ações que juntos aproximam os sujeitos das práticas cul- turais. Diferenciam-se dos objetos culturais por não se restringirem somente à materialidade dos objetos, mas englobarem também as questões imateriais. Cretella Júnior nos esclarece que: [...] Objetos Culturais são aqueles aos quais o homem acrescentou a marca de sua individualidade, objetos que passaram da natureza para a sociedade, numa trajetória do dado ao construído, num trabalho de va- loração evidente, numa transposição progressiva da categoria natural para a categoria cultural. (CRETELLA JÚNIOR, 1998, p. 57.). Isso não engloba somente os objetos artísticos que, embora também te- nham um signifi cado para alguma cultura, pois é na cultura que a arte se manifesta, contém uma intencionalidade artística que os diferencia dos demais tipos de objetos culturais. Objetos culturais são os objetos que representam um signifi cado, seja estético, utilitário ou qualquer outro que possa ser proposto pelo homem. Por exemplo, o Estádio do Maracanã é um objeto cultural que representa o futebol e é, ao mesmo tempo, um dispositivo cultural. 21Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Os objetos culturais devem ser investigados em seus contextos de ação, de maneira que o espaço cultural e o tempo completem o seu sen- tido: as formas de registro e a apropriação criativa. Já sabemos que toda cultura carrega uma história e que diferentes culturas produziram objetos semelhantes, em momentos diferentes. O espanhol Fernando Hernandez (1998) chama de Objeto Cultural toda produção das Artes Visuais, seja ela bidimensional (altura e largura) ou tridimensional (altura, largura e profundidade). Mas não só a arte produz objetos culturais. Sabiam que também são objetos culturais coisas sim- ples, do nosso dia a dia, como, por exemplo, os talheres? No ocidente usamos talherescomo garfos, colheres e facas. No oriente, os hashis são usados para se alimentar. Essas diferenças são fatos culturais interessan- tes de se observar! Curiosidade Até o século XI, quase todo mundo comia com as mãos. Os mais educados eram aqueles que usavam apenas três dedos para levar o alimento à boca. Naquele século, Domenico Salvo, mem- bro da corte de Veneza, casou-se com a princesa Teodora, de Bizâncio. Ela trouxe no enxoval um objeto pontudo, com dois dentes, que usava para espetar os alimentos. Esse primeiro garfo foi considerado uma heresia: o alimento, fornecido por Deus era sagrado e tinha de ser comido com as mãos. Mas, pouco a pou- co, membros da nobreza e do clero foram adotando o talher. O hábito demorou a pegar entre a população: com mais dentes, o espeto só se tornou popular mesmo no século XIX. Já a faca é o mais antigo dos talheres: foi o Homo erectus, que surgiu na Terra há 1,5 milhão de anos, quem criou o primeiro objeto cortante, fei- to de pedra, para caça e defesa. Desde então, o homem sempre carregou uma faca. Na Idade do Bronze, que começou por volta de 3000 a.C., ela passou a ser feita com esse metal e a mesma faca que servia para matar era usada também para descascar frutas. O primeiro a su- gerir que cada homem deveria ter um talher para ser usado ex- clusivamente à mesa foi o cardeal francês Richelieu (1585-1642), um fervoroso defensor das boas maneiras, por volta de 1630. Ao contrário da faca, a colher já surgiu com o objetivo de ser usada à mesa. Há registros arqueológicos de artefatos parecidos com mais de 20.000 anos, feitos de madeira, pedra e marfi m. Mas, no início, a colher era de uso coletivo e parecia uma concha. “Quando surgiu o pão, há 12.000 anos, já se usava uma colher para jogar o caldo sobre ele”, afi rma o sociólogo Gabriel Bollaffi, da Universidade de São Paulo (USP). Fonte: MUNDO ESTRANHO. Como surgiram os talheres? História. Disponível em: <http:// mundoestranho.abril.com.br/materia/como-surgiram-os-talheres>. Acesso em: dez. 2014. 22 Cultura e Memória Social 1.5.1 Atividade Vamos exercitar nossa percepção? Vamos fazer uma lista em duas colunas. Na primeira coluna vamos listar os dispositivos cultu- rais que conhecemos, e que existem na comunidade em que vive- mos. Na segunda, vamos listar os objetos culturais que identifi ca- mos no nosso dia a dia. Dispositivos Culturais Objetos Culturais Resposta comentada Não existe uma única e certa resposta. É importante que se perceba as diferenças, não que se acertem opções únicas de res- posta. Podem ser listados, como dispositivos culturais, exposições em museus e galerias; políticas públicas, ações; danças, músicas, encenações em teatros, escolas, praças, coretos; receitas culinárias; brincadeiras, performances e concertos etc.; ou seja, lugares onde aconteçam manifestações culturais e as manifestações em si. Como objetos culturais devem ser relacionados coisas materiais, como os talheres do exemplo, panelas, potes e demais utensílios de alimen- tação, assim como brinquedos, roupas, trajes típicos, armas etc. 1.6 AH... A CULTURA BRASILEIRA! SERÁ QUE CONHECEMOS COMO NOSSA CULTURA É FORMADA? Sabe que o maior problema ao se tentar defi nir a cultura brasileira é que isso sempre nos leva ao encontro de um debate ainda não defi nido do que seja o próprio signifi cado da ideia de “cultura brasileira”? Pois bem, um breve estudo sobre a história do Brasil nos mostra que é só no período republicano, de 1889 em diante, que começa a haver uma refl exão mais aprofundada sobre o conceito de Cultura Brasileira. Isso porque, lá no período colonial (1500-1822) e no período imperial (1822- 1889), não se tem ainda uma Cultura Brasileira. Inicialmente por não ha- ver exatamente um país a que se possa atribuir uma identidade cultural e, também, pelo motivo de haver uma inegável influência do eurocentrismo nos dispositivos culturais e cenários acadêmicos e artísticos brasileiros. Já vimos que o eurocentrismo considera avaliativamente as demais culturas em relação à Europa ser o centro do evolucionismo cultural, ou seja, o que é mais, ou menos evoluído, em relação ao que se pratica na Europa. Assim, a “Cultura Brasileira” era, nesse período, uma tentativa de espelhar e imitar a cultura europeia vigente, buscando igualar ao que se considerava certo. Hoje sabemos que a Cultura Brasileira sofre influência direta das diversas etnias e culturas, dos diversos povos e grupos étnicos que contribuíram e contribuem para a formação do povo brasileiro. Assim, as chamadas ‘matri- zes da cultura brasileira’ (principalmente brancos, negros e índios e, poste- riormente, imigrantes de diversas origens, inclusive orientais) que influenciam na composição da nossa identidade, trazem consigo hábitos e costumes que se originam de práticas culturais diversas e, cultura é, primordialmente, [...] o conjunto das práticas, das técnicas, dos símbo- los e dos valores que se devem transmitir às novas gerações para garantir a reprodução de um estado de coexistência social. A educação é o momento ins- titucional marcado do processo” (BOSI, 1992, p.10). O pesquisador Aldo Moraes (2012) nos diz que no Brasil [...] embora seja um país de colonização portugue- sa, outros grupos étnicos deixaram influências pro- fundas na cultura nacional, destacando-se os povos indígenas, os africanos, os italianos e os alemães. As influências indígenas e africanas deixaram marcas no âmbito da música, da culinária, do folclore, do arte- sanato, dos caracteres emocionais e das festas popu- lares do Brasil, assim como centenas de empréstimos à língua portuguesa. É evidente que algumas regiões receberam maior contribuição desses povos: os esta- dos do Norte têm forte influência das culturas indíge- nas, enquanto algumas regiões do Nordeste têm uma cultura bastante africanizada, sendo que, em outras, principalmente no sertão, há uma intensa e antiga mescla de caracteres lusitanos e indígenas, com me- nor participação africana. (MORAES, 2012, p. 9) A sociedade brasileira se formou a partir da miscigenação dessas et- nias e culturas, e “abraça” todas as diferenças, resultando numa cultura híbrida, nem sempre harmônica, mas que procura equilibrar os traços positivos adequados à “brasilidade” e ao que é conhecido como demo- cracia étnica racial. Atenção Darcy Ribeiro procurou destacar que Nós, brasileiros, somos um povo em ser impedido de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito, já que Etnia – Grupo de pessoas que, embora possua a mesma origem ou história, tem diferenças de origem sociocultural, como: idioma, religião, hábitos ou comportamentos. Termo comumente usado para se referir à semelhança biológica, caracterizada pelo compartilhamento da mesma raça e/ou cultura. (Etm. etno + ia) Fonte: Dicionário on-Line de português. Disponível em: <http://www.dicio.com.br/ etnia>. Acesso em: dez. 2014. 24 Cultura e Memória Social aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado. Nela fomos feitos e ainda continuamos nos fazendo. Essa massa de nativos oriundos da mestiçagem viveu por séculos sem consciência de si, afundada na ninguen- dade. Assim foi até se definir como uma nova identi- dade étnico-nacional de brasileiros. Um povo até hoje em ser na dura busca de seu destino. Olhando-os, ou- vindo-os, é fácil perceber que são, de fato, uma nova romanidade, uma romanidade tardia, mas melhor, porque foi lavada em sangue índio e sangue negro. (RIBEIRO, 1995, p. 453) É preciso destacar que conhecer e diferenciar os conceitos de cultura, além de Multiculturalismo, Globalização e Hibridismo Cultural é impor- tante ao se estudar o tema. Isso porque essas expressões trazem, em si, conceitos e abordagens in- teressantes e diversifi cados na busca da atualização constante do conceito de cultura e auxiliam aos estudos e propostas de valorização da e das cul- turas que, como já vimos, são organismos vivos e em constante mudança. Como vemos na imagem a seguir, a composiçãoétnica brasileira se faz pela miscigenação das matrizes brancas europeias, negras africanas e ama- relas indígenas, resultando num pluralismo étnico e numa multiculturalida- de como característica ‘natural’ de nossa composição como um povo. Figura 1 – Brasileiros do século XIX 1ª linha: brasileiros brancos. 2ª linha: brasileiros pardos (da esquerda para a direita: duas mulheres mulatas, duas mulheres cafuzas e uma garota e um homem caboclo). 3ª linha: três brasileiros índios de diferentes tribos seguidos por afro-brasileiros de diversas etnias. Fonte: Wikipédia (2003-2006)3 3 ERMAKOFF, G. Rio de Janeiro – 1840-1900: uma crônica fotográfica. Rio de Janeiro: G. Ermakoff Casa Editorial, 2006. LAGO, B. C. do. Os fotógrafos do Império: a fotografi a brasileira no Século XIX. Rio de Janeiro: Capivara, 2005. VASQUEZ, P. K. O Brasil na fotografia oitocentista. São Paulo: Metalivros, 2003. Disponível em: <https://pt.Wikipédia.org/wiki/Composi%C3%A7%C3%A3o_%C3%A9tnica_ do_Brasil#/media/File:Brasileiros_do_seculo_XIX.png>. Acesso em: 14 out. 2018. Multiculturalismo (ou pluralismo cultural) é um termo que descreve a existência de muitas culturas numa região, cidade ou país, com no mínimo uma predominante. A globalização acentua ainda mais essa mistura cultural. O Brasil, por exemplo, traz em sua cultura traços de muitas outras. Em pontos específi cos do país isso é mais nítido. Fonte: Banco de Conceitos. STOA USP. Disponível em: <http://disciplinas. stoa.usp.br/mod/glossary/view. php?id=62879&mode=author&hook= T&sortkey=FIRSTNAME&sortorder=asc>. Acesso em: dez. 2014. Globalização – O termo globalização surgiu após a Guerra Fria tornando-se o assunto do momento, aparecendo nos círculos intelectuais e nos meios de comunicação, tornando possível a união de países e povos. Essa união nos dá a impressão de que o planeta está fi cando cada vez menor. Um dos mais importantes fatores que contribui para a união desses povos é, sem dúvida, a internet. É impossível falar de globalização sem falar da Internet, que a cada minuto nos proporciona uma viagem pelo mundo sem sair do lugar. Dentro da rede conhecemos novas culturas, podemos fazer amizades com pessoas que moram horas de distância, trabalhamos e ainda podemos nos aperfeiçoar cada vez mais nos assuntos ligados a nossa área de interesse. Através dela milhões de negócios são fechados por dia! Fonte: GOMES, C. Globalização. InfoEscola. Disponível em: <http://www.infoescola. com/geografi a/globalizacao/>. Acesso em: dez. 2014. 25Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Curiosidade Há uma historinha, cuja origem não é conhecida, que no “mercado negro” inter- nacional de documentos, um passaporte bra- sileiro é bastante cobiçado por assaltantes e bandidos especializados em falsifi cações de documentos. Por isso, os turistas brasileiros seriam “alvos” principais desses bandidos, em viagens, porque nosso passaporte valeria muitos dólares, ou euros, para ser ‘revendi- do’ em uma falsifi cação, para pessoas que desejem mudar de identidade de forma não lícita. Isso porque, em teoria, “qualquer um” pode ser brasileiro. Não teríamos um único padrão étnico, como outros povos, e, as- sim, qualquer aparência pode ser a aparência de um brasileiro! Se é verdade, ou não, não sabemos. Mas é bom não arriscar e cuidar bem de seus documentos em uma viagem internacional, não acham? Fonte da imagem: WIKIMEDIA. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/Fi- le:Passaportebrasileironovo2006.jpg>. Acesso em: 14 out. 2018.4 Já vimos, na Seção 1 desta unidade, que cultura, culto e colonização são palavras que têm uma mesma origem. Mesmo assim, a característica de ser viva e em constante mudança, faz da cultura um organismo em eterna movimentação. Desse modo, difi cilmente poderia existir a chama- da cultura ‘pura’, pois todas são exemplos de relações humanas. Por termos sido colonizados prioritariamente por portugueses, herda- mos o idioma, e muitos dos hábitos, mas outros povos também sofreram infl uências dos portugueses e, mesmo assim, desenvolveram suas pró- prias tradições e sua própria cultura. Multimídia Vídeo Além Mar – Identidade Duração: 00:51:17 Série: Além Mar Nível de ensino: Geral Sinopse: A vida de povos unidos pelo idioma Português mostra que aqueles colonizados por Portugal em suas grandes navegações souberam aproveitar de maneira positiva essa mistura cultural. 4 Autor: Polícia Federal do Brasil (2006). 26 Cultura e Memória Social Link para assistir o vídeo: <https://www.youtube.com/watch?v=1ze8FN78glU>. José Teixeira Coelho Netto nos apresenta o conceito de ação cultural, esclarecendo que sua função é fornecer os meios para que “as pessoas inventem seus próprios fi ns no universo cultural” (TEIXEIRA COELHO NETTO, 1986). Ou seja, ação cultural é uma “intervenção sociocultural não continuada” (TEIXEIRA COELHO NETTO, 1986). Na sua defi nição, mediação cultural é: Processos de diferente natureza cuja meta é promover a aproximação entre indivíduos ou coletividades e obras de cultura e arte. Esta aproximação é feita com o obje- tivo de facilitar a compreensão da obra, seu reconheci- mento sensível e intelectual – com o que se desenvolvem apreciadores ou espectadores, na busca de formação de públicos para a cultura ou de iniciar esses indivíduos e co- letividades na prática efetiva de uma determinada ativi- dade cultural. (TEIXEIRA COELHO NETTO, 1986, p. 248) O que compreendemos é que para que a nossa cultura se mantenha viva a dinâmica, temos que nós mesmos atuarmos como mediadores da ação cultural, promovendo-a, vivenciando-a e reinventando-a de forma contínua, respeitando as variações e modifi cações que os demais agentes também realizam, intensifi cando as relações. Curiosidade Um dos campos onde percebemos claramente a maior diver- sidade de infl uências e relações que compõem a cultura brasileira é a culinária. A culinária brasileira é tão rica e diversifi cada que infl uencia até a música! A pesquisadora Juliana Oliveira (2013) nos esclarece que: Nas diferentes regiões do Brasil, apresentam-se cren- ças e tabus, diferentes hábitos e costumes. Para exemplificarmos um pouco alguns deles começare- mos pelo norte do país, onde predomina a influên- 27Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância cia da culinária indígena, baseada na mandioca e em peixes. Outros alimentos típicos do povo nortista são: carne de sol, tucupi (caldo da mandioca cozida), jambu (um tipo de erva), camarão seco e pimenta- -de-cheiro. Os pratos típicos da região Centro-oeste são compostos por arroz com pequi, sopa paraguaia, arroz carreteiro, arroz boliviano, empadão goiano, pamonha, angu, curau e os peixes do Pantanal, como o pintado, pacu, dourado, entre outros. Na região Sudeste os alimentos consumidos são bem diversificados e apresentam forte influência do índio, do escravo e dos diversos imigrantes europeus e asiá- ticos. Entre os pratos típicos se destacam a moqueca capixaba, o pão de queijo, o feijão tropeiro, a carne de porco, a feijoada, o aipim frito, o bolinho de bacalhau, o picadinho, o virado à paulista, o cuscuz paulista, a farofa, o angu e a pizza. No Sul do país, churrasco, chimarrão, camarão, pirão de peixe, marreco assado, barreado (cozido de carne em uma panela de barro) e vinho sofrem predominância de consumo. Já os pra- tos típicos da região nordeste são: carne de sol, peixes, frutos do mar, buchada de bode, sarapatel, acarajé, vatapá, cururu, feijão verde, canjica, arroz doce, bolo de fubá cozido, bolo de massa de mandioca, broa de milho verde, pamonha, cocada, tapioca, pé de mole- que, entre tantos outros. (OLIVEIRA, 2013, p. 1) Se formos estudar a cultura brasileira somente pelo aspecto da culinária isso já demandaria um imenso tempo de dedicação, tama- nha é a variedade e qualidade da culinária cultural brasileira. Multimídia Procure conhecer a música Vatapá,de Dorival Caymmi. Na letra dessa canção há a receita completa do vatapá baiano. Fonte: WIKIPÉDIA. Elingunnur. Disponível em: <https://pt.Wikipédia. org/wiki/Vatap%C3%A1#/media/File:Vatap%C3%A1.jpg>. Acesso em: 14 out. 2018. 28 Cultura e Memória Social “Quem quiser vatapá, ô que procure fazer. Primeiro o fubá, depois o dendê. Procure uma nêga baiana, ô Que saiba mexer, que saiba mexer, que saiba mexer. Bota castanha de caju, um bocadinho mais, Pimenta malagueta, um bocadinho mais, Bota castanha de caju, um bocadinho mais, Pimenta malagueta, um bocadinho mais. Amendoim, camarão, rala um coco, Na hora de machucar, Sal com gengibre e cebola, iaiá, Na hora de temperar.” (...) Fonte: YOUTUBE. <https://www.youtube.com/watch?v=RIiaHFxiAhA>. Acesso em: 14 out. 2018. Para conhecer mais músicas que falam sobre comidinhas e gos- tosuras mais do que tradicionais! • Gilberto Gil – Sítio do pica-pau amarelo Fonte: <https://www.youtube.com/watch?v=hQ_YIbw- q4O0>. • Tim Maia – Chocolate Fonte: <https://www.youtube.com/watch?v=1d3nDXe- N8hA>. • Silvio Brito – Farofa Fonte: <https://www.youtube.com/watch?v=lP9kfoSscbI>. • Braguinha – Yes, nós temos bananas Fonte: <https://www.youtube.com/watch?v=Ld2o_ aP6xXY#t=17>. (com Ney Matogrosso) • Chico Buarque – Feijoada completa Fonte: <https://www.youtube.com/watch?v=- W8nyY39Oo50>. 1.6.1 Atividade Já percebeu que os sotaques no Brasil variam muito, de acordo com as regiões? Além dos sotaques, também existem expressões, palavras e objetos que, regionalmente, adquirem signifi cados di- ferentes. Por exemplo, o pãozinho francês de alguns lugares (em geral, na região sudeste), no Rio Grande do Sul se chama caceti- nho. No mesmo estado, o docinho que a maioria do Brasil conhece como Brigadeiro, se chama negrinho. 29Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Pesquise entre seus amigos e familiares outros exemplos e crie uma lista, identifi cando o objeto com uma imagem, o nome dele, e a região onde é chamado dessa forma, de acordo com o exemplo a seguir. Imagem do Objeto Nome em sua localidade Localidade atiradeira Brasil – Rio de Janeiro bodoque Brasil – São Paulo estilingue Brasil (zonas rurais em ge- ral – derivado do inglês sling e slingshot) fi sga Portugal funga Angola Fonte: FERREIRA, A.B.H. Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Positivo, 2010. Resposta comentada Seguem alguns exemplos de expressões, mas se nas suas pes- quisas surgiram outras, não deixe de registrar!5 Expressões típicas da Região Nordeste: Expressões Significados Baixa de égua Lugar onde ninguém quer ir, lugar muito longe. Balaio de gato Desorganização, confusão. Bater a caçuleta Morrer. Cambito Perna fi na. Cão chupando man- ga Pessoa muito feia. Caxaprego Lugar muito distante. Dar o prego Enguiçar. Dar pitaco Dar opinião. Encangado Em cima, montado. Ensacar Pôr a blusa dentro da calça. Fastiado Sem fome. Fez mal Engravidou alguém. Gaia Chifre. Invocado Corajoso, ou “muito bom.” continua 5 UOL. Os diversos falares regionais: um olhar curioso. UOL Português. Semântica. Disponível em: <http://www.portugues.com.br/gramatica/os-diversos-falares-regionais-um-olhar-curioso.html>. Acesso em: 14 out. 2018. 30 Cultura e Memória Social continuação Expressões Significados Jerimum Abóbora. Liso Sem dinheiro. Mangar Ridicularizar. Nome feio Palavrão. Pastorar Vigiar. Quenga Prostituta. Racha Pelada, jogo de futebol ou disputas em geral. Sustança Energia dos alimentos. Triscar Tocar. Varapau Homem alto. Xanha Coceira na pele. Zambeta De pernas tortas. Fonte: <http://www.portugues.com.br/gramatica/os-diversos- falares-regionais-um-olhar-curioso.html>. Expressões oriundas da Região Sul: Expressões Significados Alçar a perna Montar a cavalo. Campo santo Cemitério. Embretar-se Meter-se em apuros. Guacho Animal ou pessoa criada sem a mãe, ou sem leite ma- terno. Lindeiro Ao lado de, vizinho. Maleva Bandido, malfeitor, perverso. Olada Ocasião, oportunidade. Parada Importância em dinheiro pela qual se contrata uma corrida de cavalos ou uma rinha de galos. Relho Chicote pequeno com cabo de madeira, torcido. Solito Isolado, sozinho, sem companhia. Tirana Cantiga e dança popular, acompanhada de viola. Va- riedade do fandango. Fonte: <http://www.portugues.com.br/gramatica/os-diversos- falares-regionais-um-olhar-curioso.html>. 31Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Expressões oriundas da Região Norte: Expressões Significados De rocha Palavras ou assunto com convicção. Égua de largura Muita sorte. Essa é da grife do varal Roupa roubada. Levou o farelo Morreu. Miudinho Pequeno. Paga uma ai? Paga uma bebida. Vigia bem Preste muita atenção. Umborimbora? Vamos embora? Zé ruela Abestado, besta. Fonte: <http://www.portugues.com.br/gramatica/os-diversos- falares-regionais-um-olhar-curioso.html>. 1.7 RESUMO Na unidade 1 conhecemos os diversos conceitos de cultura, de acordo com a História da Cultura; conhecemos como se construiu a História da Cultura, aprendemos sobre o que são e como são compostos os dispositi- vos culturais, conhecemos o conceito de Indústria Cultural e começamos a conhecer um pouco da Cultura Brasileira e sua formação. Na próxima unidade vamos conhecer sobre protagonismo cultural e inclusão social e sua relação com a cultura. Diante de todas essas pers- pectivas de cultura, esta unidade se constitui de modo a proporcionar o conhecimento e as oportunidades de contato e vivências em diversas ações culturais, muitas vezes vividas de forma desconectada dessa per- cepção, de modo a promover refl exão e compartilhar saberes, valorizan- do a cultura democrática para despertar a ampliação do aprendizado como instrumento de inserção social. 33Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância UNIDADE 2 PROTAGONISMO E INCLUSÃO SOCIAL 2.1 OBJETIVO GERAL Apresentar os conceitos de protagonismo e inclusão social, relacionando-os com a produção e orga- nização de informação e conhecimento. 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS a) Identificar o conceito de protagonismo/protagonista cultural na perspectiva da apropriação cultural. b) Reconhecer as abordagens da expressão “inclusão social.” 34 Cultura e Memória Social 2.3 INTRODUÇÃO Você já parou para pensar qual papel exerce diante da cultura? Já se questionou se é alguém que “consome” a cultura ou alguém que age sobre ela? Como lida com as informações, de modo geral, costuma se apropriar delas? Apropriar-se de informação e cultura é ato próprio de protagonis- tas, categoria que no âmbito da educação e da cultura distingue-se das categorias de usuários e de consumidores culturais (PIERUCCINI, 2004). Os protagonistas são agentes ativos, enquanto que os consu- midores e usuários são passivos diante da cultura. Protagonismo cultural “é ação afi rmativa nos processos simbólicos, exercida por sujeitos de diferentes meios e condições, consideradas as dimensões plurais e confl itantes da vida social e pública, no mundo con- temporâneo” (PERROTTI, 2007). Cultura, como já vimos, é algo vivo e dinâmico, e a efetiva participação, como protagonistas, sugere uma ação de interferência direta nas modifi cações, mudanças e alterações culturais. A cultura não consiste mais na soma de o “melhor que foi pensado e dito”, considerado como ápice de uma civilização plenamente realizada – aquele ideal de perfeição para o qual, num sentido anti- go, todos aspiravam. Mesmo a “arte” – designada anteriormente como uma posição de privilégio, uma pedra-de-toque dos mais altos valores da ci- vilização – é agora redefinida como apenas uma forma especial de processo social geral. (HALL, 2003, p. 135) Isso acontece porque Concentradas na palavra cultura, existem questões diretamente propostas pelas grandes mudanças históricas que as modificações na indústria, na de- mocracia e nas classes sociais representam de ma- neira própria e às quais a arte responde também, deforma semelhante. (HALL, 2003, p. 133) O protagonismo cultural toma a forma de agente de transforma- ções culturais consciente, e não somente o papel de consumidor pas- sivo de cultura. Podendo exercer, dessa forma, direitos de cidadãos, influenciar políticas públicas, e contribuir para a inclusão cultural e desenvolvimento das tecnologias sociais. Para melhor compreender esse processo, vamos conhecer primeiro o que é protagonismo e, em seguida, discutir o conceito de inclusão social que, na área de Ciências da Informação manifesta-se mais claramente nos programas de Inclusão Digital. Apropriação. Ato de apropriar ou apropriar-se. Acomodação, adaptação. Fonte: Dicionário on-line de português. Disponível em: <http://www.dicio.com.br/ apropriacao/>. Acesso em: nov. 2014. 35Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância 2.4 O QUE SERÁ PROTAGONISMO? VOCÊ SABE? Vamos começar o estudo dessa unidade conhecendo alguns conceitos fundamentais, como o signifi cado do termo protagonismo. A palavra protagonismo é formada por duas raízes gregas: proto, que signifi ca “o primeiro, o principal”; agon, que signifi ca “luta.” Agonistes, por sua vez, signifi ca “lutador.” Protagonista quer dizer, então, lutador principal, personagem principal, ator principal. Uma ação é dita protagô- nica quando, na sua execução, o educando é o ator principal no processo de seu desenvolvimento. Por meio desse tipo de ação, o educando adqui- re e amplia seu repertório interativo, aumentando assim sua capacidade de interferir de forma ativa e construtiva em seu contexto escolar e sócio comunitário (COSTA, 2007). Vamos ainda prestar atenção à afi rmação a seguir, que diz que [...] quando o indivíduo se apropria da informação ele deixa de ser mero usuário ou consumidor, mas torna- -se um “protagonista cultural”, “produtor e criador de significados e sentidos”, com domínio sobre pro- cessos simbólicos e “participação ativa e afirmativa na vida cultural.” (PERROTI; PIERUCCINI, 2007, p. 57) Ou seja, a apropriação acerca de informações culturais é que habilita o indivíduo a deixar de ser um simples consumidor de informação para se tornar um protagonista cultural, o que signifi ca que, somente quando o indivíduo ressignifi ca a informação e a transforma em ação é que ele tem participação ativa na vida cultural. creditando nessa afi rmação, derivamos a ideia de que a área de Ciência da Informação é essencial para a promoção do protagonismo cultural. Em especial, pela Infoeducação que, como o nome diz, é um campo de intersecção entre a Educação e a Ciência da Informação, se constituindo em [...] área de estudo, situada nos desvãos das Ciên- cias da Informação e da Educação, voltada à com- preensão das conexões existentes entre apropriação simbólica e dispositivos culturais, como condição à sistematização de referências teóricas e metodoló- gicas necessárias ao desenvolvimento dinâmico e articulado de aprendizagens e de dispositivos infor- macionais, compatíveis com demandas crescentes de protagonismo cultural, bem como de produção científica, constituída sob novas óticas, nas cha- madas Sociedades do Conhecimento. (PERROTTI; PIERUCCINI, 2007, p. 92) 36 Cultura e Memória Social Quando os indivíduos assumem a responsabilidade pelo seu próprio desenvolvimento, seja em que nível for, inclusive cultural, tornam-se protagonistas de seus percursos ao serem capazes de analisar, refl etir, propor mudanças e atualizações, sempre que se mostrar pertinente. A capacidade crítica proporcionada pelo protagonismo colabora no de- senvolvimento social, e a inclusão social provoca a refl exão social e o protagonismo. Ou seja, é um movimento de espiral que se retroalimen- ta, em movimento constante. A fi gura do espiral ilustra bem a propo- sição, pois quando se tem a atuação protagonista em ação, jamais se volta a ser o que era, mesmo que se aproxime um pouco. O movimento de expansão da cultura, provocado pela ação protagonista a movimenta e a transforma. Figura 2 – A atuação protagonista movimenta e transforma a cultura, promovendo sua expansão, como em uma espiral Fonte: Pixabay (2016)6 Atenção O protagonismo se mostra cada dia mais necessário para a cons- trução do conhecimento individual e coletivo vindo ao encontro do conceito de Espiral de Conhecimento bastante útil para a Gestão do Conhecimento, área de conhecimento da Administração que se relaciona com as Ciências da Informação. 6 PIXABAY. Escada em espiral. Disponível em: <https://pixabay.com/pt/escada-em-espiral- escadas-1826553/>. Acesso em: 14 out. 2018 37Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Curiosidade A Gestão Eletrônica de Documentos (GED) é uma área do co- nhecimento que está inserida no grande campo das Ciências da In- formação e também da Tecnologia de Informação, sendo resultado dessa interdisciplinaridade. Enquanto a Ciência da informação “considera a informação lato sensu como seu “objeto” e a Arquivologia tende a considerar “os arquivos” como seu único objeto (JARDIM, 1995 p. 48), per- cebemos um forte vínculo entre essas áreas, já que a informação não existe sem um suporte, e que o suporte mais a informação ca- racteriza um documento. Deste modo, sendo a Arquivologia uma ciência pertencente ao campo das Ciências da Informação, o GED tornou-se uma área de estudos tanto para os arquivistas quanto para os analistas de sistemas que o programam. Cabe ao arquivista procurar o melhor modo de realizar dentro deste sistema eletrônico a criação, controle (classifi cação, avalia- ção), manipulação, armazenamento (conservação), acesso, difu- são e recuperação da informação, evidenciando a importância do trabalho em conjunto destes profi ssionais no momento da im- plantação de um sistema GED (HEDLUND, 2010). Ciência da computação Ciência da informação Tecnologia da informação GED Fonte: HEDLUND, D.C. “Gestão Eletrônica de Documentos (GED).” Organização Eletrônica. Blog. 2010. Disponível em: <http://www.dhionhedlund.com.br/2010/06/gestao- eletronica-de-documentos-ged.html>. Acesso em: dez. 2014. 38 Cultura e Memória Social 2.5 ESSE TÃO FALADO CONCEITO DE INCLUSÃO SOCIAL... Gr amaticalmente falando, “incluir” é um verbo irregular, bitransitivo, pronominal. Ou seja, é tanto transitivo direto quanto indireto. Se ob- servarmos os dicionários, o signifi cado é sempre o de “colocar dentro”, “fazer constar”, “introduzir”, “intercalar.” Como sinônimos de incluir temos enfi ar, incorporar, inserir, introduzir e meter. Tudo depende do uso na frase, período ou ideia em que ele é usado. Logo de início podemos perceber as múltiplas possibilidades de enten- dimento que a expressão “inclusão social” traz consigo. Por isso, é impor- tante contextualizarmos a expressão quando a usamos, esclarecendo os conceitos que buscamos trabalhar ao referenciar o termo. Assim, o conceito de inclusão social é também um conceito construído culturalmente, ou seja, está relacionado aos modos e costumes de quem o referencia e à sua cultura. A percepção de inclusão, desse modo, varia, de acordo com o “lugar” e o “tempo” em que é referenciada. Atenção Na Lei nº 12.073 de 29 de outubro de 2009, a inclusão social é assim conceituada. É padrão a definição de inclusão social como sen- do o processo mais aperfeiçoado da convivência de alguém, tido como diferente, com os demais mem- bros da sociedade, tidos como supostamente iguais. Neste caso, a sociedade se prepara e se modifica para receber a pessoa portadora de deficiência, em todas as áreas do processo social (educação, saúde, trabalho, assistência social, acessibilidade, lazer, es- porte e cultura). (BRASIL, 2008, p. 2) Romeu Kazumi Sassaki (1997) nos esclarece que inclusão social é “o processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir [indivíduos], em seus sistemas sociais gerais.” Dessa forma, a inclusão social constitui, então, “um processo bilateral no qual as pessoas, ainda excluídas, e a sociedadebuscam, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre so- luções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos” (SASSAKI, 1997). Mas isso pode se relacionar à diversos contextos. Inclusão social de pessoas com defi ciências físicas (como trata Sassaki), inclusão social dos menos favorecidos economicamente etc. 39Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância A prática da inclusão social repousa em princípios até então considerados incomuns, tais como: a aceitação das diferenças individuais, a valorização de cada pessoa, a convivência dentro da diversida- de humana, a aprendizagem através da coopera- ção. A diversidade humana é representada, prin- cipalmente, por origem nacional, opção sexual, religião, gênero, cor, idade, raça e deficiência. A inclusão social, portanto, é um processo que contri- bui para a construção de um novo tipo de socieda- de através de transformações, pequenas e grandes, nos ambientes físicos (espaços internos e externos, equipamentos, aparelhos e utensílios, mobiliário e meios de transporte), nos procedimentos técnicos e na mentalidade de todas as pessoas, portanto tam- bém do próprio portador de necessidades especiais. (SASSAKI, 1997, p. 3) Para fi ns de dimensionamento de necessidades e coleta de dados para traçar políticas públicas de inclusão social, foi criado em 1995/96 o Mapa da Exclusão/Inclusão Social, metodologia que, “usando de linguagens quantitativas, qualitativas e de geoprocessamento produz dois índices territoriais que hierarquizam regiões de uma cidade quanto ao grau de exclusão/inclusão social [...]” (SPOSATI, 2002, p. 2) A ideia de inclusão social vem sendo elaborada e reelaborada – no sentido de reconhecer as necessidades humanas fundamentais para poder garanti-las na elaboração de políticas públicas – desde os des- dobramentos os estudos de Amartya Sen (Prêmio Nobel de Econo- mia de 1998), e o Relatório de Desenvolvimento Humano, trabalho de Mahbub ul Haq (SPOSATI, 2002), até a criação do conceito de desen- volvimento humano, do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), a criação do Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), pela UNES- CO que abrange “três dimensões básicas do desenvolvimento huma- no: renda, educação e saúde”, Ao tratarmos do conceito de inclusão social relacionado à Ciência da Informação devemos procurar refl etir sobre a relação entre o direito à informação e o acesso a ela. Nesse sentido, [...] a informação e o conhecimento devem ser aces- síveis a todos, independentemente de raça, nacionali- dade, gênero, local, ocupação ou status social. As tec- nologias de informação e comunicação devem estar voltadas para este fim e constituírem-se instrumentos para se alcançar um desenvolvimento verdadeiramen- te centrado no ser humano. (UNESCO, 1996 apud TARAPANOFF; SUAIDEN; OLIVEIRA 2002) Alex Serrano Almeida e Renata Braz Gonçalves (2013) acreditam que: [...] estar atento às questões relacionadas à Inclusão Social é direito e dever de todos. Contudo, acredita-se que este assunto ainda é pouco explorado e discutido em algumas áreas, como, por exemplo, na Ciência da Informação. (SERRANO e GONÇALVES, 2013, p. 241). 40 Cultura e Memória Social Por este motivo, são autores de um estudo, denominado “Inclusão social e suas abordagens na Ciência da Informação: análise da produção cientí- fi ca em periódicos da área de Ciência da Informação no período de 2001 a 2010”, em que declaram que esperam “provocar a refl exão e discussão sobre a temática e, assim, fomentar tomadas de decisões e mudanças de atitudes dos profi ssionais da informação, do poder público e da sociedade em geral” (SERRANO; GONÇALVES, 2013, p. 241). Destacam ainda que “[...] a informação deveria ser considerada um bem social a ser compartilhado, assim como educação, saúde ou infraestrutura de transportes” (FREIRE, 2007, p. 143, apud, SERRANO; GONÇALVES, 2013, p. 244), pois, “esta é um insumo fundamental para a conquista de uma sociedade inclusiva e a sua falta causa um grande desfavorecimento social.” (SERRANO; GONÇALVES, 2013, p. 244) Os pesquisadores verifi caram entre 2001 e 2010, como o título do tra- balho destaca, “a existência de 80 trabalhos que tratam da referida temá- tica” (SERRANO; GONÇALVES, 2013, p. 242), porém ressaltam que nos periódicos selecionados para o estudo, a amostra se restringe a “30 artigos que tratam da temática inclusão social” (SERRANO; GONÇALVES, 2013, p. 248). Os autores ainda acreditam que No que tange à disponibilização e ao acesso à infor- mação, é imprescindível citar o profissional da infor- mação, tendo este um papel de destaque no que concerne a uma sociedade inclusiva. O profissional da informação, especificamente o bibliotecário, deve estar atento à realidade e, acima de tudo, capacitado para atender as necessidades de seus usuários, pois “Uma sociedade baseada no uso intensivo de infor- mação, na qual o indivíduo interage com pessoas e máquinas em um constante intercâmbio de dados e informação, produz simultaneamente fenômenos de maior inclusão e exclusão social” (TARAPANOFF; SUAIDEN; OLIVEIRA, 2002). [...] A Ciência da Infor- mação é uma área que deve atender as necessidades sociais de informação, sendo assim, esta deve servir como alicerce para o desenvolvimento de políticas de inclusão social. (SERRANO; GONÇALVES, 2013, p. 245-246) Inclusão digital é, para os autores, o caminho da Inclusão Social pelo viés da Ciência da Informação, mas consideram que é necessário haver muita atenção e critérios claros para a efetivação da inclusão digital. Isso pois, “inclusão digital mal realizada pode-se tornar mais um componente a ser considerado no que diz respeito à exclusão social” (SERRANO; GONÇAL- VES, 2013, p. 257) destacando que [...] é de suma importância um planejamento bem estruturado quando se trata de inclusão digital, pois um frágil projeto e, em consequência, uma precária execução tornarão a inclusão digital uma prerrogativa a mais a ser analisada em relação à exclusão social, assim como já ocorre com: a economia, o desempre- go, a fome, o analfabetismo, a educação, o Sistema Único de Saúde, os transportes públicos, a distribui- ção agrária, dentre vários outros. (SERRANO; GON- ÇALVES, 2013, p. 257) 41Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância E que a simples disponibilização de recursos infraestruturais aos indivíduos excluídos digitalmente não os tornam incluídos digitais, tampouco na sociedade, podendo até mesmo ter um efeito contrário, tornando estes sujeitos ainda mais excluídos socialmente [...] Pensar na inclusão digital como principal alicerce para outras discussões, torna-se um equívoco, visto que progra- mas que visam à inclusão digital, certamente, não contemplaram todos os aspectos sociais que podem contribuir para a exclusão de um indivíduo. (SERRA- NO; GONÇALVES, 2013, p. 258-259) Figura 3 – Inclusão digital: solução para o acesso à informação ou um passo para a exclusão social? Fonte: Flickr (2009)7 O que é, então, necessário ser feito efetivamente para realizarmos a inclusão social pela ciência da informação? O simples acesso à informa- ção já proporciona inclusão? Se sim, como e porquê? Não creio que tenhamos uma única resposta para essas questões, mas é fato que sem conhecer recursos é impossível usá-los e apropriar-se de- les, não é verdade? Assim, a disseminação de informação de qualidade, embora não seja a única responsável pela inclusão social, colabora de forma signifi cativa na diminuição das diversas formas de exclusão. Multimídia O periódico Inclusão Social, que tem como in- teresse central a publicação de “trabalhos inéditos no âmbito da inclusão social, com temas ligados a ações, programas, projetos, estudos e pesquisas 7 FLICKR. Leonardo Augusto Matsuda. Disponível em: <https://www.fl ickr.com/photos/ poperotico/3921069882>. Acesso em: 14 out. 2018. 42 Cultura e Memória Social voltados a problemas relacionados à inclusão dos cidadãos nasociedade da informação” (INCLUSÃO SOCIAL, 2011, apud SERRANO, A.; GONÇALVES, R. B., 2013), concentra uma coleção de trabalhos de pesquisa sobre o tema e deve ser consultado para maiores esclarecimentos. Fonte: IBICT. Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnolo- gia. Inclusão Social, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1., jul./dez., 2014. Disponível em: <http://revista.ibict.br/inclusao>. Acesso em: dez. 2014. 2.6 RESUMO Nesta unidade, conhecemos os conceitos de protagonismo e inclusão social e aprendemos como a Ciência da Informação se relaciona entre es- ses dois conceitos e as práticas de cultura. Vimos também como a ciência da Informação pode ser agente de promoção da inclusão, por meio da disseminação de facilitação de acesso à informação. Na próxima unidade trataremos de Memória Social e Identidade, co- nhecendo os conceitos de patrimônio cultural, material e imaterial. UNIDADE 3 DOIS TEMAS INTERESSANTES E INTERLIGADOS: MEMÓRIA SOCIAL E IDENTIDADE 3.1 OBJETIVO GERAL Criar bases teórico/conceituais para compreender os principais conceitos que sustentam as discus- sões sobre as temáticas da construção da identidade e da memória social. Apresentar as definições de patrimônio cultural material e imaterial, com ênfase na cultura Brasileira. 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS a) reconhecer o que é Patrimônio Cultural, Memória Social e Identidade Cultural. b) identificar e diferenciar patrimônios culturais materiais e imateriais. 3.3 INTRODUÇÃO Vamos começar esta unidade conhecendo ou recuperando alguns conceitos fundamentais. Memória é o processo de adquirir, armazenar e recuperar informações que foram assimiladas pela mente. A Memória Social é a coletivização desse processo. O conceito de Memória Social tem origem no pen- samento de Maurice Halbwachs vindo da Sociologia de Durkheim e trata de uma abordagem da memória como um substrato de conhecimento coletivo e cultu- ralmente conhecido por determinado grupo em certo contexto social. Difere da forma cognitiva de estudo da memória como associada à atenção e a percepção. (HALBWACHS, 1990) A memória social é uma área que engloba, de forma multidisciplinar, várias outras e estuda o modo como as sociedades lembram ou esque- cem os acontecimentos e as ideologias por detrás desse movimento. [...] como objeto de pesquisa passível de ser concei- tuado, não pertence a nenhuma disciplina tradicional- mente existente, e nenhuma delas goza do privilégio de produzir o seu conceito. Esse conceito se encon- tra em construção a partir de novos problemas que resultam do atravessamento de disciplinas diversas. (GONDAR, 2005) Gondar afirma que a memória é uma construção e, nessa linha de pensamento, condena termos como “reconstituição” e “resgate” quan- do associados à memória. Defende que a memória: [...] não nos conduz a reconstituir o passado, mas sim a reconstruí-lo com base nas questões que nós fazemos, que fazemos a ele, questões que dizem mais de nós mesmos, de nossa perspectiva presente, que do frescor dos acontecimentos passados. (GON- DAR, 2005). O que explicita como a memória é construída e reconstruída por cada vez que é contada. Assim, o fenômeno da memória social permite a com- preensão e desdobramentos dos conceitos de diversidade cultural, patri- mônio cultural material e imaterial e faz com que seja possível a aproxi- mação com o pensamento de identidade, como afirma Le Goff (1997): “a memória é um elemento essencial do que se costuma chamar identidade, individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje.” 45Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância Figura 4 – A memória é o processo de adquirir, armazenar e recuperar informações que foram assimiladas pela mente. A memória social trata de reconstrução a cada vez que é contada Fonte: Pixabay (2014)8 3.4 DIVERSIDADE E PATRIMÔNIO CULTURAL: O QUE É AFINAL? O pesquisador Elder Alves (2010), em trabalho intitulado Diversidade Cultural, Patrimônio Cultural Material e Cultura Popular: a Unesco e a Construção de um Universalismo Global nos conta sobre a posição go- vernamental no Brasil em relação à proteção e promoção da diversidade cultural. O envolvimento decisivo do governo brasileiro, atra- vés do Ministério da Cultura, no processo de aprova- ção da convenção sobre a diversidade se dá a partir de três interesses convergentes: a necessidade pe- remptória de incorporar, na estrutura da administra- ção cultural, o valor universalista e universalizante da diversidade cultural; o interesse de inserir o tema da diversidade no espectro maior das políticas culturais para as culturas populares; e, por fim, o desejo de liderar um processo de formação discursiva que pas- sa pela formação e consolidação de novas categorias nativas, como indústrias da criatividade, diversidade cultural, patrimônio imaterial, entre outras. (ALVES, 2010, p. 547) 8 PIXABAY. Disponível em: <https://pixabay.com/pt/pensamentos-acho-que-psique-551263/>. Acesso em: 14 out. 2018. 46 Cultura e Memória Social Vamos começar a falar de Patrimônio Cultural pelo aspecto legal. A Constituição Brasileira de 1988 que rege a nossa nação estabelece, no Artº 216 que: Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmen- te ou em conjunto, portadores de referência à iden- tidade, à ação, à memória dos diferentes grupos for- madores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I – as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; III – as criações científicas, artísticas e tecnoló- gicas; IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artísti- co-culturais; V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleon- tológico, ecológico e científico. (BRASIL, 1988) Ou seja, nosso Patrimônio Cultural, nossa herança comum, é formado por itens materiais e imateriais que, em objetos ou ações e modos de ser e fazer, refl etem os costumes e a identidade cultural do povo brasileiro. É um campo bastante amplo e completo e Admitindo as inúmeras interpretações do conceito de patrimônio como um fator cultural composto por três categorias de elementos, o meio ambiente, o conhe- cimento, tudo que o homem fabricou, isto é, os bens culturais. (RODRIGUES, 2000, p. 73) Atenção De acordo com a Declaração de Caracas de 1992, “o Patrimô- nio Cultural de uma nação, de uma região ou de uma comunidade é composto de todas as expressões materiais e espirituais que lhe constituem, incluindo o meio ambiente natural” (DECLARAÇÃO DE CARACAS, 1992). A arte popular, as danças, as comidas, as lendas, os costumes, as festas, as devoções, as tradições em geral, acumuladas ao longo desses nossos já comemorados 500 anos, juntas, formam a identidade cultural nacional e são nossas maiores riquezas e constituem-se como nosso pa- trimônio cultural imaterial. Entende-se por patrimônio cultural imaterial as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhe são associados – que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos, reconhe- cem como parte integrante do seu patrimônio imate- rial. Este patrimônio cultural imaterial, que se transmite de geração em geração, é constantemente recriado por Patrimônio: s.m. Bem que vem do pai e da mãe. Conjunto dos bens, direitos e obrigações de uma pessoa jurídica. Fig. O que é considerado como herança comum. Sinônimos de Patrimônio: legado, herança, deixa, dinheiro, recursos, meios, riqueza, arcabouço e bagagem. Fonte: Dicionário on-line de português. Disponível em: <http://www.dicio.com.br/ patrimonio/>. Acesso em: nov. 2014. 47Curso de Bacharelado em Biblioteconomia na Modalidade a Distância grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza, gerando um sentimento de identidade
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