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FISIOLOGIA DO SANGUE HEMATOPOIESE Hematopoiese (hematopoese ou hemopoese) é definido como o processo de formação, desenvolvimento e maturação das células sanguíneas, os eritrócitos, leucócitos e plaquetas, a partir de um precursor comum e indiferenciado e que ocorre na medula óssea A hematopoiese (formação dos 3 tipos de células sanguíneas) pode ser dividida em: 1. Eritropoiese: é o processo que corresponde a formação somente dos eritrócitos ou hemácias. 2. Leucopoiese: processo de formação dos leucócitos; pode ser dividido em mielopoiese (formação dos leucócitos granulares: neutrófilos, basófilos e eosinófilos) e em monopoiese (formação dos monócitos e destes a diferenciação em macrófagos). 3. Trombopoiese: processo de formação dos megacariócitos que dão origem às plaquetas. Como as células sanguíneas são numerosas, não tem a propriedade de proliferação e a vida média delas são curtas (poucos dias, exceto as hemácias que são de 120 dias), a produção diária delas é muito alta. Calcula-se que a produção de granulócitos seja cerca de 1,5 bilhões/dia; para os eritrócitos 300 bilhões/dia e para as plaquetas de 250 bilhões/dia. A produção de hemácias primitivas e nucleadas no primeiro trimestre de gestação é realizada pelo saco vitelino; no segundo trimestre pelo fígado e no início do terceiro trimestre pelo fígado, baço e linfonodos e próximo ao nascimento também pela medula óssea. Até os 5 a 7 anos de idade praticamente todos os ossos largos e chatos realizam a eritropoiese, porém na fase adulta somente a medula óssea dos ossos da pelve, esterno, costelas e vértebras (principal). Todo o processo da hematopoiese inicia-se com a célula precursora comum denominada de célula tronco hematopoiética pluripotente. Na medula, as células tronco hematopoiética pluripotente vão gerar outras células idênticas (para manter a reserva destas células tronco), as células tronco linfocíticas (que formarão os linfócitos) e as células tronco não comprometidas (ainda indiferenciadas), as quais formarão as chamadas células progenitoras comprometidas (que irão diferenciar-se nas demais células sanguíneas). Estas células progenitoras comprometidas, por diferenciação vão formar as seguintes células: a) unidade formadora dos eritrócitos (que formarão os eritrócitos); b) unidade formadora dos granulócitos (que formarão os leucócitos granulócitos e os monócitos); c) unidade formadora dos megacariócitos (que formarão as plaquetas). Na eritropoiese, as células unidades formadoras dos eritrócitos irão gerar a primeira série da linhagem eritrocitária, o proeritroblasto. Deste, na sequência, eritroblasto basófilo – eritrócito policromático – eritrócito ortocromático – reticulócito – eritrócito. Na leucopoiese há uma via comum até a formação dos mieloblastos e depois há diferentes fases para a formação dos granulócitos (neutrófilos, eosinófilos e basófilos) e agranulócitos (monócitos e linfócitos). A via comum, também na leucopoiese, inicia-se com o desenvolvimento da célula tronco hematopoiética pluripotente que irá formar a célula reticular indiferenciada pluripotente a partir desta o mieloblasto, onde inicia-se as fases distintas para a formação dos leucócitos. A figura mostra resumidamente as vias para a formação dos granulócitos (a partir do mieloblasto); dos linfócitos (a partir dos linfoblasto) e também dos monócitos (a partir do monoblasto). A ativação da leucopoiese é regulada por vários fatores de crescimento (cininas e interleucinas) e pelo próprio número de leucócitos circulantes. As fases da formação dos neutrófilos, a partir do mielobasto – promieloblasto é a seguinte: mielócito neutrófilo – metamielócito neutrófilo – metamielócito em bastão – neutrófilo As fases da formação dos eosinófilos, a partir do mielobasto – promieloblasto é a seguinte: mielócito eosinófilo – metamielócito eosinófilo – eosinófilo. Para a formação dos basófilos é a seguinte: mielócito basófilo – basófilo. As fases da formação dos monócitos a partir do mieloblasto é a seguinte: mieloblasto – segmentado – monoblasto – promonócito – monócito. Os linfócitos também são produzidos pela medula óssea pelas células tronco linfoides e se diferenciam em linfócitos T (originados das células prétimócitos) e linfócitos B (pré- búrsicas). Os linfócitos tem importante papel na defesa do organismo. Os linfócitos T são responsáveis pela imunidade celular, estimulando ou atenuando a formação de anticorpos, enquanto que os linfócitos B dão origem aos plasmócitos e células B de memória que geram os anticorpos e são responsáveis pela imunidade humoral. A vida média dos leucócitos granulócitos após a liberação da medula é de aproximadamente 4 a 8 horas no sangue, mas nos tecidos pode ser de 4 a 5 dias. Já os monócitos tem uma vida média de 10 a 12 horas no sangue e nos tecidos, transformam-se em macrófagos, com uma vida média de alguns meses. Os linfócitos tem uma vida média no sangue de 6 a 9 horas, mas nos tecidos podem ter uma vida de alguns meses até anos. São células com diâmetros bem variados (de 6 a 18 µm) e com núcleo esférico e grande no centro da célula. Finalmente na trombopoiese as fases de produção das plaquetas (trombócitos) são as seguintes: célula tronco hematopoiética pluripotente – célula indiferenciada mielóide – megacarioplasto – promegacariócito – megacariócito – plaquetas. As plaquetas são fragmentos dos megacariócitos, células grandes que sofrem replicação do DNA em até 7 vezes, sem a divisão celular ou nuclear); cada megacariócitos produz de mil a três mil plaquetas. Já as plaquetas são células diminutas, de formato ovoides irregulares, com 1,5 µm de diâmetro, sua concentração sanguínea é de 250 mil/mm3 (variando entre 150 a 400 mil/mm3), é anucleada, apresenta algumas mitocôndrias, sem cor, tem uma produção média de 40 mil células/dia e apresentam uma vida média de 10 dias. O megacariócito tem um diâmetro de 50 a 100 µm, com núcleo poli lobulado de grande tamanho. Sua formação é catalisada pelo hormônio trombopoietina, produzido nos rins e fígado. A função básica das plaquetas é a adesão e agregação e, pelos fatores de coagulação existente em sua membrana e pela proteína contrátil citoplasmática denominada de trombostenina, promover os processos hemostáticos. REGULAÇÃO DA HEMATOPOIESE Para a manutenção da homeostasia sanguínea as concentrações circulantes das células sanguíneas devem ser mantidas em valores de normalidade em diferentes momentos. Assim a regulação da função hematopoiética pode ser dividida em 3 partes: 1. Regulação da eritropoiese 2. Regulação da leucopoiese 3. Regulação da trombopoiese O sufixo ”poiese” do grego significa formação contínua. A Regulação da Eritropoiese se faz pela presença de um hormônio que estimula as células tronco hematopoiéticas pluripotentes a se transformarem em proeritroblastos, mas pode também atuar em outras etapas, com menor sensibilidade; este importante hormônio é a eritropoetina (EPO). A eritropoetina é um hormônio glicoproteico, com 165 aminoácidos, peso molecular de 34.000 e é produzida nos rins (90%) e um pouco no fígado (10%). A EPO pode aumentar a eritropoiese em até 10 vezes e sua concentração plasmática média é de apenas 10-11 mol/litro. Sua destruição é exclusivamente hepática. A causa principal da secreção de EPO é a hipóxia e os principais indutores fisiológicos são a anemia (um estado hemolítico) ou a hipóxia hipóxica (grandes altitudes). O sensor de oxigenação encontra-se nos rins (ainda não identificado); se houver queda da pO2 renal, há aumento da secreção de EPO. A remoção dos rins em um animal, mantendo vivo o animal por hemodiálise, resulta em sensível anemia; a EPO hepática não é suficiente para a manutenção normal daeritropoiese. Nos rins a hipóxia leva a formação do fator indutível por hipóxia 1 (HIF1) o qual estimula a secreção de eritropoetina de imediato, chegando a uma secreção máxima em 24 horas, porém as primeiras hemácias serão liberadas da medula óssea após cerca de 5 dias. Para a eritropoiese, além dos níveis de EPO, 3 fatores são essenciais: vitamina B12, ácido fólico e o íon ferro. A vitamina B12 é vital para a produção de DNA nas células eritropoiéticas, sua falta acarreta a anemia perniciosa. A necessidade de vitamina B12 é de 1 a 3 µg/dia e o fígado pode estocar até 3 mg, garantindo quantidade suficiente para a eritropoiese por 2 a 3 anos. O ácido fólico também tem o papel na produção do DNA; é encontrado em vegetais verdes, frutas e carnes vermelhas e atualmente por lei tem uma suplementação nas farinhas de trigo e milho. O metabolismo do ferro: o ferro é fundamental para a formação do grupo heme da hemoglobina. Quando o ferro é absorvido no intestino delgado para o plasma este liga-se à beta globulina formando a transferrina. Nas células, o ferro liga-se a uma apoferritina formando a ferritina, mas pode também ser estocado na forma de hemossiderina (forma insolúvel do ferro). Nos eritroblastos, a transferrina libera o íon ferro para as mitocôndrias para a síntese do grupo heme da hemoglobina. A excreção do ferro se faz pelas fezes e na menstruação (ou hemorragias por lesões dos vasos sanguíneos). Quando ocorre a hemólise, o ferro contido na hemoglobina é reaproveitado. A Regulação da Leucopoiese não se faz por hormônios, mas sim por fatores de ativação, realizadas pelas citocinas e interleucinas. As citocinas são glicoproteínas de baixo peso molecular e seus nomes estão relacionados aos fatores de formação de colônias em estudos em vitro; são os fatores estimulantes de colônias ou CSF (do inglês Colony Stimulating Factor). As interleucinas, designadas por números, participam da ativação da formação dos linfócitos. Estes fatores (e não apenas um) são responsáveis pelo crescimento, maturação e diferenciação dos diferentes tipos de leucócitos. A Regulação da Trombopoiese se faz pela massa plaquetária circulante e não por algum indutor. Quem ativa a trombopoiese é o hormônio denominado trombopoetina (TPO); pouco se conhece sobre este hormônio glicoproteico, com 155 aminoácidos, produzidos pelos rins e pelo fígado, mas atua na trombopoiese no processo de maturação dos megacariócitos. Parece haver algum sinergismo da TPO com algumas interleucinas, as IL3, IL6 e IL11. ANEMIAS E POLICITEMIAS Anemia: do grego anaemia = falta de sangue. É a diminuição da quantidade de eritrócitos (hemácias) ou de hemoglobina no sangue; OU a diminuição do sangue em transportar o oxigênio. Policitemia: é o aumento anormal no número de hemácias no sangue Sintomas da Anemia: fadiga, cansaço, falta de ar, sensação de desmaio, tonturas, pele muito pálida e redução do consumo máximo de oxigênio. Sintomas da Policitemia: hiperviscosidade sanguínea, hipertensão sistólica, pele avermelhada (pletora), cansaço, coceira na pele após banho, cefaleia constante e elevação discreta do consumo máximo de oxigênio. Uma anemia pode ser relativa quando o número de eritrócitos está normal e constante (soluto), porém há aumento do volume plasmático (solvente). A anemia pode ser absoluta quando o volume plasmático está normal, mas o número de eritrócitos está reduzido. Por sua vez uma policitemia pode ser relativa quando o número de eritrócitos está normal, mas há redução do volume plasmático; pode ser absoluta quando o volume plasmático está normal, mas o número de eritrócitos está reduzido. Uma anemia pode ocorrer por um déficit de formação dos eritrócitos, excesso de sua destruição ou por perda sanguínea (hemorragia). Uma policitemia pode ser, basicamente, pelo aumento na taxa de formação dos eritrócitos. Quem regula a produção dos eritrócitos é o hormônio eritropoetina (EPO). As variações da taxa de eritrócitos por: a) Variação diária: devido a ingesta de líquidos (volume plasmático). b) Variação por exercício: indivíduos treinados tem mais eritrócitos e, durante o exercício, o baço libera parte de eritrócitos lá armazenados. c) Variação devido ao sexo do indivíduo: a testosterona aumenta a eritropoiese, enquanto os estrógenos a diminui, além da perda menstrual. d) Variação por altitude: a hipóxia das grandes altitudes estimula a eritropoiese. e) Variação por idade: é alta no recém-nato, diminui até 6 meses e depois eleva-se e estabiliza; em idosos é um pouco menor. f) Variação por gravidez: A partir do 5o mês há expansão do LEC. Há, pelo menos, 7 tipos de anemias, a saber: 1. Anemia por perda sanguínea (hemorragia). 2. Anemia aplástica por disfunção da medula óssea. 3. Anemia megaloblástica. 4. Anemia hemolítica. 5. Anemia esferocitose hereditária. 6. Anemia falciforme. 7. Eritroblastose fetal. 1- Anemia por perda sanguínea (hemorragia): após uma hemorragia, o organismo repõe o plasma em 1 a 3 dias, porém a reposição das hemácias poderá demorar de 3 a 6 semanas. Se a reposição de ferro for, neste caso, lenta, tem-se a anemia microcítica hipocrômica com hemácias menores e menos hemoglobina no citoplasma. 2- Anemia aplástica por disfunção da medula óssea: isto significa um funcionamento inadequado da medula óssea por alguma razão, entre elas: radiação intensa, quimioterapia, agentes tóxicos (benzeno), lúpus eritematoso ou de causa idiopática. 3- Anemia megaloblástica: com a falta de ácido fólico (vitamina B 12), as hemácias crescem de modo excessivo assumindo formas anormais e mais propícias à hemólise. 4- Anemia hemolítica: anomalias hereditárias diversas podem tornar as hemácias frágeis e se romperem facilmente no baço; a vida média das hemácias estaria reduzida. 5- Anemia esferocitose hereditária: as hemácias são pequenas e esféricas e se rompem facilmente, além do conteúdo de hemoglobina no seu interior ser menor. 6- Anemia falciforme: os eritrócitos (hemácias) contém um tipo anormal de hemoglobina denominada de ”S” com as cadeias betas anormais. Quando estes pigmentos são colocados em ambiente com baixos níveis de oxigênio eles se cristalizam e gera uma hemácia com a forma de foice, há lesões das hemácias com hemólise prematura, num mecanismo em cascata que pode levar a morte do portador. 7- Eritroblastose fetal: as hemácias fator Rh positivas do feto são atacadas por anticorpos Rh negativos da mãe, levando à ruptura das hemácias fetais. Há 2 tipos de policitemias: 1- Policitemia secundária: ocorre devido à hipóxia por insuficiência cardíaca (patológica) ou morar em regiões de grandes altitudes (fisiológica). Os órgãos hematopoiéticos produzem hemácias extras, com elevação do hematócrito e a viscosidade do sangue. 2- Policitemia Vera: causada por aberração genética nas células tronco hematopoiéticas que não param de duplicar-se. Nesta condição há elevação acentuada do hematócrito e no número de hemácias, mas também na taxa dos leucócitos e plaquetas e no volume e na viscosidade sanguínea. Tratamento para as anemias: vai depender do tipo e da intensidade do processo anêmico, porém os principais são: alimentação adequada, suplementação com sulfato de ferro, transfusão de sangue, administração de eritropoetina, transplante de medula óssea, estagnação de hemorragias frequentes (TGI), repouso e oxigênioterapia hiperbárica. No Brasil, por lei, é obrigado a adição de ácido fólico e ferro nas farinhas de trigo e milho. Tratamento para as policitemias: sangria de volumes de sangue com certa frequência (flebotomia), administração de anticoagulantes e de interferon. FETAL A quantidade de oxigênio disponível para o feto é de apenas 30 a 40% em relação à materna, então para garantir um adequado aporte de oxigênioo feto apresenta dois recursos adicionais: a) tem uma quantidade de hemoglobina bem maior (40 a 50%) do que a mãe; b) a hemoglobina fetal apresenta duas cadeias alfa (igual do adulto) e duas cadeias gama (no adulto são duas beta). A hemoglobina fetal (devido a cadeia gama) tem a capacidade de transportar de 20 a 50% mais oxigênio que a materna e sua curva de dissociação está desviada à esquerda, favorecendo a entrega do oxigênios aos tecidos em crescimento do feto. Então, o sangue contribui de maneira significativa para a manutenção da comunicação entre diferentes tipos de células, permite a oferta de nutrientes e do oxigênio e a remoção de catabólitos celulares e do dióxido de carbono, contribuindo para a perfeita harmonia no funcionamento de todos os sistemas fisiológicos e na manutenção da vida do indivíduo.