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www.esab.edu.br Metodologia do Trabalho Cientí�co Metodologia do Trabalho Científico Vila Velha (ES) 2013 Diretoria Executiva Charlie Anderson Olsen Larissa Kleis Pereira Margarete Lazzaris Kleis Thiago Kleis Pereira Conteudista Simone Regina Dias Coordenação de Projeto Andreza Lopes Patrícia Battisti Supervisão de Design Educacional Barbara da Silveira Vieira Supervisão de Revisão Gramatical Andréa Borges Minsky Supervisão de Design Gráfico Laura Martins Rodrigues Design Educacional Renata Oltramari Revisão Gramatical Elaine Monteiro Seidler Érica da Silva Martins Valduga Hellen Melo Pereira Paulo de Tarso Vieira Design Gráfico Neri Gonçalves Ribeiro Diagramação Fernando Andrade Equipe Acadêmica da ESAB Coordenadores dos Cursos Docentes dos Cursos Copyright © Todos os direitos desta obra são da Escola Superior Aberta do Brasil. www.esab.edu.br Av. Santa Leopoldina, nº 840 Coqueiral de Itaparica - Vila Velha, ES CEP 29102-040 Escola Superior Aberta do Brasil Diretor Acadêmico Beatriz Christo Gobbi Coordenadora do Núcleo de Educação a Distância Beatriz Christo Gobbi Coordenadora do Curso de Administração EAD Rosemary Riguetti Coordenador do Curso de Pedagogia EAD Claudio David Cari Coordenador do Curso de Sistemas de Informação EAD David Gomes Barboza Produção do Material Didático-Pedagógico Delinea Tecnologia Educacional / Escola Superior Aberta do Brasil Diretor Geral Nildo Ferreira Apresentação Caro estudante, Seja bem vindo à ESAB. A Escola Superior Aberta do Brasil, funda-se no princípio básico de atuar com educação a distância, utilizando como meio, tão somente, a internet. Em 2004,foi especialmente credenciada para ofertar cursos de pós- graduação a distância, via e-learning, utilizando-se de software próprio denominado Campus Online. Em 2009 foi credenciada com Instituição de Ensino Superior – IES, através da portaria MEC nº 1242/2009, de 30 de dezembro de 2009, ocasião em que também foi autorizada a ofertar o curso de pedagogia – licenciatura, na modalidade presencial, conforme portaria MEC nº 14/2010, de 9 de janeiro de 2010. Em outubro de 2012 recebeu o Prêmio Top Educação 2012, da Editora Segmento, sendo reconhecida como a Melhor Instituição de Ensino EAD para Docentes. Em 2013 é aprovada para a oferta dos cursos de: Administração (Bacharelado); Pedagogia (Licenciatura) e Sistemas de Informação (Bacharelado), todos na modalidade EAD, com avaliação máxima das comissões avaliadoras. Você já deve estar se perguntando: o que vamos aprender nesta disciplina? Pois bem, será uma prazerosa descoberta sobre assuntos muito discutidos entre pesquisadores e acadêmicos: a metodologia do trabalho científico. Esta disciplina possui um caráter instrumental, visando a atividade científica dos estudantes. Mas o que significa ciência? E o conhecimento, como se constrói? Já sabemos que para o ensino ter eficácia e qualidade precisa de uma pedagogia fundada em uma postura investigativa. E um de nossos objetivos é despertar isso em você! Ou seja, despertar a vontade de pesquisar e colocá-lo em contato com algumas ferramentas que podem ajudá-lo nesse processo. Para tanto, trabalharemos com os autores Magalhães (2005), Máttar Neto (2011), Severino (2007) e Vergara (2007). As ideias abordadas ao longo deste caderno de estudo podem se constituir em eficiente ferramenta para a realização das pesquisas e da estruturação do trabalho acadêmico-científico na área de conhecimento do curso que você escolheu. Por fim, destaca-se que este caderno de estudo pretende subsidiar uma competente preparação técnico-científica, auxiliando no enfrentamento das diversas empreitadas ao longo de seu processo de formação. Bom estudo! Equipe Acadêmica da ESAB Objetivo O nosso objetivo é formar profissionais qualificados que compreendam o processo de formação do conhecimento científico, habilitando-os tecnicamente para o exercício da pesquisa. Competências e habilidades • Reconhecer a dinâmica da pesquisa, verificando as diretrizes metodológicas e técnicas para a elaboração do trabalho científico, ao contemplar suas etapas, seus aspectos redacionais e suas diversas modalidades, no amplo contexto da vivência acadêmica. • Identificar o impacto das tecnologias da comunicação e da informação nos processos de produção do conhecimento. • Empregar os procedimentos da metodologia científica para elaboração de trabalhos técnico-científicos. • Elaborar os diversos tipos de trabalhos acadêmico-científicos, aplicando as normas da ABNT. Ementa Tipos de conhecimento e ciência. A ciência moderna e o contexto sociocultural. Tipos de Trabalhos Científicos. Metodologia de Pesquisa. Relatório de Pesquisa. Normatização de Trabalhos Científicos. Sumário 1. O que é e para que serve o conhecimento?......................................................................6 2. Tipos de conhecimento .................................................................................................12 3. O que é ciência? ............................................................................................................19 4. Pesquisa científica .........................................................................................................24 5. Sociedade da informação ..............................................................................................28 6. Classificação das ciências ..............................................................................................32 7. Continuidades e descontinuidades ................................................................................38 8. Ciência, técnica e tecnologia .........................................................................................46 9. Produção científica: fichamento ....................................................................................51 10. Produção científica: resenha crítica ...............................................................................58 11. Produção científica: artigo científico .............................................................................63 12. Produção científica: monografia, dissertação e tese ......................................................70 13. Para que serve a metodologia científica? ......................................................................77 14. Em torno do método: indução e dedução ......................................................................83 15. Pesquisa quantitativa ....................................................................................................90 16. Pesquisa qualitativa ......................................................................................................94 17. Projeto de pesquisa: finalidades e estrutura ..................................................................99 18. Projeto de pesquisa: elaboração ..................................................................................105 19. Projeto de pesquisa: finalização ..................................................................................111 20. Resultados da pesquisa: a divulgação .........................................................................116 21. Estrutura do trabalho científico: elementos pré-textuais e textuais ............................120 22. Estrutura do trabalho científico: elementos pós-textuais ............................................125 23. Citações.......................................................................................................................128 24. Elaboração das Referências .........................................................................................133 Glossário ............................................................................................................................142 Referências ........................................................................................................................151 www.esab.edu.br 6 1 O que é e para que serveo conhecimento? Objetivo Explicitar o conceito de conhecimento e identificar suas aplicabilidades. Caro aluno, antes de começarmos a trabalhar o conteúdo desta disciplina, vamos refletir sobre o motivo de sua existência logo no início do curso. Você vai perceber a inter-relação entre as unidades, que remetem umas às outras. Isso acontece porque os termos que abordaremos a seguir possuem uma relação muito próxima, e é preciso compreender como se estrutura esta equação entre conhecimento, pesquisa e o processo de ensino/aprendizagem. Severino (2007) nos auxilia nessa tarefa quando explica que a atividade de ensinar e aprender está intimamente vinculada ao processo de construção do conhecimento, pois ele é a implementação de uma equação de acordo com a qual educar – ou seja, ensinar e aprender – significa, entre outros, conhecer; e, por sua vez, conhecer significa construir o objeto; enquanto construir o objeto significa pesquisar. Então, não podemos adotar uma postura passiva no ato de assimilar o conhecimento. Pelo contrário, o que esperamos de você, nesta etapa de formação, ao ingressar no Ensino Superior, é que o conhecimento seja construído pela experiência ativa. O conhecimento humano é tema que instiga o pensamento e nos faz sempre refletir de forma diferente diante da história e dos acontecimentos contemporâneos. É impossível estudar a metodologia de pesquisa sem antes entender as formas de investigar seu principal ator: o ser humano. A forma como nos comportamos e vivemos em sociedade induz ao aparecimento de tendências de comportamento modificadas devido www.esab.edu.br 7 à sua própria evolução. Essa dinâmica move a ciência a estudar e descobrir questionamentos que não podem ser explicados apenas pela presença dos fatos. Se considerarmos o conhecimento como a construção do objeto que se conhece, concluiremos que a atividade de pesquisa é fundamental e imprescindível no processo de ensino/aprendizagem. E é por isso que Severino (2007) sustenta que ensino e aprendizagem só serão motivadores se o seu processo se der como processo de pesquisa. Então, em última instância, o que conta agora não é mais a capacidade de decorar e memorizar centenas de dados, fatos, datas, noções, mas sim a competência de entender, refletir, articular e analisar as informações, os fatos e as noções, estabelecendo interligações entre as coisas aprendidas. Trata-se, pois, de apreender processos. Tendo isso em mente, perguntamos a você: como surgiu o conhecimento? Qual a sua origem? A produção do conhecimento é um tema polêmico, já que divergem as perspectivas sobre sua origem. O ser humano atribui a origem do conhecimento a fontes variadas, tais como: • revelação, inspiração divina, graça; • autoridade, tradição, opinião de especialistas; • senso comum; • lógica dedutiva e indutiva; • observação sensorial; • pesquisa científica. A busca pelo conhecimento tem início com a preocupação em saber ao certo qual seria o lugar do ser humano no universo. Inicialmente, pode-se pensar que a busca pelo conhecimento ou a produção do conhecimento ocorre no momento em que se buscam respostas sobre a origem do ser. Mas o que significa conhecer? Trata-se de incorporar um conceito novo sobre um fato ou fenômeno qualquer. Sabemos que o conhecimento não nasce do vazio, mas sim das experiências que acumulamos em nossa vida www.esab.edu.br 8 cotidiana, por meio dos relacionamentos interpessoais, das vivências, das leituras etc. O que nos distingue dos demais animais é justamente o fato de que somos os únicos capazes de criar e transformar o conhecimento. Sim, somos os únicos capazes de aplicar o que aprendemos, por diversos meios, em uma situação de mudança do conhecimento. E por meio da linguagem registramos e transmitimos nossas experiências aos outros seres humanos. O conhecimento pode ser entendido ainda como a relação que se estabelece entre sujeito que conhece ou deseja conhecer e o objeto a ser conhecido ou que se dá a conhecer. Enquanto o conhecimento é percebido como o acúmulo de informações de cunho intelectual, como o domínio acerca de determinado assunto, a ciência pode ser compreendida como o conhecimento racional metódico, relativamente verificável e sistemático, que visa estabelecer relações necessárias entre as coisas. Então, vale a pena fazermos a distinção entre conhecimento e informação. Vejamos: uma enciclopédia em si não acarreta um processo de conhecimento em aberto, tendo em vista que ela não costuma passar de um repositório de informações já pesquisadas, previamente processadas. Já o ato de conhecer é um processo que exige que nela ocorra o ato que leva um sujeito a utilizá-la com o propósito de conhecimento (MAGALHÃES, 2005). Se a informação isolada é um dado, a informação em rede é o pressuposto do conhecimento. Ou seja, é preciso estabelecer relações, dar sentido, articular, apurar o senso crítico para promover as conexões. Magalhães (2005) explica que mesmo um conhecimento já existente no acervo da humanidade, ao ser reelaborado por uma pessoa que o desconhecia, parece novo, de forma que podemos admitir que esse processo também faz parte da criação. E o conhecimento como processo é justamente o que se deseja para a atividade escolar. Em vez de decorar e de aceitar noções sem crítica, é fundamental pensarmos em criatividade no aprendizado, dando sentido à apreensão do conhecimento. www.esab.edu.br 9 1.1 Voltando às origens No Oriente, a invenção do conhecimento foi tarefa da filosofia e da religião. A maioria das religiões orientais não apresenta uma distinção clara entre filosofia e religião. Xintoísmo, budismo, bramanismo são alguns exemplos das religiões orientais nas quais não se percebe claramente a diferença entre ensinamentos religiosos e filosóficos, sendo partes de uma unidade. No Ocidente, somente quando a Europa se livrou do longo pesadelo das guerras religiosas e se estabeleceu numa vida de exploração comercial e industrial foi que a ciência começou a ser incorporada (MÁTTAR NETO, 2011). Como afirma Máttar Neto (2011), o mundo medieval era passivo e simbólico, enxergando na natureza a assinatura do Criador. Então, o que se viu nessa trajetória da humanidade foram passos lentos de invenções e inovações, até chegarmos ao pensamento racional, que surge simultaneamente com a escrita, diminuindo a importância da memória e audição das sociedades míticas. Portanto, o berço da busca pelo conhecimento é a Grécia Antiga, onde teve início a separação que conhecemos no Ocidente entre religião e filosofia, apesar de civilizações anteriores a esta já terem apresentado consideráveis realizações científicas. Surge, assim, a primeira dicotomia que acompanha a humanidade ocidental até hoje. A dicotomia consiste na classificação pautada na divisão e subdivisão sucessiva em dois, geralmente opostos. E tratar as relações com a dicotomia do isso ou aquilo, de oposição, é operar na dualidade, na divisão. Para alguns estudiosos, a filosofia terá um peso classificatório maior do que a religião porque a sua preocupação é com a busca do saber, e isso seria a coisa mais importante a ser feita. Por outro lado, a religião ficaria responsável pelas questões espirituais. E então surgiu uma nova divisão entre mente, que representa a consciência, e espírito ou alma, que representa a inconsciência. O filósofo grego Platão, em um de seus escritos publicados em “A República”, apresenta a “alegoria da caverna”. Ele menciona o mito de www.esab.edu.br 10 uma caverna escura onde os habitantes, acorrentados de costas para o sol, veem apenas suas próprias sombras – e as sombras do mundo – projetadas na parede, iluminada por uma fogueira, que por sua vez ilumina ainda um palco em que estátuas dos seres, como homens, plantas, animais etc., são manipuladas, como que representando o cotidiano desses seres. De onde estão, os habitantes da caverna não conseguem discernir entre o ilusório e o real, e todo o conhecimentodo mundo exterior decorre apenas das sombras. Somente quando um dos prisioneiros consegue se libertar e olhar para a realidade iluminada pelo sol é que compreende, de fato, o que eram as projeções na parede. Isso nos remete à seguinte reflexão: os prisioneiros somos nós que, conforme nossas tradições diferentes, hábitos diferentes, culturas diferentes, estamos acostumados com as noções sem que delas reflitamos para fazer juízos corretos, mas apenas acreditamos e usamos como nos foi transmitido. Para sua reflexão Então, perguntamos a você: pode existir um conhecimento independente das opiniões, um conhecimento verdadeiro e não dogmático? As respostas a essas reflexões formam parte de sua aprendizagem e são individuais, não precisando ser comunicadas ou enviadas aos tutores. Figura 1 – A alegoria da caverna. Fonte: Alexandre Oliveira (2012). www.esab.edu.br 11 Outro questionamento que pode ter surgido ao longo desta leitura é o seguinte: mas, afinal, para que serve o conhecimento? Poderíamos responder com algumas alternativas: • autoconhecimento: ou seja, para se conhecer melhor; • conhecimento da realidade: conhecer o mundo que nos cerca, entendendo os fenômenos; • visão utilitarista: uso do conhecimento para se beneficiar. Mas podemos e devemos ir além dessas respostas. Já sabemos que o ser humano costuma usar o conhecimento para reagir ao meio e, se possível, transformá-lo. E é importante que você perceba que o conhecimento só adquire sentido para a humanidade na medida em que contribui para incrementar sua capacidade de fruir a vida e para diminuir o sofrimento humano. E isso fornece um sentido mais amplo às descobertas. A partir dessa compreensão e da percepção das divisões iniciais em relação ao conhecimento, começaram a acontecer outras, que transformaram a nossa compreensão sobre o termo. Passamos a fazer distinções entre o conhecimento filosófico, o conhecimento teológico, o conhecimento empírico e o conhecimento científico, assunto de nossa próxima unidade. www.esab.edu.br 12 2 Tipos de conhecimento Objetivo Apresentar os tipos de conhecimento, verificando suas inter-relações. A metodologia científica praticada atualmente se pauta por articular os rigores da produção científica às mudanças da sociedade do conhecimento. Na apresentação da disciplina, já nos referimos às áreas de conhecimento. Ali, afirmamos que a metodologia científica aplicada a cada situação varia de acordo com as premissas de cada área do conhecimento porque cada área respeita suas regras internas e a sua própria história. Assim, as pesquisas ligadas às áreas de humanidades sempre tenderão a ser mais qualitativas e menos quantitativas, enquanto que nas áreas de exatas, aplicadas e da saúde o uso das formulações quantitativas são mais recorrentes. 2.1 O tácito e o explícito na sociedade do conhecimento Vamos começar nossa unidade distinguindo dois níveis de conhecimento: o tácito e o explícito. O conhecimento tácito emerge da experiência cotidiana aliada às leituras e interpretações das mais diversas teorias. Essa confluência entre teoria e prática e a experiência pessoal de cada indivíduo não ajuda no processo de ensino e aprendizagem, pois se trata de um conhecimento que pode ser observado e entendido na prática vivenciada pela pessoa. Trata-se daquele que se obtém ao longo da vida e, desse modo, passa a fazer parte da vida das pessoas. Usualmente é complicado explicar a mecânica desse processo, isso porque se trata de um conhecimento subjetivo, sendo www.esab.edu.br 13 inerente às habilidades de uma pessoa, como “saber fazer” (know-how) alguma coisa. A palavra tácito vem do latim tacitus, que significa “não expresso por palavras” (MAGALHÃES, 2005). Assim, podemos entender o conhecimento tácito como um conjunto de procedimentos práticos que podem ser observados, não sendo necessário que exista uma pedagogia explicativa sobre como a pessoa faz aquilo. Quer um exemplo? Pense no caso de sua mãe ou avó, se for o caso, que cozinha de uma forma magistral, apesar de nunca ter feito um curso de culinária. Perceba que se trata de conhecimento subjetivo, não mensurável, de difícil captura e transmissão e, por isso mesmo, muito valioso. O conhecimento explícito é de mais fácil compreensão, visto que ele é composto de experiências que podem ser replicadas, transformando-se rapidamente em um método (MAGALHÃES, 2005). Esse método pode ser de longa duração, ou seja, servir por muito tempo, ou pode ser de curta duração, perdendo seu sentido depois de alguns meses ou anos. Sendo um sistema que permite o aprendizado de forma escrita ou imagética, atribui-se a esse tipo de conhecimento a característica de ser objetivo. As formas mais comuns do conhecimento explícito são os manuais, documentos e procedimentos, onde se sistematizam as informações, propondo, por exemplo, um método de trabalho. Vejamos a famosa escultura de Auguste Rodin, intitulada “O pensador”, na qual o artista representa a figura de Dante Alighieri. Essa escultura simboliza o poder do pensamento e da criatividade humana. www.esab.edu.br 14 Figura 2 – “O pensador”, de Auguste Rodin. Fonte: <commons.wikimedia.org>. O conhecimento humano nos dias de hoje está classificado em quatro níveis principais, os quais são denominados: conhecimento popular, conhecimento religioso, conhecimento filosófico e, por fim, o conhecimento científico. Cada um desses níveis apresenta seus argumentos para dar conta de explicar o surgimento do homem, do mundo e de toda forma de conhecimento que nele habita. Nesta unidade, esse assunto será tratado de maneira conceitual e genérica, com exceção do conhecimento científico, que será contemplado com maior profundidade em outras unidades, pois nele está a base desta disciplina. www.esab.edu.br 15 2.2 Conhecimento popular, vulgar ou empírico: o senso comum O conhecimento popular envolve as opiniões não comprovadas, ou seja, as experiências do dia a dia. Sua aquisição, em geral, não se pauta em estudos e pesquisas. E não existe uma preocupação em estabelecer relações significativas entre os fatos nem em interpretá-los. Possui como características o fato de ser reflexivo, assistemático, verificável, falível e inexato. Podemos dizer que é reflexivo, mas está limitado pela familiaridade com o objeto, então não pode ser reduzido a uma formulação geral. A característica de assistemático baseia-se na premissa de que possui uma organização particular das experiências do sujeito cognoscente, e não em uma sistematização das ideias, na procura de uma formulação geral que explique os fenômenos observados. É verificável na medida em que está limitado ao âmbito da vida diária e diz respeito àquilo que se pode perceber no cotidiano. E, por fim, consideramos falível e inexato haja vista que se conforma com a aparência e com o que se ouviu dizer a respeito do objeto (MÁTTAR NETO, 2011). O senso comum é um tipo de conhecimento que se passa de geração a geração. Por exemplo, no passado os agricultores aprenderam a dominar as técnicas de plantio, de colheita e de beneficiamento dos produtos agrícolas se baseando exclusivamente na observação da natureza. Qual é o melhor período para plantar? Qual é o melhor período para colher? Qual é a época do ano que chove mais? Qual é a época mais seca? Enfim, ao longo de algumas gerações, a observação da natureza acabou ensinando os primeiros agricultores a dominarem todo o processo de cultivo das plantas utilizadas em nossa dieta. Pense na seguinte situação como exemplo: um pescador vigilante, do alto da encosta, sabe identificar o momento exato em que um cardume entra na baía para que possa sair com seu barco pesqueiro para o mar. Ele pode ser analfabeto, morador de uma vila isolada dos grandes centros e não dispor de recursos de informação e tecnologia. A sua sabedoria fundamenta-se justamente na sua experiência cotidiana, herdada de seus antepassados ao observar o movimento das águasdo mar e a direção do vento. www.esab.edu.br 16 2.3 Conhecimento religioso, ou teológico Saiba que o conhecimento religioso parte do princípio de que as verdades nas quais se acredita são infalíveis ou indiscutíveis, posto que se trata de revelações da divindade. Sua adesão ocorre em função da fé das pessoas. Desse modo, não se coloca em dúvida nem há necessidade de se verificar sua veracidade. As verdades são consideradas infalíveis e indiscutíveis, como já se afirmou; trata-se de um conhecimento sistemático do mundo (origem, significado, finalidade e destino) como obra de um criador divino; suas evidências não são verificadas, já que está sempre implícita uma atitude de fé perante um conhecimento revelado. Note que, quando se acredita na representação mítica do mundo, pode ser considerada religião. O ato de acreditar na representação mítica significa ter fé em “verdades” registradas em livros sagrados ou reveladas por seres considerados iluminados, profetas, santos. Já as formas de institucionalização das religiões, como templos, símbolos e rituais, não garantem que necessariamente os indivíduos tenham uma consciência religiosa. 2.4 Conhecimento filosófico E o conhecimento filosófico, a que se refere? Podemos caracterizá-lo como um diálogo contínuo com os filósofos precedentes, pautando- se em raciocínios lógicos e sem obrigação de vínculo com a realidade. Cabe destacar que no início as diferenças entre filosofia e ciência não eram muito evidentes, já que os primeiros filósofos foram também os primeiros cientistas. Como afirma Máttar Neto (2011), a Filosofia é a ciência-mãe, da qual foram, pouco a pouco, separando-se formas de pensar e métodos que mais tarde se especializaram e se tornaram independentes. É por intermédio da razão que se busca analisar ideias, estabelecer relações conceituais. Veja que, nesse caso, o método empregado na www.esab.edu.br 17 construção desse tipo de conhecimento é o racional, predominando o processo dedutivo que precede a experiência, não exigindo confirmação experimental, mas apenas coerência lógica (MÁTTAR NETO, 2011). Desse modo, podemos dizer que o conhecimento filosófico é valorativo, já que seu ponto de partida consiste em hipóteses que não poderão ser submetidas à observação. Em função disso, não é verificável, já que os enunciados das hipóteses filosóficas não podem ser confirmados nem refutados. É também racional, em virtude de consistir em um conjunto de enunciados logicamente correlacionados. Possui ainda a característica de sistemático, pois suas hipóteses e enunciados visam a uma representação coerente da realidade estudada, numa tentativa de apreendê-la em sua totalidade. Cabe ainda acrescentar que os dois sistemas mais importantes que construíram o sustentáculo do saber filosófico são os seguintes: o idealismo e o materialismo, que surgiram, respectivamente, nos pensamentos de Platão (427-347 a.C.) e de Aristóteles (384-322 a.C.), filósofos que continuam dialogando com os pensadores contemporâneos. 2.5 Conhecimento científico Do mesmo modo que o filosófico, o conhecimento científico é racional, mas este possui a pretensão de ser sistemático e de revelar aspectos da realidade. Perceba que o conhecimento científico surge da necessidade de o ser humano querer saber como os fenômenos ocorrem, em vez de apenas aceitá-los passivamente. Com esse tipo de conhecimento, começamos a perceber o porquê de vários fenômenos naturais e, desse modo, temos condições de intervir nos acontecimentos ao nosso redor. Sabemos que ele surge não apenas da necessidade de encontrar soluções para problemas de ordem prática da vida diária, mas do desejo de fornecer explicações sistemáticas que possam ser testadas e criticadas por meio de provas empíricas. www.esab.edu.br 18 Máttar Neto (2011) explica que o ciclo do conhecimento científico inclui a observação, a produção de teorias para explicar essa observação, o teste dessas teorias e seu aperfeiçoamento. Mas é preciso ter em mente que a ciência, tal como a conhecemos hoje, é uma criação dos últimos trezentos anos. E ela teve pleno êxito na era moderna, propiciando avanços tecnológicos e progressos nas mais diversas áreas. Sabemos que a técnica serviu de base para a indústria, por exemplo, ampliando o poder do ser humano em manipular a natureza. Trata-se de um assunto instigante, não é mesmo? Então, vamos descobrir o que é ciência, sobretudo no que se refere ao desenvolvimento do método científico. Veja melhor esta discussão na próxima unidade. www.esab.edu.br 19 3 O que é ciência? Objetivo Contemplar a discussão sobre as ciências. A civilização grega está na base do processo de consolidação da ciência na cultura ocidental. Foi lá que Aristóteles (384-322 a.C.) inventou o primeiro método científico que a humanidade conheceu. O método indutivo-dedutivo foi uma criação dos gregos que ainda é utilizado hoje em dia. Aristóteles afirmava que a investigação científica se tratava de uma progressão de observações que formulavam um princípio geral, que servia, por sua vez, para que voltássemos às observações. Segundo esse método, o cientista precisa induzir alguns princípios dos fenômenos a serem explicados. Depois disso, era necessário deduzir afirmações sobre os fenômenos, incluindo as premissas. Parece confuso, mas de forma simples podemos dizer que tudo pode ser resumido assim: o cientista parte da observação de um fenômeno; a seguir, ele formula uma premissa chamada de indução; depois, o cientista elabora um ou alguns princípios gerais; munido desses princípios gerais, o cientista retorna às observações para validar ou não a sua teoria. Abordaremos esse assunto mais adiante, em outra unidade. Saiba que os gregos foram os primeiros a separar os saberes científicos das outras formas de saber. Entre as formas de saber que ficaram de fora do saber científico, estão os saberes mundanos (ou senso comum) e os saberes ligados às religiões, conforme já estudamos. A principal diferença entre os saberes se encontra na capacidade de o fenômeno poder ser explicado e/ou comprovado por meio de uma teoria. Os fenômenos religiosos, por exemplo, não precisam ser www.esab.edu.br 20 explicados nem comprovados, pois a crença neles se baseia em nossa fé. A fé não necessita de comprovação. Já vimos também que outro saber que não se baseia na comprovação científica é o chamado senso comum. O senso comum se baseava na observação desprovida de base científica (MÁTTAR NETO, 2011). O saber científico não se baseia na fé e também não se contenta com a observação da natureza, embora a observação da natureza seja uma parte do saber científico. Todo saber científico se baseia na observação, mas para se tornar um saber científico, é necessário se conhecer os mecanismos funcionais no interior de um sistema. Por exemplo, a descoberta do Sistema Solar. Inicialmente se acreditava que a Terra era o centro do Universo, e que os outros planetas e estrelas, inclusive o Sol, giravam em torno dela. Por mais de dois mil anos se acreditou nessa teoria. Mas, durante a Idade Média, Galileu Galilei, com o auxílio de um telescópio mais poderoso, descobriu que não era bem assim. Ou seja, ele descobriu que a Terra não era o centro do Universo e, longe disso, era a Terra que girava em torno do Sol, acompanhando o movimento dos outros planetas. Assim, a Terra se tornou uma peça a mais no quebra-cabeça do Sistema Solar, deixando de ser o seu centro. Figura 3 – Galileu Galilei. Fonte: <commons.wikimedia.org>. www.esab.edu.br 21 Como se percebe nesse exemplo, a ciência precisa de comprovações (o modelo aristotélico que comprovou o movimento dos corpos celestes), porém o avanço tecnológico (o novo telescópio de Galileu) pôde alterar a maneira como interpretamos os sistemas (o novo sistema demonstrou que a Terra não era o centro do Universo). Note então que o uso de novas tecnologias afeta a forma como concebemos as coisas. A forma comovivemos, plantamos, armazenamos, consumimos, enfim, todas as áreas de nossas vidas são afetadas quando o assunto é conhecimento. Mas atenção: a ciência se faz quando o pesquisador aborda os fenômenos aplicando determinados recursos técnicos, seguindo um método (palavra- chave quando o assunto é ciência) e apoiando-se em fundamentos epistemológicos. Este é, digamos, o funcionamento da ciência. Os fundamentos epistemológicos, nesse caso, são os que fornecem sustentação e justificativa para a metodologia praticada. Nesse sentido, Severino (2007, p. 100) explica que a ciência “[...] é sempre o enlace de uma malha teórica com dados empíricos, é sempre uma articulação do lógico com o real, do teórico com o empírico, do ideal com o real”. A etimologia da palavra ciência vem do latim scire, “saber”, “conhecer”. Mas perceba que hoje a entendemos como um conhecimento específico, ainda que não se encontre consenso para essa definição, e isso se deve à abrangência de suas atividades nas mais diversas áreas. Mas podemos dizer que, ao fazer ciência, o ser humano parte de uma determinada concepção acerca da natureza do real e do seu modo de conhecer. A sistematização dessas posições pode ser chamada de paradigmas (ou paradigmas epistemológicos). E, para que o conhecimento produzido pelo pesquisador tenha consistência, é fundamental admitir algumas verdades universais, ou seja, a ciência precisa apoiar-se em determinados pressupostos. www.esab.edu.br 22 Pode-se dizer que o conhecimento científico é resultante da investigação metódica, sistemática da realidade, pela transcrição dos fatos e fenômenos em si mesmos e analisando-os, com a finalidade de descobrir suas causas e concluir sobre as leis gerais que a governam. Nesse sentido, note que o objeto da ciência consiste no universo material físico, perceptível por meio de órgãos dos sentidos ou da ajuda dos instrumentos investigativos. E, desse modo, sua busca consiste em desvendar os segredos da realidade, demonstrando suas relações de predomínio, igualdade ou subordinação com outros fatos ou fenômenos. Você já deve ter percebido que a ciência ocorre a partir do emprego dos métodos que permitem a comprovação de determinada teoria, conforme o objeto de estudo escolhido, gerando então conhecimento científico. Magalhães (2005) nos traz uma reflexão interessante quando destaca que, por ser “conhecimento”, a ciência é processo, é algo que se transforma, não estando acabada. Conhecer significa, portanto, o constante recomeçar desse processo. Ao levar em conta o que já foi pesquisado e conhecido, o pesquisador segue adiante de modo a aperfeiçoar os níveis anteriores de conhecimento. Se o saber não for crítico, generalizante e destinado a conhecer o mundo em que habitamos, não será ciência. Possivelmente, será apenas senso comum. Estudo complementar Sugerimos que você aprofunde seus conhecimentos ao ler o artigo “O que é ciência?”, em que o autor apresenta algumas das principais concepções de ciência defendidas por filósofos da ciência desde o surgimento da ciência moderna, no século XVII. Clique aqui, vale conferir! http://www.unicamp.br/~chibeni/textosdidaticos/ciencia.pdf www.esab.edu.br 23 Não há espaço, no âmbito das ciências, para crenças, superstições ou “achismos”: é preciso primar pela objetividade, focar no problema a ser investigado, deixar as crenças de lado e, por meio de um método adequado, buscar a resolução para o fato pesquisado. Daí a importância de se desenvolver o “espírito científico”. E o que vem a ser isso? Trata-se justamente de uma atitude em busca de soluções reais para dificuldades encontradas, pautando-se em métodos adequados. Assim, o ser humano dotado de espírito científico apresenta em seu pensamento a crítica (o chamado senso crítico), a objetividade e a racionalidade. Eis que são palavrinhas que merecem nossa atenção. Por isso, são assuntos de nossa próxima unidade. Fórum Caro estudante, dirija-se ao Ambiente Virtual de Aprendizagem da instituição e participe do nosso Fórum de discussão. Lá você poderá interagir com seus colegas e com seu tutor de forma a ampliar, por meio da interação, a construção do seu conhecimento. Vamos lá? www.esab.edu.br 24 4 Pesquisa científica Objetivo Discutir o ato de “fazer ciência” hoje. “Não existe nenhum caminho lógico para a descoberta das leis do Universo. O único caminho é o da intuição.” (Albert Einstein) Até aqui você já deve ter percebido que a ciência é simultaneamente um saber teórico (que explica o real) e um poder prático (maneja o real pela técnica). E, para que se desenvolva o conhecimento científico, é preciso a realização da pesquisa científica, tão importante nos mais diversos setores e áreas. 4.1 Fazer ciência Fazer pesquisa, então, requer capacidade, competência humana e técnica. Mas, afinal, o que significa pesquisar? Basicamente, trata-se de buscar informações a respeito de algo, investigar. Seria ótimo se pudéssemos, numa pesquisa, apenas informar o termo/assunto que precisamos e tudo aparecesse pronto, bastando apenas escolher, isso sim, isso não... Mas não é bem assim que acontece. Por quê? Porque ao iniciar uma pesquisa temos uma ideia ainda vaga ou pouco fundamentada daquilo que queremos estudar. À medida que vamos estudando, o assunto se desdobra, e aquilo que antes parecia simples e certo se amplia e se complica. Além disso, nós mesmos estamos implicados naquilo que estudamos, pois a todo momento estamos acionando aquilo que sabemos naquilo que ainda estamos tentando entender. E a informação nos transforma de tal modo que, se não tomarmos alguns cuidados, podemos perder o foco, perder o interesse e tornar a pesquisa um quebra-cabeça muito difícil. www.esab.edu.br 25 Para lidar com tal situação, a metodologia de pesquisa existe. Ela nos mantém atentos àquilo que estamos buscando, de forma a selecionar e ordenar adequadamente as informações, os dados que surgem. E é fundamental, também, a formação do pesquisador, que requer instrumentos básicos para empreender trabalhos de natureza científica. Em linhas gerais, podemos dizer que um trabalho desse tipo nasce de um problema de pesquisa, da escolha do tema e da delimitação do assunto. Obviamente, o problema deve ser claro, objetivo e passível de resolução a partir do tratamento científico. Existe um pressuposto primordial que você não pode esquecer: métodos e linhas de pesquisa são ferramentas que facilitam e potencializam a geração de conhecimento. Vergara (2007) nos lembra de que a atividade básica da ciência é a pesquisa, e convém não esquecermos que as lentes do pesquisador também estão impregnadas de crenças, paradigmas, valores. Negar isso é negar a condição humana da existência. E a autora também ressalta a compreensão da ciência como processo permanente de busca da verdade, de sinalização sistemática de erros e correções, pautando-se na racionalidade. Caso a pesquisa tenha hipóteses, como veremos mais à frente, elas devem ser, de certa forma, testadas para serem confirmadas ou não, em um confronto com a realidade. Mesmo que a hipótese não se mostre verdadeira, sua formulação ajudará a encaminhar a resolução do problema. Portanto, tenha em mente que você deverá trabalhar com o binômio “problematização – hipótese”, ou seja, buscar evidências de que sua hipótese para determinado problema pode ser testada, aplicada e comprovada, sendo útil para a ciência e para a sociedade. Para isso, você deve conhecer um pouco mais sobre a formulação da(s) hipótese(s). Magalhães (2005) expõe que as hipóteses que resistem e se mostram verdadeiras acabam sendo chamadas de “leis”, de validade considerada universal, ainda que o correto seja restringir sua aplicabilidade às www.esab.edu.br 26 condições e épocas em que foram enunciadas e testadas. As leis são elaboradas em todas as áreas das ciências. E é importante entender que as teorias científicas possuem como objeto a reunião de várias leis quese relacionam. Saiba mais A teoria geral da relatividade, formulada por Einstein, teve mais algumas hipóteses comprovadas quase 100 anos após sua formulação. Para Einstein, tempo e espaço são deformados pela gravidade. Cientistas trabalharam por quatro décadas em uma sonda gravitacional (GP-B) que, em 2011, confirmou cientificamente a influência do campo gravitacional da Terra sobre o espaço e tempo. Antes disso, a hipótese foi comprovada matematicamente, e agora pode ser testada e validada devido ao avanço tecnológico. Então, note como os avanços da pesquisa podem ser lentos e graduais ou em saltos. Outro conceito básico quando nos referimos à pesquisa científica é o de causalidade. Magalhães (2005) explica que a causalidade é importante porque remete a explicação ao nível da nossa racionalidade, de maneira que possa ser entendida por qualquer um, até mesmo quando não concorde com tal explicação. Mas para uma série de fenômenos que são pesquisados – sobretudo os sociais –, é preciso lembrar que podem ocorrer causas múltiplas. Por meio de nossas percepções, conseguimos apreender os eventos que chamamos de causa e efeito. Para David Hume, filósofo escocês empirista, a causalidade seria questão de hábito: por sempre vermos www.esab.edu.br 27 supostas causas e efeitos, sugerimos e acreditamos que exista um elo que denominamos causalidade (MAGALHÃES, 2005). A pesquisa científica busca, por meio de seus resultados, a capacidade de formular leis que sejam as mais gerais possíveis e não apenas válidas para casos particulares. Sabemos que é preciso certa duração de tempo para ocorrer essa generalização. Magalhães (2005) acrescenta que as próprias leis “gerais” resultantes das generalizações são sempre históricas e, portanto, mutáveis. E acrescenta: “[...] isso vale até para as leis da física, química etc. – embora seja bom insistir que leis permanecem com validade geral enquanto duram, não se particularizando devido à sua eventual transitoriedade” (MAGALHÃES, 2005, p. 91). Ao tratarmos de ciência, é fundamental reconhecermos que há limitações para o seu desenvolvimento. Há, por exemplo, as questões éticas envolvidas, sugerindo que não se façam determinadas pesquisas. E, nesse sentido, você já deve ter notado que as discussões sobre a ética na realização das pesquisas é importantíssima. Afinal, assuntos como clonagem dos seres humanos, aplicações da energia nuclear, produção de alimentos transgênicos, controle das epidemias perpassam muitas pesquisas, e é preciso uma clara compreensão científica desses assuntos para que se definam critérios de abordagem e para que a sociedade esteja a par dessa discussão. É preciso refletir sempre: a quem interessa? Isso será bom para a sociedade? A dificuldade de tomar posição frente a temas tão polêmicos pode ser minimizada na medida em que se amplia o debate em sociedade, trazendo as considerações sociais e históricas que envolvem cada tomada de decisão. Vivemos na sociedade da informação, e esse novo cenário é propício a essa divulgação, possibilitando que ciência e tecnologia estejam sujeitas à avaliação e crítica permanentes. Talvez você esteja se questionando: o que isso tem a ver com a sociedade da informação? Vamos adiante e você vai descobrir! www.esab.edu.br 28 5 Sociedade da informação Objetivo Refletir sobre o desenvolvimento da ciência no atual contexto sociocultural. A sociedade não é um organismo imutável, ao contrário disso, ela se move cada vez mais rápido. As sociedades se assentam sobre aspectos humanos, científicos e tecnológicos, e a base da chamada sociedade da informação não é diferente. Mas o que isso significa? 5.1 Em constante mutação A origem das mudanças aceleradas que estamos observando nas últimas décadas se encontra no acentuado desenvolvimento tecnológico que podemos constatar diariamente. Desse modo, a nossa época faz parte de um processo de mudança em que as novas tecnologias são a sua base. O termo Sociedade da Informação indica que vivemos em um período que gera e consome muita informação. Nesse sentido, convém indicar que o modelo científico, aliado aos avanços tecnológicos, projeta novas formas de entendimento de como as coisas funcionam (MÁTTAR NETO, 2011). A Sociedade da Informação surgiu no final da década de 1990, quando a internet foi utilizada como forma de comunicação e de negócios, permitindo avanços científicos em todas as áreas. Os cientistas das mais diversas áreas puderam usar um novo poder que ficou ao alcance da comunidade: o poder de processamento dos computadores. Foi esse poder de processamento que permitiu a descoberta de detalhes do nosso DNA (em português ADN, que é um acrônimo de ácido desoxirribonucleico). A descoberta do DNA humano e de muitas www.esab.edu.br 29 plantas têm permitido o avanço científico na produção de alimentos e de remédios. Descobrir como o DNA funciona pode auxiliar na descoberta da cura de diversas doenças. Por outro lado, o uso acelerado de novas tecnologias acendeu a luz vermelha das discussões sobre o nosso direito de fazer determinadas pesquisas científicas. Ora, as chamadas discussões éticas estão em todos os lugares hoje em dia porque se tornou necessário saber se temos ou não o direito de mudar a composição genética das sementes de soja ou de milho ou ainda se temos o direito de escolher qual será o embrião que terá o direito de nascer. As discussões éticas suscitam muitas divergências e despertam a paixão dos seres humanos sobre o que está certo ou errado. Contudo, existe uma infinidade de maneiras de se contornar os dilemas éticos e de continuar as pesquisas por um ângulo que ainda não foi debatido pela comunidade científica ou mesmo pela sociedade civil. Para muitos estudiosos, a vida na Terra mudou mais nos últimos 20 anos do que no século XX inteiro. Tornou-se necessário aprender a conviver com uma série de novidades tecnológicas que mudaram a forma como fazemos as coisas (trabalho, estudo, diversão etc.). A sociedade mudou bastante também. A Sociedade da Informação construiu um lugar bem diferente das referências que nós tínhamos no passado recente. As Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) têm potencial para melhorar de forma significativa a sociedade. Por exemplo, a internet permite que se organize rapidamente a ajuda quando ocorrem catástrofes naturais ou grandes acidentes. As pessoas podem ainda se organizar em torno de grupos de trabalho com o objetivo de solucionar problemas coletivos. Antes da internet, a separação geográfica era um grande empecilho a muitas relações pessoais e de trabalho. Atualmente, isso não pode mais ser usado como desculpa, pois se pode trabalhar pela rede e também se divertir. Ou seja, todas as esferas da vida pública e privada foram alteradas com o advento das redes e isso é chamado de cultura digital. www.esab.edu.br 30 Para sua reflexão Você já parou e refletiu sobre como a cultura digital modificou os hábitos das pessoas de sua geração? Pense no seu dia a dia e verifique a forma pela qual você se comunica com seus amigos, com sua família, em seu trabalho ou estágio, como estuda e pesquisa, como você se diverte e se entretém nas horas livres. As respostas a essas reflexões formam parte de sua aprendizagem e são individuais, não precisando ser comunicadas ou enviadas aos tutores. De fato, você já deve ter notado que a cultura digital trouxe uma nova complexidade para nossas vidas. Isso porque temos agora uma infinidade de posições e de propostas que precisam ser revistas ou revisitadas constantemente. Pode-se pensar na cultura digital como um advento meramente tecnológico, sem ter no horizonte a mudança nos padrões de comportamento do consumidor, dos idosos ou da garotada, que vivem amparados por uma série de ferramentas que auxiliam nas diferentes formas de mediação. Pode-se pensar, por outro lado, que a discussão sobre a cultura digital é fruto exclusivo das redes sociais, mas defato a discussão em torno da cultura digital ainda está em formação. É importante que você entenda que a cultura digital é promovida pela tecnologia e por suas ferramentas, mas são as pessoas que a promovem em seu dia a dia, usando bancos via web, jogando em sua rede favorita, baixando filmes e músicas ou discutindo seus assuntos favoritos. No âmbito das pesquisas científicas, essas mudanças também trouxeram impactos. E quais são eles? Como afirma Máttar Neto (2011), a sociedade da informação liberou o homem da especialização profissional e dos limites de uma cultura, abrindo espaço para o homem universal, munido de uma instrução www.esab.edu.br 31 abrangente e em condições de mudar de profissão e, portanto, mudar também de posição no interior da organização social do trabalho. Sabemos também que a informação hoje é armazenada, disponibilizada e compartilhada com muita facilidade, gerando um intercâmbio intenso de informações. Isso permite potencializar não apenas nossa memória, mas diferentes formas de raciocínio, de relacionar os objetos, de perspectivas sobre o mundo. As informações estão disponíveis e acessíveis, e essa disponibilidade possibilita uma agilidade muito grande ao pesquisador. Temos então novas formas de ler e escrever, com bancos de dados disponíveis, fóruns públicos on-line, eventos científicos acontecendo na rede, trabalhos sendo desenvolvidos em parceria virtual. Máttar Neto (2011) ainda destaca que, nesse novo cenário tecnológico, o conhecimento deixa de ser localizado, estático, objetivável, territorializável, para se tornar também virtual. Na educação, por exemplo, não podemos mais pensar os horizontes da arena do aprendizado circunscritos à sala de aula; é preciso levar em conta os ambientes de realidade virtual. A educação deixa de ter um momento específico, como foi em outros tempos, para passar a ser pensada como formação continuada ao longo da vida das pessoas. E você sabe bem disso ao fazer um curso na modalidade a distância. Ou seja, é possível perceber claramente como a tecnologia da informação contribui para o processo de formação, trabalhando espaço e tempo em favor da educação. Obviamente, há desafios a enfrentar nesse novo cenário. O isolamento social (físico e emocional), a sobrecarga cognitiva, problemas relacionados à ergonomia, o estresse da comunicação são alguns sintomas percebidos nessa nova configuração, em que muitas vezes se percebe o empobrecimento das relações interpessoais. Mas isso não é regra. De toda forma, é preciso que estejamos atentos para evitar tais percalços, de modo a aproveitar as contribuições que a sociedade da informação pode trazer ao nosso dia a dia e ao desenvolvimento dos trabalhos científicos. www.esab.edu.br 32 6 Classificação das ciências Objetivo Apresentar dois modelos distintos de classificação das ciências, assim como seus critérios. Ao longo da trajetória histórica, em função dos diversos questionamentos postos pelos filósofos e cientistas, notamos o surgimento de várias áreas das ciências. Não há consenso, portanto, em relação a uma determinada tipologia, mas o que notamos ao nos debruçarmos sobre o histórico do desenvolvimento da ciência é uma diversificação extensa em busca de uma classificação que desse conta da produção de conhecimento. Ou seja, é fato que a classificação das ciências jamais parou de evoluir. 6.1 A classificação que jamais parou de evoluir Pelo conceito geral de ciência, já vimos quão vasta e ampla ela é, de modo a dificultar abrangê-la em sua totalidade. Daí a necessidade de fragmentar esse conjunto de conhecimentos que se propõe dar a explicação universal das coisas, para, por meio de suas partes, podermos compreender o todo. Essa fragmentação, que é o princípio fundamental da análise, estabelece as ciências particulares, entre as quais se distribuem os conhecimentos, segundo seu objeto. Todo método sistemático abrange a definição, que analisa a compreensão da verdade encontrada, enumerando os elementos que a distinguem de outras verdades, e a classificação, que a divide para analisar a sua extensão e localização no quadro geral dos conhecimentos humanos. Fez-se necessário, então, definir e classificar as ciências particulares. Mas muitas foram as classificações elaboradas. Comecemos, então, pela proposta do filósofo Aristóteles, que sugeriu uma divisão pautada na finalidade de cada ciência: www.esab.edu.br 33 • ciências teóricas: em que o objetivo seria o conhecimento puro, como a matemática e a física; • ciências práticas: em que o conhecimento do ser humano seria o objeto de estudo, como a economia e a política; • ciências poéticas: que abrangeriam as artes. Vários outros filósofos e estudiosos propuseram outras ordens, com hierarquias distintas. Destaca-se que a classificação tipológica das ciências é utilizada também para classificação da pesquisa, conforme vemos a seguir, baseando-nos em Magalhães (2005): • ciências formais: ocupam-se da lógica ou matemática (estudo das ideias); • ciências fatuais (ou empíricas): cuidam dos objetos fatuais. Estas, por sua vez, se subdividem em naturais e culturais. São as ciências da natureza e do homem. Perceba que as ciências formais são dedicadas às ideias, isto é, ao estudo de processos puramente lógicos e matemáticos. São objetos de estudo das ciências formais os sistemas formais, como a lógica, a matemática, a teoria dos sistemas e os aspectos teóricos da ciência computacional, teoria da informação, estatística, entre outros. Já as ciências fatuais estão divididas em outras duas classificações: as ciências naturais, cujo alvo de estudo é a natureza como um todo; e as ciências sociais, que se debruçam sobre o comportamento humano e suas sociedades. As ciências sociais abordam os aspectos sociais, isto é, a vida social dos indivíduos e dos grupos humanos, incluindo a antropologia, a comunicação, a administração, a economia, a geografia humana, a história, as ciências políticas, a psicologia e a sociologia. As ciências fatuais, também conhecidas como empíricas, se debruçam sobre os fatos e fenômenos naturais. Nesse caso, os pesquisadores precisam se valer da observação e de experimentações para que possam ter uma comprovação (ou não) dos problemas propostos. Geralmente www.esab.edu.br 34 não implicam considerações mais rigorosas quanto à unicidade e às fronteiras da ciência. Então, note o seguinte: as ciências naturais estudam o Universo, detendo-se nos aspectos físicos, enquanto os aspectos humanos geralmente são contemplados pelas ciências sociais. As disciplinas que estudam os fenômenos ligados ao planeta Terra, casos da geografia e geologia, por exemplo, são classificadas em um grupo nomeado ciências da terra, e alguns autores agrupam em ciências naturais e da Terra. A propósito dessas diversas classificações, Máttar Neto (2011) explica que isso se deve ao surgimento de novas ciências com o passar do tempo, sendo que as já existentes fundem-se, cindem-se ou modificam- se consideravelmente. E o autor ainda afirma que podemos pensar essas classificações a partir de três eixos: as ciências biológicas, as exatas e as humanas. Nessa proposta, as biológicas têm concentração no estudo do ser humano e dos fenômenos da natureza; as exatas têm origem na física, estatística, matemática, engenharia, entre outras; e, por fim, as humanas têm foco no estudo do homem como ser social e comportamental (psicologia, pedagogia, filosofia, história, geografia, sociologia, administração, ciências contábeis, comunicação, direito, entre outras). Saiba mais A classificação das ciências ocorreu com o advento do positivismo no século XIX. Clicando aqui você encontrará algumas das referências históricas mais conhecidas sobre o assunto. Note, então, que são vários campos disponíveis dentro de cada área das ciências e cabe ao indivíduo, com seu espírito de curiosidade, ir em busca de novas descobertas. Para isso, é preciso exercitaro questionamento, a indagação do porquê de as coisas serem como são, a busca constante por http://www.filoinfo.bem-vindo.net/filosofia/modules/lexico/entry.php?entryID=2034 www.esab.edu.br 35 respostas. E a partir daí treinar os sentidos e a inteligência para selecionar, ordenar e associar ideias provenientes da observação dos fenômenos. E, então, preparado para ir adiante? Vamos retomar os pontos principais do que vimos até aqui. www.esab.edu.br 36 Resumo Ao longo destas seis unidades, você aprendeu que ao ingressar no Ensino Superior espera-se que o conhecimento do acadêmico seja construído pela experiência ativa. O conhecimento humano é tema que instiga o pensamento e nos leva a refletir de forma diferente diante da história e dos acontecimentos contemporâneos. Vimos ainda que a dinâmica dos questionamentos que vão surgindo move a ciência a estudar e descobrir respostas que não podem ser explicadas apenas pela presença dos fatos. O conhecimento humano pode ser classificado em quatro níveis principais: conhecimento popular, conhecimento religioso, conhecimento filosófico e conhecimento científico. Cada um desses níveis apresenta seus argumentos para dar conta de explicar o surgimento do homem, do mundo e de toda forma de conhecimento que nele habita. Você aprendeu também que, ao fazer ciência, o ser humano parte de uma determinada concepção acerca da natureza do real e acerca do seu modo de conhecer. O conhecimento científico é resultante da investigação metódica, sistemática da realidade, pela transcrição dos fatos e fenômenos em si mesmos e analisando-os, com a finalidade de descobrir suas causas e concluir sobre as leis gerais que a governam. Ressaltamos que métodos e linhas de pesquisa são ferramentas que facilitam e potencializam a geração de conhecimento; e as hipóteses de uma pesquisa devem ser testadas para serem confirmadas, ou não, em um confronto com a realidade. Por fim, destacamos que o termo Sociedade da Informação indica que vivemos em um período que gera e consome muita informação. E aprendemos que o modelo científico, aliado aos avanços tecnológicos, projeta novas formas de entendimento de como as coisas funcionam. www.esab.edu.br 37 Nesse sentido, a classificação das ciências jamais parou de evoluir, e são várias as tipologias que encontramos. Por exemplo, vimos que podemos pensar as ciências a partir de três eixos: as biológicas, as exatas e as humanas. www.esab.edu.br 38 7 Continuidades e descontinuidades Objetivo Contemplar algumas das continuidades e descontinuidades das ciências. Caro aluno, agora que você já sabe que a prática da pesquisa requer a crítica, o questionamento e a exteriorização das dúvidas, vamos adiante para refletir sobre as continuidades e descontinuidades das ciências. Vejamos: as explicações existentes não costumam ser suficientemente esclarecedoras, pois ainda há problemas a serem solucionados, mesmo quando nos referimos a questões triviais, e isso significa que há um processo permanente de renovação daquilo que se aprende. Ora, você já sabe que é preciso aprender a contextualizar os problemas, já que, como vimos, o conhecimento é historicizado. Magalhães (2005) explica que algo desejado para qualquer conhecimento é justamente a ausência de contradição interna e externa, ideal também conhecido como coerência ou consistência. Apesar de ser almejado, nem sempre se pode garantir que exista. Aliás, quando nos debruçamos sobre as descobertas científicas, verificamos que é comum a pesquisa aparecer com várias contradições (lembremos, por exemplo, do caso de Galileu Galilei), sem que elas descaracterizem o objetivo de seu empreendimento como sendo de conhecimento científico. O espírito crítico, esse sim, é elemento fundamental nessa trajetória. Como destaca Magalhães (2005), mesmo quando uma comunidade de cientistas se fecha sobre dogmas, a crítica pode subsistir e, em determinados momentos, força uma revisão do que foi cristalizado. É justamente a crítica que possibilita os debates, os questionamentos, as controvérsias. www.esab.edu.br 39 Outro ponto importante que vale a pena mencionar: imparcialidade, autonomia e neutralidade do conhecimento científico são facilmente questionáveis quando se nota a filiação desse conhecimento a determinadas estruturas de poder. Um exemplo citado por Magalhães (2005) foi o tímido apoio dado no mundo às pesquisas de fusão nuclear para fins energéticos, uma promessa para resolver de maneira limpa, democrática e eficiente a demanda por recursos energéticos, mas que bate de frente com os interesses de poderosas corporações. Assim, é importante notar que é uma ilusão acreditar que as decisões sobre as pesquisas partem da própria comunidade de cientistas. Há muitos interesses em jogo também nas ciências. Para sua reflexão Há alguns anos, tivemos no Brasil uma grande polêmica sobre a pesquisa das sementes transgênicas de soja, em que se tornou conhecido o interesse de grandes grupos multinacionais, que poderiam patentear as sementes e passar a controlar os plantadores que dependessem desses produtos. Reflita: caso a pesquisa e a propriedade pertencessem a uma empresa brasileira ou a uma instituição pública, será que a perspectiva de resistência a esse conhecimento científico mudaria? Diminuiriam as restrições a esse plantio? O que você acha? As respostas a essas reflexões formam parte de sua aprendizagem e são individuais, não precisando ser comunicadas ou enviadas aos tutores. Por mais paradoxal que possa parecer, o intenso desenvolvimento da ciência ao longo do século XX acabou abalando a crença do ser humano em um universo regido por leis e passível de ser conhecido em seus mínimos detalhes. Ao contrário, enfatiza Máttar Neto (2011), o progresso científico do século anterior levou o ser humano a perceber que somente www.esab.edu.br 40 pode compreender o mundo em que vive pelas leis da probabilidade, por meio de aproximações que, em geral, são passíveis de erro. Nessa configuração, note que a ciência passa a conviver com a ideia de que o acaso desempenha papel primordial no universo, assim como no próprio ser humano. Não há ciência sem método e, portanto, o método fundamenta a busca científica em qualquer área do conhecimento. Sobre a abrangência de um método, pode-se dizer que isso varia de acordo com a sua aplicação, podendo ser geral ou específico. Geral é o método usado com a finalidade de dar conta de situações que expressam uma generalização, enquanto específicas são aplicações associadas a situações particulares, cujo foco é bem específico. Para entender melhor a amplitude dos movimentos metodológicos, que nos permitem refletir sobre os métodos em ciências, apresentamos a você, a seguir, uma síntese de alguns dos principais movimentos e suas contribuições. 7.1 Empirismo Magalhães (2005) menciona a influência de uma “linhagem” empirista na ciência, que se desenvolveu do século XVII ao XIX e engloba vários pensadores ingleses. Na ciência, empregamos o termo empirismo quando nos referimos ao método científico tradicional, originário do empirismo filosófico, que defende o seguinte: as teorias científicas devem ser baseadas na observação do mundo, em vez da intuição ou fé. Nesse sentido, o empirismo contribuiu para o desenvolvimento da ciência (MÁTTAR NETO, 2011). O empirismo foi definido pela primeira vez pelo filósofo inglês John Locke no século XVII, que entendia que a única fonte de nossas ideias é a experiência sensível, valorizando, desse modo, os sentidos (MÁTTAR NETO, 2011). www.esab.edu.br 41 John Locke considerava que o cérebro de um bebê recém-nascido é como uma tábua rasa, lousa vazia em que as experiências deixam marcas. De modo similar, o empirismo considera que os seres humanos não têm ideias inatas. De acordo com o empirismo, as teorias das ciências devem ser formuladas e explicadas a partir da observação do mundo e da prática de experiências científicas.Portanto, esse sistema filosófico descarta outras formas não científicas − fé, intuição, lendas, senso comum − como forma de geração de conhecimentos. Os principais pensadores foram: Francis Bacon (1561-1626), John Locke (1632-1704), George Berkeley (1685-1753) e David Hume (1711- 1776). 7.2 Positivismo e neopositivismo A palavra-chave quando falamos de positivismo é a neutralidade nas ciências. O principal nome? Sem dúvida, Auguste Comte (1789-1857), para quem a ciência consiste no conhecimento por excelência. E ainda: os conceitos só têm significado se puderem ser relacionados a eventos reais, isto é, se forem operacionalizados, sustenta Máttar Neto (2011). Perceba que é a verificabilidade em seu ponto alto. Já o neopositivismo é a extensão do positivismo, mas agora caracterizado pela combinação das ideias empiristas com a lógica moderna (de autores como Hilbert, Russell, Wittgenstein). O neopositivismo surgiu na Áustria, na Alemanha e na Polônia, sendo que vários dos principais filósofos emigraram para os Estados Unidos ou Inglaterra, em fuga do nazismo. Rudolf Carnap (1891-1970) e Friedrich Waismann (1896-1959) são neopositivistas, partindo do pressuposto de que a verificabilidade seria o critério de significação de um enunciado. Essa abordagem também é marcada pelas investigações centradas em um critério de demarcação, que separaria as proposições científicas do restante das proposições, expõe Máttar Neto (2011). www.esab.edu.br 42 7.3 Pragmatismo O pragmatismo constitui uma escola de filosofia estabelecida no final do século XIX, e está associado ao filósofo, cientista e matemático norte- americano Charles Sanders Peirce (1839-1914), que se soma a vários outros pragmatistas clássicos e contemporâneos. Segundo essa doutrina metafísica, o sentido de uma ideia corresponde ao conjunto dos seus desdobramentos práticos. Mas o que isso significa? Significa que a clareza de nossas ideias implica concebermos seus efeitos, isto é, sensações e reações associadas com o objeto do pensamento. Assim, o pragmatismo busca os resultados, mais do que as origens, em nossa compreensão das ideias. A estrutura do método científico, conforme o pragmatismo, é a seguinte: identificar o problema, oferecer uma hipótese explanatória e testar a hipótese contra o problema por meios dedutivos (MÁTTAR NETO, 2011). Ou seja: problema – hipótese – teste. Trata-se do método dos métodos e dele deriva a explicação do raciocínio indutivo e dedutivo que veremos mais adiante. 7.4 Marxismo e dialética Primeiramente, convém destacar alguns pontos da metodologia do marxismo, que se contrapõe ao positivismo. O primeiro ponto refere- se ao fato de que o marxismo descreve o movimento da realidade e do próprio pensamento por meio da dialética - tese/antítese/síntese. Na análise de Karl Marx (1818-1883) sobre o sistema econômico do final do século XIX, a tese seria o passado (feudalismo), a antítese, o presente (capitalismo), e a síntese, o futuro (representado pelo comunismo ou socialismo). A confrontação entre as ideias gera uma síntese, que por sua vez é submetida a uma nova tensão, e assim por diante, explica Máttar Neto (2011). www.esab.edu.br 43 Outra marca importante: as ideias são resultado das relações históricas sociais. Podemos dizer, por exemplo, que a dialética é o processo em que há um adversário a ser combatido ou uma tese a ser questionada, e que supõe, portanto, dois protagonistas ou duas teses em conflito; ou então que é um processo resultante do conflito ou da oposição entre dois princípios, dois momentos ou duas atividades quaisquer. Desse modo, o marxismo introduz uma perspectiva de estudar a verdade científica levando-se em conta as influências socioeconômicas que determinam a transmissão do conhecimento científico (MÁTTAR NETO, 2011). Ou seja, para os marxistas, é importante considerar os aspectos históricos, as dimensões políticas, ideológicas e, sobretudo, a dimensão econômica no processo de construção do conhecimento. E nesse sentido, introduz a preocupação de estudar a ciência em sua essência, isto é, não apenas se interessa pelo desenvolvimento interno das ciências, de seus métodos e sua lógica, mas sobretudo das influências socioeconômicas que determinam sua evolução. A abordagem marxista se contrapõe aos movimentos anteriores que separavam a teoria da prática, na medida em que considera que não existe prática sem teoria, e não existe teoria sem prática. E daí surge o conceito de práxis marxista. 7.5 Popper e a falseabilidade De acordo com Máttar Neto (2011, p. 80), Karl Popper (1902- 1994) “[...] é bastante conhecido como o introdutor do critério de falseabilidade para diferenciar as teorias científicas dos discursos não científicos”. Para esse filósofo e cientista do século XX, todas as boas teorias científicas são falsificáveis, mas não são todas falsas. Para Popper, entre outros, a produção científica deveria ser fundamentada no método que denominou hipotético-dedutivo. Por meio desse método, propõe falsear, refutar ou testar uma teoria. Tal atividade determinaria a cientificidade das teorias. www.esab.edu.br 44 Como podemos observar em nossa apresentação sobre as contribuições de Popper, o cientista propôs uma perspectiva de pensar e de se fazer a ciência no século XX. 7.6 A discussão contemporânea Nas décadas mais recentes, vários autores e movimentos metodológicos destacaram-se na discussão acerca do assunto. Muitos e muitos posicionamentos poderiam ser mencionados aqui, mas importa ressaltar a você, neste momento, a dinâmica das concepções acerca dos pressupostos conceituais e metodológicos compartilhados pela comunidade científica. Você notará, ao longo de sua trajetória acadêmica, que alguns métodos de pesquisa são mais recorrentes que outros em determinadas áreas de conhecimento. Vale a pena ainda chamar sua atenção para outro termo-chave quando se discute os movimentos metodológicos contemporâneos. Saiba que qualquer conhecimento opera por seleção de dados significativos e rejeição de dados não significativos: separa e une; hierarquiza e centraliza. Tais operações são comandadas por paradigmas, princípios ocultos que governam nossa visão das coisas e do mundo sem que tenhamos consciência disso. Mas o que significa paradigma? Em seu livro “A estrutura das revoluções científicas”, Thomas Kuhn (2003) apresenta a concepção de que um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica que consiste em homens que partilham um paradigma. Vejamos: na perspectiva de Kuhn (2003), um paradigma funcionaria como um mapa ou um roteiro da ciência, fornecendo critérios para a escolha de seus problemas e das soluções para os problemas. Quando o desenvolvimento do conhecimento requer explicações que o paradigma vigente não dá conta de responder, a ciência passa por uma crise, que pode dar origem a uma revolução científica. Nesse sentido, o autor www.esab.edu.br 45 defende que os enunciados têm caráter provisório e a ciência não opera com verdades irrefutáveis. Perceba, então, que as concepções históricas e as transformações internas ao conhecimento mostram que as várias concepções da verdade não são arbitrárias nem casuais ou acidentais, mas possuem causas e motivos que as explicam, e que a cada formação social e a cada mudança interna do conhecimento surge a exigência de reformular a concepção da verdade para que o saber possa se realizar. Note, por fim, que as verdades (os conteúdos conhecidos) mudam, a ideia da verdade (a forma de conhecer) muda, mas não muda a busca pelo verdadeiro, isto é, permanece a exigência de vencer o senso comum, o dogmatismo, a atitude natural e seus preconceitos. É a procura da verdade e o desejo de estar no verdadeiro que permanecem. A verdade se conserva, portanto, como o valor mais alto a que aspira o pensamento. Vimos, portanto, alguns dos principais movimentos metodológicos e suasimplicações nas mudanças do conhecimento científico. Percebemos que o conhecimento opera por seleção de dados significativos e rejeição de dados não significativos. E o que é importante para determinada corrente pode não o ser para outra, mudando, às vezes radicalmente, a forma de abordagem da ciência. Os paradigmas, que são esses princípios ocultos que governam nossa visão das coisas, diferem de um método para outro, e geram evoluções, novas formas de abordagem, novas perspectivas, novos questionamentos, impulsionando a própria evolução humana, na medida em que permite ao ser humano refletir e questionar. www.esab.edu.br 46 8 Ciência, técnica e tecnologia Objetivo Refletir sobre ciência, técnica e tecnologia. Atualmente, o poder não se restringe ao domínio dos meios materiais e dos aparatos políticos e institucionais, mas, cada vez mais, define-se a partir do controle sobre o imaterial e o intangível – seja das informações e dos conhecimentos, seja das ideias, dos gostos e dos desejos das pessoas. Como vimos, na Unidade 5, nossa sociedade é conhecida como a Sociedade da Informação e isso significa o seguinte: de forma geral, temos a informação e a consequente produção de conhecimentos como uma atividade que gera prestígio. Para entendermos um pouco melhor o caminho que a sociedade percorreu para chegar até esse ponto, é necessário perceber o que ocorreu na origem dos termos que trabalharemos nesta unidade. O primeiro deles é a ciência. O ser humano sempre sonhou em dominar a natureza com o objetivo de transformar as coisas ao nosso redor. O controle sobre a natureza está na base da ciência, ou seja, é para isso que ela existe. Os cientistas buscam conhecer os mecanismos que regem a organização social, política, econômica, química, biológica, matemática, física, enfim, conhecer faz parte da busca científica, conhecer todas as forças naturais e sociais que interferem de alguma maneira em nossas vidas. Com o passar do tempo, as ciências foram sendo organizadas em grupos. Os dois primeiros grupos que surgiram foram relacionados à efetiva comprovação dos experimentos científicos. Ou seja, é muito complicado antecipar se um sistema de governo vai dar certo ou não em um país, mas é possível calcular a distância entre a Lua e o Sol. www.esab.edu.br 47 Dessa forma, surgiu o grupo das Ciências Exatas (matemática e física, por exemplo), que eram capazes de provar, por meio de experimentos, a veracidade de suas teorias. Por outro lado, surgia um grupo de ciências que não podiam comprovar as suas teorias antes que a prática ensinasse os benefícios e os malefícios de uma determinada teoria, como acontece com as chamadas Ciências Sociais (história e sociologia, por exemplo). Saiba que o fator que une todas as ciências é o uso de métodos. Os métodos são sistemas que permitem comprovar a veracidade das informações. Normalmente, um método é constituído pela entrada de dados e informações, pela análise desses dados e informações e, finalmente, pelas deduções ou conclusões que se pode tirar das fases anteriores. A geração do conhecimento ocorre na última fase, quando é possível enxergar o fluxo completo das informações (MÁTTAR NETO, 2011). A técnica também surgiu por causa da necessidade e do desejo de dominar a natureza. Contudo, nesse caso, estamos nos referindo à representação gráfica das expressões humanas. Para entender melhor o que ocorria, vamos lançar mão de um exemplo bem simples. Para fazer uma estátua de bronze antiga, representando um ser humano, era preciso ter as ferramentas de precisão para corte e moldagem do material. Essas ferramentas foram desenvolvidas por intermédio da técnica, que era a forma por meio da qual se dominava o saber fazer das coisas. Para fazer uma estátua perfeita, era preciso ter também conhecimentos científicos ou um método capaz de orientar com precisão quais seriam as dimensões a serem aplicadas para que a estátua correspondesse ao modelo humano. Caso o projeto de fazer uma estátua humana precisa fosse bem realizado, o resultado final seria considerado uma obra de arte. Nesse exemplo, a estátua final seria um modelo de como os saberes podiam ser usados de forma combinada, aliando ciência (que fornecia informações verídicas sobre as dimensões humanas), técnica, que oferecia as ferramentas adequadas para o saber fazer, e arte, que se trata de um valor simbólico que pode ser expresso pela combinação perfeita entre ciência e técnica. www.esab.edu.br 48 Técnica, explica-nos Magalhães (2005), vem da palavra grega techné, que significa “prática”, isto é, saber fazer algo conforme um conjunto de instruções ou regras. Nesse sentido, a técnica é, sobretudo, prática equivalente ao saber fazer, podendo ser uma ligação da razão com a experiência, e às vezes se apoia na ciência, esta entendida a partir da acepção do conhecimento generalizante e crítico. O termo técnica permaneceu inalterado desde a Antiguidade até o século XVII, quando os sinais da primeira Revolução Industrial começaram a surgir na Inglaterra com a invenção do primeiro motor a vapor, a fim de fazer a sucção da água que se acumulava no interior das escavações das minas de carvão. A partir de então, o termo técnica passou a ser substituído gradativamente pelo termo tecnologia, quando aplicado ao contexto da industrialização. Dessa forma, o termo técnica continua a ser empregado em contextos ligados à arte e o termo tecnologia se aplica aos contextos que sugerem uma relação entre homens e máquinas. Magalhães (2005) sinaliza que enquanto ciência é processo, algo que se transforma e não está nunca acabado, a técnica é um conhecimento prático, ao passo que a tecnologia é a ciência de alguma técnica particular. E ainda destaca: a criatividade é ingrediente fundamental para a produção de conhecimento científico ou tecnológico e se associa aos conceitos de invenção, inovação e difusão. É comum ouvirmos pessoas se referindo ao termo tecnologia para inventos medievais ou sobre a construção das pirâmides, por exemplo. Não é incorreto esse uso, mas seria mais preciso se o termo tecnologia fosse empregado para as situações que envolvem os avanços das máquinas em nossas vidas, sobretudo depois do século XIX, quando ocorreu a chamada Segunda Revolução Industrial. As tecnologias adquiriram relevância maior quando entrou em cena uma relação de produção, levando a uma consideração mais evidente dos valores econômicos em jogo, dando mais amplitude ao uso desse termo (MAGALHÃES, 2005). A tecnologia permite criar objetos que são extensões de nossos corpos com a finalidade de aumentar a nossa capacidade produtiva. O carro é a www.esab.edu.br 49 extensão de nossas pernas, o computador, de nossas mentes, e assim por diante. Note que as interações entre os termos são recorrentes, já que a inovação tecnológica pode estar pautada nas descobertas científicas e, do mesmo modo, as necessidades inovativas tecnológicas podem gerar conhecimentos científicos. Severino (2007, p. 105) destaca que “[...] a técnica, como poder de manejo do mundo físico, atuou como mais um argumento a favor da veracidade da ciência”, contribuindo para sua consolidação. E ele explica: a ciência se legitimou por sua eficácia operatória, com a qual forneceu à sociedade recursos reais elaborados para a sustentação de sua existência material; a técnica serviu de base para a indústria, para a Revolução Industrial, ampliando o poder do ser humano em manipular a natureza. Estudo complementar Para aprofundar os seus conhecimentos sobre este assunto, sugerimos a leitura do artigo “Técnica, tecnologia e ciência”, de Milton Vargas, disponível clicando aqui. Desse modo, você pode notar que são muitas as implicações em nosso cotidiano em função do desenvolvimento da ciência e tecnologia em nossa sociedade, impactando nos campos do pensamento, do ensino, do estudo, da produção do conhecimento e da pesquisa científica. Em pleno século XXI, essa influência
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