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1 Paradigmas da pesquisa em Administração: Uma análise da produção acadêmica de anais do Enanpad Autoria: Adrianne Paula Vieira de Andrade RESUMO Os paradigmas da pesquisa representam as diferentes formas de produzir conhecimento e explicar a realidade. Em administração, destacam-se três paradigmas que são o positivismo/ pós-positivismo, o interpretativista e o crítico. Este artigo analisou os trabalhos premiados em cada divisão do Encontro da Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Administração (Enanpad) no período de 2010 a 2014 objetivando identificar os paradigmas e métodos adotados nestes trabalhos. Essa pesquisa é documental, exploratória e utilizou a abordagem qualitativa. A técnica de análise utilizada foi a análise de conteúdo temática com o auxílio do software QSR NVivo®. Os resultados mostraram a predominância do paradigma positivista e da utilização de métodos quantitativos. Esse paradigma é ainda mais evidente nos estudos das áreas de Finanças, Contabilidade, Gestão da Ciência, Tecnologia e Inovação e de Marketing. Estudos que adotam uma linha interpretativista e crítica ainda são minoria, todavia as áreas de Estudos Organizacionais e Gestão de Pessoas e Relação de Trabalho destacam-se pela adoção desses paradigmas. Palavras-chave: Paradigmas, Positivismo, Interpretativismo, Crítico. 2 1. Introdução A ciência foi concebida sob diferentes óticas e correntes teóricas. Não existe uma forma única de fazer ciência, de produzir conhecimento ou de explicar uma realidade. Segundo Creswell (2010), cada pesquisador inicia a sua pesquisa com determinadas suposições sobre como vão aprender e o que vão aprender durante a investigação, isso representa uma alegação de conhecimento que pode ser chamado de paradigma. Em termos filosóficos, os pesquisadores fazem alegações sobre o que é o conhecimento (ontologia), como o identificamos (epistemologia), que valores o compõe (axiologia), como escrevemos sobre ele (retórica) e os processos para estudá-lo (metodologia). O conceito de paradigma foi levantado por Tomas Kuhn em 1962 em seu livro a “Estrutura das Revoluções Científicas”. Os paradigmas orientam a evolução da ciência e mostram as diferentes concepções da realidade. Kuhn define um paradigma como sendo uma realização científica que durante algum tempo fornece problemas e soluções moderadoras para uma comunidade de praticantes de uma ciência. O autor coloca que a superação de paradigmas é o padrão usual do desenvolvimento de uma ciência amadurecida (KUHN, 2006). Um paradigma é entendido aqui como uma instância filosófica ou diferentes visões de mundo que irão nortear uma pesquisa (SACCOL, 2009). A compreensão desses paradigmas é imprescindível para a escolha do desenho da pesquisa. Uma pesquisa científica deve se basear em premissas e em posturas epistemológicas que irão guiar a escolha das teorias, da metodologia e o estudo como um todo. Existem vários debates sobre os paradigmas existentes no campo da administração. Lincoln e Guba (2006) consideram como os principais paradigmas de pesquisa os paradigmas positivistas e pós-positivistas e os paradigmas pós-modernos que incluem as teorias críticas e o construtivismo. Gephart (2004) estabelece os paradigmas positivista/pós-positivista, interpretativista e a teórica crítica/pós-modernismo como os principais paradigmas utilizados na administração. Myers (1997) considera três paradigmas principais, o positivista, o interpretativo e o crítico, que são os que se relacionam com a epistemologia subjacente que orienta as pesquisas em administração. Esse estudo irá considerar os paradigmas especificados por Gephart (2004) e Myers (1997). Diante disso, o objetivo deste estudo é identificar os paradigmas adotados nos trabalhos apresentados e premiados no Encontro da Associação Nacional de Programas de Pós- Graduação em Administração (Enanpad) entre 2010 a 2014, analisando as tendências ontológicas, epistemológicas e metodológicas dos estudos de cada divisão da Anpad. 2. Os paradigmas de pesquisa É preciso refletir sobre as características dos paradigmas utilizados na administração, esclarecendo as suas características, a forma como enxergam a realidade e as estratégias de pesquisa adotadas. Antes de refletir sobre os diferentes paradigmas, é necessário entender a ontologia e a epistemologia adotada pelo pesquisador pois essas posições refletem o paradigma que será adotado. Saccol (2009) adverte a importância da coerência entre os pressupostos ontológicos, epistemológicos e metodológicas em uma pesquisa científica. A ontologia envolve suposições sobre a essência dos fenômenos investigados e a natureza da realidade. Uma questão ontológica fundamental que recai para os cientistas sociais é determinar se a realidade é externa ao indivíduo ou se é produto da sua consciência 3 individual; se a realidade é de natureza objetiva, ou é produto da sua cognição individual; ou se a realidade é dada ou é produto da sua mente (BURREL E MORGAN, 1979). O pesquisador pode adotar uma ontologia realista, que acredita que o mundo natural existe independentemente da existência do ser humano; uma ontologia idealista, que defende a existência do mundo a partir das percepções dos observadores sobre ele, ou seja, um objeto ou uma entidade só passa a existir na medida que é percebido por um observador; ou uma ontologia que considera a interação sujeito-objeto em que a realidade social é construída a partir de um compartilhamento de significados entre as pessoas é percebida e criada coletivamente (SACCOL, 2009). A epistemologia envolve suposições sobre os fundamentos do conhecimento, sobre como entendemos o mundo e como transmitimos o conhecimento para outras pessoas (BURREL e MORGAN, 1979). Existem três linhas de pensamento epistemológicas: a objetivista que defende os significados objetivos que podem ser transmitidos de forma racional e objetiva; a subjetivista que parte do pressuposto que os significados são impostos sobre os objetos por parte dos sujeitos; e a construtivista que não defende a realidade objetiva mas sim a construção de significados através de processos de interação social e intersubjetividade (SACCOL, 2009). 2.1. Paradigma Positivista As origens do positivismo remetem aos pensamentos de August Comte no século XIX. Considerado por muitos como o pai do positivismo, ele defendia a concepção do conhecimento pela experiência. Posteriormente, outros pensadores trouxeram novas contribuições para o desenvolvimento do positivismo. No século XX, surge o Círculo de Viena formado por um grupo de filósofos que se juntaram informalmente na Universidade de Viena de 1922 a 1936 com o objetivo de reconceitualizar o Empirismo a partir de novas descobertas científicas. Com a divulgação do Manifesto “A concepção científica do mundo”, de 1929 subscrito por Hans Hahn, Otto Neurath e Rudolf Carnap, o grupo ganhou notoriedade. Esses filósofos defendiam o empirismo clássico o qual admite que o conhecimento factual resulta da observação e não de proposições a priori. Esse pensamento deu origem ao positivismo lógico (BARRETO, 2001). A base epistemológica deste paradigma está na combinação dessas duas linhas filosóficas, o empirismo clássico e o positivismo lógico (LIMA, 2011). O princípio da verificabilidade desenvolvido pelos empiristas reflete essa base epistemológica. Segundo Barreto (2001), esse princípio admite que o significado de uma proposição está relacionado diretamente aos dados empíricos que resultam de sua observação e que, uma vez existentes, dão veracidades à proposição. Ou seja, somente a verificação empírica definirá se as proposições são providas de significado ou não. Dentre os positivistas lógicos, destaca-se Karl Popper que demarcou os limites entre a ciência e a pseudociência ao propor o princípio da falseabilidade. Para Popper (1980),as teorias não são verificáveis, mas podem ser falseadas através de experimentos. Uma teoria existe desde que ela seja falseável, ela exclui ou proíbe não somente um acontecimento, mas pelo menos um evento e na medida em que a teoria resiste aos testes ela é corroborada. O positivismo incorpora uma ontologia realista que também é chamada de ingênua, pois considera que a realidade existe “lá fora” é real, inteligível, estável e mensurável (LINCOLN e GUBA, 2006; MERRIAM, 2009). A ciência é vista como uma forma de explicar a realidade através de fenômenos que são mensuráveis, possam ser testados e verificados. De acordo com Merriam (2009), o conhecimento obtido através do estudo desta realidade foi rotulado de "científico" e incluiu o estabelecimento de “leis” com vistas a generalização. 4 Esse paradigma incorpora uma epistemologia objetivista. Ou seja, os achados são considerados verdadeiros, representam a realidade e são obtidos através do saber experimental (LINCOLN e GUBA, 2006). O positivismo ainda considera a interdependência entre o pesquisador e o objeto de pesquisa. Nesta ótica, o pesquisador é capaz de estudar o objeto sem influenciá-lo ou ser influenciado por ele, de modo que se os procedimentos forem rigorosamente seguidos, é garantida a neutralidade e a “verdade” dos achados (FELL et al., 2010). Assim, o positivismo contrapõe-se ao conhecimento baseado apenas no raciocínio lógico, o qual acredita que a razão pode explicar os fenômenos. O positivismo privilegia o empirismo, a experiência e a observação dos fatos (BARBOSA et al. 2013). Neste paradigma sempre houve preocupação com o método e o rigor científico (CHAIU, 2012). Para obter o conhecimento o mais próximo da realidade possível, o uso do método científico passa a ser imprescindível. O uso adequado do método científico permite a realização de previsões, explicações de causa-efeito, generalização etc. Sob a perspectiva metodológica, o positivismo é experimental e manipulativo, pautado na verificação de hipóteses, testes empíricos e predomina estudos quantitativos e experimentais (LINCOLN e GUBA, 2006). Dessa forma, a falsificação e verificação das hipóteses se torna a tarefa básica de uma pesquisa que adota o paradigma positivista. Os objetivos de pesquisas desse paradigma convergem para a descoberta de verdades, teste de teorias, teste de hipóteses, inferências sobre um fenômeno a partir de uma amostra da população, previsão e a generalização de descobertas (GEPHART, 2004; BARBOSA et al., 2013 ). A principal unidade de análise em uma pesquisa positivista são as variáveis que representam um atributo ou característica representativa da teoria que pode ser mensurada. Os tipos e estratégias de pesquisa adotadas pelos positivistas são os estudos experimentais e/ou quasi/experimentais e predomina o uso de survey. O método defendido pelos positivistas é o hipotético-dedutivo. Popper (1980), um dos expoentes do positivismo, criticou o princípio da indução, ao afirmar que esse princípio pode não garantir uma verdade universal, pois o homem parte sempre do singular. Opondo-se ao princípio da indução, Popper desenvolveu o método dedutivo como a concepção de que somente se pode testar uma hipótese empiricamente após ela ter sido formulada. Neste método, o pesquisador começa o estudo com uma teoria ou com um conhecimento prévio, cria hipóteses, coleta dados, testa as hipóteses geradas. Essas hipóteses podem ser refutadas ou corroboradas. Caso elas passem pelo teste e sejam refutadas, elas terão que ser revistas ou reformuladas. Caso tenham sido comprovadas, poderão gerar um novo conhecimento ou uma nova teoria (SACCOL,2009). Como paradigma posterior ao positivismo surgiu o pós-positivismo, uma corrente desenvolvida pelos filósofos do século XIX que ratifica a ideia da verdade absoluta do conhecimento, reconhece que não podemos ser realista quando estudamos o comportamento e as ações dos seres humanos (CRESWELL, 2010). Do ponto de vista ontológico, é adotado o realismo crítico o qual corrobora com o pensamento da existência da realidade, todavia acredita que ela não pode ser perfeitamente representada pela ciência em função da própria natureza dos fenômenos e das falhas dos mecanismos de investigação (FELL et al., 2010). O pós-positivismo ainda incorpora uma epistemologia objetivista, mas não acredita que os achados são sempre verdadeiros e defende que eles estão sujeitos a falsificação. No aspecto metodológico, essa corrente dá ênfase ao “multiplismo crítico” que trás a ideia da triangulação das perspectivas e defende a realização das investigações em situações mais naturais, coletando mais elementos e mais informações, passando a incluir os métodos qualitativos (FELL et al., 2010). 5 Em administração e nas Ciências sociais, o positivismo é amplamente utilizado nas pesquisas, sendo o paradigma vigente (SACCOL, 2009). Ottoboni (2009) afirma que a administração é uma ciência recente que tem bases em outras ciências, ainda está em busca da sua consolidação, mas que se iniciou dentro do paradigma positivista. Apesar da ampla utilização, o paradigma positivista tem recebido diversas críticas. Uma das críticas reside na questão da neutralidade e interdependência do sujeito e do objeto. Na pesquisa científica essa neutralidade almejada pelo positivismo é difícil de ser alcançada, uma vez que desde o começo o pesquisador está envolvido com o seu estudo. A escolha do tema, do problema e do método não acontece de maneira neutra, o pesquisador utiliza as suas impressões, suas preferências e o seu próprio julgamento para fazê-las. Isso se torna ainda mais evidente no campo das ciências sociais em que os objetos investigados são próximos ao sujeito e estão envoltos na realidade que ele vivencia. Outra crítica que o positivismo recebe é a sua insistência na inadequação de transpor para as ciências sociais, os procedimentos e métodos que são dominantes em ciências naturais. Isso muitas vezes resulta em reducionismo da realidade e a falta da compreensão completa de um determinado fenômeno. O rigor positivismo também é criticado, um vez que a preocupação excessiva com formalismos e empirismos pode limitar, a busca pela criatividade, pela possibilidade de pensar ciência a partir de outras abordagens paradigmáticas (BARBOSA et al., 2013). 2.2. Paradigma Interpretativista / Construtivista As críticas feitas ao positivismo impulsionaram a construção de novos paradigmas. O interpretativismo teve sua origem no final do século XIX e início do século XX, diante das reações de alguns estudiosos à filosofia do positivismo (PINTO e SANTOS, 2008). Esses filósofos mostraram a possibilidade de estudo e compreensão da ação humana sob uma nova concepção ontológica, epistemológica e metodológica que não estava em coerência com os ideais positivistas. Merriam (2009) afirma que o construtivismo é um termo frequentemente usado como sinônimo de interpretativismo. Assim, entende-se que esse paradigma pode obter a nomenclatura de interpretativista e/ou construtivista. O foco da perspectiva interpretativista difere do foco da positivista pois o objetivo de uma pesquisa interpretativista é entender a atual produção de significados e conceitos usados pelos atores sociais em seu ambiente real (GEPHART, 2004). Nos estudos interpretativistas as pessoas tentam compreender o mundo em que vivem e trabalham, desenvolvendo significados subjetivos para suas experiências os quais são variados e múltiplos, levando o pesquisador a buscar uma complexidade de visões, em vez de estreitar significados em poucas categorias ou ideias (CRESWELL, 2010). Esse paradigma adota uma ontologia relativista o qual considera que a realidade é construída socialmente em planos e locais específicos e baseadas na experiências dos indivíduos, deixando de lado a ideia de uma realidade objetiva (LINCOLN e GUBA, 2006). Segundo Gephart (2004), o relativismo é adotada de tal modoque diversos significados existem e influenciam a forma como as pessoas entendem e respondem ao mundo objetivo. Ou seja, a realidade é socialmente construída, não existe uma realidade singular e observável mas existem múltiplas realidades e interpretações de um evento singular (MERRIAM, 2009). No que concerne a epistemologia, o interpretativismo é transacional e subjetivista, o que implica em descobertas que são criadas pelas ações humanas, a partir de diferentes significados detidos por diferentes pessoas ou grupos que produzem e sustentam um senso de verdade (GEPHART, 2004). Neste paradigma, o sujeito e o objeto interagem e não estão 6 distantes, pois pesquisador tem um envolvimento pessoal com a pesquisa, escolhe o fenômeno a ser investigado, o método, os dados etc. Sob o ponto de vista metodológico, esse paradigma fundamenta-se na hermenêutica e na investigação da ação por parte do indivíduo (LINCOLN e GUBA, 2006). Diante disso, a unidade de análise desse paradigma é a ação verbal e não-verbal. Neste sentido, os pesquisadores interpretativos procuram descrever, entender, e interpretar os significados dos membros e as implicações que os significados divergentes titulares para interação social (GEPHART, 2004). O método mais comumente utilizado neste paradigma é o indutivo (CRESWELL, 2010). Os pesquisadores geram ou desenvolvem indutivamente uma teoria ou padrão de significado a partir da investigação e análise dos dados empíricos. O processo de investigação em um estudo interpretativista deve ser flexível, aberto à visão dos atores pesquisados e à sensibilidade do contexto no qual a pesquisa está sendo realizada. Os métodos utilizados são essencialmente qualitativos, sendo o Estudo de Caso, a Pesquisa-Ação e a Etnografia, os mais utilizados na área da Administração. Embora esses métodos não sigam a lógica da generalização, validação inerentes ao paradigma positivista, a pesquisa interpretativista também tem critérios a serem atendidos e exigem uma preparação por parte do pesquisador para garantir a seriedade, profundidade e robustez (SACCOL, 2009). Em administração, percebe-se o aumento de trabalhos que adotam esse paradigma (BARBOSA et al., 2013). É importante destacar que além das abordagens utilizadas na administração, outras estratégias de pesquisa também são utilizadas nos estudos interpretativistas, tais como: Fenomenologia, Etnografia, teoria fundamentada e narrativas. Uma das principais críticas ao interpretativismo é o relativismo e a subjetividade que está intrínseca a pesquisa no fato do sujeito e o objeto não serem dissociados. Assim, alguns pesquisadores questionam a validade do conhecimento produzido (BARBOSA et al., 2013). 2.3. Paradigma Crítico A perspectiva crítica vai além de desvendar a interpretação dos entendimentos das pessoas, tem suas raízes em várias tradições e atualmente envolve uma variedade de abordagens. As influências iniciais incluem os estudos de Marx das condições socioeconômicas e estruturas de classe, ideias de Habermas de conhecimento técnico, prático e emancipatório, e educação transformadora e emancipatória de Paulo Freire (MERRIAM, 2009). Esse paradigma contrapõe-se ao positivismo e a teoria tradicional. A origem da teoria crítica remete a Escola de Frankfurt que foi criada em 1923-24, e recebeu essa denominação a partir dos anos 50, por pensadores, como Horkheimer, Adorno, Marcuse e Habermas, com origens intelectuais e influências teóricas variadas, que, sob o impacto dos acontecimentos da época (fim da monarquia na Alemanha e constituição da República de Weimar; primeira Guerra Mundial; Revolução Soviética; intensas lutas operárias, sobretudo na própria Alemanha; ascensão do nazismo etc.), aliados à rejeição teórica e prática que eles dispensavam à determinada versão do marxismo, procuravam desenvolver uma teoria crítica do conhecimento e da sociedade inspirados na obra de Marx e em suas raízes hegelianas, relacionando o marxismo com a tradição crítica moderna (BARRETO, 2001). Na teoria crítica prevalece a dialética da razão, se articula o grito dos violentados, marginalizados e dos mortos. O que caracteriza todos os pensadores é a rejeição do projeto da modernidade que é identificada com a concretização dessa razão cínica. Outro elemento retratado por esses teóricos foi a cultura. Os trabalhos sobre a cultura e a arte estão entre os que certamente mais contribuíram para divulgar o pensamento crítico de Frankfurt entre teóricos literários, musicólogos, críticos de arte e teóricos da comunicação (FREITAG, 2004). 7 Os trabalhos de Horkheimer (1980) e Habermas (1982) incorporaram importantes contribuições ao paradigma crítico. Horkheimer (1980) destacou a diferença entre a teoria tradicional e a teoria crítica. A teoria tradicional procura abranger todos os fatos de um campo determinado identificando as relações entre os elementos que compõem esse campo. Enquanto que a teoria crítica objetiva a busca de determinações abstratas e criação de hipóteses, começando, por exemplo, com a caracterização de uma economia baseada na troca, discorrendo sobre as suas, para se chegar a conceitos genéricos (HORKHEIMER, 1980). Habermas (1982) desenvolveu a teoria do conhecimento como teoria da sociedade e a teoria da ação. Segundo Diniz (2006), a racionalidade comunicativa desenvolvida por este autor opõe-se a racionalidade instrumental, é orientada para o entendimento, não para a manipulação e encontra-se inscrita nas relações sociais contemporâneas refletindo o capitalismo contemporâneo. Do ponto de vista ontológico, esse paradigma defende o realismo assim como no positivismo, todavia o realismo é histórico e a construção da realidade não é dada mas influenciada por valores sociais, políticos, econômicos, culturais, étnicos e de gênero cristalizadas e reificadas ao longo do tempo (LINCOLN e GUBA, 2006). Epistemologicamente, a teoria crítica é transacional e subjetivista, as descobertas são mediadas pelos valores dos sujeitos que realizam as pesquisas e são co-criadas por eles. Assim como no paradigma interpretativista, o sujeito e o objeto não estão separados mas estão em constante interação, de modo que os valores do sujeito influenciam o processo da pesquisa e a criação do conhecimento (LINCOLN e GUBA, 2006). No campo metodológico, destaca-se o uso da dialógica, dialética e de métodos baseados no contexto (LINCOLN e GUBA, 2006). Diferente das outras abordagens, a teoria crítica considera o contexto em que o fenômeno está situado. De acordo com Fell et al. (2010) esses métodos exigem uma diálogo baseado na dialética entre o investigador e os sujeitos investigados. Além disso, a teoria crítica considera que existem múltiplas visões de mundo e emprega metodologias interpretativas para descobrir significados divergentes entre os sujeitos (GEPHART, 2004). O método da dialética é baseado na contradição. Uma afirmação é ultrapassada por sua negação, e esta, por sua vez, pela negação da negação, isto acaba gerando uma nova afirmação. Esse movimento é peculiar, cada momento de dialética e da história ao mesmo tempo ultrapassa o anterior e o conserva (BARRETO, 2001). Assim, a unidade de análise desse método são as contradições, os incidentes críticos, os signos e os símbolos. A teoria crítica tem como objeto de estudo os homens como produtores de todas as suas formas históricas de vida (BARRETO, 2001). O objetivo das pesquisas que adotam o paradigma crítico é descobrir interesses e contradições ocultas, valorizando a crítica, a transformação e a emancipação dos sujeitos. Em relação a estratégia de pesquisa adotada, destacam-se o neo-marxismo, feminismo, pesquisa ação participativa (PAR), teoria racional crítica, etnografia crítica como ( MERRIAM, 2009). Na área de Administração, constata-se uma carência de pesquisas críticas que aprofundem conhecimento sobre práticas e organizações locais. Entretanto, identifica-sealguns trabalhos como os de Guerreiros Ramos, Mauricio Tragtenberg e Fernando Prestes Motta que submeteram a Administração e os estudos organizacionais ao crivo crítico antes da década de 1990 (DAVEL e ALCADIPANI, 2004). Os trabalhos de Guerreiro Ramos (1989, 1996) iniciaram a tradição crítica na área de Administração no Brasil chamando atenção para os problemas decorrentes da expansão do mercado e propondo a delimitação dos sistemas sociais (VIEIRA e CALDAS, 2006). De um modo geral, os estudos críticos em administração emergem com o objetivo de conferir a palavra àqueles que, ao se identificarem como racionais, indiscutíveis e indubitáveis, são raramente considerado(a)s pelas teorias organizacionais tradicionais que 8 tendem a idealizar a administração. Em administração, são constatadas três grandes conjuntos de tradições teóricas que tem sido regularmente utilizadas. O primeiro conjunto engloba as tradições modernistas desenvolvidas no âmbito do marxismo, do neomarxismo e da Escola de Frankfurt. O segundo é baseado na proposta de Jacobson e Jacques denominados de tradições pós-analíticas. E, o terceiro grupo incorpora as teorias feministas (DAVEL e ALCADIPANI, 2004). Por fim, o quadro 1 apresenta uma síntese dos três paradigmas abordados aqui exibindo as principais características de cada um deles em relação a ontologia, epistemologia, metodologia, objetivos, tarefas, unidade de análise e estratégias de pesquisa. Quadro 1- Crenças básicas dos paradigmas da pesquisa. Positivista/Pós-positivista Interpretativista/ Construtivista Crítica Ontologia Positivismo- Realismo ingênuo: realidade “real” mas inteligível Pós positivismo- Realismo crítico: realidade “real” mas imperfeitamente inteligível Relativismo: realidades construídas em planos e locais específicos Realismo histórico : A realidade virtual influenciada por valores sociais, políticos, econômicos, étnicos, de gênero cristalizados ao longo do tempo Epistemolo gia Positivismo – Dualista/objetivista: descobertas verdadeiras, saber experimental Pós-Positivismo- Objetivista/Dualista: tradição crítica/comunidade: descobertas provavelmente verdadeiras Transacional/subjetivista: Descobertas criadas Transacional/subjetivista: Descobertas mediadas por valores e co-criadas Metodolog ia Positivismo – Experimental/manipuladora: verificação das hipóteses; métodos sobretudo quantitativos Pós-Positivismo- Experimental modificada/ manipuladora: multiplismo crítico: falsificação de hipóteses, pode incluir métodos qualitativos Hermenêutica: investigação da ação. Dialógica/dialética : métodos baseados no contexto Objetivos Descoberta de verdades, Previsão, controle, Generalização Descrever, Entender, Interpretar significados Descobrir interesses e contradições ocultas : a crítica, a transformação e a emancipação Tarefas Realizar a explicação e controle das variáveis: discernir hipóteses verificadas ou hipóteses não-falseadas Produzir descrições de significados dos membros e definições da situação: compreender a construção da realidade Desenvolver uma visão estrutural ou histórica que revelam as contradições e permitem emancipação, espaços para vozes silenciadas Unidade de análise Variável Ação verbal e não verbal Contradições, incidentes críticos, signos e símbolos Tipos/ Estratégia de pesquisa Experimental, survey, quasi- experimental Fenomenologia, Etnografia, hermenêutica, teoria fundamentada, narrativas, estudo de caso, naturalista/ qualitativa Neo-marxismo, feminismo, pesquisa ação participativa (PAR), teoria racional crítica, etnografia crítica Fonte: Adaptado de Licoln e Gubba (2006), Gephart (2004) e Merriam (2009) 9 3. Procedimentos metodológicos Esse estudo é caracterizado como uma pesquisa documental, exploratória e utiliza a abordagem qualitativa. Dessa forma, a unidade de análise desta pesquisa são artigos acadêmicos dos Anais do Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (Enanpad) que foram premiados como o melhor artigo da sua divisão acadêmica. O período de análise escolhido foi do ano de 2010 a 2014. A coleta dos artigos premiados das 11 divisões do Enanpad no período escolhido resultou em 54 artigos. Os artigos dos anais do Enanpad foram escolhidos para a análise devido a expressividade do evento, o qual é considerado o principal congresso da área de Administração do Brasil. O prestígio e respeito do evento reflete a qualidade dos trabalhos aprovados e apresentados no encontro. Esses artigos foram coletados no site da Anpad e nos CD’s que contém os anais do evento. A análise de dados foi apoiada pelo software QSR NVivo® versão 10 para Windows. Esse software é um tipo de software de apoio a análise qualitativa de dados, também conhecido como Computer Assisted Qualitative Data Analysis Software (CAQDAS) que auxilia o processo e facilita a análise (MERRIAM, 2009). Os 54 artigos foram exportados para o NVivo® e tiveram a classificação de fonte interna. Em seguida, foi realizada a leitura dos artigos com um maior ênfase no resumo, introdução, metodologia e conclusão. Após isso, foram criados as categorias de análise que foram baseadas no framework especificado por Diniz et al. (2006). As categorias de análise foram: unidade de análise, foi identificado se o artigo apresenta explicitamente um problema/pergunta e objetivo de pesquisa; paradigma adotado, o qual foi identificado do ponto de vista ontológico, epistemológico e metodológico com base nos pressupostos teóricos aqui discutidos e contidos no quadro 1; método de pesquisa, identificou-se a tipologia do método empregado e a consistência da conclusão, que foi identificada a partir do alinhamento da conclusão com o problema, objetivo da pesquisa e paradigma adotado. Em seguida, foi realizada uma análise de conteúdo do tipo categorial ou temática de Bardin (2004) que consistiu na criação de códigos para cada categoria de análise e na interpretação dos resultados. Foram utilizadas algumas ferramentas do software que auxiliaram na interpretação e visualização dos resultados, tais como matriz de codificação, matriz agrupada e mapa de contexto. 4. Resultados Em relação a unidade de análise, foram criados três códigos para identificar se os autores dos trabalhos especificam os objetivos e problema de pesquisa. Todos os artigos analisados especificam o objetivo da pesquisa, o qual foi claramente identificado nos resumos dos trabalhos e na introdução. Entretanto, a problematização da pesquisa e o detalhamento da questão de pesquisa não foi identificado em todos os trabalhos. Apenas 14 trabalhos apresentaram explicitamente o problema da pesquisa que guiou a pesquisa. Os outros trabalhos discutiram o objeto do estudo, alguns mostraram lacunas teóricas e práticas mas não deixaram a questão de pesquisa explícita. Para análise do método adotado nos trabalhos, foram criadas duas subcategorias "empírico" e "teórico" e três códigos "quantitativo", "qualitativo" e "misto". Conforme pode ser visto no quadro abaixo, a maioria dos trabalhos premiados nos últimos cinco anos são empíricos e adotaram uma abordagem quantitativa estudando os fenômenos através da adoção de modelos que explicam relações causais entre variáveis, geram e testam hipóteses. Destaca- 10 se que apenas 17 trabalhos utilizaram uma abordagem qualitativa, o que mostra que essa abordagem ainda pode ser mais explorada na pesquisa em administração. Quadro 1- Método por divisão A : Empírico B : Misto E : Qualitativo O : Quantitativo AB : Teórico ADI 5 1 2 2 0 APB 4 0 3 1 1 CON 4 0 0 4 1 EOR 4 0 4 0 0 EPQ 3 0 1 2 2 ESO 5 0 1 4 0 FIN 5 0 0 5 0 GCT 5 0 0 5 0 GOL 5 0 2 3 0 GPR 5 0 5 0 1 MKT 5 0 1 4 0 Total 49 1 17 31 5 Fonte: Resultados da pesquisa, 2015 Aliado a isso, foi identificado apenas um estudo que adotou o métodomisto e utilizou técnicas de coleta e análise de dados qualitativos e quantitativos. Esse estudo pertence a área de Administração da Informação (ADI). Creswell (2010) destaca as potencialidades desse método e mostra que os pesquisadores poderão adotá-lo para expandir os resultados de um método com outro e obter uma análise ampla do problema de pesquisa. Assim, recomenda-se o uso desse método para aprimorar e enriquecer os estudos em administração. Essa matriz de codificação também mostra o método adotado nos estudos de cada divisão da Anpad. Em algumas áreas percebe-se o predomínio de determinado método, como é o caso da área de Finanças (FIN), Gestão de Ciência Tecnologia e Inovação (GCT), Contabilidade (CON), Estratégia em organizações (ESO) e Marketing (MKT) em que predominam os estudos quantitativos os quais fundamentam seus achados em dados e técnicas estatísticas. Nas áreas de Administração Pública (APB) e Estudos Organizacionais (EOR) predominam estudos qualitativos voltados para o entendimento dos fenômenos sociais a partir das experiências, interações etc. Nas áreas de Ensino e Pesquisa em Administração e Contabilidade (EPQ), Administração da Informação (ADI) e Gestão de Operações e Logística (GOL) não foi identificada a predominância de um método. Cada abordagem de pesquisa tem técnicas e estratégias de investigação peculiares. Diante disso, o quadro 2 apresenta uma matriz de codificação que dispõe as técnicas e estratégias da pesquisa qualitativa e da quantitativa identificadas nos artigos de cada área da Anpad. Quadro 2 – Detalhamento do método por divisão Métodos ADI APB CON EOR EPQ ESO FIN GCT GOL GPR MKT Quantitativo – Estudo survey | Experimental Análise de Cluster 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 Análise de variância (ANOVA) 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 2 Análise envoltória de dados 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 Análise 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 11 fatorial Equações estruturais 2 0 1 0 1 2 0 0 2 0 2 Estatística descritiva 0 1 0 0 0 1 1 0 1 0 0 Estatística não – paramétrica 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 Regressão linear 0 0 3 0 0 0 4 2 0 0 1 Regressão Quantílica 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 Qualitativo Estudo de caso 1 0 0 1 0 0 0 0 2 1 1 Etnografia 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 Observação participante 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 Pesquisa narrativa 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 Entrevistas 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1 Grupo focal 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0 Painel de especialistas 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 Fonte: Resultados da pesquisa, 2015. Em relação ao método de levantamento (survey) e experimento, a modelagem de equações estruturais é a técnica de análise mais utilizada e foi identificada em estudos de diversas áreas, tais quais ADI, CON, EPQ, ESO, GOL e MKT. Além disso, constata-se o uso da técnica de regressão linear nos estudos da área de CON, FIN e GCT. No que concerne as estratégias de investigação da pesquisa qualitativa, constatou-se a aplicação de três das técnicas especificadas por Creswell (2014) que foi o estudo de caso, a etnografia e a pesquisa narrativa. A estratégia mais utilizada nos estudos foi o estudo de caso o que corrobora com a literatura que apresenta essa estratégia como uma das mais utilizadas na pesquisa qualitativa no campo das ciências sociais (YIN, 2015). Na maior parte dos estudos analisados constatou-se o rigor metodológico na aplicação do método, constatou-se que em alguns deles foi utilizada a triangulação. É importante destacar que outras estratégias como a fenomenologia e a teoria fundamentada não foram utilizadas nesses estudos. Além disso, foi observado que a maior parte dos estudos qualitativos analisados não especificou qual é a abordagem de pesquisa utilizada, apontando apenas as técnicas de coleta e análise adotadas. Creswell (2014) recomenda a adoção de uma estratégia de investigação da pesquisa qualitativa que seja adequada para o alcance dos objetivos da pesquisa e resposta ao problema de pesquisa. A outra categoria de análise foi "Paradigma" que está subdivida em três subcategorias que representam os três paradigmas abordados nesse estudo, que são: “Positivista/Pós- positivista”; “Interpretativista” e “Crítico”. Para cada subcategoria forma vinculados três códigos que apresentam aspectos ontológicos, epistemológicos e metodológicos de cada paradigma conforme pode ser visto na matriz de codificação abaixo (quadro 3). Não foi possível identificar o paradigma em três artigos que foram codificados como teóricos. Constatou-se que o paradigma positivista/ pós-positivista é o que orienta a grande parte dos estudos, dos 54 estudos analisados, 36 são orientados por esse paradigma. Os aspectos epistemológicos e metodológicos do positivismo foram facilmente identificados e codificados, todavia o aspecto ontológico não foi identificado nem codificado na maioria deles pois os trabalhos não situam e explicam o paradigma que norteia o seu trabalho. 12 Creswell (2014) afirma que os investigadores em geral desconsideram a etapa de apresentar os pressupostos filosóficos que estão incorporados na pesquisa, todavia é útil destacá-los e posicioná-los nos níveis do processo de pesquisa. Dos trabalhos analisados que foram classificados como positivista, apenas o trabalho premiado da divisão ESO em 2012 especifica a sua orientação ontológica como pode ser visto no trecho abaixo. O objetivo do presente estudo é desenvolver um modelo organizacional para avaliação de desempenho e eficiência dos hospitais filantrópicos (...) .A concepção de avaliar desempenho e produtividade (eficiência) nas organizações surgiu dos ideais positivistas propostas por Augusto Comte, numa revolução científica em que a matemática servira de respaldo para as experimentações e validações dos processos operacionais. Esse resultado corrobora com Barbosa et al. (2013) o qual apresenta o positivismo como um paradigma muito forte na administração que orienta grande parte das pesquisas. O autor ainda explica que o fato da Administração ter sua origem no campo prático sob a égide do paradigma positivista-funcionalista contribui para essa tendência. Quadro 3 – Categoria Paradigma por Divisão ADI APB CON EO R EP Q ESO FIN GC T GOL GPR MKT PARADIGMA CRÍTICO D : ONT- A realidade é influenciada por valores 0 0 0 1 1 0 0 0 0 1 0 B : EPIST- Conhecimento gerado ligado a transformação e emancipação 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 0 C : MET-Uso da dialética e dialógica 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 0 PARADIGMA POSITIVISTA / PÓS-POSITIVISTA H : ONT-A realidade é socialmente construída 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 J : EPIST- Conhecimento gerado ligado a previsão, controle e generalização 3 1 4 0 1 4 5 5 4 0 5 G : MET- Investigação de ação, percepção e experiência 3 1 4 0 2 2 5 3 1 0 7 PARADIGMA INTERPRETATIVISTA L : ONT-A realidade é objetiva e compreendida 0 0 0 3 1 0 0 0 0 2 0 F : EPIST- Conhecimento gerado ligado a interpretação de significados 1 1 0 3 1 0 0 0 0 3 0 K : MET- Experimental, manipulativo, verificação de hipóteses 1 1 0 3 1 1 0 0 1 3 0 Fonte: Resultados da pesquisa, 2015 13 O paradigma interpretativista foi identificado em 12 estudos. Em 11 desses estudos foram identificados os aspectos epistemológicos, ontológicos e metodológicos. Nesses trabalhos foi possível constatar que os autores especificaram suas escolhas e justificaram o uso do método e o delineamento do estudo com base no paradigma escolhido. Um bom exemplo disso é o trecho do artigo premiado na divisão de EOR em 2014. A justificativa para a escolha do método se baseou principalmente nos pressupostos ontológicos e epistemológicos dos autores, que não só compartilham dos ideais da produção coletiva do saber, como também sustentam o argumento de que o uso de métodos participativos no estudo da economia solidária (...) O paradigma crítico foi identificado em apenas três estudos das linhas de EOR, GPR e EPQ. Nesses estudos, os aspectos ontológicos, epistemológicos e metodológicos estão explicitados. Esse resultado corroboracom Davel e Alcadipani (2003) que mostra a carência de estudos críticos em administração e principalmente de estudos empíricos em profundidade, os autores afirmam que existe um predomínio de artigos ensaísticos. No quadro acima é possível constatar os paradigmas utilizados em cada divisão da Anpad. Os estudos analisados das divisões CON, FIN, GCT e MKT adotam o paradigma positivista e utilizam métodos eminentemente quantitativos com o uso de experimentos e survey para explicar os fenômenos, identificar relações e testar hipóteses. Apenas um estudo da divisão de MKT, adota o paradigma positivista/ pós positivista e o método qualitativo. Creswell (2014) mostra que é possível adotar um sistema de crenças fundamentado no pós-positivismo na pesquisa qualitativa, esses estudos utilizam múltiplos níveis de análise de dados, usam programa de computadores para auxiliarem a análise e redigem os resultados em forma de relatórios científicos que tem uma estrutura parecida com o de estudos quantitativos. Nas divisões EOR e GPR predomina o paradigma interpretativista e o crítico, não foram verificados estudos que estão dentro do paradigma positivista/ pós-positivista. Uma explicação para a adoção desses paradigmas é o objeto de estudo que estão vinculados a essas divisões. O objeto de estudo muitas vezes são fenômenos organizacionais que são investigados dentro de um contexto e a partir das vivências dos sujeitos. Para subsidiar esses estudos são utilizados métodos qualitativos para compreender os significados, experiências e ações dos sujeitos. Nas divisões APB, EPQ e ADI não existe um paradigma nem um método dominante. Os estudos quantitativos adotam um paradigma positivista, já os estudos qualitativos estão incorporados ao paradigma interpretativista. Esse resultado que mostra o panorama da divisão ADI corrobora com Fell et al. (2010) e Diniz (2006) que constataram a predominância da visão positivista nos estudos de sistemas de informação no Brasil e a carência de estudos que explicam o contexto social e cultural da área. A maior parte dos estudos das divisões GOL e ESO tem uma orientação positivista e utiliza métodos quantitativos. Foram identificados apenas dois estudos que estão vinculados ao paradigma interpretativista e utilizam métodos qualitativos. A última categoria de análise foi “Consistência da conclusão” que teve o código “Consistente com objetivo, paradigma e métodos”. Esse código teve 54 referências codificadas, ou seja, todos os artigos analisados apresentam uma consistência nos seus achados com objetivo e método especificados e também com o paradigma, embora grande parte deles não torna explícito o paradigma adotado. 14 5. Considerações finais Este estudo trouxe algumas reflexões sobre os paradigmas da pesquisa e sua aplicação em administração. Por meio de uma pesquisa empírica foi constatado que a maior parte dos estudos em administração adotam uma visão positivista com o uso métodos quantitativos. Verificou-se que em algumas áreas da administração esse paradigma é mais evidente, tais quais, Finanças, Contabilidade, Gestão da Ciência, Tecnologia e Inovação e Marketing. Em contrapartida, foram identificados poucos estudos sob a ótica dos paradigmas interpretativistas e crítico. Aliado a isso, evidencia-se a existência de poucos trabalhos que utilizam os métodos qualitativos. As áreas de Estudos organizacionais e Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho destacam-se na utilização de uma linha interpretativista e/ou crítica em seus estudos, procurando analisar os fenômenos a luz dos pressupostos ontológicos, epistemológicos e metodológicos dessas correntes. Apesar da predominância do positivismo, foram identificados trabalhos interpretativos e críticos que enfatizam a complexidade dos fenômenos estudados. Isso parece mostrar que a administração está inserida em uma perspectiva multiparadigmática de modo que são desenvolvidos diversos métodos para analisar os fenômenos e desenvolvidas teorias mais abrangentes. Barbosa et al. (2013) defende essa perspectiva mostrando que a administração pode usar paradigmas múltiplos para olhar os fenômenos organizacionais, respeitando as abordagens opostas e revelando facetas interdependentes de fenômenos complexos. É importante ressaltar que não existe um paradigma superior a outro, cada um apresenta aspectos metodológicos, ontológicos e epistemológicos únicos. Ao adotar um paradigma, o pesquisador deve escolher aquele que seja coerente e capaz de subsidiar uma investigação eficaz do seu objeto de pesquisa. Como limitação da pesquisa destaca-se a restrição do período do tempo analisado. Sugere-se estudos posteriores que analisem a produção científica nas áreas específicas da administração e mostrem estratégias de triangulação de paradigmas e métodos. Por fim, esse estudo contribui para a reflexão sobre os paradigmas da pesquisa em administração, mostrando a importância da adoção de novos enfoques epistemológicos, metodológicos e ontológicos para a compreensão dos fenômenos organizacionais. 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