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jusbrasil.com.br 18 de Maio de 2021 [Papo de Criminalista]: Você sabe distinguir as excludentes da ilicitude? Olá criminalistas, tudo bem? Hoje vamos dedicar este espaço para trazer um breve resumo das excludentes da ilicitude descritas no art. 23, do CP, para que vocês possam ter uma clareza da distinção entre elas e nunca mais errar em provas ou em suas atuações profissionais. Vamos lá? Exclusão de ilicitude Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Excesso punível Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo. (Destaquei) O estado de necessidade, a legítima defesa, o estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular de direito são causas que uma vez verificadas excluem o crime, já que afastam a contrariedade da conduta ao direito. O ESTADO DE NECESSIDADE é disciplinado pelo art. 24, do CP: Estado de necessidade Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. §1º. Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. §2º. Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. Aqui o crime é excluído porque o agente atua em desfavor de um bem jurídico para salvaguardar direito próprio ou alheio de um perigo atual, não provocado por si e que não poderia ser evitado de outra forma. Por isso, o elemento subjetivo da excludente é o animus salvandi, ou seja, a vontade de agir para salvar um bem jurídico que está em perigo. É o caso, por exemplo, de uma pessoa que verificando que uma casa está em chamas, quebra o vidro da janela para salvar a vida de uma criança que estava dentro da residência. No exemplo, apesar de o agente causar um dano ao proprietário do imóvel, a sua conduta não será criminalizada, já que agiu para salvar a vida de outrem que estava em risco. O estado de necessidade é subsidiário, pois uma característica fundamental do estado de necessidade é que o perigo seja inevitável, bem como seja imprescindível, para escapar da situação perigosa, a lesão a bem jurídico de outrem. Podendo afastar-se do perigo ou podendo evitar a lesão, deve o autor do fato necessário fazê-lo. No campo do estado de necessidade, impõe-se a fuga, sendo ela possível. Exemplo: alguém se vê atacado por um cachorro feroz, embora possa, fechando um portão, esquivar-se da investida; não pode matar o cão, a pretexto de estar em estado de necessidade. O perigo era evitável, assim como a lesão causada. (NUCCI, 2020) Já a LEGÍTIMA DEFESA é definida no art. 25, do CP: Legítima defesa Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes. Ela é verificada quando o agente atua, moderadamente, para se defender de injusta, atual ou iminente agressão sofrida. Aqui o sujeito age com o chamado animus defendendi. Atua em legítima defesa quem, para se defender de um assalto, efetua um disparo de arma de fogo contra o ladrão. Mas, é importante dizer que para se configurar essa legítima defesa exige que os meios utilizados para a defesa sejam aqueles necessários para fazer cessar a agressão injusta, atual ou iminente. Importa destacar que a legítima defesa exige que a reação seja a uma conduta humana, que se mostra injusta. Assim, por exemplo, se alguém mata um animal feroz que o ataca, não atua em legítima defesa, mas sim em estado de necessidade. É comum ouvirmos a defesa desta excludente nos casos em que homicídios são praticados em razão de adultério, na chamada legítima defesa da honra. A meu sentir, trata-se de defesa insustável, pois não há que se falar em moderação na ação de alguém que tira a vida de outrem em razão de uma infidelidade conjugal. Ademais, se a conduta acontece de forma premeditada e após certo tempo da descoberta da infidelidade conjugal, os requisitos da atualidade ou iminência da agressão não seriam verificados. Pontue-se, ainda, que o Supremo recentemente decidiu pela inconstitucionalidade da defesa da tese de legítima defesa da honra no Plenário do Júri (ver ADPF 779). Em relação ao ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL, aqui o sujeito atua conforme o próprio direito, agindo em conformidade com deveres (ou seja, obrigações) que lhe são impostos pela lei (penal ou não). Essa excludente é bastante debatida em casos de operações policiais, quando, por exemplo, o agente policial efetua um disparo de arma de fogo contra o criminoso com o fito de salvar a vida de vítima de sequestro. Neste caso, a conduta policial não poderá ser criminalizada porque a sua atuação profissional exige aquela ação. Citando Marcello Jardim Linhares, Nucci nos oferece outras diversas exemplificações de situações que configuram o estrito cumprimento do dever legal. Vejamos: (...) a execução de pena de morte feita pelo carrasco, quando o sistema jurídico admitir (no caso do Brasil, dá-se em época de guerra, diante de pelotão de fuzilamento); b) a morte do inimigo no campo de batalha produzida pelo soldado em tempo de guerra; c) a prisão em flagrante delito executada pelos agentes policiais; d) a prisão militar de insubmisso ou desertor; e) a violação de domicílio pela polícia ou servidor do Judiciário para cumprir mandado judicial de busca e apreensão ou mesmo quando for necessário para prestar socorro a alguém ou impedir a prática de crime; f) a realização de busca pessoal, nas hipóteses autorizadas pelo Código de Processo Penal; g) o arrombamento e a entrada forçada em residência para efetuar a prisão de alguém, durante o dia, com mandado judicial; h) a apreensão de coisas e pessoas, na forma da lei processual penal; i) o ingresso em casa alheia por agentes sanitários para finalidades de saúde pública; j) a apreensão de documento em poder do defensor do réu, quando formar a materialidade de um crime, de acordo com a lei processual penal; k) o ingresso em casa alheia por agentes municipais para efeito de lançamento de imposto; l) a comunicação da ocorrência de crime por funcionário público à autoridade, quando dele tenha ciência no exercício das suas funções; m) a denúncia à autoridade feita por médicos, no exercício profissional, da ocorrência de um crime; n) a denúncia feita por médicos à autoridade sanitária, por ocasião do exercício profissional, tomando conhecimento de doença de notificação obrigatória; o) a violência necessária utilizada pela polícia ou outro agente público para prender alguém em flagrante ou em virtude de mandado judicial, quando houver resistência ou fuga (...) (NUCCI, 2020) Por fim, temos o EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO, que se assemelha à excludente anterior, mas tem como diferencial o fato de que o agente atua para exercer um direito (uma faculdade) que a lei lhe confere. A máxima aqui é que se o Direito permite a realização de uma conduta, não poderá a lei penal criminalizá-la. Exemplo clássico da doutrina para esta excludente é a prisão em flagrante efetuada por qualquer do povo, nos termos do art. 301, primeira parte, do CPP. Neste caso, um cidadão comum irá cercear a liberdade de outrem pautado em direito descrito em lei processual penal. Importante destacar que em todas as excludentes o excesso será punido, seja a título doloso ou culposo. Um caso famoso de discussão de excesso na legítima defesa foi do atentado sofrido pelaapresentadora Ana Hickmann. Vocês se lembram? O cunhado da apresentadora foi denunciado pelo Ministério Público de Minas Gerais pelo homicídio de suposto fã que invadiu o quarto de hotel da artista e desferiu tiros contra sua assessora (e cunhada). A acusação defendeu existir excesso na conduta do cunhado de Ana, que desferiu vários tiros contra o agressor. No entanto, a tese de excesso foi afastada, prevalecendo não ser razoável exigir-se de alguém que se via sobre a mira de um revólver e com a esposa baleada uma postura de discernimento sobre a quantidade de disparos efetuados. Acesse AQUI a notícia do caso no TJMG. Espero que tenham gostado do resumo! Aguardo os amigos e as amigas na nossa próxima reflexão. Abraços, ____________________ Referências: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 779, Relatoria do Ministro Dias Toffoli, julgada em 15/03/2021. Disponível https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/noticias/tjmg-mantem-absolvicao-de-cunhado-de-ana-hickmann.htm#.YKOWpahKiUl em < https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp? incidente=6081690 > __________. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/del2848compilado.htm > __________. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/del3689compilado.htm > __________. TJMG mantém absolvição de cunhado de Ana Hickmann. Disponível em < https://www.tjmg.jus.br/portal- tjmg/noticias/tjmg-mantem-absolvicao-de-cunhado-de-ana- hickmann.htm#.... > NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. ____________________ Quem sou? Advogada, especialista em Direito Penal, Processo Penal e Direito Tributário. Apaixonada pela produção de conteúdo jurídico online. Entusiasta na confecção de materiais jurídicos práticos para estudantes e profissionais do Direito. Também estou no LinkedIn. Você pode me encontrar por lá: https://www.linkedin.com/in/anna-paula- cavalcantegfigueiredo https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6081690 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/noticias/tjmg-mantem-absolvicao-de-cunhado-de-ana-hickmann.htm#.YKOWpahKiUl https://www.linkedin.com/in/anna-paula-cavalcante-g-figueiredo Disponível em: https://annapaulacavalcante.jusbrasil.com.br/artigos/1209429277/papo-de- criminalista-voce-sabe-distinguir-as-excludentes-da-ilicitude
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