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Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 OS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS A proteção internacional dos direitos humanos é feita atualmente por meio dos chamados Sistemas Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos, arquitetados tanto em nível global como regional. O sistema global de proteção está arquitetado no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). Já os sistemas regionais de proteção estão afetos a regiões específicas do planeta, encontrando-se arquitetados no âmbito de organizações internacionais específicas. Atualmente encontram-se consolidados três sistemas regionais de proteção: (i) o sistema europeu, no âmbito da União Europeia (EU), (ii) o sistema interamericano, no plano da Organização dos Estados Americanos (OEA) e (iii) o sistema africano, no âmbito da União Africana (UA). 1. O SISTEMA GLOBAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS O sistema global de proteção dos direitos humanos foi criado e vem sendo administrado pela Organização das Nações Unidas (ONU). Tem início com a Carta da ONU (também conhecida como Carta de São Francisco)1, documento que estabeleceu a ONU em 1945 e que dispôs em seu art. 1º (3) ser propósito da Organização “conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião”. (Grifo nosso) O sistema desenvolveu-se posteriormente com a proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (Resolução 217 A III) em 10 de dezembro 1948, que foi complementada (material e processualmente) por dois importantes tratados internacionais: o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e o Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais (PIDSEC), ambos adotados pela Assembleia Geral da ONU em 1966. Esse 1 A Carta da ONU pode ser baixada na íntegra no seguinte endereço: <https://goo.gl/KzC7cu>. Acesso em 26 set. 2018. https://nacoesunidas.org/carta/ https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0591.htm https://goo.gl/KzC7cu Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 conjunto de textos recebeu o nome de Carta Internacional dos Direitos Humanos. O sistema global de proteção dos direitos humanos também é conhecido como sistema internacional de proteção dos direitos humanos, sistema onusiano ou sistema universal de proteção dos direitos humanos e tem como finalidade alcançar a promoção, a proteção e o respeito dos direitos humanos de todas as pessoas que se encontram espalhadas ao redor do globo. Trata-se de um sistema composto por (i) tratados internacionais abertos à adesão de todos os Estados (e também de Organizações Internacionais), indistintamente de sua localização geográfica; e por (ii) órgãos (mecanismos de proteção, v.g., os Comitês) voltados à promoção da dignidade humana em todo o mundo. Cumpre ainda lembrar que, além dos tratados internacionais (que são instrumentos juridicamente vinculantes para os Estados que deles fazem parte), existem no sistema global várias declarações internacionais (que não geram propriamente uma vinculação jurídica para os Estados que as proclamam, senão uma vinculação de ordem moral) voltadas genérica ou especificamente para a proteção dos direitos humanos no plano global, além de normas de outra natureza que de algum modo estão relacionadas aos direitos humanos. Em relação aos instrumentos internacionais (tratados, declarações, resoluções etc.) de proteção dos direitos humanos, além da Carta Internacional dos Direitos Humanos, composta pela DUDH, pelo PIDCP e pelo PIDSEC, torna- se importante aqui destacar os principais instrumentos onusianos até o momento existentes e que protegem a todos os seres humanos em geral ou a categorias mais específicas ao redor do globo. É preciso aqui fazer uma advertência a todos que se preparam para concursos públicos e para o exame da OAB: estes exames jurídicos têm exigido conhecimentos não apenas acerca das normas que tutelam os direitos humanos (nome dos instrumentos), mas também do conteúdo do tratado ou documento internacional, razão pela qual recomenda-se fortemente o estudo detido de seus textos, para que se domine a informação acerca dos diplomas jurídicos onde podem ser encontradas determinadas normas. Vide tabela dos instrumentos internacionais globais abaixo: Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 3 INSTRUMENTOS GLOBAIS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS * Tabela elaborada a partir dos textos originais dos instrumentos internacionais, extraídos da internet, bem como das obras Curso de Direitos Humanos (André de Carvalho Ramos) e Direito Internacional Público e Privado (Paulo Henrique Gonçalves Portela) Instrumento Ano Comentários Carta das Nações Unidas 1945 Cria a ONU e inicia o sistema internacional de proteção dos direitos humanos (art. 1º, 3). Não consagra direitos, nem cria órgãos especificamente voltados a promover a observância dos direitos humanos no plano internacional. No entanto, define que a proteção da dignidade humana é um dos fundamentos da paz e do bem-estar no mundo e atribui, portanto, à promoção dos direitos humanos, o caráter de tema prioritário da sociedade internacional (art. 55, “c”). Declaração Universal dos Direitos Humanos 1948 Documento mais respeitado em matéria de direitos humanos no âmbito global; juntamente com o PIDCP e o PIDSEC, dá início ao desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos como um ramo autônomo do Direito Internacional. Do ponto de vista técnico- formal não é um tratado, mas uma resolução da Assembleia Geral da ONU, razão pela qual há discussão na doutrina acerca de seu caráter jurídico vinculante. Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos 1966 É um tratado cujos preceitos são juridicamente vinculantes e que tem como objetivo principal detalhar os direitos estabelecidos na DUDH e contribuir para sua aplicação. Cria mecanismos de monitoramento internacional de sua implementação pelos Estados Partes (Comitê de Direitos Humanos, que recebe relatórios sobre as medidas adotadas para tornar efetivos os direitos civis e políticos e comunicações interestatais). Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos 1966 Tratado com a finalidade de instituir mecanismo de análise de petições de vítimas ao Comitê de Direitos Humanos por violações a direitos civis e políticos previstos no Pacto. Segundo Protocolo Adicional ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos 1989 Tratado que tem como objetivo a abolição da pena de morte. Visa a avançar no sentido de proibir quase que completamente a pena de morte no mundo. Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais 1966 Tratado que visa a promover e proteger os direitos econômicos, sociais e culturais, que também deverão ser objeto da atenção dos Estados, os quais deverão progressivamente assegurar seu gozo, por esforços próprios ou pela cooperação internacional, com o auxílio de todos os meios apropriados nos planos econômico e técnico e até o máximo de seus recursos disponíveis (art. 2, 1). Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 4 Importante Lacuna:não foi criado um Comitê específico para monitorar o cumprimento do PIDESC pelos Estados, como ocorreu no PIDCP. Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais 2008 Tratado que veio contribuir para a efetivação dos direitos econômicos, sociais e culturais, ao combinar o sistema de petições, o procedimento de investigação e as medidas provisionais (cautelares), reafirmando, assim, a exigibilidade e a justiciabilidade de tais direitos e os equiparando, finalmente, ao regime jurídico internacional dos direitos civis e políticos. O seu art. 1º prevê a competência do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais para receber petições individuais ou no interesse de indivíduos e grupos de indivíduos, que noticiem violação de direitos econômicos, sociais e culturais realizadas pelo Estado Parte. Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio 1948 Tratado celebrado logo após a 2ª Guerra Mundial que denota a preocupação da comunidade internacional em evitar a repetição de determinados atos de violência ocorridos durante o conflito, que foram dirigidos especificamente a certos grupos nacionais, raciais e religiosos. A Convenção parte da percepção de que o genocídio é algo “odioso”, que causou grandes perdas para a humanidade no decorrer da história, e cujo enfrentamento requer a cooperação internacional. Genocídio como crime de jus cogens. Foi o primeiro tratado a definir o crime (art. 2º). Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados 1951 Tratado internacional que tem como objetivo precípuo a proteção dos refugiados ao redor do globo. Inicialmente, a Convenção possuía uma limitação temporal (para acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951) e outra geográfica (somente para os eventos ocorridos na Europa) para a definição de refugiado, que foram abolidas posteriormente por um Protocolo adicional. Protocolo de 1967 Relativo ao Estatuto dos Refugiados 1967 Tratado que eliminou as limitações (temporal e geográfica) trazidas pela Convenção de 1951. Combinando-se o art. 1º do Protocolo com o art. 1º da Convenção, refugiado é a “pessoa que é perseguida ou tem fundado temor de perseguição; por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas e encontra-se fora do país de sua nacionalidade ou residência; e que não pode ou não quer voltar a tal país em virtude da perseguição ou fundado temor de perseguição”. Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Presos (Regras de Mandela) 1955 Estabelecem os padrões internacionais mínimos para o tratamento de reclusos. Foram adotadas pelo I Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e para o Tratamento de Delinquentes, em 1955, aprovadas pelo Conselho Econômico e Social em 1957 e 1977. Em maio de 2015, foram atualizadas pela Comissão das Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 5 Nações Unidas sobre Prevenção do Crime e Justiça Criminal, tendo tais atualizações sido aprovadas, à unanimidade, pela Assembleia Geral da ONU em dezembro de 2015. Foi aprovada, pela Assembleia Geral da ONU, a denominação honorífica da Resolução como “Regras Nelson Mandela”, em homenagem a quem passou 27 anos de sua vida preso, na luta pelos direitos humanos, igualdade, democracia e promoção da cultura da paz. Estas regras possuem natureza de soft law (conjunto de normas não vinculantes de Direito Internacional) e espelham diversos direitos dos presos, previstos em tratados, como, por exemplo, o direito à integridade física e psíquica, igualdade, liberdade de religião, direito à saúde, entre outros. A aplicação dessas regras deve ser feita de forma imparcial, sem qualquer tipo de discriminação (com base em raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra, origem nacional ou social, meios de fortuna, nascimento ou outra condição). Entretanto, as crenças religiosas e os preceitos morais do grupo a que pertença o recluso devem ser respeitados. Devem ser respeitados os demais direitos fundamentais do preso não afetados pela restrição de sua liberdade. Convenção Suplementar sobre Abolição da Escravatura, do Tráfico de Escravos e das Instituições e Práticas Análogas à Escravatura 1956 O tratado sucedeu a Convenção sobre Escravatura de 1926, emendada pelo Protocolo de 1953, com o intuito de intensificar os esforços para abolir a escravidão, o tráfico de escravos e as instituições e práticas análogas à escravidão. Veio em resposta a um problema persistente em todo o mundo ainda hoje: as práticas análogas à escravidão, também denominadas “escravidão contemporânea”, já que episódios de redução a condição análoga de escravo ainda ocorrem no mundo, inclusive no Brasil. Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial 1966 Tratado que tem como finalidade promover e encorajar o respeito universal e efetivo pelos direitos humanos, sem qualquer tipo de discriminação, em especial a liberdade e a igualdade em direitos, tendo em vista que a discriminação entre seres humanos constitui ameaça à paz e à segurança entre os povos. O combate à discriminação racial parte dos princípios da universalidade, da igualdade e da não discriminação, que levam à premissa de que todos os indivíduos possuem uma dignidade que lhes é inerente e que não pode ser afetada por qualquer motivo, inclusive de raça. A Convenção fundamenta-se também no entendimento de que qualquer doutrina de superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa, e que não existe justificativa para a discriminação racial, teórica ou prática. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 6 Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) 1979 Tendo em vista a persistente manutenção das discriminações contra a mulher ao redor do mundo, esse tratado visa a contribuir para conferir maior peso político e jurídico à proteção da dignidade da mulher, cuja situação na maioria das sociedades do mundo, no decorrer da história e na atualidade, nem sempre tem sido marcada pelo gozo de direitos em patamar de igualdade com os homens. Além disso, a Convenção visa a tutelar certas peculiaridades da condição da mulher, como a maternidade. Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher 1999 O tratado teve por objetivo aperfeiçoar o sistema de monitoramento da CEDAW, assegurando o direito de petição quanto às violações dos direitos nela garantidos. Por meio dele o Estado reconhece a competência do Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher para receber e considerar comunicações apresentadas por indivíduos ou grupo de indivíduos – ou em nome deles, se contarem com seu consentimento ou se for justificada a ação independente do consentimento – que se encontrem sob sua jurisdição e que sejam vítimas de violações de quaisquer dos direitos estabelecidos na Convenção (arts. 1º e 2º). Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes 1984 A conclusão de um tratado específico quanto ao tema demonstra a preocupação da sociedade internacional com a tortura, fato recorrente na história da humanidade, que atinge diretamente a vida e à integridade física e mental da pessoa e que é promovido pelo ente que tem como compromisso primário proteger a dignidade humana: o Estado. A Convenção dispõe expressamente que ninguém será sujeito à tortura ou a pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante. Regras Mínimas daONU para Administração da Justiça da Infância e Juventude (Regras de Beijing) 1985 Adotadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua Resolução 40/33, de 29 de novembro de 1985, estas regras, que são normas soft law, têm como objetivo instar os Estados Membros a procurar, em consonância com seus respectivos interesses gerais, promover o bem- estar da criança e do adolescente e de sua família, bem como a se esforçar para criar condições que garantam à criança e ao adolescente uma vida significativa na comunidade, fomentando, durante o período de idade em que ele é mais vulnerável a um comportamento desviado, um processo de desenvolvimento pessoal e de educação o mais isento possível do crime e da delinquência. Deverá ser concedida a devida atenção à adoção de medidas concretas que permitam a mobilização de todos os recursos disponíveis, com a inclusão da família, de voluntários e outros grupos da comunidade, bem como da escola e de demais instituições comunitárias, com o fim de promover Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 7 o bem-estar da criança e do adolescente, reduzir a necessidade da intervenção legal e tratar de modo efetivo, equitativo e humano a situação de conflito com a lei. Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes 2002 Tratado que teve por objetivo estabelecer um sistema de visitas regulares de órgãos nacionais e internacionais independentes a lugares onde as pessoas são privadas de liberdade, com o intuito de prevenir a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes (art. 1º). Protocolo de Istambul 1999 A incompatibilidade entre a proibição da tortura e sua subsistência no cenário contemporâneo evidencia a necessidade constante de implementação de medidas eficazes contra tratamentos desumanos por parte dos Estados. Por este motivo, foi apresentado ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, em 1999, um manual para a investigação e documentação eficazes da tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, que foi denominado Protocolo de Istambul. Em 2003, o documento foi oficialmente adotado pelo Alto Comissariado, como manual modelo na área, bem como tem sido sua utilização recomendada no âmbito do Conselho de Direitos Humanos (relatoria especial contra a tortura, por exemplo). Juridicamente o Protocolo não é vinculante, por ser norma soft law. Convenção sobre os Direitos da Criança 1989 Tratado voltado especificamente para a proteção dos direitos humanos das crianças. A Convenção leva em conta o direito de que as pessoas na infância recebam cuidados e assistência especiais, em virtude da falta de maturidade física e mental, conforme reconheceu a DUDH, bem como a Declaração de Genebra de 1924 sobre os Direitos da Criança, a Declaração dos Direitos da Criança adotada pela Assembleia Geral da ONU em 20 de novembro de 1959 e PIDCP e PIDSEC. Embora outros diplomas internacionais também confiram proteção às crianças, a Convenção sistematizou não só direitos civis e políticos, mas também econômicos, sociais e culturais em um só texto, voltado especificamente para a sua proteção. Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança referente à venda de crianças, à prostituição infantil e à pornografia infantil 2000 Tratado adotado com a finalidade de ampliar medidas previstas na Convenção, com a finalidade de garantir a proteção das crianças (grupo particularmente vulnerável e mais exposto ao risco de exploração sexual) contra a venda de crianças, a prostituição infantil e a pornografia infantil, ante a preocupação com o significativo e crescente tráfico internacional de crianças para tais fins, com a prática disseminada do turismo sexual e com a crescente disponibilidade de pornografia Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 8 infantil na internet e em outras tecnologias modernas. O Protocolo Facultativo à Convenção Sobre os Direitos da Criança Relativo ao Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados 2000 Tratado firmado com o objetivo de aumentar a idade para o possível recrutamento (forçado ou voluntário) de pessoas pelas forças armadas, reconhecendo-se as necessidades especiais das crianças particularmente vulneráveis ao recrutamento ou utilização em hostilidades, em decorrência de sua situação econômica, social ou de sexo. Leva em consideração as causas econômicas, sociais e políticas que levam ao envolvimento de crianças em conflitos armados. Enuncia que os Estados Partes deverão adotar todas as medidas possíveis para assegurar que membros de suas forças armadas menores de 18 anos não participem diretamente de hostilidades e deverão assegurar que menores de 18 anos não serão recrutados de maneira compulsória em suas forças armadas (arts. 1º e 2º). Devem ainda elevar a idade mínima para o recrutamento voluntário de pessoas em suas forças armadas nacionais acima de 15 anos (art. 3º). Regras Mínimas da ONU para Proteção dos Jovens Privados de Liberdade 1990 Adotadas pela Assembleia Geral da ONU por meio da Resolução 45/113, de 14 de dezembro de 1990, estas regras, de caráter soft law, têm como objetivo fixar os padrões internacionais mínimos para o tratamento de jovens privados de sua liberdade. Afirmam que a reclusão de um jovem em um estabelecimento deve ser feita apenas em último caso e pelo menor espaço de tempo necessário; e também se reconhece que, devido a sua grande vulnerabilidade, os jovens privados de liberdade requerem e proteção especiais e que deverão ser garantidos seus direitos e bem-estar durante o período em que estejam privados de sua liberdade e também após este. Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riade) 1990 Adotado pela Resolução 45/112, de 14 de dezembro de 1990, este documento, também de caráter soft law, fixa princípios orientadores para a atuação dos Estados, auxiliando-os no desenvolvimento de abordagens e estratégias nacionais, regionais e internacionais para a prevenção da delinquência juvenil. Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias 1990 Este tratado foi elaborado tendo em vista uma série de diplomas internacionais já existentes sobre os direitos dos trabalhadores migrantes, bem como considerando a amplitude do fenômeno da migração, nessa era de globalização. Seu objetivo fundamental foi estabelecer normas para uniformizar princípios fundamentais relativos ao tratamento dos trabalhadores migrantes e de suas famílias, por meio de uma proteção internacional adequada, especialmente tendo em vista sua situação de vulnerabilidade e seu afastamento do Estado de origem. A elaboração do tratado Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 9 considerou ainda os problemas das migrações irregulares, em que os trabalhadores são frequentemente empregados em condições de trabalho menos favoráveis que outros, o que leva a que se procure tal mão de obra a fim de se beneficiar da concorrência desleal. Assim, seu texto considerou a necessidade de encorajar a adoção de medidas adequadas para prevenir e eliminar os movimentos clandestinos e o tráfico dos trabalhadores migrantes, assegurando, ao mesmo tempo, a proteção dos direitos fundamentais desses trabalhadores. Declaração e Programa de Ação de Viena 1993 A Declaração e Programa de Ação de Viena foi firmada em 1993, por ocasião da Conferência Mundialsobre Direitos Humanos. O objetivo da Declaração é o de reafirmar, no contexto internacional pós-Guerra Fria e de aprofundamento da globalização, os princípios relativos à proteção da dignidade humana e atualizá-los ao novo quadro internacional. Tecnicamente, a Declaração de Viena não é um tratado, consistindo apenas em documento de caráter político. Entretanto, seus dispositivos já fazem parte de tratados e de normas internas dos Estados e, desse modo, são vistos, por boa parte da doutrina, como normas costumeiras ou princípios gerais do Direito. Protocolo de Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, especialmente Mulheres e Crianças, complementar à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional 2000 Este tratado é complementar à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, de 2000. Sua finalidade está pautada na prevenção e no combate ao tráfico de pessoas, que requer atuação conjunta dos países de origem, trânsito e destino, com medidas destinadas a prevenir o tráfico, punir os traficantes e proteger suas vítimas, nos termos de seu preâmbulo. Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado 2006 Este tratado ressalta a necessidade de prevenir o desaparecimento forçado de pessoas e de combater a impunidade nesses casos, afirmando o direito à verdade das vítimas sobre as circunstâncias do desaparecimento forçado e o destino da pessoa desaparecida, bem como o direito à liberdade de buscar, receber e difundir informação com este fim. Foi adotada após a adoção da Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados pela Assembleia Geral das Nações Unidas (Resolução n. 47/133), de 1992, tendo em vista a gravidade do desaparecimento forçado, que constitui crime e, em certas circunstâncias definidas pelo Direito Internacional, crime contra a humanidade. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 0 Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência 2007 A Convenção visa a promover, a proteger e a assegurar o exercício pleno e equitativo dos direitos humanos por todas as pessoas com deficiência e a fomentar o respeito pela dignidade que lhes é inerente (art. 1°), tratando-as em condições de igualdade em face dos demais integrantes do gênero humano e contribuindo, desse modo, “para corrigir as profundas desvantagens sociais” com que convivem e para permitir sua maior participação na vida social. Foi o primeiro tratado aprovado pelo Brasil na forma do § 3º, do art. 5º, da CRFB, tendo, portanto, equivalência de emenda constitucional na ordem jurídica brasileira. Protocolo Facultativo à Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência 2007 Por meio deste Protocolo, os Estados reconhecem a competência do Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência para receber e considerar comunicações submetidas por pessoas ou grupos de pessoas, ou em nome deles, sujeitos à sua jurisdição, alegando serem vítimas de violação das disposições da Convenção pelo referido Estado Parte. O Comitê tem competência para o exame dos relatórios periódicos e para o exame de petições das vítimas. Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas e Medidas não Privativas de Liberdade para Mulheres Infratoras (Regras de Bangkok) 2010 Trata-se de um conjunto de normas de soft law, não possuindo força vinculante aos Estados. Porém, serve como importante vetor de interpretação do alcance de normas nacionais e internacionais sobre direitos humanos que podem incidir sobre as mulheres presas, como, por exemplo, o direito à integridade pessoal, devido processo legal, entre outras, bem como para orientar a produção normativa posterior. Vale aqui ressaltar o Tratado de Marraquexe para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas para Pessoas Cegas, adotado em 2013 pela conferência diplomática da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Este tratado tem como objetivo possibilitar às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades de leitura, o acesso ao conteúdo de livros originalmente impressos, principalmente “a criação de instrumentos normativos e administrativos internos voltados a assegurar o acesso facilitado à reprodução e distribuição de obras em formato acessível aos cegos e deficientes visuais, superando limitações (por exemplo, direitos autorais). Visa, assim, eliminar a escassez crônica de publicação de obras em formatos acessíveis a pessoas com deficiência visual, democratizando o acesso à cultura, educação, bem como ao Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 1 desenvolvimento pessoal e ao trabalho em igualdade de oportunidades”.2 Trata- se de mais um tratado aprovado pelo Brasil de acordo com o § 3º, do art. 5º, da CRFB, tendo, portanto, equivalência de emenda constitucional no ordenamento jurídico brasileiro. Além da proteção de caráter normativo, que se dá por meio de todos os tratados internacionais (e por textos de outra natureza, v.g., declarações, diretrizes, regras etc.) acima elencados, o sistema global conta ainda com órgãos e mecanismos internacionais de monitoramento dos direitos humanos, que serão os responsáveis pela aplicação e efetivação das normas internacionais. A ONU possui órgãos próprios e também relações de apoio administrativo e técnico com vários órgãos criados pelos diversos tratados que são elaborados sob seu patrocínio, voltados à proteção dos direitos humanos. Esse conjunto de mecanismos de proteção geridos tanto por órgãos onusianos quanto por órgãos previstos em tratados diversos apoiados pela ONU também integra o denominado “sistema global, internacional, onusiano ou universal de direitos humanos”. O ponto que une esses órgãos é a atuação da ONU, quer (i) diretamente (órgãos da própria organização) ou (ii) indiretamente (órgãos independentes, previstos em tratados elaborados sob seu patrocínio e que recebem apoio técnico e administrativo da Organização). São órgãos das Nações Unidas voltados à proteção dos direitos humanos: • o Conselho de Direitos Humanos – criado em 2006, por meio da Resolução n. 60/251 da Assembleia Geral da ONU, o Conselho substituiu a antiga Comissão de Direitos Humanos (1946-2006), que havia sido criada pelo Conselho Econômico e Social da ONU (ECOSOC). Sua principal função é promover o respeito universal aos direitos humanos por meio do acompanhamento do cumprimento dos compromissos internacionais celebrados pelos entes estatais na matéria. É composto por 47 Estados-membros, escolhidos por votação secreta da Assembleia Geral da ONU, para um mandato de 3 (três) anos. Tem competência para (i) promover e fiscalizar a observância da proteção de direitos humanos pelos Estados da ONU e (ii) atualmente, 2 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, e- book. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 2 gere o sistema dos procedimentos especiais e o Mecanismo da Revisão Periódica Universal (RPU); Procedimentos Especiais – Paulo H. G. Portela explica que os procedimentos especiais são aqueles previstos nas Resoluções n. 1235, de 1967 (procedimento público), e n. 1503, de 1970 (procedimento confidencial), do Conselho Econômico e Social da ONU (ECOSOC). “São objeto de um mandato conferido a um especialista, chamado de ‘relator especial’ (special rapporteur), ou a um grupo de trabalho, competentes para examinar transgressões das normas de direitos humanos e para elaborar estudos e relatórios e emitirrecomendações a respeito, podendo receber reclamações individuais, prestar assessoria aos interessados e formular e executar iniciativas dirigidas à promoção dos direitos humanos. Os procedimentos especiais podem incluir visitas aos Estados. Tais missões dependem, porém, de que os entes estatais a serem visitados tenham, previamente, declarado sua anuência em receber tais missões, por meio dos chamados ‘convites permanentes’ (standing invitations), os quais, quando apresentados, implicam que os Estados deverão sempre aceitar pedidos de visitas em sede de procedimentos especiais”.3 Revisão Periódica Universal (RPU) – Um dos mais importantes instrumentos de ação do Conselho de Direitos Humanos é o do RPU. A essência desse mecanismo é o peer review (monitoramento pelos pares), pelo qual um Estado tem a sua situação de direitos humanos analisada pelos demais Estados da ONU. Conforme explica André de Carvalho Ramos, o “RPU prevê que todos os Estados da ONU serão avaliados em períodos de quatro a cinco anos, evitando-se a seletividade e os parâmetros dúbios da escolha de um determinado país e não outro”.4 O procedimento do RPU foi estabelecido pela Resolução n. 5/1 do Conselho de Direitos Humanos, de 18 de junho de 2007. Quanto à composição, são os Estados-membros do Conselho de Direitos Humanos avaliam o Estado. Todos os Estados da ONU devem passar pela RPU a cada quatro anos. Quanto à competência, o RPU visa estabelecer um “diálogo construtivo” com o Estado examinado, de modo que os compromissos são voluntários e não podem ser impostos ao Estado sob revisão. Portanto, não há nesse procedimento qualquer condenação formal dos Estados como haveria, v.g., perante os tribunais internacionais de direitos humanos. No caso do peer review o cumprimento das recomendações é totalmente voluntário, dependendo a sua efetividade da boa vontade (e, sobretudo, da ética) dos Estados.5 3 PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. Incluindo Noções de Direitos Humanos e de Direito Comunitário. Salvador: JusPODIVM, 2017, p. 916. 4 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit. 5 Vide página da RPU relativa ao Brasil no sítio da ONU: <https://goo.gl/j21jVZ>. Acesso em 04 out. 2018. https://www.youtube.com/watch?time_continue=1&v=R4ukdbt8YK0 Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 3 • os Relatores Especiais de Direitos Humanos – a partir da criação dos procedimentos especiais pelas Resoluções n. 1235 (procedimento público) e n. 1503 (procedimento confidencial)6 do ECOSOC, especialmente em razão do primeiro surgiu a necessidade de nomeação de órgãos de averiguação de violações de direitos humanos, cuja abrangência pode ser geográfica (por país) ou temática. Tais órgãos podem ser unipessoais ou coletivos e a denominação é variada, isto é, nos casos unipessoais, há o uso da expressão “Relator Especial” ou ainda “Especialista Independente”; no caso dos órgãos colegiados, utiliza-se a expressão “Grupo de Trabalho”. Conforme explica André de Carvalho Ramos, o trabalho desses órgãos “consiste em realizar visitas aos países, em missões de coleta de dados (fact-finding missions), bem como em agir diante de violações de direitos humanos solicitando (não podem exigir) atenção do Estado infrator sobre os casos. Seus relatórios não vinculam, apenas contêm recomendações, que são enviadas aos Estados e também ao Conselho de Direitos Humanos e Assembleia Geral da ONU”.7 • o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR) – é o principal órgão da ONU encarregado de promover e proteger os direitos humanos. Foi criado pela Resolução 48/141 da Assembleia Geral da ONU, de 1993, a partir de recomendação da Conferência Mundial sobre Direitos Humanos de Viena, ocorrida no mesmo ano. Conforme explica Paulo H. G. Portela a “função precípua do OHCHR é promover e proteger os direitos humanos no mundo e liderar os esforços das Nações Unidas nesse sentido, conferindo também maior relevância política ao tratamento do tema (...) inclui, entre suas competências específicas, o apoio aos demais órgãos da ONU envolvidos com a matéria, abrangendo a coordenação das atividades que desenvolvem e o esforço para que todas as áreas das Nações Unidas 6 O procedimento confidencial tem alcance diminuto, pois visa apenas detectar quadro de violação grave e sistemática de direitos humanos em um país. 7 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, op. cit. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 4 incluam considerações relativas à proteção da dignidade humana no tratamento dos temas de sua competência”.8 São órgãos e entes externos, criados por tratados diversos elaborados com incentivo explícito da ONU e que recebem apoio da Organização: • os Comitês criados por tratados internacionais de âmbito universal – têm como principal atribuição monitorar o cumprimento das obrigações que os Estados assumiram dentro do sistema global ao aderirem ou ratificarem determinado tratado. Estão voltados, portanto, a assegurar a observância das normas convencionais (seja de um único tratado ou de uma restrita série de acordos específicos); COMITÊS QUE INTEGRAM A ARQUITETURA DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DAS NAÇÕES UNIDAS Nome do Comitê Tratado determinante da criação Comitê de Direitos Humanos Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos Comitê de Direitos Sociais, Econômicos e Culturais Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) Comitê contra a Tortura Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes Comitê para os Direitos da Criança Convenção sobre os Direitos da Criança Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Comitê contra Desaparecimentos Forçados Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado 8 PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, op. cit., p. 914. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 5 O Comitê de Direitos Humanos é um órgão da ONU, composto por 18 peritos independentes, cuja criação e funcionamento foram regulados pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos – PIDCP (arts. 28 a 39).9 O primeiro Protocolo ao referido Pacto instituiu um mecanismo de análise de petições de vítimas ao Comitê, por violações a direitos civis e políticos previstos no PIDCP. Estes dois tratados, PIDCP e Protocolo são normas de caráter supralegal no ordenamento jurídico brasileiro, de acordo com o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal. Em 17 de agosto de 2018, o Comitê proferiu uma decisão (medida provisória ou interim measures) contra o Estado brasileiro, envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para o Comitê, o Brasil estaria violando direitos civis e políticos previstos no PIDCP (precisamente o art. 25), razão pela qual “solicitou” ao país a adoção de medidas provisórias aptas a fazer cessar a violação de tais direitos e possibilitar que Lula concorresse “nas eleições de 2018” até a existência de uma sentença irrecorrível (o que até o presente momento não há) e com “acesso adequado à imprensa e aos membros do seu partido político”. Em outra decisão subsequente, proferida em 10 desetembro de 2018, o Comitê reafirmou que o Judiciário, Executivo e Legislativo brasileiros têm que cumprir a sua decisão e permitir candidatura de Lula. A questão foi muito debatida no Brasil. Em relação a tais decisões, há basicamente dois posicionamentos divergentes. Alguns alegam que as decisões do Comitê são obrigatórias e vinculantes para o Brasil, sob o argumento de que: (i) as decisões do Comitê são de um órgão internacional ao qual o Brasil reconheceu a competência para fiscalizar o cumprimento e eventuais violações dos direitos previstos no PIDCP; (ii) o Brasil aderiu internacionalmente ao Protocolo ao depositar a carta de adesão. Por outro lado, outros alegam que tais decisões seriam apenas uma recomendação e por isso não poderiam vincular juridicamente o Estado brasileiro, argumentando que: (i) as recomendações são de cunho político e não têm força vinculante para o país; (ii) a não existência de um decreto presidencial internalizando o Protocolo, de modo que ele ainda não integra a ordem jurídica brasileira. É preciso ressaltar que o Congresso Nacional brasileiro aprovou o referido Protocolo ao PIDCP por meio do Decreto Legislativo n. 311, de 17 de junho de 2009, ratificando-o em 25 ele setembro ele 2009. No entanto, até o presente momento o Brasil ainda não internalizou o referido tratado por meio de um decreto presidencial que, de acordo com o entendimento do STF, é o instrumento necessário para a vigência dos tratados internacionais no plano interno brasileiro. No entanto, com a ratificação do tratado internacional, o Brasil já se torna obrigado internacionalmente ao seu cumprimento, sob pena de responsabilização internacional. 9 O Brasil depositou a Carta de Adesão ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos junto à ONU em 24 de janeiro de 1992. Posteriormente, o país internalizou o referido tratado por meio do Decreto Presidencial n. 592, de 06 de julho de 1992, momento em que passou a integrar a ordem jurídica brasileira com força de norma supralegal. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm https://www.viomundo.com.br/politica/urgente-conselho-de-direitos-humanos-da-onu-garante-os-direitos-politicos-de-lula-ser-candidato-nas-eleicoes-de-2018-incluindo-acesso-apropriado-a-imprensa.html https://www.ohchr.org/EN/NewsEvents/Pages/DisplayNews.aspx?NewsID=23464&LangID=E https://lula.com.br/wp-content/uploads/2018/09/Scanner_20180910_164015-3.pdf https://lula.com.br/wp-content/uploads/2018/09/Scanner_20180910_164015-3.pdf http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decleg/2009/decretolegislativo-311-16-junho-2009-588912-publicacaooriginal-113605-pl.html http://indicators.ohchr.org/ Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 6 • o Tribunal Penal Internacional (TPI) – criado pelo Estatuto de Roma de 1998, o TPI visa, precipuamente, a processar e a julgar indivíduos que tenham cometido “crimes internacionais”', assim entendidos aqueles atos ilícitos, tipificados no Estatuto, que se revestem de maior gravidade, que tenham alcance internacional e que incluem atos atentatórios aos direitos humanos, como os crimes de genocídio e de guerra e os crimes contra a humanidade. No entanto, conforme esclarece Paulo H. G. Portela, “o TPI ainda não está aberto a examinar todas as causas envolvendo direitos humanos, mas apenas aquelas de maior gravidade e de alcance internacional (...). Outrossim, o TPI não é proclamado especificamente como cone internacional de direitos humanos, nem pela doutrina nem por seus próprios instrumentos constitutivos”.10 Além destes órgãos que foram analisados, importa ainda mencionar o Conselho Econômico e Social (ECOSOC), criado pela Carta das Nações Unidas (Capítulo X, arts. 61 a 72) como órgão ONU responsável por coordenar assuntos internacionais de caráter econômico, social, cultural, educacional, de saúde e conexos. Trata-se do foro central para discussão desses temas e de formulação de recomendações aos Estados e ao sistema das Nações Unidas. É composto por 54 Estados das Nações Unidas eleitos pela Assembleia Geral e cada membro tem um voto. As decisões são tomadas por maioria dos membros presentes e votantes. 10 PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, op. cit., p. 935. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 7 2. OS SISTEMAS REGIONAIS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS Além do sistema onusiano de proteção dos direitos humanos, de abrangência global, conforme visto, existem também os sistemas regionais de proteção desses direitos, que se encontram afetos a regiões distintas do globo e arquitetados junto a organizações internacionais específicas. Atualmente existem 3 (três) sistemas que se encontram estruturados em diferentes continentes: 1) o Sistema Europeu de Proteção dos Direitos Humanos – arquitetado no âmbito da União Europeia (UE), pelo Conselho da Europa (CE); 2) o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos – arquitetado no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA); 3) o Sistema Africano de Proteção dos Direitos Humanos – arquitetado no âmbito da União Africana (UA). Apesar da existência de alguns documentos voltados à proteção dos direitos humanos no plano regional árabe-islâmico, não é possível afirmar-se na atualidade a existência de um Sistema Árabe-Islâmico de Proteção dos Direitos Humanos, o que ainda é uma grande aspiração. Nesse contexto é possível destacar a existência dos seguintes documentos: (i) a Declaração Universal Islâmica de Direitos Humanos, de 1981; a Declaração dos Direitos Humanos do Cairo ou Declaração dos Direitos Humanos do Islam, adotada em 1990 pela Organização para a Cooperação Islâmica (OCI); e (iii) a Carta Árabe dos Direitos do Homem, adotada pelo Conselho da Liga dos Estados Árabes, em 1994 e atualizada em 2004. Vale destacar que os direitos humanos para os povos árabes se apresentam como um poder derivado de um poder divino, o que acaba por produzir situações complexas para determinados segmentos sociais, v.g., para as mulheres.11 Por sua vez, no continente asiático não existe até o presente momento qualquer documento relevante sobre a proteção dos direitos humanos e sequer uma expectativa de conclusão de uma convenção regional ou sub-regional de direitos humanos. 11 GUERRA, Sidney. Direito Internacional dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 164. https://goo.gl/52Zisc https://goo.gl/52Zisc https://goo.gl/tXCeUL https://goo.gl/tXCeUL http://www.refworld.org/docid/3ae6b38540.html http://www.refworld.org/docid/3ae6b38540.html Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 8 Por fim, vale esclarecer que os sistemas internacionais (global e regionais) de proteção dos direitos humanos não são estanques, separados ou distantes um dos outros. Conforme ressalta Valerio Mazzuoli, “pelo contrário, o sistema global e os sistemas regionais são coadjuvantes e complementares. Isso significa que a falta de solução para um caso concreto no sistema interamericano (ou no sistema europeu, ou africano) de direitos humanos não impede a vítima de se dirigir às Nações Unidas para vindicar o mesmo direito, previsto num tratado pertencente ao sistema global (v.g., o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966)”.12 Verifica-se então que os sistemas regionalizados de proteção dos direitos humanos são organizados paralelamente ao sistema de proteção global da ONU, sendo que a finalidade do sistema global é atuar de forma ampla em todos os Estados soberanos, tendo os sistemas regionais uma atuação complementar àquele, buscando-se aperfeiçoar e fortalecer asdeterminações dos moldes gerais, bem como tratar das especificidades relativas aos direitos humanos em cada âmbito regional. Rhona K. M. Smith, ao apontar algumas vantagens dos sistemas regionais, destaca que, “na medida em que um número menor de Estados está envolvido, o consenso político se torna mais facilitado, seja com relação aos textos convencionais, seja quanto aos mecanismos de monitoramento. Muitas regiões são ainda relativamente homogêneas, com respeito à cultura, à língua e às tradições, o que oferece vantagens”.13 Atualmente, portanto, está consolidada a convivência entre o sistema global de proteção dos direitos humanos (integrado pelos instrumentos das Nações Unidas acima analisados) e os sistemas regionais de proteção desses direitos (europeu, interamericano e africano), cada um apresentando um aparato jurídico próprio. Na sequência será estudado o sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, por ser aquele do qual o Brasil faz parte. 12 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Os Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos. Uma análise comparativa dos sistemas interamericano, europeu e africano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 16. 13 SMITH, Rhona K. M. Textbook on International Human Rights. 6. ed. Oxford: Oxford University Press, 2014, p. 87. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 1 9 2.1 O SISTEMA REGIONAL INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS 2.3.1 Aspectos introdutórios O sistema interamericano de direitos humanos (SIDH) está constituído no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA)14, uma organização internacional intergovernamental, criada por um ato internacional, isto é, por um tratado, especificamente pela Carta da Organização dos Estados Americanos (ou Carta da OEA)15, aprovada na IX Conferência Internacional Pan-Americana, realizada em Bogotá, em 1948. Pode-se afirmar que o sistema interamericano de direitos humanos foi “inaugurado” formalmente pela Carta da OEA, que destacou em seu preâmbulo a necessidade de contemplar um sistema capaz de garantir o respeito aos direitos humanos no continente americano.16 Mais tarde previu o seu atual art. 53 que a OEA realiza os seus fins por intermédio de alguns órgãos específicos, dentre eles a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Comissão IDH). 14 A OEA é também uma organização regional, de acordo com o art. 52 (1) da Carta das Nações Unidas: “Nada na presente Carta impede a existência de acordos ou de entidades regionais, destinadas a tratar dos assuntos relativos à manutenção da paz e da segurança internacionais que forem suscetíveis de uma ação regional, desde que tais acordos ou entidades regionais e suas atividades sejam compatíveis com os Propósitos e Princípios das Nações Unidas”. 15 O texto da Carta está disponível em: <https://goo.gl/EQKcFN>. Acesso em 25 abr. 2018. A Carta foi posteriormente reformada pelo Protocolo de Reforma da Carta da Organização dos Estados Americanos (“Protocolo de Buenos Aires”), assinado em 27 de fevereiro de 1967, na Terceira Conferência Interamericana Extraordinária; pelo Protocolo de Reforma da Carta da Organização dos Estados Americanos (“Protocolo de Cartagena das Índias”), assinado em 5 de dezembro de 1985, no Décimo Quarto período Extraordinário de Sessões da Assembleia Geral; pelo Protocolo de Reforma da Carta da Organização dos Estados Americanos “Protocolo de Washington”), assinado em 14 de dezembro de 1992, no Décimo Sexto período Extraordinário de Sessões da Assembleia Geral; e pelo Protocolo de Reforma da Carta da Organização dos Estados Americanos (“Protocolo de Manágua”), assinado em 10 de junho de 1993, no Décimo Nono Período Extraordinário de Sessões da Assembleia Geral da OEA. 16 “Certos de que o verdadeiro sentido da solidariedade americana e da boa vizinhança não pode ser outro senão o de consolidar neste Continente, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade individual e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do Homem”. https://goo.gl/EQKcFN Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 0 Artigo 53. A Organização dos Estados Americanos realiza os seus fins por intermédio: a) Da Assembleia Geral; b) Da Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores; c) Dos Conselhos; d) Da Comissão Jurídica Interamericana; e) Da Comissão Interamericana de Direitos Humanos; f) Da Secretaria-Geral; g) Das Conferências Especializadas; e h) Dos Organismos Especializados. Poderão ser criados, além dos previstos na Carta e de acordo com suas disposições, os órgãos subsidiários, organismos e outras entidades que forem julgados necessários. A existência de uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos para a proteção dos direitos humanos no continente americano foi prevista, ainda que não originariamente, pelo art. 106 da Carta da OEA17, que também previu que um tratado internacional posterior (no caso, a CADH), estabeleceria a sua estrutura, competência e normas de funcionamento: Artigo 106. Haverá uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos que terá por principal função promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização em tal matéria. Uma convenção interamericana sobre direitos humanos estabelecerá a estrutura, a competência e as normas de funcionamento da referida Comissão, bem como as dos outros órgãos encarregados de tal matéria. 17 A Carta da OEA, em sua redação original, não contemplava nenhum órgão ou mecanismo encarregado da promoção ou proteção dos direitos humanos, não havia nenhuma instância encarregada de supervisionar a vigência destes direitos no continente. Originariamente a Comissão IDH foi criada pela Resolução n. VIII, adotada durante a V Reunião de Consulta de Ministros de Relações Exteriores, em 1959 e iniciou suas operações em 1960, quando o Conselho da OEA aprovou seu Estatuto e elegeu os seus primeiros membros. “Em decorrência da criação da Comissão não ter sido realizada por um instrumento convencional e nem sido contemplada na estrutura institucional da OEA, mediante o Protocolo de Buenos Aires, em 1967, é que foi corrigida tal situação jurídica precária com a revisão da Carta da OEA, incorporando a Comissão IDH ao texto da Carta e designando-a como um órgão principal da Organização, que tem como função essencial promover a observância e proteção dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização, nestes assuntos” (FERREIRA, Adriano Fernandes. Elementos de Direitos Humanos e o Sistema Interamericano. Timburi, 2016, e-book). http://www.oas.org/council/sp/RC/Actas/Acta%205.pdf http://www.oas.org/council/sp/RC/Actas/Acta%205.pdf Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 1 Em razão destas disposições da Carta da OEA se afirma que a Comissão IDH é um órgão da OEA, embora ela também seja um órgão da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (CADH), conforme dispôs a própria Convenção, como se verá adiante. Na mesma Conferência em que foi adotada a Carta, os Estados americanos também adotaram a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948)18, primeiro instrumento regional americano específico sobre direitos humanos. Esta Declaração não foi adotada na forma de um tratado internacional, de modo que não constitui um instrumento juridicamente vinculante que resulta obrigatório para os Estados. No entanto, tem-se sustentado que os direitos previstos nela têm a categoria de costume internacional ou que enuncia princípios fundamentais reconhecidos pelos Estados americanos.19 Anos mais tarde, em 1969 é adotadano âmbito da OEA a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (CADH)20, o tratado regente e mais importante de proteção dos direitos humanos no continente americano. Portanto, atualmente o sistema de proteção internacional dos direitos humanos no continente americano abarca os procedimentos contemplados na Carta da Organização dos Estados Americanos e na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, bem como na Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. Em razão disso se costuma afirmar que no âmbito americano existe um duplo sistema de proteção dos direitos humanos:21 a) o sistema geral da Carta e da Declaração Americana; que abrange todos os 35 países independentes e soberanos das Américas; e, b) o sistema específico da CADH, que abarca apenas os Estados que são partes na Convenção. 18 Disponível em: <https://goo.gl/NgsnGz>. Acesso em 25 abr. 2018. 19 Corte IDH – Interpretação da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem no âmbito do art. 64, da CADH, Opinião Consultiva OC - 10/89 de 14 de julho de 1989, parágrafos 11, 14 e 18. 20 Disponível em: <https://goo.gl/oGMsJh>. Acesso em 25 abr. 2018. 21 GUERRA, Sidney. Direitos Humanos: Curso Elementar. 3. ed. São Paulo: 2015, p. 143. https://goo.gl/NgsnGz https://goo.gl/oGMsJh Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 2 O “sistema americano é um sistema duplo com a presença de dois subsistemas normativos em matéria de direitos humanos, que são resultados da pluralidade de fontes jurídicas aplicáveis nessa matéria e do grau em que elas resultam vinculantes para os Estados. O primeiro subsistema compreende competências que possui a Organização de Estados Americanos com relação a todos seus membros [em decorrência da Carta da OEA e da Declaração Americana], o segundo somente é aplicável aos Estados Partes da Convenção e documentos conexos [em decorrência da CADH”.22 A Carta da OEA é um documento mais abrangente no que tange ao número de Estados a ela submetidos, porém menos protetivo, por contemplar apenas a Comissão IDH como órgão voltado à proteção dos direitos humanos (art. 53). Já a CADH se apresenta como um documento menos abrangente no que diz respeito ao número de Estados a ela submetidos (só aqueles que a ratificaram ou a ela aderiram posteriormente), porém mais protetivo, pois além de contemplar a Comissão IDH como órgão de proteção dos direitos humanos, também instituiu a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), que é o órgão jurisdicional do sistema interamericano para a proteção dos direitos humanos, a ela se submetendo todos os Estados que reconhecem a sua jurisdição (art. 33).23 Além da Carta da Organização dos Estados Americanos (1948), da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969), o SIDH conta ainda com diversos outros tratados internacionais que compõem o corpus juris interamericano, que pode ser sintetizado conforme quadro abaixo: 22 FERREIRA, Adriano Fernandes. Elementos de Direitos Humanos, op. cit. 23 “Artigo 33. São competentes para conhecer dos assuntos relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados Partes nesta Convenção: a) a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Comissão; e b) a Corte Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Corte”. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 3 INTRUMENTOS NORMATIVOS DO SISTEMA INTERAMERICANO Os instrumentos abaixo podem ser acessados na íntegra no site da Comissão IDH: <https://goo.gl/5Ck4Ps>. Acesso em 15 mai. 2017. Documentos institutivos da OEA e do Sistema Interamericano 1. Carta da Organização dos Estados Americanos (1948) (tratado); 2. Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948); Tratados internacionais de direitos humanos 3. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969); 4. Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (1985); 5. Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, “Protocolo de San Salvador” (1988); 6. Protocolo à Convenção Americana sobre Direitos Humanos referente à Abolição da Pena de Morte (1990); 7. Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, “Convenção de Belém do Pará” (1994); 8. Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas (1994); 9. Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (1999); 10. Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (2013); 11. Convenção Interamericana contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância (2013); 12. Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas (2015); Outros instrumentos relativos aos direitos humanos (soft law) 13. Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão (2000); 14. Carta Democrática Interamericana (2001); 15. Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas (2008); 16. Carta Social das Américas (2012); 17. Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas (2016); Estatutos e Regulamentos dos órgãos do Sistema Interamericano 18. Estatuto da Comissão Interamericana de Direitos Humanos; https://goo.gl/5Ck4Ps Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 4 19. Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos; 20. Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre o Fundo de Assistência Jurídica do Sistema Interamericano de Direitos Humanos; 21. Estatuto da Corte Interamericana de Direitos Humanos; 22. Regulamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos; 23. Regulamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre o Funcionamento do Fundo de Assistência Jurídica às Vítimas. O Sistema Interamericano “apresenta-se como ferramenta de importância inestimável para a garantia efetiva dos direitos humanos no continente americano, pois através dos dois órgãos de proteção dos direitos humanos previstos nos documentos internacionais americanos (Comissão e Corte Interamericana) garante-se não só o acompanhamento da conduta dos Estados- membros, mas também a possibilidade de julgar casos atentatórios aos direitos humanos”.24 2.3.2. Os órgãos de proteção dos direitos humanos no Sistema Interamericano De acordo com o art. 33 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, tem competência para realizar a proteção dos direitos humanos previstos na CADH dois importantes órgãos: (i) a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Artigo 33. São competentes para conhecer dos assuntos relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados Partes nesta Convenção: a) a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Comissão; e b) a Corte Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Corte. 24 GUERRA, Sidney. Direitos Humanos: Curso Elementar, op. cit., p. 151. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 5 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (COMISSÃO IDH) A Comissão IDH25 é um órgão principal e autônomo da OEA, instituído pela Carta da OEA, conforme visto. Mas também é um órgão de proteção dos direitos humanos consagrado na Convenção, conforme estabelecido pelo art. 33 da CADH. Conforme se nota, a Comissão possui tratamento normativoem dois tratados internacionais (Carta da OEA e a CADH). Ela tem, portanto, uma natureza dúplice ou ambivalente, isto é, constitui um órgão da OEA e também um órgão da CADH. De acordo com Adriano Fernandes Ferreira, com relação aos Estados que não ratificaram a CADH (mas que são membros da OEA), a Comissão IDH exerce funções puramente políticas ou diplomáticas. Já com relação aos Estados partes na Convenção, a Comissão também cumpre importantes funções de natureza “semi-jurisdicional”.26 A Comissão IDH é um órgão criado pela Organização dos Estados Americanos para “promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização” sobre a matéria, conforme estabelecido pelo art. 106 da Carta da OEA. Por determinação desse dispositivo convencional previsto na Carta, a CADH dispôs sobre a organização, funções, competência e procedimento da Comissão IDH em seus arts. 34 a 51. O art. 39 da CADH estabeleceu que “a Comissão elaborará seu estatuto e submetê-lo-á à aprovação da Assembleia Geral e expedirá seu próprio regulamento”. Portanto, importante notar que além da regulação prevista na CADH, a Comissão Interamericana também conta com normas regulamentadores em seu Estatuto27 e em seu Regulamento.28 25 Vide site da Comissão IDH em: <http://www.oas.org/pt/cidh/>. Acesso em 15 mai. 2018. 26 FERREIRA, Adriano Fernandes. Elementos de Direitos Humanos, op. cit. 27 O estatuto da Comissão foi aprovado pela Resolução AG/RES. 447 (IX-O/79), adotada pela Assembleia Geral da OEA, em seu Nono Período Ordinário de Sessões, realizado em La Paz, Bolívia, em outubro de 1979. O texto integral do documento pode ser encontrado em: <https://goo.gl/5zEqA5>. Acesso em 15 mai. 2018. 28 O regulamento da Comissão foi por ela aprovado em seu 137° período ordinário de sessões, realizado de 28 de outubro a 13 de novembro de 2009 e foi modificado em 02 de setembro de 2011, em seu 147º período de sessões, celebrado de 08 a 22 de março de 2013, para entrada em vigor em 01 de agosto de 2013. O texto integral do documento pode ser encontrado em: <https://goo.gl/Kn0rMQ>. Acesso em 15 mai. 2018. http://www.oas.org/pt/cidh/ https://goo.gl/5zEqA5 https://goo.gl/Kn0rMQ Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 6 A Comissão IDH representa todos os membros da Organização dos Estados Americanos (CADH, art. 35). Por isso, sua competência “alcança todos os Estados-partes da Convenção Americana em relação aos direitos da pessoa humana nela consagrados, como também a todos os Estados integrantes da Organização dos Estados Americanos, em relação aos direitos consagrados na Declaração Americana de 1948”.29 Sua sede está situada em Washington, D.C., nos Estados Unidos. A Comissão realiza pelo menos dois períodos ordinários de sessões por ano, no lapso que haja determinado previamente, bem como tantas sessões extraordinárias quantas considerem necessárias. Antes do término do período de sessões, a Comissão determinará a data e o lugar do período de sessões seguinte (Art. 14, 1, do Regulamento). As sessões, como regra geral, serão realizadas em sua sede; no entanto, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, a Comissão poderá decidir por reunir-se em outro lugar, com a anuência ou a convite do respectivo Estado (Art. 14, 2, do Regulamento). Em relação à sua composição, a CIDH é composta por 07 (sete) membros (denominados Comissários ou Comissionados), que devem ser pessoas de alta autoridade moral e de reconhecido saber em matéria de direitos humanos (CADH, art. 34). Estes membros são eleitos a título pessoal (não como representantes dos seus Estados de origem), pela Assembleia Geral da OEA, de uma lista de candidatos propostos pelos governos dos Estados membros, sendo que cada governo pode propor até três candidatos, nacionais do Estado que os propuser ou de qualquer outro Estado membro da OEA. Quando for proposta uma lista de três candidatos, pelo menos um deles deverá ser nacional de Estado diferente do proponente (CADH, art. 36). No tocante ao mandato de seus membros, eles serão eleitos por quatro anos e só poderão ser reeleitos uma única vez, não podendo fazer parte da Comissão mais de um nacional de um mesmo Estado (CADH, art. 37). 29 GUERRA, Sidney. Direitos Humanos: Curso Elementar, op. cit., p. 152. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 7 As vagas na Comissão, não resultantes da expiração normal do mandato, serão preenchidas pelo Conselho Permanente da Organização, de acordo com o que dispuser o Estatuto da Comissão (CADH, art. 38).30 Conforme previsto no art. 106 da Carta da OEA e também no art. 41 da CADH, a principal função da Comissão IDH é “promover a observância e a defesa dos direitos humanos” no continente americano, sendo que, para desempenhar esta tarefa, no exercício de seu mandato ela desempenha funções e atribuições no sentido de (CADH, art. 41): a) estimular a consciência dos direitos humanos nos povos da América; b) formular recomendações aos governos dos Estados membros, quando o considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos; c) preparar os estudos ou relatórios que considerar convenientes para o desempenho de suas funções; d) solicitar aos governos dos Estados membros que lhe proporcionem informações sobre as medidas adotadas no âmbito interno em matéria de direitos humanos; e) atender às consultas que, por meio da Secretaria-Geral da OEA, lhe formularem os Estados membros sobre questões relacionadas com os direitos humanos e, dentro de suas possibilidades, prestar-lhes o assessoramento que eles lhe solicitarem; 30 Conforme explica Caio Paiva, “ocorrendo vaga na CIDH que não seja decorrente de expiração normal do mandato (renúncia e morte de um comissário p. ex.), o preenchimento desta deve obedecer ao que preveem a CADH (art. 38) e o Estatuto da Comissão (art. 11), funcionando da seguinte forma: (I) Ao verificar-se uma vaga que não se deva à expiração normal de mandato, o Presidente da Comissão notificará imediatamente ao Secretário-Geral da OEA, que, por sua vez, levará a ocorrência ao conhecimento dos Estados membros da Organização; (II) Para preencher as vagas, cada Governo poderá apresentar um candidato, dentro do prazo de 30 dias, a contar da data de recebimento da comunicação do Secretário-Geral na qual informe da ocorrência de vaga; (III) O Secretário-Geral preparará uma lista, em ordem alfabética, dos candidatos e a encaminhará ao Conselho Permanente da Organização, o qual preencherá a vaga. Finalmente, prevê o art. 11.4 do Estatuto da CIDH que ‘Quando o mandato expirar dentro dos seis meses seguintes à data em que ocorrer uma vaga, esta não será preenchida’” (PAIVA, Caio. (Quase) Tudo sobre a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, op. cit.). Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 8 f) atuar com respeito às petições (individuais) e outras comunicações (interestatais), no exercício de sua autoridade, de conformidade com o disposto na Convenção; e, g) apresentar um relatório anual à Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos. Um Estado membro da OEA pode vir a sofrer uma “sanção” aplicada pela Comissão IDH, em razão de não observar os preceitos contidos nos documentos internacionais componentes do corpus juris interamericano. Nesse caso, o Estado violador dos direitos humanos será submetido a um constrangimento internacional público (power of shame and embarasment) por meio dadivulgação de um relatório para os Estados-membros da OEA. Por não se tratar de um órgão jurisdicional, esta é a “sanção” máxima que a Comissão poderá impor a um Estado membro (da OEA e/ou da CADH), isto é, a publicação no seu Relatório Anual sobre a condenação do Estado, documento este que será divulgado na Assembleia Geral da OEA. E além disso, a Comissão poderá ainda incluir em seu relatório, recomendações para que o Estado solucione o problema denunciado. A CADH criou um sistema de petições individuais e de comunicações interestatais, possibilitando à Comissão IDH o recebimento de denúncias ou queixas contendo alegações de violações de direitos humanos protegidos pela Convenção e por outros tratados do Sistema Interamericano. O procedimento de petição individual é considerado de adesão obrigatória para os Estados que aderem ou ratificam a CADH (art. 44). Artigo 44 Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados membros da Organização, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado Parte”. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 2 9 Por outro lado, o procedimento de comunicação interestatal (entre Estados) é estabelecido pela própria Convenção como facultativo (art. 45). Artigo 45 1. Todo Estado Parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação desta Convenção ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece a competência da Comissão para receber e examinar as comunicações em que um Estado Parte alegue haver outro Estado Parte incorrido em violações dos direitos humanos estabelecidos nesta Convenção. 2. As comunicações feitas em virtude deste artigo só podem ser admitidas e examinadas se forem apresentadas por um Estado Parte que haja feito uma declaração pela qual reconheça a referida competência da Comissão. A Comissão não admitirá nenhuma comunicação contra um Estado Parte que não haja feito tal declaração. 3. As declarações sobre reconhecimento de competência podem ser feitas para que esta vigore por tempo indefinido, por período determinado ou para casos específicos. 4. As declarações serão depositadas na Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos, a qual encaminhará cópia das mesmas aos Estados membros da referida Organização. Para que um procedimento de petição individual (art. 44) ou comunicação interestatal (art. 45) contendo uma denúncia ou queixa de violação dos direitos humanos previstos na CADH possa ser iniciado junto à Comissão IDH, devem estar presentes algumas condições de admissibilidade, conforme o estabelecido pelo art. 46 da Convenção: Artigo 46 1. Para que uma petição ou comunicação apresentada de acordo com os artigos 44 ou 45 seja admitida pela Comissão, será necessário: a) que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos; b) que seja apresentada dentro do prazo de seis meses, a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notificado da decisão definitiva; c) que a matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e d) que, no caso do artigo 44, a petição contenha o nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição. 2. As disposições das alíneas a e b do inciso 1 deste artigo não se aplicarão quando: a) não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo legal para a proteção do direito ou direitos que se alegue tenham sido violados; b) não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido de esgotá-los; e c) houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos. Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 3 0 Com fundamento neste dispositivo da Convenção, a doutrina aponta como condições de admissibilidade as seguintes: 1) Esgotamento dos recursos internos (local remedies rule) – o art. 46, 1, “a”, da CADH estabelece que antes do peticionamento à Comissão devem ter “sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos”; A jurisdição internacional de proteção aos direitos humanos apresenta um caráter subsidiário, isto é, somente atua quando o Estado supostamente violador dos direitos não atua ou atua deficientemente. Portanto, compete primeiramente ao Estado, num legítimo exercício de sua soberania, apurar e tomar providências relativas a violações que tenham sido aplicadas em sua contingência territorial. Conforme expõe André de Carvalho Ramos, o “esgotamento dos recursos internos exige que o peticionante prove que tenha esgotado os mecanismos internos de reparação, quer administrativos, quer judiciais, antes que sua controvérsia possa ser apreciada perante o Direito Internacional”, pois desse modo, “fica respeitada a soberania estatal ao se enfatizar o caráter subsidiário da jurisdição internacional, que só é acionada após o esgotamento dos recursos internos”.31 Desse modo, os recursos internos devem apresentar-se de maneira adequada e acessível para que possam satisfazer as pretensões daqueles indivíduos que tenham sido alvo de violações no plano interno estatal.32 Ou seja, constitui um dever do Estado, prover os recursos internos aptos a reparar os danos porventura causados aos indivíduos, sob pena de responder 31 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 338. 32 A Corte IDH já se pronunciou sobre o que entende por recursos adequados. Para a Corte, dizer que os recursos são adequados significa “(...) que a função desses recursos, dentro do sistema do direito interno, seja idônea para proteger a situação jurídica infringida. Em todos os ordenamentos jurídicos internos existem múltiplos recursos, porém nem todos são aplicáveis em todas as circunstâncias. Se, em um caso específico, o recurso não é adequado, é óbvio que não há que se esgotá-lo. Assim, ele indica o princípio de que a norma está encaminhada a produzir um efeito e não pode interpretar-se no sentido de que não produza nenhum ou seu resultado seja manifestamente absurdo ou irrazoável” (Caso Fairén Garbi e Solís Corrales vs. Honduras. Mérito. Sentença de 15 de março de 1989. Série C, n. 6, § 88). Disponível em: <https://goo.gl/16iaU9>. Acesso em 22 mai. 2018. https://goo.gl/16iaU9 Direitos Humanos Prof. Luciano Meneguetti – ver. 03 - set. 2019 P ág in a 3 1 duplamente no plano internacional, isto é, (i) pela violação inicial de direitos humanos protegidos nos tratados internacionais e (ii) por não prover o indivíduo de recursos internos aptos a reparar o dano causado. A própria CADH, em seu art. 46 (2), estabelece os casos de dispensa da necessidade de prévio esgotamento dos recursos internos, a saber: a) quando não existir o devido processo legal para a proteção do direito violado (art. 46, 2, “a”); b) quando não se houver permitido à vítima o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido de esgotá-los (art. 46, 2, “b”); c) quando houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos (artigo 46, 2, “c”); d) quando o recurso disponível for inidôneo (por exemplo, o recurso não é apto a reparar o dano); ou inútil (por exemplo, já há decisão da Suprema Corte local em sentido diverso); ou, e) quando
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