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As Duas Faces da Morte-1 (1)

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As Duas Faces 
da Morte 
 
 
Léo Matos 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Copyright by Léo Matos 1995 
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida em qualquer forma ou 
meios, eletronicamente ou mecanicamente, inclusive tirando fotocópias, gravando ou por qualquer sistema 
de armazenamento de informações sem permissão por escrito do autor exceto no caso de cotações breves 
(citando a fonte) em publicações científicas. 
 
 
As Duas Faces da Morte 
 
Léo Matos 
 
 
 
O MISTÉRIO DA MORTE 
 
 O mistério da morte tem surpreendido o homem desde tempos 
imemoriais e o homem tem tentado vários meios para descobrir o que é a 
morte e possíveis estados de consciência pós-morte. 
 Morte é a passagem do estado da chamada vida, onde funções vitais 
específicas operam dentro de um organismo (que é composto de órgãos 
funcionando de uma forma organizada específica), para outro estado de ser, 
onde essas funções deixam de operar naquele mesmo organismo, que agora 
ficará "desorganizado" entrando num estado de trans-formação. Essa é a 
morte biológica física. 
 Morte sendo, então, igualada à transformação pode ser aplicada não 
apenas à um contexto físico da existência mas também à um contexto 
psicológico. Nesse sentido veremos que não apenas nossas células do corpo 
morrem aqui e agora e outras células nascem ou renascem, mas que também 
nossas emoções e pensamentos existem dentro deste contexto de 
transformação constante a que chamamos morte. 
 
 Geralmente uma pessoa é considerada morta quando seu coração 
parou de bater e a respiração cessou
1
. 
 Quando pensamos sobre morte é sempre em conecção com a imagem 
de algo ou alguém que morreu: um parente próximo, alguém que 
conhecemos ou mesmo um animal ou planta. Em nossa mente aparece a 
figura de um acontecimento físico, biológico, com uma conotação 
emocional consciente ou inconsciente. Essa conotação freqüentemente 
implica distância, rejeição ou indiferença (a qual é uma forma suave de 
rejeição). A raiz inconsciente dessas atitudes é nosso medo da morte. 
 O ingrediente básico que torna qualquer dos nossos problemas difíceis 
demais, complicados e preocupantes é o medo. 
 
O MEDO E AS DUAS FACES DA MORTE 
 
 Medo é uma emoção humana de suma importância; e o medo da 
morte é um de nossos instintos mais importantes o qual nos permite 
sobreviver. 
 Entretanto, com relação à morte podemos observar claramente dois 
tipos básicos de medo os quais são duas faces da morte: o medo da morte 
física atual, que é um medo necessário e saudável, pois esse medo funciona 
como um poderoso mecanismo de defesa (ou instinto de sobrevivência), o 
qual nos ajuda a manter nossos corpos longe da morte ou possível 
destruição; e o medo psicológico da morte, o qual na realidade é um medo 
produzido por uma morte projetada no futuro. Esse medo vem a ser um 
 
1
 Em termos médicos é imprescindível que o EEG apresente a linha isoelétrica para que a pessoa seja 
considerada morta. 
medo nascido de uma fantasia auto-criada, com efeitos psicológicos 
prejudiciais para a própria pessoa assim como para seu ambiente. 
 Esse medo psicológico da morte (que costuma existir em um nível 
inconsciente) produzirá na pessoa diferentes tipos de sintomas, como por 
exemplo, falta de auto-confiança, alienação, depressão, falta de iniciativa, 
pessimismo, nervosismo e agressividade, tensão física e psicológica, 
doenças psicossomáticas, falta de coragem e entusiasmo, incapacidade de 
experienciar alegria e freqüente tendência consciente assim como 
inconsciente para auto sabotagem e suicídio (Matos, 1980). 
 Todos esses sintomas aparecem porque o que realmente tememos em 
relação à morte (no caso do medo psicológico) não é a morte do nosso corpo 
físico, mas a destruição, morte e transformação de nossa auto-imagem (ou 
ego) a qual nós projetamos no futuro em uma situação de "perigo". 
 Faremos tudo para manter essa auto-imagem, pois não tornamos claro 
e consciente para nós mesmos o que é nossa imagem e o que somos nós 
mesmos. 
 
A AUTO-IMAGEM 
 
 Para sobreviver neste mundo como seres humanos nós precisamos ter 
uma identidade. Em nossa sociedade moderna e sofisticada essa identidade, 
a qual é uma imagem de nós mesmos (isto é, a pessoa que imaginamos e 
cremos que somos), se torna muito importante. 
 Nós certamente precisamos saber quem somos nesta sociedade na 
qual vivemos e quais são os papéis e comportamentos esperados de nós. 
Nesse caso criamos uma imagem de nós mesmos, a auto-imagem ou ego
2
. 
 Nesse sentido, a auto-imagem é um instrumento sabiamente 
concebido pela sociedade para funcionar como um espelho, para funcionar 
como um protetor ou guardião. Acontece que esse guardião, com o passar do 
tempo, se torna um guarda. 
 Um guardião tem mente aberta e é protetor. O guarda tem usualmente 
a mente estreita, é restritivo e eventualmente manterá seu prisioneiro 
encarcerado para sempre; e aqui parece que é isso o que acontece à maioria 
das pessoas no que diz respeito à suas auto-imagens. Elas esquecem que a 
imagem é apenas uma imagem e acabam acreditando que as auto-imagens 
são realmente elas próprias. É aqui que começa o problema porque a pessoa 
se enganou ao tomar um espelho social, uma simples identidade social 
impermanente, como sendo uma identidade definitiva, e passa a crer que ele 
próprio é uma imagem. 
 Então a pessoa começa a viver a maior parte da sua vida apenas em 
um mundo de imaginação. Isso pode (e freqüentemente acontece) se tornar 
um jogo social coletivo que resultará numa "verdade" consensual. Quando 
isso acontece as pessoas que vivem em tal sociedade, onde predomina essa 
"verdade" consensual, se sentirão cada vez mais alienadas de si e da 
natureza, ficarão amedrontadas (com medo e suspeita uns dos outros), 
agressivos e especialmente com um forte e inconsciente medo da morte. 
 De alguma forma nós perdemos nossa identidade mais profunda e 
agora cremos que somos o que não somos, isso é, uma imagem. E para 
 
2
 Ego aqui significa a concepção individual de si próprio, o modo como ele imagina que ele é, isto é, a 
auto-imagem. 
salvar essa imagem, que agora tomamos como sendo nosso "eu real" nós, 
inconscientemente, criamos uma poderosa barreira de auto-defesa baseada 
nos conteúdos do medo. Como esse medo está mais em um nível 
inconsciente e não é expressado, ele se torna auto-destrutivo, emergindo 
então como sintomas individuais e coletivos. O sintoma coletivo mais 
conhecido é o que chamamos tabu da morte (ver: Matos, 1987). 
 
O NASCIMENTO DO TABU DA MORTE 
 
 Esse tabu pode nos parecer um mistério. Quando e como nós criamos 
um tabu sobre algo tão natural e inevitável como a morte? Somos nós seres 
humanos "naturalmente loucos" e criadores potenciais de auto-sofrimento? 
Por que ao invés de encarar diretamente esses problemas criados por uma 
"futura morte do ego" nós criamos um tabu da morte? 
 Exatamente agora nós estamos vivos e teoricamente sabemos que 
vamos morrer um dia, mas nós não sabemos o que a morte é realmente, 
porque geralmente ninguém que conhecemos jamais voltou da morte para 
nos contar o que ela é. Por causa disso fazemos uma fantasia consciente ou 
inconsciente do que a morte é. Nós imaginamos o que ela poderia ser. 
 Há dois tipos básicos de fantasias que podemos fazer sobre o que é a 
morte, ou melhor, o que virá após a morte física: uma é que não há nada 
após a morte e outra é que há alguma coisa após a morte. Nós jamais 
seremos capazes de saber, com certeza, o que é. Você pode ter uma 
formação cristã e acreditar que você irá para o inferno ou para o céu (sendo 
católico você terá uma alternativa a mais: o purgatório). Como um hindu ou 
um budista a pessoa acreditará em muitas vidas passadas e futuras; e como 
Marxista você acreditará que acreditanão haver nada após a morte. 
 Seja qual for a crença pessoal de alguém, haverá sempre uma dúvida, 
à menos que a pessoa tenha morrido para descobrir o que há depois da 
morte. 
 Aqui é interessante lembrar que a Psicologia Tibetana Budista tem 
elegantes e sofisticados manuais da morte e do processo de morrer, da 
existência entre uma vida e outra e do renascimento. 
 Podemos perguntar onde e como os tibetanos encontraram esta 
cartografia que usualmente não encontramos no Ocidente? A resposta é 
simples, Lamas tibetanos e yogues, estudando através de milênia os 
mistérios da morte, não apenas intelectualmente mas experiencialmente 
(através de práticas e meditações extremamente complexas e sofisticadas), 
pesquisaram (dentro de um contexto científico existindo num paradigma 
diferente do nosso) e descobriram o que para nós ainda é um mistério. 
 Uma das afirmações é que alguns lamas e yogues do Tibete 
conseguem não apenas lembrar as suas vidas passadas, mas exatamente 
aquele caminho (em Tibetano: Bardo) que existe entre uma vida e outra. 
Eles têm seus sofisticados livros da morte (Bardo Thödol), parte dos quais 
foi traduzido para línguas ocidentais (Evans-Wentz, 1968). 
 Os antigos egípcios tiveram também o seu manual sobre a morte, o 
Livro Egípcio da Morte, mas infelizmente o que chegou a nós foram apenas 
alguns pergaminhos desta coleção de escritos e somente a tradição escrita. 
Os tibetanos nos oferecem ainda esta tradição viva, e certamente é possível 
aprender estes métodos (Veja: "Debate com o Dalai Lama: o budismo diante 
da ciência", em Thot # 58, 1992) 
 Na tradição ocidental Apuleius
3
 , o filósofo platônico, menciona sobre 
o antigo manual usado pela igreja cristã Ars Moriendi (um guia que o 
sacerdote usava para guiar o indivíduo na sua viagem pos mortem) e afirma 
em sua Metamorphoses (XI, 23): 
 
Eu fui para os confins da morte. Eu caminhei 
o umbral de Proserpine [na dimensão dos 
mortos]. Eu nasci através de todos os 
elementos, e retornei à Terra outra vez. 
 
 No entretanto, os antigos manuais ocidentais, a maioria perdidos 
atualmente, pouco ou quase nada oferecem sobre os caminhos práticos da 
morte e estados de consciência experienciados durante e após a morte. 
 No momento atual as informações práticas sobre morte, morrer e pós-
morte, são praticamente desconhecidas pelo homem ocidental. 
 Uma pessoa pode tentar descobrir o que é morte de várias maneiras. 
Alguns procurarão na filosofia, religião, ler artigos e livros específicos e até 
farão perguntas. A ciência ocidental ainda não tem uma resposta sobre o que 
são exatamente os estados de consciência experienciados durante o 
momento da morte, e o que há depois da morte. Como a pessoa não pode 
encontrar uma resposta satisfatória, ela se fecha para esse assunto. 
 Em um nível consciente ou semi-consciente a pessoa começa a fazer 
uma fantasia negativa sobre o que vem após a morte. Por certas razões 
específicas as fantasias que desenvolvemos são negativas e não positivas. 
Estamos vivos agora. Eu estou aqui, você está aqui e quando estamos em 
uma comunidade (família, amigos, sociedade) onde vivemos, isto e as 
 
3
 Citado em Evans-Wentz (1968) cf. tradução para o inglês de H. E. Butler (Oxford, Clarendon Press, 
1910). 
pessoas à volta nos dá uma espécie de segurança. De repente, nesse 
ambiente humano alguém (mãe, pai, amigo, etc) morre. 
 Normalmente nos apegamos às pessoas e as coisas. Isto, 
automaticamente produz o medo de perda. Se pudéssemos ser mais realistas 
e lembrar que nada é eterno, então em vez de nos apegarmos e termos medo 
de perder aquilo ou aquele(a), usaríamos toda a nossa energia para estar aqui 
no presente desfrutando plenamente o que temos agora e nos dedicando com 
amor e sem apego às pessoas. Buda falou que "todo encontro é o começo de 
uma separação." Mas preferimos esquecer esta verdade e desfrutar a nossa 
ilusão nos protegendo com outra ilusão, o apego. Este apego nos faz criar, 
num nível semi-consciente a fantasia que aquele objeto, situação ou pessoa, 
é eterno. 
 Então a chegada da morte faz essa pessoa desaparecer de nossa 
proximidade e nós sentimos sua falta. Podemos perguntar: onde está essa 
pessoa? - "A morte a levou!" E como sentimos falta dessa pessoa e sabemos 
que ela nunca poderá voltar, então nós, semi-conscientemente ou 
inconscientemente, começamos a igualar morte com algo desagradável. 
Algo que traz sofrimento (a desagradável sensação da falta de um ente 
querido). Então começamos a fazer fantasias negativas sobre a morte. À essa 
altura consideramos a morte como algo ruim, como um inimigo, pois sem 
aviso prévio ela pode levar uma pessoa amada, um amigo, um parente... Até 
mesmo nós à qualquer momento!! Dessa maneira começamos então a 
classificar a morte como um acontecimento negativo. 
 Quando não somos capazes de entender e compreender essa morte no 
nosso contexto de vida diária (num nível comum de realidade ordinária) 
começamos a afastar essas idéias para longe de nossa mente consciente (isto 
é, reprimir). E é assim que nasce um tabu. 
CRISE EXISTENCIAL E PSICOSE SENIL 
 
 O tabu nos encoraja a evitar o assunto da morte e a agarrar aquilo que 
cremos ser vida. Nos apegamos cada vez mais aos bens materiais e nos 
ligamos às situações emocionais. Tentamos reter e eternizar um mundo que 
é impermanente; tentamos fazê-lo estático e previsível de acordo com nossas 
expectativas, um universo que é essencialmente dinâmico. Isso, 
naturalmente, trará cada vez mais frustrações e aumentará nossos 
sofrimentos. Tentaremos cada vez mais negar a existência da morte, 
armazenando então dores e sofrimentos psicológicos futuros. Isso porque 
igualamos o que acreditamos ser morte biológica com destruição e total 
desaparecimento; e como não queremos desaparecer no vácuo porque não 
queremos perder nossa auto-imagem, então rejeitamos a morte, criando um 
tabu. O tabu se torna nossa "proteção contra morte". 
 Sufocando o pensamento de nossa morte, com o passar dos anos, 
chegará uma idade em que esse se tornará um problema sério. O medo que 
estava bloqueado (reprimido) dentro de nós começa a emergir pois, com a 
idade, não se pode escapar do fato de se estar, devagar e sempre, 
aproximando do dia dessa conseqüência final. Aqui nós precisaremos não 
apenas deixar o nosso tão amado corpo mas tudo de material e emocional 
que colecionamos durante toda a nossa vida. 
 Podem surgir dois problemas devido a negação da morte: entre os 35 
e 50 anos pode acontecer uma crise existencial (ela também pode acontecer 
mais cedo). Isto significa o momento na sua vida em que tudo o que você 
fez e adquiriu no passado, e aquilo que você irá fazer no futuro, não tem 
nenhum significado. Você se sente alienado. Coisas que anteriormente 
significaram algo para você perdem sua importância e você começa a se 
sentir como um robô. 
 A psicose senil é outro problema produzido por esta negação da 
existência da morte. Isso não é tão incomum como pode parecer. Quando o 
ser humano começa a se aproximar de uma certa idade, o que depende da 
cultura, a pessoa pode começar a ter idéias e formas de comportamento 
rígidos não conseguindo se adaptar à evolução natural de sua sociedade e, 
algumas vezes, até regredindo ao nível psicológico de uma criança pequena. 
Têm sido realizadas várias pesquisas dessa síndrome (psicose senil) e sua 
causa parece ser o medo da morte (Eissler, 1955; Christ, 1961; Gillespie, 
1963). 
 Se você pergunta a alguma pessoa se ela tem medo da morte, 
freqüentemente ela lhe dirá que não. Entretanto, aprofundando no assunto, 
descobrimos que a maioria das pessoas comuns temem a morte. E esse medo 
oculto é uma razão básica de muitos problemas ou sintomas que 
mencionamos aqui. 
 Quando temos medo, nós retrocedemos e nos fechamos. Fechar-nos, 
significa que de alguma forma nos desligamosdo mundo ao nosso redor. 
Nós ficamos bloqueados e, mais cedo ou mais tarde, vários problemas 
começam a emergir em nossas vidas. 
 Carregando em si o fantasma do medo da morte, a pessoa é sempre 
cautelosa demais. Isto não significa que esta pessoa está pensando na morte 
e a temendo o tempo todo. Bem ao contrário. Em um nível consciente, 
raramente aparece o pensamento da morte. No entanto isso é mostrado na 
vida de uma pessoa de várias maneiras. A pessoa perde sua criatividade, sua 
espontaneidade e se separa a si mesma de si e dos outros, tornando-se 
alienada. E um sintoma mais comum é ter medo de seres humanos. 
 Este fenômeno de ter medo de outros seres humanos é pouco 
conhecido na América Latina, exceto talvez em metrópoles bastante 
grandes; mas relativamente comum em grandes cidades da Europa. Na 
Finlândia, por exemplo, é um fenômeno tão comum em todo o país que na 
língua finlandesa existe uma palavra especial ("ihmispelko") para designar a 
experiência de ter medo de seu semelhante (independentemente se o mesmo 
é um membro de sua sociedade, um colega de trabalho, e, às vezes, até 
mesmo da própria família). 
 Isto parece ser um efeito colateral negativo das sociedades super 
industrializadas da Europa, o que certamente, acontece por causa dos meta-
modelos (filosofias) de realidade usados por estas sociedades. Meta-modelos 
existindo dentro de um quadro de referência materialista. 
 Em Tóquio, que é uma das maiores cidades do mundo, num país 
super-industrializado, não constatei nas pessoas o síndrome de "ihmispelko" 
(medo de seres humanos). Isto se deve possivelmente a que os meta-
modelos usados no Japão vem de religiões (v.g. Budismo) que têm técnicas 
práticas e efetivas para lidar com a existência da morte. 
 
A OUTRA FACE DA MORTE 
 
 Quando pensamos em morte, sempre pensamos em seu oposto: a vida. 
A vida para mim significa que eu estou aqui agora respirando e consciente 
do meu corpo e sentidos, e não estou morto. O que é vida para mim? Bem, é 
minha vida. O modo como pessoas no ocidente usualmente pensam da vida 
é de uma forma linear bi-dimensional: 
 
 
 VIDA MORTE 
 
 nascimento_ __ _ _ _ agora _ _ _ _ _ /..... morte.... 
 
 
 Eu nasci um dia, e esse dia é o começo da minha vida. Eu vivi tantos 
e tantos anos e estou com tal idade agora. Eu acho que vou viver mais 50 ou 
60 anos e depois eu vou morrer. Essa linha que se estende do meu 
nascimento até minha morte é minha vida. 
 Uma maneira simples mas bem inadequada de conceituar vida. A vida 
se torna algo consciente para você com o que você experiencia e se torna 
consciente; o que você basicamente classifica de bom ou mau. De alguma 
forma você tem um certo controle da vida. Mas não há um controle seguro 
da morte. Isso o deixa impotente diante da morte. 
 Por isso, sem nenhuma saída, nós escolhemos rejeitar e deixar para 
amanhã a existência da morte. Aqui, de uma maneira subconsciente, 
começamos a criar fantasias negativas sobre a morte. Porque de alguma 
forma consideramos que nossa vida não é uma linha se estendendo do 
nascimento até a morte mas ela certamente se estende além do nascimento 
(nós enterramos no nosso inconsciente nossas memórias perinatais) e morte. 
Muitas vezes isto nos faz ficar com medo da morte a qual agora para nós 
existe no futuro. Esse medo começa a afetar nossa vida. 
 Se você olhar para o que é realmente a morte em relação à nós seres 
humanos, você acabará perguntando o que é o ser humano. E, para usar um 
modelo muito simples, podemos dizer que para ser um ser humano você 
precisa ter um corpo humano, sentimentos (emoções) e uma mente. Desse 
modelo simples olharemos para um ser humano em relação à morte e 
morrer. O nível físico: Onde está a morte? Aqui e agora! Podemos verificar 
sua presença aqui e agora, porque sabemos que nosso corpo é composto de 
células, e, cientificamente, sabemos que agora mesmo essas células estão 
morrendo e novas células estão nascendo continuamente. Nesse caso, a 
morte não está no futuro mas aqui e agora; e sua presença em realidade faz a 
essência da vida, que é a transformação contínua de nosso corpo neste 
contexto de vida, morte e renascimento. Milhões de células morrem e outras 
nascem o tempo todo. Aqui nós damos conta de que a morte não está no 
futuro, mas aqui e agora. 
 Dessa forma, a morte não é um inimigo. Se as células não 
regenerassem nesse contexto fluente de morte-renascimento (o que acontece 
em nosso corpo agora mesmo), agora mesmo não estaríamos aqui. Pelo 
menos não nessa forma humana! 
 No nível emocional vemos que a morte está aqui agora e não no 
futuro. Nossos sentimentos mudam o tempo todo. Eles morrem e renascem. 
Lembre como seu sentimento era ontem à noite, ou essa manhã durante o 
café. Eles certamente mudaram e novos sentimentos nasceram de novo. 
 No nível intelectual, quando você pensa sobre suas idéias e ideais 
você nota que eles também mudam. Olhe seus ideais: Quais eram seus ideais 
10 ou 5 anos atrás, e quais são agora. Eles devem ter mudado de algum 
modo. Os pensamentos estão mudando quase constantemente, e sua mente 
experiencia um fluir de trans-formação de morte e re-nascimento. Dessa 
forma você pode notar que no nível intelectual a morte está aqui e agora, 
tanto quanto nos outros níveis. 
 
 
 
 
O CASO DE SAMUEL 
 
 Samuel é um homem de negócios, de 34 anos, que participou de uma 
workshop de três dias que dei na Venezuela. Durante este evento ele não 
falou uma única palavra, e após a workshop me solicitou uma sessão de 
terapia individual. 
 Fico sabendo que ele tem medo da morte, medo de pessoas 
desconhecidas, é alcoólatra e que o seu médico o diagnosticou com cirrose, 
informando-o que se ele continuar bebendo ele viverá no máximo mais seis 
mêses. Ao mesmo tempo Samuel apresenta um comportamento que 
aparentemente é paradoxal, ele tem fortes tendências suicidas. 
 Aqui decido usar com ele a técnica de Sonho Catártico Dirigido 
(DDC = Day Dream Catharsis). Esta é uma técnica que desenvolvi nos 
últimos quinze anos a qual leva a pessoa rapidamente às regiões mais 
profundas de seu inconsciente, facilitando, num espaço de tempo 
relativamente curto, descobrir as raízes de problemas importantes, que 
muitas vezes se situam num nível perinatal e transpessoal. O aspecto 
catártico desta técnica tem mostrado ser de grande benefício no processo de 
cura de problemas relacionados com morte, suicídio, severos casos de 
depressão e 'borderline' (veja: Matos, 1993). 
 
 A sessão acontece na casa de Samuel e peço à ele para deitar num 
sofá, fechar os olhos, e me contar sobre o seu medo da morte. 
 
S(amuel): Eu não sei o que falar... mas eu tenho medo de morrer. Meu medo 
de morrer é tanto que passo noites e noites com insônia. Eu tenho uma 
dificuldade muito grande para dormir. 
L(eo): Eu quero que você me fale mais sobre isto. 
S: Às vezes eu bebo um pouco mais e... ao mesmo tempo que tenho muito 
medo da morte sinto atração por ela. 
L: Quero que você me conte uma situação específica que ocorreu com você 
onde você sentiu medo da morte e ao mesmo tempo vontade de morrer. 
S: Eu não consigo me relacionar bem com os outros. Tenho muitos poucos 
amigos e o único lugar em que sinto alguma satisfação é em meu escritório 
fazendo os meus negócios e os meus projetos. Mas mesmo tudo isto, muitas 
vezes, me parece vazio demais. 
 Na semana passada dei uma festa no meu apartamento, e para me 
sentir mais à vontade comecei a beber, uma vez mais, a beber 
excessivamente. Depois de várias doses de whisky e de conversar com 
várias pessoas, comecei a sentir vontade de morrer. Meu apartamento é um 
triplex no vigésimo quinto andar, e estávamos bebendo no terraço. Então, 
como já fiz antes, deitei na amurada esperando talvez que algo acontecesse e 
eu caísse lá embaixo. 
L: E o que aconteceu? 
S: Nada. É sempre assim, eu nãoentendo, ao mesmo tempo que tenho muito 
medo da morte é como se algo me atraísse para morrer. 
L: Agora eu quero que você descreva para mim no tempo presente o que 
você acaba de me contar. 
 
 Samuel descreveu novamente a sua experiência da festa e quando 
chegou ao ponto em que estava deitado na amurada, bêbado, lhe instruí: 
 
L: Agora, eu quero que você faça a fantasia que você não volta à festa mais 
que algo acontece e você realmente cai desta amurada. 
S: Meus amigos estão conversando em voz alta, ouço o som da música, e me 
sinto muito cansado de minha vida. Tudo é tão vazio! Nada me traz alegria 
ou felicidade. Mesmo tendo e ganhando muito dinheiro isto não me dá mais 
nenhuma satisfação. Eu gostaria de morrer... Agora eu sinto que estou 
perdendo o equilíbrio aqui no alto desta amurada e, agora... estou caindo no 
espaço! 
 
 Samuel se vê chocando contra o asfalto e experienciando sua própria 
morte. Ele se sente agora flutuando acima de seu corpo, começando 
lentamente a flutuar para cima. Quando no ar, vendo a cidade de Caracas lá 
embaixo iluminada, ele olha para cima e vê uma estrela muito grande e se 
sente atraído por esta luz brilhante. Em seguida sente que está voando com 
uma velocidade muito grande em direção à esta estrela dourada. 
 Ele está se aproximando cada vez mais desta estrela, e se 
transformando a si mesmo nesta luz. Após aproximadamente um minuto 
peço a Samuel para fazer a fantasia que ele se transforma num raio de luz 
desta estrela. Samuel sente que agora ele é um raio de luz dourada neste 
espaço infinito. Samuel diz que agora se sente leve e feliz sendo um raio de 
luz. 
 Esta experiência de morte-e-renascimento psicológico do ego é uma 
experiência que leva a pessoa à um espaço transpessoal de grande poder. 
Samuel agora deixou de existir como uma pessoa (ego) e seu medo de morte 
agora desapareceu; ele é simplesmente um raio dourado de luz no espaço. 
 Samuel se sente bem agora porque psicologicamente morreu para seu 
antigo ego (auto-imagem) que era o agente principal criando aquela situação 
específica de medo da morte, e renasceu como este raio de luz. 
 A tendência suicida era uma forma inconsciente que Samuel usava 
para matar o seu ego e renascer psicologicamente como uma nova pessoa. 
A estrela (que é um sol) representa na simbologia do inconsciente coletivo 
transpessoal a vida, o pai, o elemento masculino de poder. Samuel morreu 
psicologicamente e agora está retornando à vida (a estrela, o sol), e quando 
peço a ele para se transformar neste raio de luz da estrela, é para Samuel 
transcender o dualismo entre ele mesmo (sua auto imagem) e a vida, uma 
nova vida de luz e calor. Esta luz é em seguida integrada ao corpo e à esta 
existência pessoal de Samuel. 
 A parte mais importante é a integração da experiência transpessoal 
aqui e agora, neste corpo onde Samuel existe nesta vida específica, nesta 
realidade ordinária e social de cada dia. O objetivo desta integração é duplo. 
Primeiro, ele representa o fechamento de um círculo ou gestalt muito 
importante na vida de Samuel. Isto o levará à um sentimento de bem estar, 
de equilíbrio psicológico. Segundo, o objetivo da experiência transpessoal 
deve ser o de enriquecer nossa vida, integrando o nível transpessoal ao nível 
pessoal. 
 
L: Sendo este raio de luz dourada você pode viajar para qualquer parte do 
universo, e agora você está viajando a uma grande velocidade para o planeta 
Terra. Você está se aproximando da Terra e agora está entrando no topo 
desta cabeça (aqui, suavemente coloco a mão no topo da cabeça de Samuel 
para que ele possa outra vez se conscientizar de seu corpo aqui e agora). 
Você entra na cabeça e lentamente vai enchendo o corpo com esta luz muito 
bonita.(...) Você sente o corpo agora cheio com esta luz dourada? 
S: Sim. 
L: Como você se sente agora quando o seu corpo está cheio com esta luz 
dourada. 
S: Muito bem. 
L: Agora quero que você, lentamente, abra os olhos e olhe aqui para mim. 
Como você se sente agora? 
S: Muito bem. 
L: O que você sente pela morte agora? 
S: Bem. 
 
 Em seguida Samuel fechou os olhos e dormiu profundamente por 
aproximadamente uma hora. Eu me mantive sentado ali ao lado de Samuel, 
e, quando ele, naturalmente acordou, me disse que fazia anos que não tinha 
um sono tão profundo e reparador como aquele. 
 Na semana seguinte Samuel viajou para Helsinki, onde ficou durante 
um mês se submetendo à um tratamento psicoterapêutico transpessoal 
intensivo comigo. 
 Ele se mostrou um cliente extremamente dedicado e no fim deste 
intensivo período de psicoterapia transpessoal voou para Nova York com 
sua esposa para passar uma semana de férias antes de retornar a Caracas. Ele 
se sentia agora livre de seu problema de alcoolismo e vários outros 
problemas secundários. 
 Samuel foi um caso extremamente interessante, tendo o mesmo 
experienciado durante um único mês de terapia, o que talvez alguma outra 
pessoa experienciaria em dez ou quinze anos de terapia convencional. 
 Pedi a ele para me telefonar de Nova York e depois, pelo menos uma 
vez por semana, de Caracas. Achei importante que ele mantivesse este 
contato comigo, pois não tinha certeza de que ele seria realmente capaz de 
se manter totalmente afastado do álcool. 
 Samuel nunca me telefonou, escrevi para ele mas não respondeu. Fiz 
a fantasia que ele tinha continuado a beber e que o prognóstico de seu 
médico tinha se materializado. Para minha surpresa, dois anos depois recebi 
uma longa carta de Samuel me informando que ele não apenas tinha parado 
de beber mas que havia encontrado um novo significado na sua vida. Ele 
contava que antes só pensava em ganhar mais e mais dinheiro, e não se 
interessava pelos outros seres humanos, e que agora ele havia encontrado 
um caminho espiritual. 
 Muitas vezes, aquilo que tememos é aquilo que desejamos. Como 
podemos então temer a morte e concomitantemente desejá-la? Uma 
resposta simples seria porque a morte tem várias faces. E destas faces a que 
parece mais ameaçadora é a morte psicológica. E, apesar de que isto possa 
parecer um paradoxo, o que mais desejamos é exatamente esta morte 
psicológica (Matos, 1980). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONCLUSÃO 
 
 Existem dois tipos de morte: morte biológica e a que você imagina 
no futuro e que causa medo da morte, limita você, aliena você e faz você ter 
medo de outros seres humanos. 
 Você está mais vivo quando está feliz e você está totalmente vivo 
quando você permite vida e morte fluírem naturalmente em sua sinfonia de 
ser. Assim você é um ser integrado, mutante e fluindo, que experiencia um 
estado de harmonia e PAZ. 
 Para que isso possa acontecer, a morte, que tem sido como um 
inimigo a te esperar numa esquina mais escura da vida, deve se tornar uma 
amiga. Desta maneira o inimigo que era potencialmente destrutivo agora se 
torna um amigo e professor. 
 Uma vez no Himalaia, em um lugar de extrema beleza, na vila 
Tibetana de Dharamsala, eu conversava com alguém sobre morte e vida 
quando uma criança que estava me ouvindo me disse: 
 "O erro é meu professor 
 a morte minha companhia 
 a vida é meu guru". 
 (S.V.M.) 
 
 Da sabedoria natural de uma criança podemos re-aprender sobre um 
aspecto natural da existência: quando você aceita seus erros como 
professores (ou dádivas) e tem a morte como companhia, então sua vida será 
integrada (ou re-integrada) e você será capaz de ouvir sua própria sabedoria 
natural. 
 Tradução: Ilanise Míriam 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
CHRIST, A. E., Atitudes em Relação à Morte dentro de 
 um Grupo de Pacientes Geriátricos Psiquiátricos. 
 Jornal de Gerontologia, 16, 1961, 56-59. 
 
EISSLER, K. R., O Psiquiatra e o Paciente Terminal. 
 Nova Iorque: International University Press, 
 1955. 
 
EVANS-WENT, W. Y., The Tibetan Book of the Dead. 
 Oxford: Oxford University Press, 1968.GILLESPIE, W. H., Alguns Fenômenos Repressivos 
 em Idade Avançada. Jornal Britânico de 
 Medicina e Psicologia, 36, 1966, 203-209. 
 
MATOS, L., As Raízes da Depressão em uma crise 
 suicida: Uma Abordagem Transpessoal. 
 Suplemento de Psiquiatria Fênica 1980. 
 Procedimentos do Simpósio pela Secção de 
 Psicopatologia Clínica da Associação 
 Psiquiátrica Mundial. Helsinki, 1980. 
 
MATOS, L., Psicologia da Morte: 
 Abordagem Oriental e Ocidental. 
 Em: A morte e seus destinos. Paris: Prajna 1987. 
 
MATOS, L., Day Dream Catharsis. 
 Trabalho apresentado no Congresso 
 Internacional do Processo de Cura: Mais 
 Além do Sofrimento e da Morte. 
 Montreal, Junho, 20-23, 1993.

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