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O Meio Ambiente e a Humanidade Claudia de Alcantara Peres 1ª Edição |Setembro| 2013 Impressão em São Paulo/SP Catalogação elaborada por Glaucy dos Santos Silva - CRB8/6353 O Meio Ambiente e a Humanidade Coordenação Geral Nelson Boni Professor Responsável Claudia de Alcantara Peres Coordenação de Projetos Leandro Lousada Revisão Ortográfica Vanessa Almeida Projeto Gráfico, Dia- gramação e Capa Ana Flávia Marcheti 1º Edição: Setembro de 2013 Impressão em São Paulo/SP P437d Peres, Claudia de Alcantara. O meio ambiente e a humanidade. / Claudia de Alcantara Know How, 2013. 116 p. : 21 cm. Inclui bibliografia ISBN : 1. O meio ambiente. 2. Humanidade. 3. Educação ambiental. 5. Conflito socioambiental. I. Título. CDD 344.046 3 APRESENTAÇÃO Neste livro, abordaremos temas importantes para o estudo e compreensão do Direito Ambiental. Partindo da conceituação, analisaremos a evolução da relação homem/meio ambiente e os aspectos harmônicos e conflituosos que têm origem nesta re- lação. Avançaremos aos dias atuais, trataremos da le- gislação específica e sua aplicação a casos concretos especialmente trazidos a este trabalho como referên- cia da orientação da jurisprudência mais recente. Não obstante a relação homem/meio ambiente remonte a tempos imemoriais, a legislação ambien- tal brasileira e a chegada desta matéria à discussão nos Tribunais Superiores são fatores relativamente recentes e que, tanto mais por isso, merecem análise criteriosa e detalhada. Esperamos que ao final deste curso tenhamos despertado em cada um dos alunos o interesse ver- dadeiro pelo meio ambiente e sua preservação, e for- necido alguns instrumentos para a sua defesa, dentro e fora dos Tribunais. Sumário Capítulo 5 - Construção social do espaço. Capítulo 6 - - Conflitos socioambientais e diversidade de práticas culturais, manejo am- biental e construções da realidade social. 6.1- Diversidade de práticas culturais, manejo ambiental e construções da realidade social. Gabarito Referências .7 .19 .33 .47 .55 CONSTRUÇÃO SOCIAL DO ESPAÇO 5. Cada um de nós compõe a sua história, e cada ser em si carrega o dom de ser capaz, e ser feliz. Conhecer as manhas e as manhãs o sabor das massas e das maçãs, é preciso amor pra poder pulsar, é preciso paz pra poder sorrir, é preciso chuva para florir.50 Toda forma de vida acontece, se desenvolve e evolui inserida em limites espaciais. Espaço e tempo são fatores determinantes na evolução das espécies, e os primeiros conceitos abs- tratos apreendidos pelo homem. Tudo o que existe ou acontece situa-se em tempo e espaço determina- dos, sem identificar esses parâmetros não é possível a compreensão de qualquer acontecimento pela ra- zão humana. Mesmo no momento atual, em que se vivencia 50 parte da letra de” Tocando em Frente’, música de autoria de Almir Sater e Renato Teixeira 8 a rápida e eficaz troca de informações, a transferên- cia em tempo real de dados e tecnologias, questões ligadas a humanização do espaço precisam ser consi- deradas para a compreensão da relação homem/meio ambiente em seus aspectos cultural, social e econômi- co, específicos e diferenciados, caso a caso. A forma como o espaço é ocupado, os valores e as experiências ali vivenciados pelo grupo que o habita é o que o torna um “lugar” ou um território, um espaço humanizado e identificado, caracterizado de maneira íntima pela evolução da relação homem/ meio ali estabelecida. Assim, importa resgatar a his- tória da ocupação de determinado lugar para com- preendê-lo em seu momento atual. A construção social do espaço acontece a partir da experiência e percepção da comunidade instalada de modo estável; a identidade do grupo tem um de seus alicerces na identidade com lugar51 ou território que por ela ocupado. A geografia vincula espaço e tempo às condi- ções históricas, econômicas, culturais, sociais, polí- ticas, físicas que passam por mudanças, adaptações e se transformam, interferindo de forma direta no desenvolvimento de determinado local e no que en- tendemos por identidade cultural. Voltando um pouco neste texto, tratamos das 51 assim a casa, o bairro, a cidade, o país. 9 mudanças provocadas no ambiente pela Revolução Industrial na Europa do século XVIII e o conse- quente crescimento das cidades e da população ur- bana, para o que se tornou necessário transformar as cidades em espaços funcionais e limpos, construir moradias, calçar ruas, providenciar o tratamento de água e esgotos. Voltando um pouco mais, se consi- derarmos o início da evolução humana, poderemos perceber como a fixação do homem em determina- do espaço físico influiu de maneira decisiva na evo- lução e perpetuação da espécie e como esta, em con- trapartida, influiu de maneira decisiva na construção do espaço. Como já dissemos outras vezes, a relação ho- mem/meio ambiente é íntima, e inafastável. É fundamental considerar o espaço como o palco da evolução da espécie humana. As relações vivenciadas mantém o indivíduo seguro ou não, confortável ou não, e é através destas experiências que se poderá tornar afetivamente ligado a um de- terminado lugar. Esta identificação, assim entendido o processo de construção da significação, o levará a cuidar e preservar, ou não, o espaço que ocupa. Se na Pré-História a preservação da espécie humana esteve intimamente ligada com sua fixação no solo, para o homem moderno o espaço que ocupa é fator de segurança e estabilidade emocional. Podemos concluir que o “sentimento de per- 10 tencimento a um determinado lugar constrói uma introspecção de valores que condiciona o modo de vida dos indivíduos”, como formulou Milton Almei- da dos Santos, em sua obra “A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção”52 . Aqui, tratamos território, ou lugar, como o espaço físico delimitado, ocupado por determinada população que se identifica e interage dentro de padrões culturais, sociais, econômicos e éticos construídos a partir desta convivência cotidiana. A partir da análise das relações interpessoais mantidas, e destas com o meio, a distri- buição do acesso e forma de destinação dos recursos, a cooperação e solução de conflitos, o conceito de terri- tório deve ser construído e compreendido. Assim, o lugar é produto das relações concretas entre homens e natureza e entre homens e grupos sociais, em um panorama que se pretende estar equi- librado por vínculos de identidade e solidariedade. Na atualidade, o espaço físico da maioria dos Estados está quase que totalmente dividido entre áreas rurais e urbanas, com restritas zonas de tran- sição. Questões ambientais prementes têm origem nesta apropriação do espaço, na intervenção do ho- mem sobre a natureza para a urbanização frenética do espaço. Aqui, propositadamente, usamos o termo “apropriação”, e não “humanização” do espaço. 52 4ª ed. Edusp, 2003 11 Em grandes centros urbanos quase não é per- ceptível a identificação da comunidade com o lugar que ocupa; o crescimento desordenado aumenta dis- tâncias e retira do indivíduo a possibilidade de criar vínculos afetivos com a cidade em que mora. As po- líticas governamentais que num passado recente im- pulsionaram o movimento habitacional em direção à periferia fizeram do trajeto casa-trabalho um longo e cansativo percurso, percorrido com a utilização de meios de transporte poluentes (automóveis e ôni- bus) ou construídos ao custo de grande impacto am- biental e social (trens de superfície ou subterrâneos). Assim, o trabalhador comum sai de casa mui- to cedo e retorna tarde da noite, não vivencia seu bairro ou sua comunidade, não cria os vínculos que o conduziriam a um comportamento de cuidado e zelo com o ambiente que o cerca, enfim, não per- cebe a cidade como o “seu lugar”. Não se verifica a efetiva construção social do espaço, teoricamente,considerado o espaço como base da vida cotidiana e da sociabilidade entre os membros da comunidade. Além das áreas periféricas das grandes cidades, ocupação de áreas que deveriam estar sob proteção e preservação ambiental, mananciais e encostas, por exemplo, é também um dos tentáculos desse polvo chamado crescimento urbano desordenado. Num primeiro momento, se instala na encosta um pequeno grupo de famílias, que constrói barra- 12 cos simples, “puxam” a energia, usam rios e córregos como fonte de água. Em pouco tempo, estará instala- da uma comunidade maior, serão observadas crianças brincando despreocupadamente, estarão construídas casas de alvenaria edificadas sem qualquer qualidade técnica e com uso material improvisado, que, talvez, venham abaixo no período de chuvas, aumentando as estatísticas dos desastres ambientais. Antes que um leitor mais atento nos questione, é importante informar que há, e não são poucas, leis e normas que regulamentam a ocupação e uso do solo, bem como o uso social da propriedade, estabelecem políticas públicas e de planejamento urbano, definem e penalizam a prática de crimes ambientais53. A sua aplicação, controle e a fiscalização de seu cumprimen- to são os pontos de fragilidade a serem considerados na análise da realidade fática; papéis que cabem, prio- ritariamente, ao estado, como agente regulador das relações sociais e titular do poder de polícia. A título de ilustração, em março de 2013, em Petrópolis, região serrana do estado do Rio de Janei- ro, morreram 33 (trinta e três) pessoas em decorrên- cia de deslizamento de terra causado por temporais. Serenada a chuva, a defesa civil do município, em sobrevoo da área atingida, identificou 15 mil famílias que permaneciam em áreas de risco, além de 1064 53 a começar pelo Capítulo VI – do Meio Ambiente, da Constituição Federal de 1988. 13 (um mil e sessenta e quatro) desalojados. Se conside- rarmos a família mediana que compõe a classe traba- lhadora brasileira, composta por 5 (cinco) pessoas, estamos falando de pelo menos 70.000 pessoas mo- rando em condição de risco nas encostas do estado. Em contrapartida, o mercado imobiliário bra- sileiro investe cada vez mais intensamente na cons- trução de conjuntos habitacionais de alto padrão, localizados na “periferia chique”, bairros afastados dos centros urbanos e cidades que integram regiões metropolitanas, planejados e construídos com toda a infraestrutura cuidadosamente destinada ao bem- -estar de famílias ricas. Nestes “condomínios” hori- zontais, a construção de vias de acesso, ruas e praças, serviços de iluminação, coleta de resíduos sólidos e segurança são custeados e controlados por iniciativa de administradores e proprietários dos imóveis. A usual existência de bloqueios, barreiras e controles de acesso torna privado o que seria, em tese e por definição legal, público. Coisa parecida acontece em diversas praias do litoral brasileiro. Estamos tratando, vale frisar, de populações de cidades territorial, social e economicamente próxi- mas, localizadas no estado do Rio de Janeiro. As cidades precisam crescer, o desenvolvimen- to econômico produz geração de emprego e ren- da, aumento da produção de alimentos e bens e do consumo, e novas demandas. Fazê-lo com vistas à 14 melhoria da qualidade de vida das populações é fazê- -lo de forma sustentável54. O planejamento político e social precisa ser direcionado para estabelecer as prioridades locais, o uso adequado do solo, a preser- vação de áreas verdes e margens de rios urbanos, a instalação de sistemas de infraestrutura que estimu- lem o uso de meios de transporte público e a redução do tempo de descolamentos, a eficiência energética, a coleta seletiva de resíduos sólidos, a valorização da vida em comunidade.55 Neste cálculo estão considerados o tempo im- produtivo despendido em deslocamentos, o gasto de combustíveis, acidentes entre veículos e gasto médi- cos com vítimas, gastos com saúde pública. Considerando um dia normal e sem inter- corrências (engavetamentos ou acidentes graves, chuvas atípicas, desabamentos), a malha viária mal distribuída e sem manutenção, o transporte coletivo de má qualidade, uso excessivo de veículos particu- lares, envelhecimento da frota, falhas no sistema de coleta de resíduos sólidos, enchentes e alagamentos, são agentes suficientes para a apuração dessas per- das e velhos conhecidos dos moradores das capitais e grandes cidades brasileiras. Neste cálculo estão considerados o tempo im- produtivo despendido em deslocamentos, o gasto de 55 Revista Valor Setorial, novembro 2010; Valor Econômico S.A. 15 combustíveis, acidentes entre veículos e gasto médi- cos com vítimas, gastos com saúde pública. Considerando um dia normal e sem intercor- rências (engavetamentos ou acidentes graves, chuvas atípicas, desabamentos), a malha viária mal distri- buída e sem manutenção, o transporte coletivo de má qualidade, uso excessivo de veículos particulares, envelhecimento da frota, falhas no sistema de cole- ta de resíduos sólidos, enchentes e alagamentos, são agentes suficientes para a apuração dessas perdas e velhos conhecidos dos moradores das capitais e grandes cidades brasileiras. É preciso repensar as cidades, para restabelecer a intimidade e o vínculo de afetividade/identidade entre estas e seus moradores, as autoridades públicas e funcionários. Buscar restaurar a civilidade, consi- derada a origem semântica do termo, como objetivo de políticas públicas é uma maneira eficiente de con- tribuição para a mudança de comportamentos em direção ao desenvolvimento sustentável das cidades. 16 ATIVIDADES 1. Que definição de território é adotada no texto? 2. Em que medida o crescimento urbano de- sordenado interfere no conceito de construção so- cial do espaço?. 3. Que medidas políticas podem ser adotadas como meio de estimular o desenvolvimento susten- tável das cidades? 4. De que forma os congestionamentos afe- tam a economia das cidades? 5. Defina civilidade. CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS 6. Há mais de 400 milhões de anos, plantas vasculares fotossintetizadoras e multicelulares começaram a aderir às margens dos continentes. Logo esses orga- nismos cobriram as costas rochosas, desaceleraram o fluxo das águas, formaram solos e avançaram para o interior. Formaram-se radículas absorventes de nu- trientes, estames se achataram em folículos que cap- tavam a luz solar e sementes substituíram esporos como agentes de dispersão. Há uns 40 milhões de anos, algumas delas conseguiram um tipo especial de ramificação – não mais se bifurcando, um ramo se converteu em um estame principal e depois, quando se desenvolveram vasos para transportar água para cima e nutrientes para baixo, em um tronco. Dessa forma, escaparam da competição ao nível do chão pela luz solar e ganharam um grau de imunidade con- tra a predação animal. Surgiram as primeiras florestas. A arborescência, contudo, significava também mor- talidade: quando essas plantas se transformaram em 20 árvores, abandonaram forçosamente a reprodução vegetativa através da propagação da raiz. Por fim em pé, tornaram-se, tanto trágica quanto triunfantemen- te, indivíduos - em sua concepção, suas lutas pela vida e sua morte.56 A origem do conflito retorna à origem da vida, à luta pela sobrevivência e liderança do grupo. Em muitos momentos da evolução das espécies, rivalida- des e conflitos eram resolvidos em confrontos vio- lentos. Os motivos, geralmente, eram disputas por alimento, território ou por uma fêmea, a proteção da prole etc. Restrita a análise à visão científica, a competi- ção que gera os conflitos entre membros da mesma espécie ou de espécies diferentes é muito bem-vinda, porque favorece o processo evolutivo, fazendo pre- valecer os seres ou indivíduos mais bem adaptados ao ambiente. No mundo moderno, osconflitos, em regra, são resolvidos por uso de outras forças que não as físicas, não obstante tenham a mesma causa original: o embate entre interesses distintos. Não é razoável pensar numa sociedade real em que não sejam pro- duzidos conflitos, posto que é da essência da natu- 56 Warren Dean, in “A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica Brasileira”. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. p.34 21 reza humana a defesa de seus interesses pessoais em detrimento de outros que não estejam em conformi- dade com estes. Todas as relações humanas, sem nenhuma ex- ceção, sejam privadas ou públicas, estão sujeitas a desencadear conflitos. A questão ambiental ganha dimensão no Brasil, mais intensamente, a partir do final da década de 1970, em harmonia com movi- mentos sociais e políticos impulsionados pela defesa do projeto de redemocratização do país. Em partes diversas do mundo, a crescente luta social pela defesa dos direitos humanos envolve a de- fesa do meio ambiente como uma de suas bandeiras. A realidade da degradação ambiental e a neces- sidade de mudanças políticas, sociais e comporta- mentais que considerem a necessidade de preserva- ção e recuperação do meio ambiente, trazem a ques- tão do desenvolvimento econômico sustentável para a pauta da discussão internacional. Neste primeiro momento, prevalecem no Bra- sil, de forma inquestionável, os interesses econômi- cos ainda na esteira da ressaca do “milagre econômi- co” da década de 1970 e da retração da economia na década seguinte; o crescimento médio do PIB bra- sileiro que girava em torno de 7% caiu para menos de 2% ao ano; além disso, as taxas internacionais de juros fizeram crescer o endividamento externo do país e o déficit público. 22 Nesse cenário de limitações econômicas, políti- cas e sociais em que o Brasil esteve envolvido, a ques- tão ambiental ganha defensores a partir de sua incor- poração no discurso do “politicamente correto” já em voga no exterior no início da década de 1990. Manejo sustentável, racionalidade econômica, consenso, res- peito e comprometimento com as gerações futuras, são termos comuns neste novo discurso. Eventos e conferências mundiais apresentam os primeiros critérios de caráter ambiental a serem observados em contratos internacionais, precurso- res do ISO 14000, concebido e definido em 1993 pela International Organization os Standardization, que estabelece padrões para gestão ambiental a se- rem observados por empresas e governos. A cer- tificação ISO é um atestado de responsabilidade ambiental reconhecido por organismos nacionais e internacionais e deve ser renovado periodicamen- te, depois da reavaliação da atividade econômica e a análise criteriosa sobre o efetivo cumprimento de legislação ambiental, diagnóstico atualizado de im- pacto ambiental de cada atividade e a eficiência de procedimentos para sua eliminação ou diminuição, além disso, o treinamento e qualificação de pessoal. Vale observar que toda e qualquer atividade econômica produz algum tipo de impacto ambien- tal e não é razoável pretender estancar ou impedir o crescimento econômico das nações, daí a importância 23 de encontrar meios eficazes de minimizar os efeitos nocivos ao ambiente que, necessariamente, serão cau- sados pela produção industrial, atividade essencial ao desenvolvimento da economia mundial. Quanto mais intensa a atividade econômica, mais necessária a ado- ção de medidas de proteção do ambiente. A promoção de práticas direcionadas ao de- senvolvimento econômico sustentável tem recebido incentivos financeiros e técnicos de governos e or- ganismos internacionais de maneira bastante intensa nos últimos 20 anos. Parece já estar consolidado o entendimento de que apenas agindo nesta direção, se tornará viável garantir recursos naturais essenciais para a sobrevivência das gerações futuras; a partir da construção de uma estrutura social e econômica que garanta o equilíbrio entre a produção e o consumo de recursos naturais. Assim, é de império viabilizar a “exploração equilibrada dos recursos naturais, nos limites da sa- tisfação das necessidades e do bem-estar da presente geração, assim como de sua conservação no interes- se das gerações futuras.”, definição de sustentabili- dade proposta por José Afonso da Silva.57 É importante sempre lembrar que nenhuma mudança efetiva de comportamento será alcança- da sem a avaliação de questões econômicas, sociais, 57 Direito ambiental constitucional. 4ª Ed. São Paulo. Malheiros, 2003. 24 políticas, culturais e éticas que estão intrinsecamen- te ligadas ao desenvolvimento das nações. Estas questões são geradoras de conflitos ditos socioam- bientais. Conflitos instalados pela diversidade de in- teresses de grupos sociais que tenham origem nas inter-relações entre sociedade – elemento que pode entendido e delimitado territorialmente – e o meio ambiente – elemento ilimitado (ao menos em tese), extraterritorial e transnacional. Vale ressaltar que variações climáticas alcançam todo o planeta, o impacto ambiental de desastres recen- tes ultrapassou, em muito, os limites geográficos dos paí- ses em que se deu o “epicentro”, e que o meio ambiente, em sentido amplo, é patrimônio da humanidade. Questões ambientais alcançam parâmetros glo- bais e exigem soluções que não podem ser alcança- das por ações políticas isoladas. A abordagem de conflitos socioambientais deve ser feita a partir da avaliação das causas sociais e naturais (biofísicas), como se fosse o meio ambien- te um agente real e capaz, com intenção e interesses. Deste contraponto nasce o equilíbrio necessário ao entendimento do conflito e propositura de soluções viáveis e exequíveis. É o que a doutrina conceitua como “abordagem ecológica”. O meio ambiente tratado como entidade tem uma história que precisa ser conhecida e analisada, tempo de existência, evolução, ciclos, alterações 25 de “comportamento” que podem ser causadas por razões diversas (terremotos, desertificação, degra- dação), e mostra-se, no momento atual, com carac- terísticas que refletem as mudanças e adaptações vivenciadas. Assim, o ambiente tem parte ativa no conflito, tem razões e justificativas que devem ser consideradas e avaliadas. Identificar o foco do conflito e seus reflexos principais é o ponto de partida para compreender sua dinâmica. Usualmente, são consideradas 3 (três) prin- cipais causas geradoras de conflitos socioambientais, que podem, ou não, ultrapassar barreiras territoriais: 1. o controle sobre recursos naturais – petróleo ou ouro, a exploração e pesquisa em áreas de florestas, ocupação irregular do solo, por exemplo; 2. impactos sociais e ambientais gerados pela ação hu- mana – contaminação de recursos hídricos, poluição, construção de grandes obras de infraestrutura, ou por desastres ambientais de grandes proporções; 3. valores culturais e étnicos – caça de elefantes para extração de marfim, na África, e a utilização de carne de cachorro como alimento em comunidades orien- tais são bons exemplos. Em qualquer caso, identificada a causa do con- 26 flito, é necessário identificar e qualificar as partes nele envolvidas, conhecer suas razões, intenções e reivindicações, pesquisar as origens históricas e fun- damentos de tais posturas e entendê-las justificadas, ou não, compreender as forças políticas e econômi- cas envolvidas na crise. Cada conflito tem dinâmica própria, compreen- dê-la é essencial para a formulação de propostas de solução pacíficas, exequíveis e viáveis. No mais das vezes, a avaliação de aspectos puramente técnicos e legais não é suficiente para uma adequada interpre- tação, tanto mais se está em pauta um conflito que ultrapassa fronteiras territoriais. Para uma correta ava- liação precisam ser considerados aspectos históricos, sociológicos, antropológicos, econômicos epolíticos. É interessante citar o caso das comunidades quilombolas no Brasil. Apenas no estado de São Paulo existem mais de 35 comunidades, concen- tradas prioritariamente entre o Vale do Ribeira e o Litoral Norte do estado. Até 2007, apenas 5 (cin- co) comunidades haviam recebido os títulos de suas terras, não obstante a Constituição Federal de 1988 haver garantido aos remanescentes das comunidades o reconhecimento da propriedade e determinado a outorga do direito sobre as terras ocupadas58. 58 Art. 68 das ADCT; o procedimento é regulamentado pelo Decreto n.4887/2003 27 Este exemplo demonstra, assim, que nem sem- pre o conflito socioambiental é vivenciado e solucio- nado entre aqueles que lhe deram causa. Notícia publicada no jornal O Estado de São Paulo, de 25 de abril de 201359, informa a atualiza- ção dos padrões de qualidade do ar no estado. De acordo com a nota, o governo paulista, por decre- to, reduziu os padrões considerados adequados para oito tipos de poluentes atmosféricos, entre eles, o monóxido de carbono, os materiais particulados e o ozônio. A última atualização de padrões havia sido realizada em 1990, mais de 20 anos atrás. O professor Paulo Saldiva, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, ouvido pela reportagem, informa que a cada ano, 4 mil pessoas morrem na capital paulista por causa dos efeitos no- civos da poluição. Nesta matéria, estão bastante evidentes os muitos aspectos envolvidos no conflito socioam- biental, posto: a poluição atmosférica das grandes cidades, causada em grande parte pela queima de combustível de automóveis, está intimamente liga- da à economia em crescimento (que financia o au- mento da produção de veículos automotores e do poder aquisitivo e acesso a crédito da população), à deficiência e sucateamento da frota do transporte 59 caderno Metrópole, pag. A3 28 público, ao tráfego intenso gerado pelo aumento da frota particular, à falta de ofertas de trabalho bem remunerado em locais mais afastados dos centros urbanos, à falta de projetos sociais que estimulem o uso compartilhado de veículos, à carência de ci- clovias, à insegurança e violência em ascensão nas grandes cidades (que desestimula a população da fa- zer pequenos trajetos a pé), são alguns dos inúmeros fatores que contribuem para a exagerada poluição atmosférica que se verifica na capital paulista. Como se pôde perceber, conflitos socioam- bientais têm causas múltiplas, que exigem soluções de amplo espectro. Vale considerar que há diversos estudos em an- damento e projetos a serem implantados para minimi- zar e reduzir os impactos ambientais já evidentes nas grandes cidades. Novos projetos e políticas públicas, porém, não devem ser pensados na perspectiva de re- dução de impactos, mas sim na prevenção deles. Saindo do ambiente urbano, diversas atividades agroeconômicas são nascedouro de conflitos entre grupos sociais e econômicos. Se a análise seguir em direção ao interior brasileiro serão identificadas em pelo menos 19 (dezenove) estados áreas de conflito instalado pela posse e ocupação de terras, organiza- dos e dirigidos, entre outros movimentos e organi- zações não governamentais, pelo MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, e proprietários 29 rurais privados e públicos, dentre elas áreas destina- das exclusivamente a pesquisa e áreas produtivas. No rastro do acirramento dos movimentos so- ciais pela reforma agrária dos anos 1970 (a desapro- priação da propriedade privada por interesse social está prevista na legislação brasileira desde 1962)60, e com alegado amparo na Constituição Federal de 1988, que recepcionou a norma no artigo 184 e se- guintes61, grupos autodenominados “sem terras” invadem propriedades, muitas vezes com o uso de violência e armas, e se instalam em acampamentos improvisados, como forma de pressão política para a realização da desapropriação e destinação do imóvel a assentamento de famílias de trabalhadores rurais. Estimativas do MST (via site oficial) indicam que neste momento existem 150 mil famílias acampadas aguardando o encerramento de 523 processos de desapropriação já em andamento por iniciativa do INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Re- forma Agrária, órgão do Governo Federal. Importa considerar que não se está, aqui, defen- dendo nenhuma causa ou tomando qualquer partido. Há, também, neste momento (2013) conflitos instalados em terras sob administração e responsa- bilidade da FUNAI – Fundação Nacional do Índio, 60 Lei 4.132, de 10 de setembro de 1962 61 Capítulo III – Da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária 30 além de serem intensos os debates travados política e juridicamente em torno da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, no esta- do do Pará .62 É notável que a legislação brasileira, por muito fragmentada e esparsa, e por vezes engessada por especificidades exageradas, permite o surgimento de conflitos na medida em que de per si dificulta a interpretação e aplicação da norma. A revisão e co- dificação de toda a legislação sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável, anseio dos operadores do direito ambiental, certamente seria um fator de redução de controvérsias, da regulamentação exces- siva e de conflitos socioambientais. 62 Iniciados os estudos para a implantação da usina em 1975 em 2011 foi concedida a licença para o início da construção da infraestrutura, o que está em andamento. Estima-se que em 2019 entre em funciona- mento a última das 24 turbinas projetadas. 31 ATIVIDADES 1. A que podemos atribuir a ocorrência de conflitos na atualidade? É viável pensar em sua su- pressão total? 2. De acordo com a doutrina, quais as princi- pais causas geradoras de conflitos socioambientais?. 3. Que fatores devem ser avaliados para a cor- reta interpretação de um conflito? R. Precisam ser considerados aspectos históricos, sociológicos, antropológicos, econômicos e políticos. 4. O que são comunidades quilombolas? 5. A que fator pode ser atribuído o maior vo- lume da poluição atmosférica nos grandes centros urbanos? Pode ser avaliado isoladamente? (Bloco 1) DIVERSIDADE DE PRÁTICAS CULTURAIS, MANEJO AMBIENTAL E CONSTRUÇÕES DA REALIDADE SOCIAL. 6.1 Inferno Verde, Pulmão do Mundo, Hiléa, Paraíso Verde, Eldorado, são algumas designações e metáfo- ras, entre tantas, com que a Amazônia é referida ao longo dos tempos, de acordo com as variações do humor ideológico de plantão. A Amazônia, tal como a bio e a sociodiversidade que lhe são constitutivas e, talvez por isso mesmo, está enredada numa teia de dramas, conflitos, controvér- sias que se multiplicam numa escala proporcional às pequenas e grandes ambições de que ela sempre foi alvo, desde sua conquista e posse, no decorrer dos séculos XVII e XVIII, pelos europeus. Um estudo desenvolvido pelo Ipea, cujo anúncio se fez recentemente pela mídia, estimou em cerca de 4 trilhões de dólares a riqueza potencial da diversidade biológica e mineral contida em nossas matas. A flo- 34 resta amazônica, se a estimativa estiver correta, é, sem dúvida, responsável por grande parte desse valor, e é por isso que a região concentra tantos conflitos quan- tas são as soluções que para eles se propõe e tantas vezes se adiam. Inadiável, é claro, é a lembrança permanente de que ali se desenrola uma luta constante, às vezes anônima, ou- tras notória e espetacular entre os homens e a natureza, entre a riqueza e as formas sociais de seu uso e apro- priação, entre a sua apropriação e a consciência, cada vez mais dramática, de que é preciso aceitar-lhe, na sua diversidade social e biológica, a estranheza, renunciando assim, ao projeto insano de sua total domesticação.63 Diversidade cultural é tema sempre interessan- te, abrangente e controverso. A cultura de um povo, assuntoque já temos tra- tamos neste trabalho, é construída pela convergência de fatores históricos, geográficos, religiosos, econô- micos, sociais, políticos, éticos etc.. que estão relacio- nadas a sua origem e evolução. São estes valores que individualizam e identificam as populações, que lhe garantem unidade e segurança. É da evolução histórica e da essência da lei am- biental respeitar valores históricos, culturais, locais 63 Carlos Vogt, editor chefe de Ciência e Cultura , revista da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, ano 58, n. 3 35 e regionais. Não atentar para estas peculiaridades é escrever letra morta em matéria socioambiental. A imposição de normas, gerais ou não específi- cas, que possam respeitar valores culturais tradicionais e consolidados de uma comunidade e entrar em con- fronto com os de outras, não atende ao objetivo maior da norma legal, que é pacificar e prevenir conflitos. Notadamente, no Brasil, é inviável conceber uma norma geral e única, válida em todo o território nacional que não se possa adequar aos valores históricos, cultu- rais, religiosos e sociais bastante específicos e que distan- ciam, desde a origem, os povos que formaram muitas comunidades que compõem a população brasileira. O Primeiro Relatório Nacional para a Con- venção sobre Diversidade Biológica-Brasil, documento publicado pelo Ministério do Meio Ambiente, dos Re- cursos Hídricos e da Amazônia Legal, em 1998, assim considera a diversidade cultural: Não bastasse tudo isso, conta ainda o Brasil com uma considerável diversidade cultural, já que em seus limi- tes, além dos descendentes de europeus, asiáticos e africanos, vivem mais de 200 grupos indígenas, cada um com seus costumes, línguas e formatos culturais específicos. A própria extensão e variedade de conhe- cimentos desses grupos sobre a diversidade biológica constitui outro patrimônio notável. 36 Na sequência, cita: portugueses, italianos, es- panhóis, alemães, poloneses, ucranianos, japoneses, sírios e libaneses, além de representantes dos povos samba, moxicongo, angico, nagô, jejê, fanti, achan- ti, haussa, mandinga, tapa e fulá como os principais grupos formadores da população brasileira. A principal norma que regulamenta a matéria é a Lei n.º 9.985, de 18 de julho de 2000, que institui o Sis- tema Nacional de Unidades de Conservação da Natu- reza64, e estabelece áreas naturais a serem especialmente protegidas, delimitadas por critérios que respeitam mais especificidades ambientais e as culturais das populações do que fronteiras físicas ou territoriais. Estas áreas estão classificadas em duas únicas ca- tegorias, de acordo com suas características e objetivos a serem atingidos: Unidades de Proteção Integral, distribuídas en- tre Estações Ecológicas e Parques Nacionais, desti- nadas a realização de pesquisas e desenvolvimento de projetos de educação ambiental; Reservas Biológicas, destinadas ao abrigo de espé- cies de flora e fauna de importante significado científico; Monumentos Naturais e Refúgios de Vida Silves- tre, destinados a proteção do ambiente natural para a re- produção de espécies da flora local e de fauna migratória, 65 que unifica a legislação esparsa sobre a matéria, desde o Código Florestal Brasileiro de 1965 37 e Unidades de Uso Sustentável, que estão selecionadas e divididas entre Áreas de Proteção Ambiental (APA), Áreas de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), Floresta Nacional (FLONA), Reserva Extrativista (RESEX), Re- serva de Fauna (REFAU), Reserva de Desenvolvimen- to Sustentável (RSD), Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), para alcançar o objetivo de restauração e conservação do ambiente, a lei determina que cada uni- dade de conservação tenha seu próprio plano de manejo, de acordo com condições técnicas que especifica e a ser implantado e aplicado sob a orientação, monitoramento e supervisão de grupo de gestão multidisciplinar, for- mada por agentes públicos e privados, e com a ampla participação da população residente65, especialmente nas áreas de uso sustentável. São 728 as Unidades de Conservação criadas em território brasileiro até 2012. Manejo ambiental é o conceito que define um projeto que estabelece as ações necessárias para ava- liar riscos, preparar, prevenir, controlar, compensar e corrigir efeitos possíveis ou impactos negativos ao ambiente causados no desenvolvimento de trabalho ou atividade. Assim, é meio de viabilizar a execução de atividade econômica com o menor prejuízo am- biental possível, mantendo o máximo da qualidade ambiental e da integridade ecológica. 65 art. 27 e §§ da Lei 9985/2000 38 É importante, então, sua aplicação antes, durante e depois da instalação da atividade. Manejo pode ser com- preendido como planejamento ambiental. A Carta dos Andes66, de 1958, define planejamen- to, em sentido amplo, de 1958, define planejamento, em sentido amplo, como “um método de aplicação, contí- nuo e permanente, destinado a resolver, racionalmente, os problemas que afetam uma sociedade situada em determinado espaço, em determinada época, através de uma previsão ordenada capaz de antecipar suas anterio- res consequências”. Adotada esta definição e adequando-a para um conceito ambiental, teremos que planejamento ambien- tal, ideia da que se origina a de manejo, é o processo de planificação que tem por objetivo identificar problemas e necessidades humanas e buscar soluções viáveis com o máximo de manutenção de qualidade ambiental, que res- peitem os limites da capacidade ambiental, com o uso e aproveitamento sustentado de recursos e a minimização de riscos e impactos ambientais. Em tese, e por força de norma constitucional, cabe ao Poder Público assegurar a todos os ocupantes do território brasileiro o direito ao meio ambiente eco- logicamente equilibrado, bem de uso comum do povo. 66 Documento apresentado como resultado dos debates realizados no Seminário de Técnicos e Funcionários em Planejamento Urbanos, re- alizado na Colômbia 39 Para o cumprimento de seu mister, precisa regulamentar e viabilizar meios de preservar, restaurar e promover o manejo de espécies e ecossistemas67. Qualquer projeto de manejo, e muito especial- mente os destinados à aplicação em unidades de conservação, deve promover a integração da área de unidade de conservação com a vida econômica e so- cial das comunidades residentes e vizinhas, permitir que a atividade econômica praticada tradicionalmen- te pelas comunidades seja mantida como meio de subsistência e de produção de renda, sem que afete de maneira negativa a integridade do ambiente natu- ral, com o claro objetivo de alcançar o uso sustentá- vel dos recursos naturais. Planos de manejo devem considerar e respeitar as diversidades socioambiental e cultural e os siste- mas de organização e representação social das popu- lações tradicionais de cada região, e as especificida- des de suas inter-relações. E, é importante que seja estabelecido um compromisso coletivo e explícito entre usuários, gestores e outros grupos de interesse de empenho para viabilizar a execução do plano, sob pena de este estar fadado ao insucesso. É importante, também, que o plano de manejo vá além da proposta de métodos e procedimentos técnicos a serem adotados. Precisam estar presentes 67 CF/1988, art.225, §1º, inc. I 40 no planejamento a implementação de ações direcio- nadas à educação e capacitação de recursos huma- nos que priorize a conservação do meio ambiente, valorize o saber tradicional e melhore as condições de exploração de recursos e comercialização da pro- dução; a previsão de investimentos econômicos di- recionados ao aumento de produtividade, a maior competitividade e a redução da desigualdade social, além do fortalecimento das atividades comunitárias e da gestão participativa e democrática da atividade econômica da localidade. Sem estes cuidados a implantação de unidades de conservação de uso sustentável,notadamente as que operam em parceria com agentes privados, pode transformar o pequeno produtor independente em trabalhador sub-remunerado, sem instrumentos cul- turais, sociais e econômicos hábeis a melhorar sua condição de vida e perspectiva de crescimento social. Com a observância destes cuidados, as áreas administradas sob plano de manejo ambiental po- dem ser produtivas e, em casos específicos, lucrati- vas e comercialmente interessantes. Um estudo divulgado em 2011, e realizado com o apoio da UNEP-WCMC68, órgão ambiental da ONU, para a avaliação do impacto e potencial 68 United Nations Environment Program-World Conservation Moni- toring Center 41 econômico das unidades de conservação brasileiras, informa que a produção de madeira em tora nas Flo- restas Nacionais (FLONA) e Estaduais da Amazônia em áreas de manejo (concessão florestal) tem poten- cial de gerar, anualmente, entre R$1,2 bilhão a R$2,2 bilhões, mais do que toda a madeira nativa extraída anualmente no país; a produção de borracha nas 11 Reservas Extrativistas (RESEX), identificadas como produtoras, resulta em R$16,5 milhões anuais, a pro- dução de castanha do Pará em outras 17 reservas tem potencial para gerar R$39,2 milhões, além disso, a criação e manutenção das unidades de conservação no Brasil impediu a emissão de 2,8 bilhões de tone- ladas de carbono, de valor estimado R$96 bilhões. Incentivos fiscais também são economicamen- te atrativos para municípios e estados cujos territó- rios tenham Unidades de Conservação, via ICMS Ecológico69 com a maior transferência da receita do imposto arrecadado pelos estados aos municípios em contrapartida à perda de receita com a instalação da área de preservação em seu território. Em 2009, a receita real de ICMS Ecológi- co repassada pelos 12 (doze) estados com regu- lamentação estadual aos seus municípios foi de R$401.144.269,00, incremento de receita orçamen- 69 Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços, regulamentado por lei estadual 42 tária que deve prioritariamente ser direcionada a in- vestimentos públicos suplementares e melhoria da gestão ambiental do município. É importante frisar que não há impedimento legal de que as áreas de preservação ambiental sejam produtivas ou que recebam investimentos públicos e privados, não são intocáveis e não representam im- posição de atraso de desenvolvimento econômico, portanto. Impõe-se, porém, que sejam administradas de maneira comprovadamente sustentável e que par- te importante da renda produzida seja revertida em investimentos em infraestrutura e projetos sociais e de geração de renda para as populações locais. Feito desta forma, além da preservação e con- servação do ambiente, os investimentos em áreas de unidades de conservação geram resultados positivos indiretos, e proporcionam a melhoria da realidade social das comunidades. Realidade social que deve ser analisada e com- preendida a partir do conjunto de fenômenos sociais que resultam das relações dos homens entre si e des- tes com a natureza, consideradas questões psicológi- cas, históricas, antropológicas, sociológicas, políticas e econômicas que direta ou indiretamente são atuan- tes na formação do modo como o homem se utiliza dos recursos naturais. Projetos que tenham por ob- jetivos a melhoria da realidade social precisam fazer considerações a respeito de todos estes aspectos e 43 apresentar proposições social e economicamente vi- áveis e exequíveis. Política ambiental eficiente, parcerias público- -privadas, monitoramento e fiscalização adequada e permanente, investimentos em pesquisa, em infraes- trutura, educação e capacitação das populações são meios comprovadamente eficazes e viáveis de conter danos ao meio ambiente, por consequência lógica, de melhoria da qualidade de vida e da realidade social. Nunca é demais lembrar que meio ambiente é tema que abrange tudo o que nos cerca, não está restrito a limites territoriais e que os recursos natu- rais não são ilimitados. Que apenas 2% da água do planeta é doce e que 90% dela está no subsolo ou congelada nos polos; que mais de 1 bilhão de pesso- as não têm acesso à água tratada e mais de 4 milhões de crianças morreram em 200070 em decorrência de doenças infecciosas, como a cólera e a malária; que 150 mil Km² de floresta tropical são derrubadas anu- almente; que a população mundial cresce em ritmo acelerado e consome 40% além da capacidade de reposição da biosfera, déficit que aumenta 2.5% ao ano; que cada um dos 190.755.79971 brasileiros pro- duz, em média, 1 kg de lixo doméstico por dia e que a falta de saneamento básico responde por 65% das 70 dados da ONU 71 dados do censo IBGE 2010 44 internações hospitalares do país. Tratar da questão ambiental com seriedade, posto isso, é urgente e imprescindível. 45 ATIVIDADES 1. O que é manejo ambiental? 2. O que são unidades de conservação?. 3. Quais as especificidades do plano de mane- jo devem ser aplicadas em unidades de conservação? 4. É admitido o investimento privado em unida- des de conservação. Se sim, a que está condicionado? 5. Que questões ambientais, em sua opinião, carecem de soluções mais urgentes? (Bloco 2) 47 UNIDADE 5 1 - Espaço físico delimitado, ocupado por de- terminada população que se identifica e interage den- tro de padrões culturais, sociais, econômicos e éticos construídos a partir desta convivência cotidiana. 2 - Por conta da dificuldade de identificação da comunidade com o lugar que ocupa; o aumento de distâncias e tempo de deslocamento entre o local de moradia e trabalho retira do indivíduo a possibili- dade de criar vínculos afetivos com a região em que mora. O cidadão não percebe a cidade como o “seu lugar”. Isso impede que haja efetiva construção so- cial do espaço, teoricamente considerado como base da vida cotidiana e da sociabilidade entre os mem- bros da comunidade. 3 - Projetos direcionados para estabelecer as prioridades locais, o uso adequado do solo, a preser- vação de áreas verdes e margens de rios urbanos, a instalação de sistemas de infraestrutura que estimu- lem o uso de meios de transporte público e a redução do tempo de descolamentos, a eficiência energética, a GABARITO 48 coleta seletiva de resíduos sólidos, por exemplo. 4 - Os congestionamentos causam perdas es- timadas em R$4 bilhões por ano à economia paulis- tana; menores perdas atingem as cidades brasileiras com população entre 50 mil e 500 mil habitantes. 5 - Regras de convívio social entre os mem- bros de uma sociedade; conjunto de formalidades observadas pelos indivíduos entre si em sinal de res- peito mútuo e consideração; polidez, urbanidade; boa educação. UNIDADE 6 1 - No mundo moderno, os conflitos, em re- gra, têm causa no embate entre interesses distintos. Não é razoável pensar numa sociedade real em que não sejam produzidos conflitos, posto que é da es- sência da natureza humana a defesa de seus interes- ses pessoais em detrimento de outros que não este- jam em conformidade com estes. 2 - A disputa sobre o controle de recursos na- turais, os impactos sociais e ambientais gerados pela ação e a discordância de valores culturais e éticos. 49 3 - Precisam ser considerados aspectos his- tóricos, sociológicos, antropológicos, econômicos e políticos. 4 - São comunidades formadas por descen- dentes de antigos escravos fugitivos que se esta- beleceram em diversas regiões do litoral e interior brasileiro. A Constituição Federal de 1988 garantiu a essas comunidades o reconhecimento da proprie- dade e a outorga do direito sobre as terras ocupadas. 5 - Principalmente é causada pela queima de combustível fóssil utilizada em veículos. Deve ser considerada em conjunto com outros fatores, tais como economia em crescimento (que financia o au- mento da produção de veículos automotores e do poder aquisitivo e acesso a crédito da população),à deficiência e sucateamento da frota do transporte público, ao tráfego intenso gerado pelo aumento da frota particular, à falta de ofertas de trabalho bem remunerado em locais mais afastados dos centros urbanos, à falta de projetos sociais que estimulem o uso compartilhado de veículos, à carência de ci- clovias, à insegurança e violência em ascensão nas grandes cidades. 50 51 GABARITO UNIDADE 5 1 - Espaço físico delimitado, ocupado por de- terminada população que se identifica e interage den- tro de padrões culturais, sociais, econômicos e éticos construídos a partir desta convivência cotidiana. 2 - Por conta da dificuldade de identificação da comunidade com o lugar que ocupa; o aumento de distâncias e tempo de deslocamento entre o local de moradia e trabalho retira do indivíduo a possibili- dade de criar vínculos afetivos com a região em que mora. O cidadão não percebe a cidade como o “seu lugar”. Isso impede que haja efetiva construção so- cial do espaço, teoricamente considerado como base da vida cotidiana e da sociabilidade entre os mem- bros da comunidade. 3 - Projetos direcionados para estabelecer as prioridades locais, o uso adequado do solo, a preser- vação de áreas verdes e margens de rios urbanos, a instalação de sistemas de infraestrutura que estimu- lem o uso de meios de transporte público e a redução do tempo de descolamentos, a eficiência energética, a 52 coleta seletiva de resíduos sólidos, por exemplo. 4 - Os congestionamentos causam perdas es- timadas em R$4 bilhões por ano à economia paulis- tana; menores perdas atingem as cidades brasileiras com população entre 50 mil e 500 mil habitantes. 5 - Regras de convívio social entre os mem- bros de uma sociedade; conjunto de formalidades observadas pelos indivíduos entre si em sinal de res- peito mútuo e consideração; polidez, urbanidade; boa educação. UNIDADE 6 1 - No mundo moderno, os conflitos, em re- gra, têm causa no embate entre interesses distintos. Não é razoável pensar numa sociedade real em que não sejam produzidos conflitos, posto que é da es- sência da natureza humana a defesa de seus interes- ses pessoais em detrimento de outros que não este- jam em conformidade com estes. 2 - A disputa sobre o controle de recursos na- turais, os impactos sociais e ambientais gerados pela ação e a discordância de valores culturais e éticos. 53 3 - Precisam ser considerados aspectos his- tóricos, sociológicos, antropológicos, econômicos e políticos. 4 - São comunidades formadas por descen- dentes de antigos escravos fugitivos que se esta- beleceram em diversas regiões do litoral e interior brasileiro. A Constituição Federal de 1988 garantiu a essas comunidades o reconhecimento da proprie- dade e a outorga do direito sobre as terras ocupadas. 5 - Principalmente é causada pela queima de combustível fóssil utilizada em veículos. Deve ser considerada em conjunto com outros fatores, tais como economia em crescimento (que financia o au- mento da produção de veículos automotores e do poder aquisitivo e acesso a crédito da população), à deficiência e sucateamento da frota do transporte público, ao tráfego intenso gerado pelo aumento da frota particular, à falta de ofertas de trabalho bem remunerado em locais mais afastados dos centros urbanos, à falta de projetos sociais que estimulem o uso compartilhado de veículos, à carência de ci- clovias, à insegurança e violência em ascensão nas grandes cidades. 55 Referências A. Simões, L.H.R. Simões. “Os desencon- tros dos diversos agentes sociais na gestão de recursos naturais: um campo de mediação a ser construído”. In: Glase, M., Cabra, N., Ribeiro, A.L. (org). Belém: NUMA/UFPA, 2005. BARBIERI, José Carlos. Gestão Ambiental Empresarial. Conceitos, modelos e instrumen- tos. São Paulo: Saraiva, 2004. CARDOSO, Artur Renato. 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