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Diabete Mellitus - Bioquímica

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ 
FACULDADE DE VETERINÁRIA 
DISCIPLINA: BIOQUÍMICA VETERINÁRIA II 
PROF. DR. GENÁRIO SOBREIRA SANTIAGO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DIABETES MELLITUS EM PEQUENOS ANIMAIS 
 
 
 
 
 
Gabriela Lima Araújo 
Gabriela Costa Veras 
Ingryde Paula Aragão Leitão 
Luiz Antônio Moreira Miranda 
 
 
 
 
 
 
 
 
FORTALEZA – CE 
2020 
1. INTRODUÇÃO 
 
Dentre os órgãos do Sistema Digestório, o pâncreas contém diversas proteases, 
como a tripsina e a quimotripsina, que são normalmente liberadas no intestino delgado para 
auxiliar na digestão, ele possui uma parte endócrina e uma exócrina, formadas, 
histologicamente, pelas ilhotas pancreáticas e pelos ácinos serosos, respectivamente. Dentre os 
hormônios produzidos na porção endócrina, estão o glucagon e a insulina, produzidos 
respectivamente pelas células alfa (A) e beta (B), ambos atuam na regulação da taxa de glicose 
no sangue, enquanto o glucagon é hiperglicemiante, a insulina é hipoglicemiante, ou seja, ela 
atua reduzindo a taxa de açucar no sangue. 
Segundo Nelson e Cox (2014), a descoberta da insulina começou com uma 
observação acidental. Em 1889, Oskar Minkowski e Josef Von Mering começaram um 
experimento sobre a digestão das gorduras, então removeram cirurgicamente o pâncreas de um 
cão e observaram que o animal estava produzindo muito mais urina do que em condições 
normais e que ela continha níveis de glicose muito altos, então supuseram que a falta de algum 
produto pancreático causaria o diabetes. 
Já em 1921, Frederick G. Banting e Charles Best perceberam que várias evidências 
apontavam para um grupo de células especializadas no pâncreas (as ilhotas de Langerhans) 
como a fonte do fator antidiabético, o qual viria a ser chamado de insulina (do latim insula, 
“ilha”). Então, auxiliados por J. B. Collip, prepararam um extrato pancreático purificado que 
curava os sintomas do diabetes experimental em cães e, um mês mais tarde, a preparação de 
insulina foi injetada em Leonard Thompson, um menino de 14 anos gravemente doente com 
diabetes melito. Em poucos dias, os níveis de corpos cetônicos e de glicose na urina de 
Thompson diminuíram drasticamente (NELSON; COX, 2014). 
Em um indivíduo normal, quando há ingestão de uma refeição rica em carboidratos, 
é gerada uma concentração de glicose sanguínea excedente àquela comum entre as refeições – 
segundo PÖPPL (2011) é, nos cães normais, de 60 a 100mg/dL e, nos gatos normais, de 70 a 
170 mg/dL. O excesso de glicose é captado pelos miócitos dos músculos cardíaco e esquelético 
(que a armazenam como glicogênio) e pelos adipócitos (que a convertem em triacilglicerois) 
(NELSON; COX, 2014). 
A captação de glicose pelos miócitos e adipócitos é mediada pelo transportador de 
glicose denominado GLUT4. Entre as refeições, alguns GLUT4 estão presentes na membrana 
plasmática, mas a maioria encontra-se sequestrada nas membranas de pequenas vesículas 
intracelulares. A insulina, liberada pelo pâncreas em resposta à alta concentração de glicose 
sanguínea, desencadeia o movimento dessas vesículas intracelulares à membrana plasmática, 
com as quais se fundem, levando as moléculas de GLUT4 para a membrana plasmática. Com 
mais moléculas de GLUT4 em ação, a taxa de captação de glicose aumenta em 15 vezes ou 
mais. Quando os níveis de glicose sanguínea retornam ao normal, a liberação de insulina torna-
se lenta e a maioria das moléculas de GLUT4 é removida da membrana plasmática e 
armazenada em vesículas (NELSON; COX, 2014). 
A diabetes é caracterizado por uma captação deficiente da glicose, ela pode ser 
“insipidus” ou “mellitus”. Quando está relacionada a uma deficiência do hormônio anti-
diurético (ADH) ou quando os néfrons não respondem ao ADH, a diabetes é denominada 
“insipidus” (rara em cães e gatos). Ou seja, a diminuição da reabsorção de água levam à poliúria 
que recorre em uma polidipsia compensatória, sem outras alterações. 
Já a diabetes “mellitus” é a desordem pancreática mais comum em cães e gatos, 
caracterizada pela deficiência relativa ou absoluta de insulina, sendo que a do tipo 1 está 
relacionada a uma ausência de secreção de insulina pelas células beta pancreáticas e a do tipo 
2 a uma resistência periférica à ação da insulina. A do tipo 1 é a mais comum nos cães e a do 
tipo 2 mais prevalente nos gatos. 
 
2. DIABETES MELLITUS TIPO 1 
 
De acordo com Pöppl et al. (2018), a Diabetes Melito do tipo 1 ou dependente de 
insulina, é causado pela destruição das células β com perda progressiva e eventualmente 
completa da secreção de insulina. Atualmente, é a doença endócrina mais freqüente na clínica 
de cães, tendo maior ocorrência em determinadas raças. Aparece provavelmente em indivíduos 
geneticamente suscetíveis, por fatores ambientais (infecções virais), resposta auto-imune, que 
por sua vez, promove a destruição progressiva das células beta. 
Uma vez estabelecida a deficiência absoluta ou relativa da liberação de insulina 
pelas células beta, ocorre uma redução na utilização tecidual de glicose, aminoácidos e ácidos 
graxos. O fígado acelera os processos de glicogenólise e gliconeogênese, gerando um excesso 
de glicose no sangue. Este processo é mediado não somente pela falta de insulina, como também 
pelo excesso relativo de glucagon, uma vez que a hipoinsulinemia favorece a secreção de 
glucagon pelas células alfa das ilhotas. A glicose proveniente da dieta também contribui para a 
hiperglicemia, induzindo ainda mais glicotoxicidade (PÖPPL et al., 2018). 
Apesar da DM canina ser tipicamente associada à diabetes autoimune de humanos 
(DM tipo 1), estudo recente falhou em demonstrar evidências da existência de um componente 
autoimune em cães. Contudo, associações genéticas por análise de pedigrees, e a documentação 
de polimorfismos no gene do antígeno leucocitário canino já foram demonstrados em cães 
suportando a associação com DM tipo 1 de forma similar à observada em humanos (PÖPPL et 
al., 2018). 
 No entanto, como em humanos a DM tipo 1 é diagnosticada em indivíduos jovens, 
e na espécie canina a média de idade ao diagnóstico é cerca de 10 anos de idade, a DM canina 
é muitas vezes comparada à Diabetes Autoimune Latente do Adulto (LADA) observada em 
humanos que desenvolvem autoimunidade contra elementos das células beta já com idade 
avançada. Uma vez iniciado o ataque autoimune, gradualmente, o paciente vai perdendo massa 
de células beta funcionais até que, a partir de determinado ponto, não há mais capacidade por 
reserva secretória de insulina capaz de manter a glicemia sob controle (PÖPPL et al., 2018). 
 
2.1. Diabetes Melito Gestacional (DMG) 
Segundo Pöppl e Araujo (2010), o aumento na concentração sérica de progesterona 
durante o diestro pode causar diabetes em cadelas, por promover um efeito antagônico à 
insulina, reduzindo a ligação de insulina ao receptor e o transporte de glicose nos tecidos alvos 
e, secundariamente, por promover a liberação de GH pela glândula mamária. O GH, um dos 
hormônios contrarreguladores da insulina, reduz a concentração de receptores à insulina, 
reduzindo a captação de glicose nas células alvo (PÖPPL; ARAUJO, 2010). 
Contudo, outros autores consideram a redução na concentração dos receptores na 
membrana celular das células alvo, como uma consequência da downregulation (um fenômeno 
onde observa-se a redução na concentração de receptores para determinado hormônio frente a 
uma concentração excessiva de tal hormônio na circulação) decorrente da hiperinsulinemia 
devido à resistência insulínica gerada pelo GH. Os efeitos lipolíticos do GH também são 
antagônicos aos efeitos da insulina. Evidências acumuladas sugerem que o GH modula a 
sensibilidade à insulina por múltiplos mecanismos, pois as vias de sinalização intracelular do 
GH e de seu principal efetor, o IGF-I, convergem com as vias de sinalização intracelular da 
insulina (PÖPPL; ARAUJO, 2010). 
Observa-se que no Brasil, grandeparte dos pacientes diabéticos é composta de 
fêmeas não castradas apresentadas para diagnóstico inicial durante o diestro. Essa perspectiva 
evidencia um forte papel do excesso de secreção de hormônio do crescimento – GH no tecido 
mamário induzido pela progesterona na patogenia destas pacientes. Como o GH é 
extremamente antagônico às ações da insulina, há uma necessidade de maior secreção do 
hormônio produzido pelas células beta pancreáticas para vencer a resistência insulínica, 
podendo acarretar exaustão da capacidade secretória das células beta pâncreas, especialmente 
nos casos em que outros mecanismos predisponentes estiverem presentes. Este é o principal 
mecanismo diabetogênico identificado em fêmeas não castradas, enquanto em fêmeas castradas 
e em machos, o mecanismo autoimune é mais comum (PÖPPL et al., 2018). 
Esta forma de diabetes no cão remete à diabetes mellitus gestacional em humanos, 
onde diversos fatores nutricionais, raciais, genéticos e imunológicos podem aumentar o risco 
de diabetes durante o predomínio da progesterona. As semelhanças bioquímicas na dinâmica 
de resistência à insulina em cadelas prenhes levaram a proposição do uso de cães como modelo 
de pesquisa para estudo das alterações metabólicas durante a gestação de mulheres. Na 
população canina, cerca de 5% das pacientes identificadas com diabetes durante o diestro, 
podem reverter a necessidade de insulina se castradas imediatamente após o diagnóstico. As 
cadelas que sofrem diabetes reversível durante o diestro e que não são castradas apresentam 
grandes chances de tornarem-se diabéticas na próxima fase lútea do ciclo, independente da 
presença ou não de gestação (PÖPPL; ARAUJO, 2010). 
Um estudo recente de uma série de casos de diabetes gestacional em cadelas 
evidenciou que o diagnóstico de diabetes normalmente é feito entre 30 e 64 dias após o 
acasalamento, afetando normalmente cadelas de meia-idade (entre 2 e 8 anos), com uma 
tendência a maior predisposição ao desenvolvimento desta alteração em raças nórdicas Spitz, 
sugerindo uma predisposição genética ao desenvolvimento de DMG nestas raças. A maioria 
dos casos de DMG em cadelas, são causados por resistência à insulina pelos hormônios 
gestacionais (prolactina e progesterona) e desta forma tendem a ser reversíveis. Contudo a 
hiperglicemia crônica pode levar a um estado diabético irreversível em decorrência da 
glicotoxicidade sobre as células β, mesmo após o término da prenhes, especialmente se 
houverem outros fatores de risco envolvidos como autoimunidade e pancreatite (PÖPPL; 
ARAUJO, 2010). 
Da mesma forma, quanto mais velho o animal, teoricamente maior a chance de 
desenvolver DM permanente em decorrência da redução na capacidade de secreção de insulina 
associada ao envelhecimento. Este mesmo estudo evidenciou melhor prognóstico naqueles 
pacientes que foram tratados com o término farmacológico da gestação ou por ovário-
histerectomia. A redução na concentração dos hormônios gestacionais pós término da prenhez 
pode levar a remissão do diabetes em menos de 10 dias, e o uso de insulina nestes pacientes 
esteve associado a melhores chances de remissão da doença, uma vez que estas pacientes 
estiveram mais protegidas do fenômeno da glicotoxicidade. Em fêmeas caninas, a incidência 
de DM é duas vezes maior que em machos (3) e cerca de 70% pacientes diagnosticados com 
diabetes são fêmeas (PÖPPL; ARAUJO, 2010). 
 
2.2. Bioquímica da Diabetes Melito Dependente de Insulina (tipo 1) 
 
Segundo Nelson e Cox (2014), os indivíduos com diabetes melito tipo 1 têm 
pouquíssimas células b e são incapazes de liberar insulina suficiente para desencadear a 
captação de glicose pelas células do músculo esquelético, do coração ou do tecido adiposo. 
Assim, após uma refeição contendo carboidratos, a glicose se acumula a níveis anormalmente 
altos no sangue, condição conhecida como hiperglicemia. Incapazes de captar glicose, o 
músculo e o tecido adiposo utilizam os ácidos graxos armazenados nos triacilgliceróis como 
seu principal combustível. Acredita-se que esses altos níveis de glicose sejam pelo menos uma 
das causas das sérias consequências de longo prazo no diabetes não tratado – insuficiência renal, 
doenças cardiovasculares, cegueira e cicatrização debilitada. 
 
2.2.1. Captação deficiente da glicose 
 
O principal transportador de glicose nas células do músculo esquelético, músculo 
cardíaco e tecido adiposo (GLUT4) está armazenado em pequenas vesículas intracelulares e se 
desloca para a membrana plasmática apenas em resposta a um sinal de insulina. No músculo 
esquelético, coração e tecido adiposo, a captação e o metabolismo da glicose dependem da 
liberação normal de insulina pelas células b pancreáticas em resposta à quantidade elevada de 
glicose no sangue (NELSON; COX, 2014). 
 
 
FIGURA 1 – Deficiência na captação da glicose. Fonte: Nelson e Cox (2014). 
 
Quando a ingestão de uma refeição rica em carboidratos gera uma concentração de 
glicose sanguínea excedente àquela comum entre as refeições (cerca de 5 mM), o excesso de 
glicose é captado pelos miócitos dos músculos cardíaco e esquelético (que a armazenam como 
glicogênio) e pelos adipócitos (que a convertem em triacilgliceróis). A captação de glicose pelos 
miócitos e adipócitos é mediada pelo transportador de glicose GLUT4. Entre as refeições, 
alguns GLUT4 estão presentes na membrana plasmática, mas a maioria encontra-se sequestrada 
nas membranas de pequenas vesículas intracelulares (NELSON; COX, 2014). 
A insulina, liberada pelo pâncreas em resposta à alta concentração de glicose 
sanguínea, desencadeia o movimento dessas vesículas intracelulares à membrana plasmática, 
com a qual elas se fundem, levando as moléculas de GLUT4 para a membrana plasmática. Com 
mais moléculas de GLUT4 em ação, a taxa de captação de glicose aumenta em 15 vezes ou 
mais. Quando os níveis de glicose sanguínea retornam ao normal, a liberação de insulina torna-
se lenta, e a maioria das moléculas de GLUT4 é removida da membrana plasmática e 
armazenada em vesículas (NELSON; COX, 2014). 
No diabetes melito do tipo 1, a inserção de GLUT4 nas membranas, assim como 
outros processos normalmente estimulados por insulina, estão inibidos. A deficiência de 
insulina impede a captação de glicose por GLUT4; como consequência, as células são privadas 
de glicose, enquanto ela está elevada na corrente sanguínea. Sem glicose para o suprimento de 
energia, os adipócitos degradam triacilgliceróis estocados em gotas de gordura e fornecem os 
ácidos graxos resultantes para outros tecidos para a produção mitocondrial de ATP (NELSON; 
COX, 2014). 
Dois subprodutos da oxidação dos ácidos graxos acumulam-se no fígado 
(acetoacetato e b-hidroxibutirato) e são liberados na corrente sanguínea, fornecendo 
combustível para o cérebro, mas também diminuindo o pH do sangue, causando cetoacidose. 
A mesma sequência de eventos ocorre no músculo, exceto que os miócitos não estocam 
triacilglicerois, mas captam os ácidos graxos que são liberados na corrente sanguínea pelos 
adipócitos (NELSON; COX, 2014). 
De acordo com Nelson e Cox (2014), a administração de insulina reverte esta 
sequência de eventos: GLUT4 se desloca para a membrana plasmática dos hepatócitos e 
adipócitos, a glicose é captada e fosforilada por essas células, e o nível de glicose no sangue 
decresce, reduzindo potencialmente a produção de corpos cetônicos. 
 
3. DIABETES MELLITUS TIPO-2 EM FELINOS 
 
O diabetes do tipo-2 instala-se lentamente, os sintomas são mais suaves e, por isso, 
não reconhecidos no início. Na realidade, trata-se de um grupo de doenças nas quais a atividade 
reguladora de insulina está prejudicada ou insuficiente: a insulina é produzida, más algum 
componente do sistema de resposta à insulina está defeituoso (NELSON; COX, 2014). 
Na DM tipo-2, que compartilha muitas similaridades com a doença observada em 
felinos, a resistência insulínicasecundária à obesidade gera um mecanismo diabetogênico de 
longo prazo. Felinos e humanos que desenvolvem DM tipo-2 apresentam um marcador 
patológico clássico, que é a amiloidose das ilhotas pancreáticas. Este depósito amiloide é 
secundário a maior secreção, e consequente deposição no interstício das ilhotas do peptídeo 
amilina. A amilina é um hormônio co-secretado pelas células beta pancreáticas no momento da 
secreção de insulina e que auxilia no controle glicêmico, regulando a secreção de glucagon e 
retardando a velocidade digestiva (PÖPPL et al., 2018). 
Contudo, frente a esta maior secreção e deposição intersticial, cronicamente, a 
amiloidose perturba a entrega de nutrientes e oxigênio, levando à disfunção das células beta e 
prejuízo à secreção de insulina. Recentemente, um papel do acúmulo intracelular de amiloide 
tem sido apontado como um fator tão ou mais importante que os depósitos extracelulares. Além 
disso, glicotoxicidade também corrobora na documentação da hiperinsulinemia no momento do 
diagnóstico nestes pacientes (PÖPPL et al., 2018). 
Pöppl et al. (2018) consideram que a maior parte dos pacientes felinos diabéticos é 
composta de machos castrados que vivem em ambientes indoor; todos importantes fatores de 
risco para a obesidade, resistência insulínica e diabetes mellitus. Outros fatores de risco 
documentados em felinos são dieta comercial seca rica em carboidratos, infecções orais, gênero 
masculino, uai de corticoides, idade e a raça Birmanês. 
O tecido adiposo é reconhecido como um tecido endócrino ativo, especialmente em 
pacientes obesos, com elevada secreção de adipocitocinas (hormônios secretados por 
adipócitos) pro-inflamatorias, como a leptina, IL-1, TNF-alfa, resisti a, dentre outras. A única 
adipocitocinas c efeitos benéficos é a adiponectina, a qual apresenta efeitos anti-inflamatórios 
e pró-insulinicos. Contudo, a adiponectina também é a única adipocina que tem sua secreção 
reduzida frente à obesidade, sendo vista como um importante fator associado à patogenia da 
DM tipo-2 em felinos e humanos (PÖPPL et al., 2018). 
4. DIAGNÓSTICO, COMPLICAÇÕES E TRATAMENTO 
 
4.1. Sinais clínicos 
Os sinais clínicos do diabetes melito, dependem do tipo, grau e das condições 
precedentes à insuficiência de insulina. É considerada a doença dos “4P’s”, pelo fato de que 
normalmente ocasiona poliúria, polidpsia, polifagia e perda de peso (PÖPPL et al., 2018). 
4.1.1. Glicosúria 
Toda glicose circulante é livremente filtrada nos glomérulos renais, contudo, as 
células dos túbulos renais proximais apresentam uma capacidade limitada de reabsorver esta 
glicose do ultrafiltrado glomerular. Em cães, este limiar é ultrapassado quando a glicemia fica 
acima de valores de 180 a 220 mg/dL. Nesta situação, ocorre a presença de glicose na urina 
(glicosúria). 
4.1.2. Polidipsia e poliúria 
Esta glicosúria promove diurese osmótica, impedindo a água de ser reabsorvida ao 
longo do néfron, ocasionando a poliúria. O centro da sede, localizado no hipotálamo, é ativado 
quando detecta aumento na osmolaridade do líquido cefalorraquidiano e/ou quando recebe 
estímulos aferentes dos barorreceptores pulmonares, atriais, aórticos, carotídeos e renais em 
situações de hipovolemia, desencadeando a procura por líquidos para correção do estado hídrico 
corporal e levando a polidipsia compensatória à poliúria. 
4.1.3. Polifagia 
 Dois centros hipotalâmicos controlam a ingestão de alimentos: o “centro da fome” 
na região lateral, responsável pelo controle da quantidade de alimento ingerido, e o “centro da 
saciedade” localizado na região ventro-medial. A insulina é um importante regulador e ativador 
do centro da saciedade e, na sua ausência, associado ao processo catabólico, ocorre um estímulo 
à polifagia. Outros mecanismos neuroendócrinos complementam o controle do apetite e peso 
corporal. 
 
 
4.1.4. Perda de peso 
 A insulina suprime o sistema lipase hormônio-sensível e, frente à hipoinsulinemia, 
ocorre acentuada lipólise, gerando ácidos graxos livres não esterificados (utilizados como 
fontes de combustível oxidativo extra-hepático, também sendo assimilados pelo fígado) e 
glicerol (utilizado na gliconeogênese). A insulina também apresenta um efeito anabólico sobre 
a musculatura e, frente à hipoinsulinemia crônica, ocorre catabolismo de proteínas como fonte 
de aminoácidos para a gliconeogênese. Esta lipólise e proteólise intensas, associadas à perda 
calórica representada pela glicosúria, são responsáveis pela perda de peso dos pacientes. 
Incapazes de captar glicose, o músculo e o tecido adiposo utilizam os ácidos graxos 
armazenados nos triacilgliceróis como seu principal combustível. Se o diabetes não for tratado, 
esses indivíduos apresentam velocidade aumentada na oxidação de gorduras, para a obtenção 
de energia e, portanto, perdem peso (NELSON; COX, 2014). 
 
4.2. Complicações crônicas 
Complicações resultantes da diabetes ou de seu tratamento são comuns, dentre elas: 
catarata, retinopatia diabética, hipoglicemia, pancreatite crônica, infecções recorrentes e 
cetoacidose diabética (PÖPPL et al., 2018). 
4.2.1. Catarata diabética 
A catarata diabética é a complicação a longo prazo mais comum da diabetes 
mellitus em cães. Acredita- se que a patogênese da catarata está relacionada com a alteração da 
osmolaridade das lentes, induzindo um acúmulo de sorbitol e galactitol produzidos por meio da 
redução de glicose e galactose pela enzima aldose redutase. Sorbitol e galactitol são potentes 
agentes hidrofílicos e causam um influxo de água nas lentes, levando a um inchaço e ruptura 
das fibras e o desenvolvimento de catarata. A partir do momento de seu início, o processo de 
formação da catarata é irreversível e pode ocorrer rapidamente. 
Cães diabéticos mal controlados, com problema de flutuação nas glicemias, têm um 
risco maior do desenvolvimento rápido da catarata, ao mesmo tempo que, um bom controle 
glicêmico com flutuações mínimas de glicemia pode prolongar o início de sua formação da 
catarata. A cegueira causada pela catarata pode ser revertida com o tratamento cirúrgico em 
aproximadamente 80% dos casos. Fatores que afetam o sucesso da cirurgia incluem o controle 
glicêmico antes da cirurgia, presença de retinopatias e uveíte. 
4.2.2. Retinopatia diabética 
A causa da retinopatia diabética é provavelmente multifatorial e deve envolver 
mudanças bioquímicas secundárias à hiperglicemia e aumento da atividade da aldose redutase, 
produtos finais de glicação avançada, alterações hemodinâmicas e prejuízo vascular endotelial. 
Fatores de risco para o desenvolvimento de retinopatia têm sido pouco caracterizados em cães 
diabéticos, embora o controle glicêmico possa estar associado com sua progressão. Como a 
catarata se desenvolve com frequência nos cães diabéticos e a mesma interfere no exame da 
retina, o ideal seria submeter todos os pacientes diabéticos a exame oftalmológico completo 
antes que a catarata se estabeleça. 
4.2.3. Cetoacidose diabética 
Trinta a quarenta por cento dos pacientes diabéticos podem se apresentar 
inicialmente em cetoacidose diabética, uma condição grave e limitante à vida, associada à falta 
de apetite, náusea, êmese, hiperglicemia acentuada, cetonemia, e acidose metabólica 
(cetoacidose); demandando tratamento emergencial. 
A cetoacidose ocorre em consequência da deficiência na produção insulina no 
pâncreas. Por conta dessa deficiência, há um aumento crítico dos níveis de glicose no sangue, 
porém, ela não pode ser utilizada. Sem glicose disponível, os ácidos graxos passam a ser 
utilizados como “combustível” principal das células, levando a uma alteração metabólica 
características da diabetes: a oxidação excessiva, mas incompleta dos ácidos graxos no fígado. 
O acetil-CoA produzido, não pode ser oxidado completamente pelo ciclo do ácido cítrico, pois 
a alta relação NADH/NAD1 produzida pela b-oxidação inibe o ciclo (NELSON; MICHAEL,2014). 
O acúmulo de acetil-CoA leva à superprodução dos corpos cetônicos, acetoacetato 
e b-hidroxibutirato, que não podem ser usados pelos tecidos extra-hepáticos na velocidade com 
que são produzidos no fígado. A superprodução de corpos cetônicos, chamada de cetose, resulta 
em uma concentração muito aumentada desses compostos no sangue (cetonemia) e na urina 
(cetonúria). Os corpos cetônicos são ácidos carboxílicos que se ionizam, liberando prótons. No 
diabetes não controlado, esta produção de ácido pode superar a capacidade do sistema tampão 
bicarbonato do sangue e produzir uma redução no pH sanguíneo, chamada de acidose, ou, em 
combinação com a cetose, cetoacidose, combinação potencialmente letal (NELSON; COX, 
2014). 
 
4.3. Diagnóstico e tratamento da diabetes melito 1 e 2 
 O histórico de manifestações clínicas de poliúria, polidpsia, polifagia e perda de 
peso, apesar de serem comuns nos casos de diabete mellitus, não podem ser considerados 
patognomônicos da doença. Sendo assim, se faz necessária a avaliação laboratorial em todos os 
casos, incluindo minimamente a mensuração da glicemia e exame de urina tipo 1. Segundo 
PÖPPL (2011), o valor de glicemia normal nos cães varia de 60 a 100mg/dL. Valores acima de 
200mg/dl podem ser considerados como diagnostico positivo (PÖPPL et al., 2018). 
No exame de urina, glicosúria, cetonúria, lipúria, proteinúria, bacteriúria (com ou 
sem a presença de piúria) e hematúria são achados comuns em pacientes com DM. Se grandes 
quantidades de corpos cetônicos forem detectados no exame químico da urina em um animal 
com letargia, vômitos, diarreia ou desidratação, deve-se mensurar a concentração do beta 
hidroxibutirato no sangue e realizar uma hemogasometria para avaliar diminuição de 
bicarbonato e do pH sanguíneo a fim de se estabelecer o diagnóstico de cetoacidose diabética, 
instituindo-se, assim, a terapia emergencial apropriada. A presença de cetonúria associada à 
glicosúria sugere um quadro de cetose, mas não necessariamente indica cetoacidose, pois os 
mecanismos tampões do organismo podem estar mantendo o pH plasmático compensado. Além 
disso, a cetonúria pode ocorrer em indivíduos saudáveis em jejum (PÖPPL et al., 2018). 
 
 
 
 
FIGURA 2 – Diferentes tipos de insulina disponíveis no mercado nacional, dose inicial e 
suas respectivas concentrações. Fonte: Pöppl et al. (2018). 
 
 
Segundo Pöppl et al. (2018), a insulinoterapia é a base do tratamento da diabetes 
de cães e gatos (Figura 2). Como um dos principais objetivos da insulinoterapia é reduzir a 
glicemia sem causar hipoglicemia, aconselha-se iniciar com a dose mínima de insulina, 
aumentando-a conforme as necessidades individuais do paciente. Contudo, frente à ausência de 
catarata no momento do diagnóstico, há uma certa urgência em alcançar um bom controle 
glicêmico para evitar o comprometimento da visão do paciente, minimizando, assim, o impacto 
da doença na qualidade de vida do cão e na relação tutor-animal. 
 
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Em um indivíduo normal, a regulação da glicemia acontece hormonalmente a partir 
da insulina e do glucagon. No indivíduo enfermo pelo diabetes mellitus, a metabolização da 
glicose é comprometida, se for em virtude das células beta das ilhotas pancreáticas de 
produzirem insulina, há um quadro de Diabetes Mellitus do tipo 1; se for uma ocasião 
relacionada à obesidade, em indivíduos adultos, não dependente da concentração de insulina, 
há a Diabetes Mellitus do Tipo 2. Ressalta-se a poliúria, polidpsia, polifagia e perda de peso 
entre os sinais clínicos e que são comuns complicações resultantes da diabetes ou de seu 
tratamento – a insulinoterapia. 
Sobre a insulinoterapia, cabem alguns adendos: a aplicação deve ser diária, a 
insulina deve ser guardada na geladeira, deve-se utilizar seringas apropriadas e a aplicação é 
por via subcutânea na região das costelas; ademais, o animal deve ter acesso a uma dieta 
adequada para diabéticos (em quantidade adequada e horário específica. A rotina alimentar e 
uma aplicação correta da insulina são os maiores aliados para garantir a qualidade de vida do 
animal. 
 
 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
FARIA, P. F. Diabete Mellitus em cães. Acta Veterinária Brasilica, v.1, n.1, p.8-22, 2007 
 
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NELSON, D. L.; MICHAEL, M. C. Princípios de bioquímica de Lehninger [recurso 
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ed. Porto Alegre. Artmed, 2014.

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